Marcos 7.31-37

Auxílio Homilético

25/08/1985

Prédica: Marcos 7.31-37
Autor: Nelso Weingaertner
Data Litúrgica: 12º Domingo após Trindade
Data da Pregação: 25/08/1985
Proclamar Libertação - Volume: X

 

I — O contexto

A perícope é matéria exclusiva de Marcos e forma uma unidade literária. Ela está inserida num contexto de relatos sobre milagres de Jesus: Mc 7.24-30: A mulher sírio-fenícia e Mc 8.1.9: A segunda multiplicação de pães. Os três relatos certamente querem dar ênfase ao pensamento teológico de Marcos, que onde quer que Jesus passa, acontecem milagres. Jesus faz aquilo que se espera da época messiânica, veja Is 35.5ss.

II — Análise do texto

A perícope inicia com uma descrição não muito precisa do lugar onde aconteceu o milagre. Somos de opinião, que para o entendimento do texto não é importante analisar o local geográfico, nem tampouco especular se o surdo e gago era judeu ou pagão, basta repetir, que o milagre aconteceu na região de Decápolis, que era território habitado por não-judeus. O v 31 certamente não é mais do que a fixação do milagre numa das caminhadas de Jesus.

A partir do v. 32 o milagre é descrito com exatidão quase protocolar. Algo semelhante ainda encontramos em Mc 8.22-26: A cura de um cego em Betsaida. Nos demais relatos sobre milagres de Jesus apenas é dito, que sob a palavra e ordem de Jesus doenças e demônios eram expelidos.

O v. 32 relata, que trouxeram um surdo e gago para que Jesus lhe impusesse as mãos. A prática de curar pela imposição de mãos era bastante difundida na época, não faltavam taumaturgos (tanto em Israel como no paganismo) que assim curavam. Talvez é interessante refletir: quem trouxe o doente à presença de Jesus? Parentes? Amigos? Ou pessoas ávidas de ver algo sensacional acontecer?

O v. 33 parece dar a entender, que o surdo e gago foi levado à presença de Jesus quase como um objeto, que ninguém se preocupou em transmitir-lhe o que estava acontecendo. O fato, que Jesus o tirou da multidão, o levou à parte e os gestos (pôs-lhe os dedos nos ouvidos e lhe tocou a língua com saliva), segundo nosso entender, não visavam nada mais do que conscientizar o surdo e gago que Jesus se interessava por ele e seu problema. O significado destes gestos o doente entendia — talvez ele já fora levado a outros taumaturgos (milagreiros), que atuavam de maneira muito semelhante ao descrito no milagre. Jesus não queria curar este homem de maneira miraculosa, sem a sua participação, e sim, ele devia entender o que estava por acontecer, e estes gestos foram a linguagem que este homem era ca paz de compreender.

Também o v. 34, que mostra Jesus erguendo os olhos ao céu, é em primeiro lugar prédica em gestos para o surdo mudo, que assim é avisado, que algo maravilhoso está por acontecer, que Deus atuará em sua vida. Ë importante observar, que antes que Jesus suspira (prece pelo Espírito Santo) e pronuncia o Efatá, ou seja, antes que Ele faz o milagre acontecer, Ele estabelece um relacionamento entre o paciente e Deus. Somos de opinião, que tudo o que nos é dito nos v 33 e 34 não tem nenhum outro significado que o exposto acima, e que devemos ter cuidado para não interpretar o texto de maneira diferente da visada pelo evangelista, que o incluiu no relatório do Evangelho. Interpretações alegóricas, como são sugeridas por alguns exegetas, certamente não interpretam de maneira correia o espírito da perícope.

O v. 35 diz claramente, que aqui somos confrontados com um ato de nova criação. O surdo e gago não só passou a ouvir e se lhe soltou o empecilho da língua, mas ele passou a falar desembaraçadamente. A palavra de ordem de Jesus: Efatá não se referiu apenas aos órgãos doentes, no caso ouvidos e cordas vocais, mas a toda pessoa — o homem todo foi visado e se tornou nova criatura.

