Atos 2.36-41

Auxílio Homilético

14/05/1978

Prédica: Atos 2.36-41
Autor: Harald Malschitzky
Data Litúrgica: Domingo de Pentecostes
Data da Pregação: 14/05/1978
Proclamar Libertação - Volume: III
Tema: Pentecostes


I – Texto

O texto, assim como se encontra na tradução de Almeida, permanece bastante fiel ao original. Todas as variantes não são mais do que notas explicativas que nada alteram no seu conteúdo. A tradução no Novo Testamento em Linguagem de Hoje também é muito fiel. Parece-me que apenas no versículo 40b esta última destoa um pouco, induzindo facilmente a uma interpretação meramente moralista, quando transcreve a expressão geração perversa com a expressão bem mais fraca: gente perdida.

II - Contexto

Toda a passagem está inserida no relato era torno do acontecimento de Pentecostes. Iniciando com o final do discurso de Pedro, o texto em questão mostra as consequências, o envolvimento de pessoas através da mensagem. Ouvintes ocasionais e talvez também alguns gozadores (vv.12-13) são atingidos de tal forma que não têm alternativa a não ser fazer a pergunta: O que vamos fazer? O princípio e o desenvolvimento da Igreja coincidem nesta passagem.

III – Exegese

V.36: Lendo este versículo isoladamente, ele não passa de uma acusação muito grave, a saber, acusação de homicídio claro e frio. Mas é bom ouvir logo as palavras do versículo 39, o qual deixa claro que o interesse de Pedro não reside na acusação, mas sim no envolvimento e na inclusão também dos judeus, pois Deus não reage frente à culpa, mas a supera (Mueller-Schwefe) soberanamente. Confrontados com esta boa nova, os ouvintes são conclamados a aceitar a ação de Deus no Cristo e a, consequentemente, corrigir os seus próprios conceitos acerca do Messias esperado. É interessante que Pedro não tenta, mediante argumentação lógica, provar a sua afirmação, mas ele a anuncia, e os que aceitam esta mensagem se colocam sob o senhorio do Cristo.


V.37: As palavras de Pedro atingem profundamente os ouvintes. A partir desta pregação, a partir do reconhecimento de que Deus venceu a parada, nasce o reconhecimento da própria vida errada e em desconformidade com Deus. Note-se que este reconhecimento não nasce por si, mas ele é provocado pela boa nova anunciada por Pedro. Os ouvintes estão aturdidos, pasmados e não têm outra saída que não seja a pergunta: O que vamos fazer?, ou então em termos mais populares: E agora? A simples formulação desta pergunta já significa que eles não podem mais permanecer indiferentes (novamente os vv.12-13), mas acabam por se colocar ao lado dos apóstolos e desejam saber mais, desejam vislumbrar uma saída de sua situação errada diante de Deus. Já esta pergunta, que não nasceu por si mesma, é fruto da ação do Espírito Santo, pois ela é provocada pela palavra anunciada.

V.38: A resposta de Pedro é simultaneamente um convite: Convertei-vos, e cada um seja batizado. A tradução de Almeida parece-me que dilui o sentido original do METANOETE (converter-se, ser convertido). O verbo original (METANOEO), usado 14 vezes nos Sinóticos, expressa algo que envolve o homem todo, antes de mais nada o centro de sua vida pessoal, mas na mesma linha e consequentemente também o seu comportamento a todo momento em qualquer lugar, seus pensamentos, suas palavras e suas ações (Mt 12.33ss; 23.26) (J. Behm). Vai daí que a conversão não é um acontecimento único e isolado, mas um processo contínuo, um afogar o velho homem contínua e diariamente (M. Lutero). Entretanto, o convite de Pedro não estaria sendo entendido se a conversão fosse confundida com um esforço meramente humano, com o esforço de o homem, por sua própria razão ou força, colocar-se diante de Deus. Justamente em Mt 18.3 Jesus explica o que significa a conversão: Tornar-se criança, entrar na dependência de Deus, receber de Deus o que não se pode ter por si mesmo. Apesar disso a conversão não deixa de ser também um imperativo, e nesta dialética se torna impossível e impraticável o cálculo a partir do qual o homem poderia sair justificado por suas obras.

