Mateus 28.16-20

Auxílio Homilético

22/05/2005

Prédica: Mateus 28.16-20
Leituras: Deuteronômio 4.32-34,39-40 e 2 Coríntios 13.11-14
Autor: Wilfrid Buchweitz
Data Litúrgica: 1º Domingo após Pentecostes – Santíssima Trindade
Data da Pregação: 22/05/2005
Proclamar Libertação - Volume: XXX


1.Introdução

Deus nos dá sua palavra como instrumento de comunicação através de todos os tempos em todos os lugares. Mas cabe à igreja administrar a comunicação dessa palavra pelos tempos e lugares afora. Faz sentido que em diferentes situações sejam lidos e ouvidos e considerados textos adequados. O roteiro mais usado e mais conhecido é o que segue as datas mais importantes na vida de Jesus e que gira em torno dos acontecimentos de Natal, Páscoa e Pentecoste.
Mas nem todos os textos da Bíblia cabem automaticamente nesse esquema. Por isso a igreja, em suas diversas instâncias, coloca-os em outros lugares do ano eclesiástico.

Assim os três textos acima são colocados num domingo que, ao menos numa das tradições, chama-se de Domingo da Santíssima Trindade. Parece que, depois de ler e ouvir muitos textos sobre o Deus Filho (Natal e Páscoa) e no domingo passado sobre o Deus Espírito Santo, agora é importante reunir novamente num mesmo texto Deus Pai, Filho e Espírito Santo, a Santíssima Trindade. Parece que, depois de ter olhado a face Filho de Deus e a face Espírito Santo, agora é importante olharmos juntas a face Pai, a face Filho e a face Espírito Santo de nosso um só Deus.

Então um dos elementos para os cultos deste domingo é a Santíssima Trindade. Outro é o conteúdo dos três textos. Precisamos estudá-los e descobrir seu significado. E o terceiro elemento é nossa realidade, a realidade da comunidade, dentro da qual a mensagem precisa ser inserida. Como organizar tanta riqueza de forma significativa dentro da pregação, das orações e dos hinos de um culto de mais ou menos uma hora é nosso desafio.

2. Doutrina

2.1 – A Santíssima Trindade

Não cabe aqui, nem é possível, elaborar ou reproduzir uma doutrina da Santíssima Trindade. Mas quero traçar algumas considerações que me parecem importantes.

Deus sempre é maior do que nossa cabeça. Ele não cabe em nosso raciocínio. Às vezes, eu não me conheço nem entendo a mim mesmo. Como vou querer entender e conhecer Deus!

Mas, na Sagrada Escritura, Deus nos revela traços, aspectos, faces dele que são importantes, necessários, imprescindíveis para a nossa fé e vida.
A Bíblia fala de Deus como Pai, Criador. Minha vida vem dele. O mundo e tudo o que existe vêm dele. Mas, quando eu na minha Bíblia leio a palavra Pai, lembro as outras faces de Deus, a face de Filho e de Espírito Santo. Não dá para dividir Deus em partes. Junto com o Pai, Criador, sempre também está presente o Filho, o Salvador, e o Espírito Santo. Se eu falo do Filho, também estão presentes o Pai e o Espírito Santo. E o Espírito Santo sempre é o Espírito do Pai e do Filho. Por isso, se eu, a partir de minha fé cristã, digo Pai ou Criador, eu implicitamente também digo Filho e digo Espírito Santo. Se eu, a partir de minha fé cristã, digo Filho, eu implicitamente também digo Pai e Espírito Santo. Se eu, a partir de minha fé cristã, digo Espírito Santo, implicitamente também digo Pai e Filho.

Mas pode acontecer que, na minha limitação ou conveniência ou ignorância, eu só fale de Deus Pai, Deus Criador, o tempo todo, a vida toda; pode acontecer que não só a face de Deus Filho deixe de ser importante, mas que a própria obra salvadora do Filho perde sua importância na minha vida e isto pode ter como consequência que eu, ou uma igreja inteira, não tenha mais consciência do meu pecado. Ou isso pode ter como resultado que não só o Espírito Santo deixa de ser importante, mas que a própria obra santificadora do Espírito Santo perde sua importância. Então minha fé não é mais obra do Espírito Santo, mas é obra de não sei o quê. A igreja não é mais obra do Espírito Santo, mas é obra de pessoas.

