João 6.60-69

Auxílio Homilético

10/09/2006

Prédica: João 6.60-69
Leituras: Josué 24.1-2a,14-18 e Efésios 5.21-31
Autor: Heinz Ehlert
Data Litúrgica: 14º.Domingo após Pentecostes
Data da Pregação: 10/09/2006
Proclamar Libertação - Volume: XXXI

1. Considerações exegéticas

O trecho em pauta está no final do capítulo que narra os acontecimen- tos e o discurso de Jesus na Galiléia, que conduziram para uma definição dos galileus em relação a Jesus, que se autoproclama de pão de Deus ou “pão do céu”.

No capítulo anterior (5), Jesus defende sua autoridade contra a agressão por parte dos judeus, reportando-se à mensagem de Moisés, que invoca como testemunha para as suas afirmações.

No presente capítulo, o milagre (“sinal”) da alimentação de uma multidão (5 mil) leva a uma interpretação errônea, terrena, de sua missão. Querem fazê-lo rei “à força”. Jesus esquiva-se para, no dia seguinte, procurado pela multidão, esclarecer as coisas num tipo de “homilia” sobre o outro “maná” que procede do céu, diferente daquele que “os pais” comeram no deserto. Culmina com a afirmação de que ele, em pessoa, é o maná que vem do céu. “Eu sou o pão da vida.

Quem vem a mim, nunca mais terá fome. E quem crê em mim nunca mais terá sede.” Com sempre novas variações explica quem ele é e qual a missão que tem do Pai (vv. 36-58). Ele é o mediador único da vida eterna.

Imediatamente antes do trecho em estudo, ainda se encontra uma observação interessante sobre a localização dos acontecimentos: na sinagoga de Carfanaum, junto ao lago de Genesaré.

Analisemos, a seguir, mais pormenorizadamente os versículos do trecho indicado (vv. 60-69):

vv. 60 e 61: Deve tratar-se de um número maior de simpatizantes, que o evangelista até chama de discípulos ou “seguidores”. Até aí achavam interessante o discurso do mestre. Agora notam que a coisa fica mais séria, exige um posicionamento. Entre si comentam que é um discurso “duro”, que não dá para engolir ou aceitar.

Embora não falem diretamente a Jesus, esse percebe o que acontece. Por isso a pergunta que ao mesmo tempo revela que ele está a par da reclamação deles referente ao discurso “duro” e da intenção de abandoná-lo por causa disso e desafia para um diálogo esclarecedor. Só depende da disposição de ele quererem ouvir.

v. 62: O conteúdo da continuação, porém, não facilita em nada, não ameniza. Aponta profeticamente para um evento futuro, mas que diz respeito à missão maior do “Filho do Homem”. Ela culminará no “subir para onde estava antes”. Reforça a afirmação de sua origem celestial e a sua volta ao Pai que o enviou. Com outras palavras: prenuncia a sua ascensão. Mas, no contexto de João, “subir” também indica para o tipo de morte, ou seja, subir à cruz.

Cabe destacar que Jesus, segundo João, usa o mesmo termo/título “Filho do Homem” que encontramos nos evangelhos sinóticos (Mt 25.31; Mc 8.31.38; Lc 9.58).

v. 63: A vida verdadeira provém do Espírito de Deus – uma referência à palavra criadora de Deus (Gn 2.7). Só que aqui Jesus identifica as suas próprias com as de Deus, atribuindo-lhes o mesmo poder.

v. 64: Uma constatação que expressa: Jesus sabe o que vai acontecer – gente que não vai crer e até a traição (de Judas). Deixa transparecer tam- bém a sua tristeza por isso.

v. 65: A consequência: estão fora da salvação. O Pai não os trouxe para junto dele.

v. 66: Agora se confirma o que Jesus previu: a debandada desses seguidores simpatizantes, que não quiseram aceitar que Jesus é o “Filho do Homem” (= filho de Deus).

v. 67:.A pergunta dirigida especificamente aos doze exige definição e decisão. Eles continuarão discípulos com tudo o que isso implica, oferta e compromisso?

v. 68: Simão Pedro faz-se porta-voz de todos eles na forma de uma contrapergunta: ir a quem? Seguida da afirmação: “Tu tens as palavras da vida eterna”, mostrando que aceitam o afirmado por Jesus (v. 63). O que será explicitado numa confissão solene.

v. 69: “E nós temos crido e conhecido que tu és o Santo de Deus” (prefiro essa tradução àquela da “Linguagem de Hoje”). Semelhante à confissão de Pedro nos sinóticos (Mt 16.16; Mc 8.29; Lc 9.20), a formulação em João expressa a fé no Messias, mas diferente do que lá não fala, nem em “Cristo”, nem em “Filho de Deus”, mas em “Santo de Deus” (cf. também Mc 1.24; Lc 4.34 – proferido por um possesso de “espírito imundo”). Jesus é o “santo de Deus”, porque Deus o santificou (Jo 10.36) e Deus mesmo está nele (Jo 10.30.38). Ele faz parte de Deus – no verdadeiro sentido da palavra – e não do mundo. Digno de nota é que a confissão aparece como fruto de crer e (re)conhecer. O reconhecimento pode ser entendido como oriundo da fé, e não vice-versa. O encontro com Jesus resulta nisso. Por isso as suas palavras são reconhecidas como da vida eterna, ou seja, com poder de dar a vida eterna (v. 63), o que ninguém mais poderia proporcionar. Seria, pois, loucura abandoná-lo. Segui-lo é a única alternativa .

