Companheiro fiel e inseparável nas Novas Áreas

A PALAVRA DO LEITOR

01/08/1988

Companheiro fiel e inseparável nas Novas Áreas

P. Geraldo Schach

Quem já ouviu falar em Pimenta Bueno? Em início de 1972, o Jornal Evangélico falava, pela primeira vez, desta desconhecida localidade, no então Território de Rondônia, onde se encontrava um punhado de famílias evangélicas, vindas do Estado do Espírito Santo. Elas vieram em busca de terra para si e para seus filhos e acamparam na barranca do rio Melgaço, ao lado de cabanas de seringueiros e pescadores, cercados de mata nativa por todos os lados.

Naquela época, o Jornal Evangélico, num artigo do pastor Jost Ohler, desafiava: É a IECLB uma Igreja missionária? Evangélicos de Rondônia esperam por um pastor que os acompanhe na construção de um novo lar e uma nova comunidade. Até quando a 1ECLB vai esperar para ir até Rondônia?

Há muitas maneiras de se ler o JOREV. Para uns, o seu recado passa desapercebido; para outros, ele significa chamado ao engajamento, conscientização e até mudança de endereço. Para os primeiros evangélicos de confissão luterana nas Novas Áreas de Colonização (NAC), o JOREV sempre foi companheiro fiel e inseparável.

Foi ele que motivou o primeiro pastor (na época, professor catequista) a solidarizar-se com os pomeranos capixabas que construíram as primeiras comunidades e capelas de tábua no então Território de Rondônia. Qual não foi a alegria dessa gente, quando, em 1972/1973, o Jornal Evangélico publicava as fotos dos primeiros cultos, das primeiras comunidades, lavouras de arroz, de café e outras.

UM CASAL DE PATOS

Novas levas de migrantes chegavam a cada dia. Os evangélicos cresciam em número e organização. A publicação de nomes como Braun, Hollander, Discher, Boone, Brandt, Tesch, Kester, e de lugares como Pimenta Bueno, Melgaço, Espigão d'Oeste e Cacoal, representavam para centenas de meeiros, agricultores sem-terra, do Espírito Santo, um sinal de esperança rumo a um futuro melhor numa nova terra.

O Jornal Evangélico ganhou terreno nas selvas de Rondônia. Em dois anos, o número de famílias evangélicas aumentou muito e a metade destas eram assinantes do JOREV. O Arnoldo até vendeu um casal de patos para fazer a sua primeira assinatura!

Cada nova edição do Jornal era esperada com ansiedade. Muitos caminhavam quilômetros até a casa paroquial, só para saber se a Folha Dominical já havia chegado. Num mundo tão distante da terra natal, a notícia através do JOREV provocava sorrisos e lágrimas. Mexia com a vida. Fazia um bem danado ver a foto de alguma igreja que eles mesmos ajudaram a construir.

No dia em que o JOREV publicou fotos dos primeiros cultos em Rondônia, a alegria foi geral. Uns diziam: Agora os parentes vão ficar sabendo que as onças ainda não nos devoraram. Alguém disse: Veja só, eu nunca pensei que um dia iria sair num jornal. Só quem viveu aquele isolamento sabe avaliar, mais de perto, o quanto de ânimo isto significou para esta gente humilde.

VIDA DURA NA SELVA 

Foi naqueles primórdios da IECLB nas Novas Áreas de Colonização que o Jornal Evangélico publicou artigo do Pastor Presidente da IECLB, Karl Gottschald, desafiando comuni-dades e paróquias de todo o Brasil a apadrinharem comunidades em Rondônia. A Comunidade de Lajeado, no Rio Grande do Sul, foi a única que respondeu ao apelo do Presidente. Na época, muitos de nós se perguntavam se valia a pena investir naquele sertão longínquo, sabendo que não se dava conta nem dos desafios nas antigas comunidades.