O que muitas vezes acontece em igrejas nessa situação é que um grupo de pessoas ou comunidades se dá conta dessa anormalidade e começa a acentuar a dimensão esquecida ou negligenciada, que acentua ou superacentua de tal forma que cria uma nova unilateralidade. Se antes os membros da igreja só (estou exagerando de propósito) eram criaturas de Deus, agora são só (exagero de novo) pecadores. Se antes o Espírito Santo era deixado de lado, agora tudo é Espírito Santo. Uma preocupação legítima, em vez de levar a uma correção, leva a uma nova deformação. Vai dos 8 aos 80. Se no meio disso se instala uma luta por poder, o que em nós pessoas ou grupos na igreja não é muito difícil de acontecer, então o estrago e o testemunho negativo podem ser grandes. Mas cabe-nos levar a sério as pessoas e os grupos que na igreja alertam para distorções. 

Já por isso o domingo da Santíssima Trindade é importante.

2.2 – Os textos

2.2.1 – Deuteronômio 4.32-34,39-40


Moisés fala ao povo que se encontra frente à terra prometida. Faz o povo olhar para trás, para sua história, e ver como Deus o acompanhou. Podem comparar a história de Deus com Israel a qualquer outro povo e a quaisquer outros deuses. Não há comparação. Nenhum outro deus fez o que o Deus de Israel fez. E o que Deus fez no passado ele vai fazer também no futuro, quando o povo entrar em sua nova terra. Deus acompanhará o povo. Protegerá. Mostrará o caminho. Dará mandamentos. Só o Senhor é Deus em cima no céu e embaixo na terra. Se o povo guardar os mandamentos, ele irá bem e os filhos também. Vão viver bem na terra que Deus promete para sempre. A palavra de Moisés é de uma importância extraordinária nesse momento na história de Israel. O Deus Todo-poderoso entrará com o povo na terra prometida e estará com eles.

2.2.2 – Mateus 28.16-20

Jesus fala a seus discípulos numa situação que tem alguma semelhança com a de Moisés e de Israel naquele tempo. O povo de Jesus também entrará, não numa nova terra, mas num novo mundo. Para isso Jesus dá a seus discípulos a tarefa de fazerem o povo do novo Israel passar pela celebração do Batismo. O Batismo será a marca de que Deus vai estar com ele. Deus Pai, Filho e Espirito Santo vai estar com as pessoas e o povo até o fim do mundo. Também aqui não haverá comparação com outros deuses. Jesus tem todo o poder no céu e na terra.
E Jesus dá mais uma tarefa: ensinar ao povo os mandamentos. Na obediência aos mandamentos, o novo Israel também irá bem. Sem os mandamentos, o velho Israel foi mal e o novo também irá mal. Ignorar ou desprezar os mandamentos será desprezar Deus, afastar-se de Deus, desprezar o pacto estabelecido por Deus no Batismo.

2.2.3 – 2 Coríntios 13.11-14

Entendo que este texto foi escolhido e juntado aos dois acima por causa da menção da Trindade no versículo 13. O Deus Pai, Filho e Espírito Santo está, estará e o apóstolo Paulo deseja que esteja com as pessoas cristãs e a comunidade de Corinto. Assim como Moisés e Jesus, também Paulo menciona os mandamentos: Aperfeiçoai-vos, consolai-vos, sede do mesmo parecer, vivei em paz (v. 11). Onde isto acontecer, a comunidade irá bem. E Paulo mostra, em outros trechos das duas cartas aos Coríntios, que onde eles não respeitam os mandamentos, as pessoas e a comunidade vão mal.
E que a graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo sejam com eles é o voto de Paulo. Através de graça, amor e comunhão Deus estará com eles, sempre.

