Marcos 3.31-35

Auxílio Homilético

13/09/1981

Prédica: Marcos 3.31-35
Autor: Edson Saes Ferreira
Data Litúrgica: 13º. Domingo após Trindade
Data da Pregação: 13/09/1981
Proclamar Libertação - Volume VI


I - Texto

1. Tradução

V.31: Chegaram então sua mãe e seus irmãos e, ficando do lado de fora, mandaram chamá-lo.

V.32: E a multidão estava sentada ao redor dele, e disseram-lhe: Eis que tua mãe e teus irmãos (e tuas irmãs) estão lá fora e te procuram.

V.33: Então respondeu-lhes, dizendo: Quem é minha mãe e meus irmãos?

V.34: E, olhando os que estavam assentados ao redor de si. disse: Eis minha mãe e meus irmãos!

V.35: Pois, qualquer que fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, irmã e mãe.

2. Aparato crítico

No v.32 coloquei e tuas irmãs entre parênteses para chamar a atenção do leitor. Acontece que as palavras KAI HAI ADELPHAI - e tuas irmãs - foram omitidas em muitos dos testemunhos:

a) por acidente, devido a descuido de cópias,

b) deliberadamente, porque nem nos vv.31 e 34 as irmãs são mencionadas.

Alguns editores defendem a validade da adição, posto que a omissão poderia ter sido ocasionada por terminações similares das palavras, em que o olho de um escriba inadvertidamente poderia ter deixado escapar alguns poucos termos. O trecho de Mt 13.56 menciona as suas irmãs, e pode ser que a adição registrada no Evangelho de Marcos tenha sido feita em harmonia com esse versículo de Mateus, em alguns manuscritos.

II - Considerações exegéticas

A nova relação: a verdadeira família de Jesus

Os evangelistas apresentam, inocentemente, e sem qualquer antecipação de dificuldade, o fato que Jesus tinha vários irmãos e irmãs (cf. Mc 6.3).

Devemos analisar essa visita da família de Jesus juntamente com as palavras que se encontram em Mc 3.20-21: Então ele foi para casa. Não obstante, a multidão afluiu de novo, de tal modo que nem podiam comer. E quando os parentes de Jesus ouviram isto, saíram para o prender; porque diziam: Está fora de si.

O ministério de Jesus aumentou de tal maneira que nem tinha tempo para comer, e pode-se imaginar que, devido às múltiplas curas e à intensificação das controvérsias com as autoridades religiosas, a agitação chegou, algumas vezes, a um estado de furor. A família de Jesus, como é evidente, compreendeu algo da situação, e, ouvindo ainda mais acerca dos acontecimentos, supôs que ele tivesse sido mentalmente afetado. Não há que duvidar que pensaram estar fazendo um ato de misericórdia, prendendo Jesus e levando-o para casa. É certo que não foram até ali a fim de atrair a atenção do povo, dizendo: Somos parentes deste grande e famoso homem. Pelo contrário, queriam livrar Jesus de sua própria insanidade, bem como das ameaças das autoridades. Sua intenção, apesar de muito errada, pelo menos era honesta. Esse incidente na vida de Jesus ilustra quão pouco a sua própria família o compreendia, e também quão pouco compreendia a sua missão.

Algumas tradições antigas falam da família de Jesus como sendo numerosa. Mas o dogma da Igreja Católica Romana tem defendido a ideia da virgindade perpétua de Maria, tendo inventado, engenhosamente, alternativas para esse claríssimo ensinamento.

Podemos e devemos estar absolutamente certos de que, se qualquer doutrina de 'Virgindade perpétua fosse importante aos olhos dos evangelistas, eles teriam deixado claro aqui que, com o termo irmãos e irmãs, estavam a designar parentes mais distantes, como primos, ou que esses eram filhos de José através de um casamento anterior. O fato de não terem feito tais explicações mostra que devemos entender o dito relativamente à família imediata de Jesus, filhos de José e Maria. Ninguém pensava diferente disso, até que o dogma exaltou Maria acima das nuvens.

