Apocalipse 19.11-16

Auxílio Homilético

19/11/1978

Prédica: Apocalipse 19.11-16
Autor: Ricardo Nör
Data Litúrgica: Penúltimo Domingo do Ano Eclesiástico
Data da Pregação: 18/11/1978
Proclamar Libertação - Volume: III

 

l - Prelimnares

O livro de Apocalipse (=Revelação) apresenta características peculiares dentro do grupo de livros que formam o Novo Testamento. O autor relaciona a concepção apocalíptica de historia com a mensagem da cruz, ressurreição e volta de Cristo para, assim, apresentar a sua última etapa. A descrição dos acontecimentos finais com as cores vivas da apocalíptica tem o propósito de fortalecer as comunidades cristãs então ameaçadas por poderes antagônicos bem como exortá-las à vigilância. As visões apresentam, sob o sinal do reinado de Deus e de sua implantação definitiva, o sentido das perseguições e martírios resultantes do testemunho ao Senhor. Apocalipse constitui-se, portanto, de mensagem profética marcada pela expectativa do fim iminente sendo dirigida para dentro de uma situação histórica concreta.

II - Texto e contexto

A perícope 19.11-16 inicia o último dos sete ciclos de visões, que trata da vinda de Cristo e a vitória de Deus sobre a humanidade rebelde e todas as forças antidivinas (19,.11-22.5). Mediante esta vitória acontece a libertação definitiva da comunidade cristã dispersa pelo mundo. O conteúdo do livro obedece indicação dada em l.19: João reproduz a aparição do Cristo exaltado (1.9-20), a realidade atual existente, descrita nas sete cartas circulares às comunidades (caps. 2-3), e os acontecimentos escatológicos (caps. 4-22), que formam o corpo principal da obra.

III - Observações exegéticas

V. 11: Vi o céu aberto: a revelação apocalítica atinge aqui um dos seus pontos altos. No início (4.1) é aberta apenas uma porta no céu, em 11.19 é o templo de Deus. Com o início da parusia o próprio céu é aberto. Um cavalo branco e seu cavaleiro: o cavalo e a montaria do rei e do comandante, e o branco é a cor da luz, do que é celeste, escatológico, vitorioso. É possível explicar em parte a origem da figura através das cerimônias romanas onde o César é homenageado como o triunfador. Aqui, Cristo é visto como o único e verdadeiro vitorioso. O quadro é oposto ao da entrada de Jesus em Jerusalém, que nada tem de triunfal. O Rei deixa do sinal da humildade e vem como vencedor poderoso para julgar com justiça e lutar: em cumprimento à profecia de Isaías 11.4, o Messias militante reina agora como soberano justo. Seu nome é Fiel e Verdadeiro - como o próprio Deus! - que quer a vida dos homens e destrói os que destroem a terra (11.18.

V.12: Como Deus, Dn 10.6, seus olhos são como chama de fogo: nada escapa do seu olhar julgador. Ele tem mais coroas que o dragão (12.3) e a besta (13.1): seu domínio sobrepuja a todos, pois lhe foi confiada a soberania de Deus. 'Sua característica peculiar é expressa pelos nomes que lhe são atribuídos. O segundo dos quatro nomes mencionados (vv.ll,l2,l3,l6) só ele conhece: ninguém pode dispor dele (cf. Mt 11.27). O significado real do seu ser permanece oculto, inacessível.

V. 13: A comunidade de fé, porém, o reconhece através do seu terceiro nome: A Palavra de Deus, a própria pessoa de Jesus Cristo. Também na parusia ele aparece com a marca da sua morte: veste molhada em sangue.

V.14: O surgimento de grupos de anjos vestindo trajes brancos e limpos faz antever a vitória decisiva daquele que é puro. Estes exércitos celestiais não portam armas, o que destaca o sacrifício e a vitória exclusivamente através de Jesus Cristo.

V.15: A única arma de Cristo é a espada afiada: a palavra de Deus que julga. Ela é suficiente para a vitoria já prognosticada em 17.14 (veja também Mt 24.35)- Apascentar com cetro de ferro não significa um domínio de força, mas a destruição das nações em decorrência do julgamento. A linguagem simbólica em 15b é um pleonasmo que acentua o fato da ira de Deus ser definitiva. A parusia é num primeiro momento palavra de juízo que destrói toda e qualquer sublevação contra Deus.

V.16: O cavaleiro traz o título que atesta a sua dignidade: Rei dos reis e Senhor dos senhores. O Cordeiro sacrificado, reconhecido até então apenas pela comunidade cristã, se torna agora visível diante de toda a humanidade como o Senhor supremo.

Os acontecimentos descritos em 19.11-l6 têm caráter literário, o que significa dizer que não se trata do desenrolar de um evento histórico temporal. A visão não quer apresentar uma descrição objetiva de fatos concretos, mas procura relatar através de categorias literárias apocalípticas o que, na verdade, transcende a esfera humana do perceptível. O emprego de uma linguagem figurada serve para expressar o inexprimível: Jesus Cristo, o Senhor, vem em triunfo para julgar através da sua palavra a humanidade que se recusa a santificar a Deus e que quer construir o futuro com as próprias mãos.