Assim, o JOREV, talvez sem querer, tornou-se instrumento de avaliação do espirito comunitário reinante em nossa Igreja como um todo. Mas, enquanto as comunidades estavam preocupadas consigo mesmas, isso não acontecia com muitos evangélicos isoladamente. A publicação de histórias da vida dura na selva fez brotar belos testemunhos de solidariedade e de comunhão à distância.

Assim foi quando o Alberto fraturou a perna no mato e teve que ser carregado nas costas do irmão por diversos quilômetros, até encontrarem socorro. Este relato foi lido no Jornal Evangélico por um leitor no leito de um hospital em Santa Rosa (RS).

Este leitor, que por coincidência estava hospitalizado também em razão de uma perna fraturada, fez uma significativa doação em dinheiro ao Alberto, de Rondônia. Ele, no entanto, não teve gesso, nem hospital, nem enfermeira. Dor partilhada gera vida e alegria! Creio que este tipo de solidariedade veiculada pelo Jornal Evangélico sensibilizou muita gente no caminho da fé em nossa Igreja. Assim também novos obreiros deixaram desafiar-se a assumir o ministério na área da saúde, da educação, da agricultura, entre outros.

A famosa história do recorte

Entre os fatos pitorescos que aconteceram com pessoas e Jornal Evangélico conto a mudança dos Vesper, que vieram do Paraná, e a localização do Joni, de Taquara(RS), em Tangará da Serra, no Mato Grosso.

Os Vesper encostaram seu caminhão de mudança em Pimenta Bueno, e com o Jornal Evangélico na mão, pai, mãe c filhas batiam de casa em casa procurando o pastor local. Quando a gente se encontrou, conferiram, mais uma vez, o meu nome no jornal, e entre sorrisos de alegria, disseram: Nós vamos morar daqui a uns 200 quilómetros, num lugar chamado Ouro Preto. Queremos cultos, sua visita e uma assinatura do 'Nosso Jornal'. Quando o senhor aparece por lá?

Também no Mato Grosso a IECLB engrossou suas fileiras na década de 70. Quem não lembra das estórias cheias de aventuras do Hildor Reincke no Jornal Evangélico? Ele mesmo se dizia pastor caixeiro-viajante, e quando localizava um membro da Igreja, apresentava-se como comprador de arroz, borracha e outros.

Pois foi no Mato Grosso, na cidadezinha de Tangará da Serra, onde o Joni, de Taquara (RS), recebeu um recorte do Jornal Evangélico, via correio, que falava da presença da IECLB nesta localidade.

FAMOSO RECORTE

Joni, que trabalhava no laboratório do hospital, não se conteve c mostrou o recorte ao primeiro cliente do dia. O Alemãozinho apertou as mãos do Joni, dizendo: Rapaz, nós somos da mesma Igreja. Que legal! Os cultos são lá perto de casa. Vê se comparece no domingo que vem! A história do recorte do JOREV tornou-se famoso, e o Joni, tesoureiro da comunidade! 

Se, por um lado, estas matérias de conteúdo não comprometedor eram muito solicitadas, por outro, os artigos que questionavam o posicionamento da direção da Igreja ou que denunciavam arbitrariedades e a expulsão do pequeno agricultor da terra nem sempre tinham um espaço integral no Jornal Evangélico. No entanto, quando publicadas, geravam reações de protesto e ameaça de cancelamento de assinaturas por parte de cristãos anestesiados pelo sistema.

Importa saber que, em seus primórdios nas Novas Áreas de Colonização, o Jornal Evangélico muito contribuiu para gerar solidariedade e comunhão cristã.


Geraldo Schach joi o primeiro pastor de Rondônia, depois exerceu seu pastorado em Cuiabá (MT); desde 1986 atua na Paróquia de Morro Redondo (RS).


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Autor(a): Geraldo Schach
Âmbito: IECLB
ID: 32181
HISTÓRIA
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