Das quinze vezes que esses irmãos de Jesus são mencionados (dez nos evangelhos, uma em Atos e quatro nos escritos de Paulo), quase sempre aparecem em companhia de Maria, mãe de Jesus. É estranho que os primos de Jesus andassem sempre em companhia de sua tia, que nesse caso seria Maria, mãe de Jesus, ao invés de andarem em companhia de sua própria família.

A não ser por motivo de preconceito teológico, não há razão para não acolhermos essas palavras (irmãos e irmãs de Jesus) em seu sentido mais natural; isto é, eram filhos de José e Maria, em sentido natural.

A elevação de Maria à estatura de deusa é uma tradição romana, contrária ao próprio tratamento de Jesus à sua mãe, e contrário à ideia que diz que Jesus era o único de sua espécie entre os homens, posição esta que ele jamais dividiu com sua mãe.

Finalmente, devemos notar que a doutrina da perpétua virgindade de Maria não é apoiada nas Escrituras. Parece razoável supor que uma doutrina dessa natureza, caso tivesse tanta importância como alguns afirmam, pelo menos seria apoiada por uma pequena afirmação bíblica nesse sentido.

No texto mencionado, Jesus Cristo estabelece as condições de um verdadeiro parentesco. Não se trata somente de uma questão de carne e sangue. Pode ser que uma pessoa se sinta melhor com alguém que não é um parente carnal do que com uma pessoa com a qual tenha laços mais íntimos através do sangue.

No que consiste um autêntico parentesco?

1. O verdadeiro parentesco reside numa experiência comum. Tal fato se dá, quando se trata de uma experiência na qual duas pessoas, ou mais, tenham passado juntas por uma determinada situação. Há um ditado que diz: Duas pessoas se tornam amigas, na realidade, quando podem perguntar uma à outra: Lembras? E em seguida passam a conversar sobre as coisas que passaram juntas. Lembro aqui que para serem amigos, não basta rirem juntos. Quem sabe se faz necessário passar pelo processo de rir e chorar juntos, de ganhar e repartir o pão juntos. Poderíamos dizer que a experiência comum dos cristãos é serem pecadores perdoados.

2. O verdadeiro parentesco consiste em um interesse comum. Quando pessoas formam um grupo e, a partir desse grupo, falam acerca das suas alegrias, dificuldades, fazem algo juntas, constroem juntas, lêem a Bíblia e oram juntas, colocam-se à disposição para o servir e se estimulam a fazerem isso — há um interesse comum. Os cristãos têm esse interesse comum, porque todos os cristãos desejam aprender mais a respeito de Jesus Cristo e de como ser instrumento dele aqui na terra.

3. O verdadeiro parentesco tem raiz numa obediência comum. Os discípulos de Jesus Cristo formavam um grupo heterogêneo. Entre eles existia toda classe de crenças e opiniões. Um coletor de impostos, como Mateus, e um nacionalista fanático, como Simão, o zelote, deveriam ter-se odiado a ponto de morte. No entanto, estavam unidos porque ambos tinham aceito a Jesus Cristo como mestre e Senhor. Normalmente, qualquer grupo é composto por homens de diferentes matizes, classes sociais e que sustentam opiniões diferentes. No entanto, se permanecem juntos durante bastante tempo, acabam formando um grupo de amigos, devido a uma obediência comum. Os homens podem se fazer amigos quando obedecem ao mesmo senhor. Se num grupo há amor para com Jesus Cristo, então, automaticamente, há amor presente no grupo, um ama o outro.

4. O verdadeiro parentesco acontece ali onde existe uma meta comum. Poucas coisas unem tanto os homens como uma meta comum. Quer me parecer que esta é uma lição muito importante para nós como igreja. Se é certo dizermos que o verdadeiro parentesco acontece a partir de uma objetivo comum, são os cristãos que possuem o segredo, porque todos pro¬curamos conhecer melhor Jesus Cristo e ser instrumentos dele para levar o reino de Deus a outras pessoas.