IV - Meditação

A visão se destina as comunidades cristas que sofrem dificuldades por causa da sua fé no Senhor dos senhores. O seu testemunho gera conflitos com os poderes dominantes do mundo. Muitos fatores parecem indicar que o futuro está nas mãos destas forças antagônicas a Deus. Contra todas as aparências, porém, Cristo vem para julgar os opressores. Esta mensagem consoladora, humanamente absurda, ë revestida com a roupagem viva e marcante da apocalíptica. O quadro esboçado é fantástico e até mesmo grotesco: muitas coroas e uma só cabeça, olhos como chama de fogo, espada afiada saindo da boca... Assim, com o uso de recursos literários apropriados, é anunciado o fim iminente.

A comunidade de fé, imbuída da ardente expectativa pelo fim que trará consigo a libertação de todas as suas privações, apresenta como característica o seu não enquadramento no estado de coisas vigente. A ordem presente é relativizada por fazer parte das coisas penúltimas. O acontecimento decisivo ainda está por vir através de uma intervenção direta de Deus. Esta esperança permite que a comunidade crista compreenda o sentido da história universal a partir do futuro por ela já conhecido.

A visão afirma que o juízo se efetivará através de acontecimentos provenientes de fora. Isso significa que não há margem para qualquer concepção de um desenvolvimento progressivo da humanidade rumo a um estágio perfeito. A transformação definitiva não se dará mediante mudanças históricas, políticas ou sociais. Também a comunidade cristã está sempre de novo ameaçada pela tentação de construir o futuro mediante o uso de recursos humanos. A visão deixa claro que o novo céu e a nova terra devem ser aguardados única e exclusivamente de cima.

A imagem apresentada pela visão parece estar estruturada nos diferentes nomes do cavaleiro: Fiel e Verdadeiro (v.11), nome que ninguém conhece (v.12), a Palavra de Deus (v.13), Rei dos reis e Senhor dos senhores (v.16). A designação dos nomes desempenha papel decisivo na compreensão da visão.

A palavra de Deus encarnada na pessoa de Jesus de Nazaré, outrora apenas captada pela fé, se torna agora manifesta aos olhos de toda a humanidade. O homem humilde montado num burrinho e que morre indefeso numa cruz aparece de maneira nada pacífica como o Senhor dos senhores - para julgar! Cristo vem como juiz. Aqui reside uma dificuldade especial do texto. Numa época em que se acentua tanto a comunhão fraterna é duro ter que ouvir - e anunciar! - que Cristo vem para separar os homens entre si. Com a parusia chega o momento da separação visível entre o trigo e a erva daninha. A visão exige da prédica o anúncio da polarização clara dos homens - acontecimento aguardado não apenas para o fim dos tempos, mas já inaugurado na estrebaria de Belém.

Com Jesus se estabelece a divisão entre os homens: Não penseis que vim trazer paz à terra; não vim trazer paz, mas espada (Mt 10.34). Ele é para uns rocha de salvação e para outros pedra de tropeço (l Pe 2.6ss). A separação entre luz e trevas continua acontecendo no momento presente, sempre, porém, de maneira velada, escondida.

É necessário que se atente para o fato que a visão não fala de um final feliz, como é o caso em outras passagens bíblicas. O que a comunidade cristã pode fazer aqui é interceder e permanecer numa atitude de fé no Senhor, em cujas mãos está o futuro de todos.

V - Indicações para a prédica

Como motivação podem-se apresentar algumas interpretações bastante difundidas em nosso meio como, por exemplo, a tentativa de ver em acontecimentos atuais o cumprimento de profecias contidas no livro de Apocalipse: as guerras, a violência, a fome, etc., são compreendidas como sinais dos últimos tempos - como se nunca tivesse havido guerras,, violência e fome neste mundo... Aqui se poderia explicar que o Apocalipse não quer ser entendido como um livro de futurologia onde são apresentadas especulações históricas. Um outro exemplo que poderá despertar o interesse dos ouvintes é o referente ao número de escolhidos que entrarão no reino de Deus, cuja soma dá exatamente 144.000. Este número pode ser decomposto da seguinte forma: 12 x 12 x l.000, sendo que o número 12 é designativo dos eleitos, dos escolhidos de Deus (12 foram as tribos de Israel, 12 os discípulos de Jesus). O valor 1.000 expressa a imensidade, quer dizer o mesmo que muito. A cifra total significa, portanto, a multidão incontável dos eleitos de Deus. Com a explicação deste número simbólico se poderá apontar para os problemas que fatalmente surgirão com uma interpretação literal - ao pé da letra - do livro. Após a leitura do texto poderão ser explicados, em rápidos traços, os diferentes elementos que compõem a visão. Depois de os ouvintes terem uma noção da linguagem figurada do texto, poder-se-á entrar então na parte principal da prédica. Aqui, uma das possibilidades é centrar os pensamentos no tópico Cristo vem para julgar”, com a análise de suas consequências, algumas delas já apontadas na meditação.

VI - Bibliografia

- BRÜTSCH, Charles. Die offenbarung Jesu Christi. In: Zürcher Bibelkommentare. Vol. 2: Capitulos 11-20. Zwingli Verlag, Zurich, 1970.
- LOHSE, Eduard. Die Offenbarung des Johannes. In: Das Neue Testament Deutsch. Vol. 11. 9a. ed., Vandenhoeck & Ruprecht, Göttingen, 1966.
- CALWER PREDIGTHILFEN. Vol. 10. Calwer Verlag, Stuttgart, 1971.
- HÖREN und FRAGEN. Vol. 6. Neukirchener Verlag, 1971.


Autor(a): Ricardo Nör
Âmbito: IECLB
Testamento: Novo / Livro: Apocalipse / Capitulo: 19 / Versículo Inicial: 11 / Versículo Final: 16
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1978 / Volume: 3
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 18177
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