3. A realidade

Numa primeira olhada saltam aos olhos violência, injustiça, exploração, desemprego, doença, descrença, falta de esperança, filas em toda parte, insegurança, desfalques, corrupção, um quadro muito sombrio. Algumas dessas coisas têm suas causas a nível individual, outras a nível coletivo local ou nacional ou internacional ou global.

Este é o pano de fundo do tom, do clima, da atmosfera de televisão, jornal, conversa de grupos.

Mas quando a gente olha mais detidamente, com mais cuidado e com mais atenção, percebe-se no meio do quadro acima muita vida, muito amor, muita luta pela vida por parte de pessoas, grupos, comunidades, igrejas, ONGs (organizações não-governamentais), escolas, grupos de voluntários, empresas, em uma diversidade e criatividade muito grandes. Há milagres pipocando em muitos lugares. A gente corre perigo de não enxergar isso, porque esses sinais são simples, não causam sensação, não interessam muito à mídia, não vendem jornal.

Dá para constatar tranqüilamente que, ali onde são vividos e aplicados valores como os que propõe o evangelho e mandamentos como os que estão na Bíblia, nasce e cresce vida. Nem todas essas coisas acontecem nas igrejas. Muitas vezes, acontecem em quaisquer grupos. E quem diz que Deus não age por meios e caminhos que não são identificados como cristãos? O Espírito de Deus age onde quer. Lembro-me de ter lido um texto em que Dietrich Bonhoeffer, que lutou ativamente contra a violência do nazismo e por isso foi preso e executado, manifesta-se no sentido de que há épocas em que se devem identificar as diferenças entre pessoas, grupos, igrejas, para clarear motivações, objetivos, verdades. Mas que há outras épocas em que todas as pessoas que lutam pelo bem e justiça devem juntar suas forças para lutar pelo bem e pela justiça, independente de traços e naturezas diferenciados. Ele era de opinião de que na situação em que ele vivia isso deveria acontecer. Acho que hoje Bonhoeffer diria a mesma coisa, que todas as pessoas de boa vontade devem unir suas forças na luta contra sofrimentos e males.

4. Meditação

Num mundo injusto e cheio de males, Deus é Senhor e acompanha a caminhada de seu povo. Este é o evangelho, a boa-nova de todos os textos. O que deixa a gente pensativo é que essa injustiça e grande parte desses males são causadas por estruturas construídas e sociedades administradas por pessoas e países assim denominados de cristãos. A Europa é de tradição cristã. A América do Norte também. A América do Sul também. O Brasil se orgulha de sua tradição cristã. A grande maioria dos governantes é batizada e seus filhos também. A grande maioria das pessoas responsáveis pela economia também é batizada e seus filhos também. As igrejas sempre tiveram poder e influência muito grandes. O Brasil é um país muito rico. Como então montar estruturas e leis que permitiram e até promoveram tanta injustiça? Como é que o amor e a justiça foram banidos pelo egoísmo e pela ganância. Onde ficou o Batismo? Se guardar os mandamentos tem a promessa de ir bem, por que vamos tão mal? E os filhos também vão mal. E os netos também.

Fomos batizados, mas não assumimos o Batismo? Estudamos os mandamentos, mas não os aplicamos na vida? Confessamos nossos pecados, mas não nos arrependemos e não mudamos de vida? Deus é maior do que todos os deuses. A Jesus foi dado todo o poder no céu e na terra. Por que permitimos que outros deuses tomassem conta ou por que chamamos outros deuses? Ou não ensinamos os mandamentos às pessoas, aos filhos? Por que não estudamos os mandamentos?

Deveríamos conhecer Deus melhor? Dividimos Deus em partes e observamos só a parte que nos convinha? Damos atenção ao Criador, mas achamos que não precisamos do Salvador porque não temos pecado? Por que não sabemos o que fazer com o Espírito Santo e o deixamos de lado? Absolutizamos o Criador, ou o Salvador, ou o Santificador? 