2. Meditação

Os evangelistas dão testemunho do ministério de Jesus na Terra Santa, na Palestina, no seu tempo. Narram milagres, feitos e discursos, ensinos de Jesus. Falam também, maravilhados, do impacto que causaram, do efeito que tiveram sobre o povo, as “multidões”. Em grande parte seria uma história de sucesso – até a intervenção das autoridades eclesiásticas e depois civis. Pois em muitas ocasiões até conseguiu calar os escribas, os professores da lei.

O evangelista João conta-nos, no trecho em estudo, uma situação diferente. Os simpatizantes não só se irritaram, escandalizaram, mas se retiraram, abandonando-o sob protesto. Que experiência amarga para qualquer professor, profissional liberal, comerciante, artista ou político – e até para o pregador! Pois eles dependem do aplauso, consentimento e apoio dos discentes, dos clientes, do público, do povo. Será uma questão não só de realização pessoal e auto-estima, mas de sobrevivência.
Os profetas do Antigo Testamento experimentaram recusa, oposição e perseguição, muitas vezes dos governantes e outros poderosos. João Batista, esse profeta e precursor de Jesus, acabou encarcerado e assassinado, apesar do sucesso que teve entre o povo.

Jesus passou pela experiência de “muitos discípulos” virarem-lhe as costas e o abandonarem, apesar dos “sinais” que presenciaram ou de que ouviram falar. Jesus também ficou triste – certamente não por causa dele, de seu insucesso, mas por causa deles: vão ser excluídos da salvação. Não serão participantes da vida eterna. Era uma questão de vida e morte, sim. Salvação e vida para os seres humanos, criados à imagem de Deus. “Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu filho unigênito para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3.16). O ministério de Jesus tinha esse sentido.

Vivemos num mundo globalizado, numa sociedade pluralista, tanto em relação à cultura, à religião, como em relação aos recursos para a sobrevivência. Os meios de comunicação na era internet contribuem para dar-nos a impressão de que estamos atualizados quanto à situação e ao momento que vivemos.

Que papel pode ter o evangelho, a mensagem de Cristo, nesse contexto? E qual a situação de seus discípulos hoje?

Membros da igreja são, por definição, discípulos, seguidores de Jesus. Que significa isso neste nosso mundo? Neste mundo pluralista, onde uma imensidão de outros valores são apregoados e oferecidos para a “vida”? Onde líderes e ídolos buscam homens e mulheres, crianças e velhos para que comprem as mercadorias, abracem a causa, submetam-se à influência deles e lhes sirvam? Mas sempre na ilusão de que é para o seu bem?

Não se pode fechar os olhos diante da verdadeira situação que vivemos. Aos milhares de miseráveis em nosso derredor por causa de estruturas injustas, de exploração evidente, de enganações e entorpecimentos os mais variados.

É preciso voltar-se a Jesus, abrir-se para o encontro com ele. Ele está aí e bate a porta. Tem palavras da vida eterna. O evangelho é também hoje poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê (Rm 1.16).

Mas certamente não basta ao discípulo usufruir. Somos enviados com o evangelho para dentro do mundo. Este nosso mundo globalizado e pluralista, pervertido e corrupto, precisa do evangelho. O evangelho que tem poder curador. Mas é confiado a gente como nós. Gente frágil, sendo ao mesmo tempo justos e pecadores. É certo que o Cristo confessado pelos apóstolos precisa ser interpretado para os nossos contemporâneos por palavras e ações. Exige dedicação e sacrifício. Será que estamos prontos para isso?

3. Indicações para a prédica

Título: Seguir ou abandonar – eis a questão.

Passos:

Poderíamos iniciar citando a pergunta de Jesus e a contrapergunta de Simão Pedro (vv. 67 e 68). E continuar: Como será que você responderia sinceramente? Dependerá de sua experiência prévia com Jesus. Quem é Jesus para você neste mundo em que vivemos?

A seguir, descrever com alguns exemplos o momento histórico que vivemos, caracterizado pela globalização e pluralidade de ofertas (nos campos religioso, ideológico, comercial, econômico e político), ao lado da exclusão e exploração, da miséria de grande parte da população.

Passar então a falar do evangelho como boa notícia para essa vida diante do futuro incerto e da morte certa. O que representa, de concreto, ter ao alcance “palavras da vida eterna”? Mas não deixar de mencionar o “duro” da pregação de Jesus. Seguir ou abandonar diante disso!

Numa terceira parte, admitida a decisão de seguir a Jesus, concluir com o compromisso que implica ser seguidor de Jesus em nossa situação vivencial.

Terminar com a confissão de Simão Pedro (como porta-voz também nosso).

Bibliografia

BÜCHSEL, Friedrich. Das Evangelium nach Johannes. In: Das Neue Testament Deutsch. 5. ed. Göttingen: Vandenhoek & Rupprecht, 1949.
BÜLK, Walter Das Johannesevangelium und die Gegenwart. 2. ed. Hamburg: Agentur des Rauhen Hauses, 1948.
SCHNEIDER, Johannes. Das Evangelium nach Johannes. In: Theologischer Handkommentar zum Neuen Testament (Sonderband). 2. ed. Berlim: Evangelische Verlagsanstalt, 1978.

 
 


Autor(a): Heinz Ehlert
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 14º Domingo após Pentecostes
Testamento: Novo / Livro: João / Capitulo: 6 / Versículo Inicial: 60 / Versículo Final: 69
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2005 / Volume: 31
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 23656
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