A multidão presente entendeu o que aconteceu e por isso confessa, quase como num salmo de louvor, v. 37: tudo Ele tem feito esplendidamente bem — não somente faz ouvir os surdos, como falar os mudos.

O v. 36 diz que Jesus não quer que os sinais da misericórdia de Deus, que Ele estabelece, sejam usados e explorados de maneira propagandística e deturpem a verdadeira finalidade de sua vinda ao mundo, que é ...servir e dar a sua vida em resgate por muitos (Mc 10.45) e Os judeus pedem sinais... mas nós pregamos a Cristo crucificado (1 Co 1.22s). Certamente as palavras do v. 36 querem apontar para esta verdade fundamental. Os milagres de Jesus não são show, mas manifestações de misericórdia de Deus, que apontam para a nova esperança que se abre em Jesus Cristo para o mundo esperança esta, que é confessada pela multidão no v. 37.

III — Conclusões teológicas

Esta perícope nos mostra de maneira bem concreta o que é misericórdia e como ela é praticada — Jesus vai ao encontro do doente, se comunica com ele em seu mundo por meio de gestos e eleva tudo ao trono de Deus em prece por nova criação. O milagre relatado na perícope em evidência deve ser contado e testemunhado como tal sinal.

Deve-se dar ênfase aos seguintes aspectos:

a) que Jesus tomou o doente à parte para se comunicar com ele (gestos) e não tratá-lo como simples objeto.

b) que Jesus com o suspiro eleva a Deus todo o sofrimento e toda a solidão do surdo e gago e roga pela força do Espírito Santo.

c) que ao pronunciar o Efatá, uma palavra de ordem cheia de DYNAMIS, acontece nova criação (Neuschoepfung).

d) que a multidão entendeu, por este sinal, que com Jesus está surgindo uma nova época (Is 35.5ss) e por isso rompe em louvor e confessa : Tudo Ele tem feito esplendidamente bem.

IV — Meditação

O que significam os milagres de Jesus? Eles são sinais que nos permitem ver com antecedência como será, quando vier o novo céu e a nova terra, quando Deus enxugará dos olhos toda lágrima, e a morte já não mais existirá... (Ap 21.3ss).

Também os milagres e as transformações que acontecem hoje, em nossos dias, a partir da proclamação do senhorio de Jesus Cristo, não são nada mais do que sinais, que espelham a nova realidade que aguardamos. Quem entende os milagres como sinais prolépticos, que espelham algo que aguardamos, recebe por meio deles força e ânimo em situações de crise, doença, sofrimento e morte, porque tem a certeza, que Jesus não se conforma com nossos sofrimentos. Doença e morte não são somente nossos inimigos, mas também os de Jesus. Os milagres, portanto, devem ser vistos e entendidos como sinais daquilo que Cristo tem preparado para aqueles, que lhe são fiéis até a morte e que estão dispostos a segui-lo, carregando a sua cruz.

O testemunho da multidão: Tudo ele tem feito esplendidamente bem, certamente quer lembrar Gn 1.31: 'Viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom. A reconstituição desta realidade sempre foi, é e será a esperança do povo de Deus. A multidão, que assim confessava e louvava nos arredores de Decápolis, certamente é só um pequeno grupo, comparado às multidões, que no correr dos séculos experimentaram sinais semelhantes em seu meio e que viram nestes sinais a presença atuante de Deus na história. Os que entendem esta mensagem recebem a força para suportar as adversidades que nos acompanham no caminho para o novo céu e a nova terra.

V — Escopo

Em Jesus Cristo a presença do Reino de Deus se manifesta de tal maneira, que o homem marginalizado pela doença é reconduzido à comunhão com Deus e sua comunidade e se torna participante da vida em sua plenitude.