Em si também o batismo está dentro desta dialética entre dádiva e imperativo. Antes de mais nada o batismo insere o ser humano no corpo de Cristo e, portanto, é uma graça. Mas ele também compromete seriamente o batizado.

O Espírito Santo, o poder do próprio Deus é que doa, presenteia e converte o ser humano. E o mesmo Espírito Santo é o poder sustentador do homem na sua jornada de testemunho cristão.

V.39: Aqui se expressa a universalidade da mensagem e da ação de Deus. Os limites da casa de Israel (v.36) são extravasados e transpostos pelo amor de Deus e por sua ação através do Espírito Santo, pois Deus não se deixa prender a limitações, quaisquer que sejam.

Vv.40-4l: Geração perversa é o povo de Deus que, como um filho, se afasta do pai, fugindo de seu olhar e de sua vontade (Mueller-Schwefe). O chamamento para afastar-se da geração perversa não é um convite a formar uma elite, mas um convite a nadar contra a correnteza, a, em nome de Deus, dizer e realizar coisas que nem sempre cabem dentro dos conceitos e preconceitos tradicionais ou vigentes, mas dizer e fazê-lo justamente em favor também dos perversos.

O número de convertidos não deve nem pode ser tomado ao pé da letra. Trata-se de um número muito global, o qual, ainda assim, nos permite aquilatar o crescimento impressionante das primeiras comunidades.

IV - Reflexão

A Igreja tem como instrumento por excelência de seu trabalho a PALAVRA, instrumento do qual Deus se vale para agir no mundo a ponto de João anunciar a palavra que se fez carne (Jo 1.14). E me parece que uma das crises de hoje é a nossa desconfiança frente a esta palavra. Naturalmente temos razões para tanto em um mundo inflacionado por palavras vazias e descomprometidas, palavras ditas hoje e desditas amanhã com a maior naturalidade. Consequência desta nossa desconfiança muitas vezes é um ativismo que mantém um bom número de pessoas tensas e alertas e cujo resultado sempre de novo afirma a nós mesmos que, afinal, alguma coisa está sendo feita. Estamos perdendo a dimensão véterotestamentária (até que ponto será que já a perdemos?) da palavra (DABAR) que é tão concreta a ponto de ter o impacto de um tijolaço. Desconfiamos da afirmação neotestamentária, segundo a qual a palavra é viva e eficaz (Hb 4.12). Entretanto, foram palavras humanas anunciando uma mensagem nada humana que serviram de veículo na formação da primeira comunidade; foram palavras que deram início a um movimento que culminou com a aceitação do senhorio do Cristo por parte de muita gente. É evidente que estas palavras têm um conteúdo: o Cristo crucificado e vivo.

Talvez no aniversário da Igreja, quando lembramos o dia de seu nascimento, devêssemos arriscar o anúncio corajoso do Cristo, esperando que ao menos alguns acordem para fazer seriamente a pergunta: O que fazer! Quais as consequências hoje do senhorio de Cristo? Que consequências tem o meu batismo? O que significa converter-se? É claro que será impossível pregar sobre todos os temas. Será necessário que o pregador se decida, de preferência na direção que lhe é a mais difícil. Uma introdução deveria fazer a colocação do texto todo.

V - Bibliografia

- BEHM, Johannes. Artigo METANOIA. In: Kittel, Rudolf. Theologisches Wörterbuch zum NT. Vol. 4, pp.972ss.
- BEYER, Hermann Wolfgang. Die Apostelgeschichte. In: Das Neue Testament Deutsch. Göttingen, Vandenhoeck 6 Ruprecht.
- ESSER, Hans Helmuth. Meditação sobre Atos 2,36-41. In: Göttinger Predigtmeditationen. Caderno 2, 1972.
- MUELLER-SCHWEFE, Hans-Rudolf. Meditação sobre Atos 2,36-41. In: Göttinger Predigtmeditationen. Caderno 2, 1966.


Autor(a): Harald Malschitzky
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Pentecostes

Testamento: Novo / Livro: Atos / Capitulo: 2 / Versículo Inicial: 36 / Versículo Final: 41
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1978 / Volume: 3
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 14509
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