Não soubemos dar repercussão política ao serviço da igreja? Ou substituímos a dimensão evangélica de nossa pregação pela dimensão política e, às vezes, por política partidária?

Ao mesmo tempo pregamos, sim, a palavra de Deus e ensinamos, sim, os mandamentos e, por isso, pessoas e comunidades viveram e vivem melhor. Há experiências de vida feliz e rica ao nosso redor. Às vezes, corremos perigo de nos deixar contagiar por um pessimismo generalizado e nos tornamos cegos para os milagres que acontecem ao nosso redor e em nosso meio. Achamos que só os seres humanos vão decidir os rumos do mundo e esquecemos que Jesus Cristo é o Senhor. Por que não nos treinamos para ver os sinais de vida ali onde pessoas amam e praticam a justiça? Por que não falamos disso? Por que não agradecemos por isso? Por que não louvamos a Deus pela sua presença entre nós? Por que não escrevemos em nossas mesas, como fez Martim Lutero, ou em outros lugares Baptisatus sum (sou batizado), Jesus Cristo é o Senhor da minha vida?

5. A prédica

Há várias possibilidades para a prédica. Vou mencionar aquelas que eu vejo:

a) Pode-se, partindo do domingo, pregar sobre a Santíssima Trindade. Ajudar a comunidade a entender algo mais da Trindade e depois trazer esse Deus triuno para a comunidade de nosso tempo naquilo que os textos dizem.

b) Pode-se tematizar o Deus presente na caminhada do povo de Deus através da história. Deus está presente com poder e, ali onde nós o permitimos e estamos dispostos a ser seus instrumentos, vai-se bem, experimentam-se sinais do reino. 

c) Pode-se tematizar o Batismo. Somos batizados. Que importância o Batismo continua tendo em nossa vida? Vamos recordar nosso Batismo? Vamos reassumir nosso Batismo?

d) Vamos tematizar: batizar e ensinar?

6. Subsídios litúrgicos

Confissão de pecados: Agradecemos-te, misericordioso Deus, que podemos iniciar nosso culto com a confissão de nossos pecados, de nossas confusões e de nossos medos. Agradecemos-te, nosso Senhor Jesus Cristo, que entregaste tua vida na cruz para nos redimir de todo mal e nos reconciliar com Deus. Agradecemos-te, Espírito Santo, que intercedes por nós e nos consolas quando oramos: Tem piedade de nós, Senhor.

Oração do dia: Deus Pai, Filho e Espírito Santo. Prostramo-nos em adoração diante do mistério de tua essência divina. Não pretetendemos decifrar o que não podemos entender. Ajuda que aceitemos: chamar-te, ó Deus, nosso Pai, conhecer-te, Senhor Jesus, como nosso irmão e salvador, invocar-te, Espírito Santo, como nosso consolador e poder em nossas vidas. Glória seja a ti, Deus triuno, que nos aceitas. Fortalece nossa fé, Senhor. Amém.

Oração de intercessão: Pedir que a comunidade mencione motivos de intercessão e intercalar as preces com: Tem, Senhor, piedade.

Bibliografia

HEIM, Burkhard. Beten im Gottesdienst. Neuffen: Sonnenweg Verlag, 1973.
SCHLATTER, Adolf. Das Evangelium nach Matthäus. Stuttgart: Calwer Verlag, 1947. (Schlatters Erläuterungen zum Neuen Testament, 1)
SCHNIEWIND, Julius. Das Evangelium nach Matthäus. 5. ed. Göttingen: Vandenhoeck&Ruprecht, 1950. (Das Neue Testament Deutsch, 2)
WOLFF, Günter. Mateus`28.16-20. In: Proclamar Libertação. Vol. X, São Leopoldo.

 


Autor(a): Wilfrid Buchweitz
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 1º Domingo após Pentecostes - Domingo da Trindade
Testamento: Novo / Livro: Mateus / Capitulo: 28 / Versículo Inicial: 16 / Versículo Final: 20
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2004 / Volume: 30
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 20354
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