VI — Proposta para condução da prédica

Para a pregação propomos partir eventualmente da constatação, que Jesus veio ao mundo e encontrou, por onde quer que passasse, multidões aflitas e exaustas (Mt 9.35ss). Para estas multidões ele anunciava o Evangelho do reino e curava os doentes.

Na sequência contar a história da perícope ilustrando-a, conforme os itens a) - d), citados acima. A seguir mostrar em exemplos concretos pessoas que hoje vivem à margem da sociedade como o surdo e gago e que são tratados como simples objetos (assistencialismo paternalista!). Não ter medo de dizer, que não podemos ajudar a todos (por sinal Jesus também não ajudou a todos que sofriam), mas que somos chamados a erguer sinais bem concretos no lugar em que vivemos e atuamos, que levam ao louvor e a esperança e que espelhem também em nossos dias algo daquilo que há de vir.

VII —Subsídios litúrgicos

1. Confissão de pecados: Senhor, tu nos conhece melhor do que nós mesmos, sabes como é grande o nosso egoísmo, que muitas vezes não permite ver no próximo um irmão, mas apenas um objeto que tratamos com frieza e até usamos para a nossa própria promoção. Tu também sabes que andamos tão ocupados com nossos pensamentos e propósitos que não temos tempo para a tua causa. Apesar de tudo isto. Senhor, estamos aqui e pedimos que tenhas comunhão conosco.- Concede-nos a força de teu Santo Espírito que renova e santifica. Senhor, precisamos de ti, de tua comunhão e da comunhão com os irmãos para que possamos ter vida plena, por isso rogamos: Tem piedade de nós. Senhor.

2. Oração de coleta: Senhor, nosso Deus! Todos nós queremos uma vida realizada. Tu vieste dar-nos esta vida em Jesus Cristo. Não permitas que nos cansemos de procurá-la, e dá que também a encontremos, pois é dela que mais precisamos. Isso te pedimos em nome de nosso Salvador Jesus Cristo. Amém.

3. Oração final: Oramos com palavras de Francisco de Assis: Senhor! Faze de mim um instrumento da tua paz! Onde houver ódio, faze que eu leve amor. Onde houver ofensa, que eu leve o perdão. Onde houver discórdia, que eu leve a união. Onde houver dúvidas, que eu leve a fé. Onde houver erros, que eu leve a verdade. Onde houver desespero, que eu leve a esperança. Onde houver tristeza, que eu leve a alegria. Onde houver trevas, que eu leve a luz.
Mestre! Faze que eu procure mais consolar, que ser consolado. Compreender, que ser compreendido. Amar, que ser amado, pois é dando que se recebe, é perdoando que se é perdoado e é morrendo que se vive para a vida eterna. Amém.

VIII –Bibliografia

- DEHN, G. Meditação sobre Marcos 7.31-37. In: Georg Eichholz (ed): Herr, tue meine Lippen auf. v. 1. Wuppertal/Barmen, 1959.
- LOHMEYER,, E. Das Evangelium des Markus. Göttingen, 1963
- SCHABERT, A. Das Markus Evangelium. München, 1964.
- SCHLATER, A. Erläuterungen zum Neuen Testament. In: Die Evangelien und die Apostelgeschichte. v. 1. 4 ed. Stuttgart, 1928.
- TEBBE, W. et allii. Meditação sobre Marcos. 7.31-37. In: Gepredit den Völkern, v. 1. Breklum, 1960.
- VOIGT, G. Meditação sobre Marcos 7.31-37. In: -. Der Schmale Weg. Gtittingen, 1976.
- ZIMMERMANN, W. D. Markus ueber Jesus. Guetersloh, 1970.


Autor(a): Nelso Weingärtner
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 13º Domingo após Pentecostes
Testamento: Novo / Livro: Marcos / Capitulo: 7 / Versículo Inicial: 31 / Versículo Final: 37
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1984 / Volume: 10
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 14667
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