III - Meditação

Como todos sabem, vivemos num país chamado católico, quando nu realidade o que impera é um acentuado sincretismo. No entanto, não passam desapercebidas de ninguém as grandes concentrações em torno de chamadas santas, santuários e assim por diante. Neste contexto lembro u grande concentração que acontece de novo em Aparecida do Norte, onde é venerada a chamada padroeira do Brasil. Com relação a isso quero chamar • atenção para o gesto político do Presidente João Figueiredo que assinou decreto tornando nacional o dia 12 de outubro, dia consagrado à Senhora Aparecida, padroeira do Brasil.

É para dentro dessa realidade que somos chamados a pregar e anunciar que não há alguém como Jesus Cristo.

O texto de Mc 3.31-35 fala claramente de uma mulher que constituiu família, pessoa normal, casada, mãe de vários filhos. Em quê ficaria desabonada a mãe de Jesus ao admitirmos o que a Bíblia fala, ou seja, que ela teve vários filhos?

Aos que se defrontaram com o texto, quero lembrar que no lado evangélico (IECLB), por influência da doutrina católica, são poucos os evangélicos que sabem que Jesus Cristo tinha irmãos e irmãs. São poucos os que sabem que Maria e José tiveram filhos e em número acentuado (cf. Mc 6.3; Mt 13.55-56). Não quero dizer que isso seja o mais importante do texto; no entanto, dentro do nosso contexto cheio de falsos mediadores, deve esta questão ser ressaltada, para então lembrarmos que só Jesus Cristo é o Mediador entre Deus e os homens (cf. Jo 14.6; l Tm 2.5).

O presente texto nos mostra, entre outras coisas, que Jesus punha a obediência a Deus acima de quaisquer laços de família. Usualmente, nenhuma escolha é necessária, e os que servem a Deus melhor são os que servem com uma família unida. Mas desde Mc 2 e Mt 9 temos várias narrativas de controvérsias. Isto mostra que o conflito, causado pela lealdade a Cristo, pode afetar a família, tornando-se necessária uma opção. A história prova que isso ocasionalmente acontece. A vontade de Deus deve ser suprema na vida, e isso operar-se-á mediante total lealdade a Cristo.

Uma família deve ser o porto seguro de onde o navio parte para velejar os mares e não uma doca onde se amarra e lança raízes. As ações e palavras de Jesus mostram as prioridades competidoras de Deus: a família mais ampla, a comunhão dos praticantes de sua vontade.

IV - Prédica

Quer me parecer que são várias as direções possíveis para uma prédica a partir do texto de Mc 3.31-35.
Algumas possibilidades, sugestões:

a) Pois, qualquer que fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, irmã e mãe. Falar sobre a nova família de Jesus Cristo, ou seja, os que fazem a vontade de Deus.

b) Falar sobre verdadeiro parentesco, a partir de Jesus Cristo: experiência comum, interesse comum, obediência comum, meta comum.

c) Dependendo do ambiente da pregação ou estudo — influência acentuada de outros mediadores, que não Jesus Cristo — falar sobre a família carnal de Jesus Cristo. Isso pode levar ao ponto de mostrar que só Jesus Cristo é o mediador entre Deus e os homens. Nem mesmo a mãe de Jesus pode exercer tal função. Ocasião para lembrar as palavras do próprio Jesus que disse: Pois, qualquer que fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, irmã e mãe.

V - Bibliografia

- ALLMEN, J. J. von. Vocabulário Bíblico. São Paulo, 1972.
- BARCLAY, W. Marcos. In: El Nuevo Testamento. Vol.3. Buenos Aires, 1974.
- BERKOUWER. G. C. A Pessoa de Cristo. São Paulo, 1974.
- CHAMPLIN, R. N. O Novo Testamento Interpretado. Vol. l. Guaratinguetá, (s.d.).
- INSTITUTO CATEQUÉTICO SUPERIOR DE NIJMEGEN. O Novo Catecismo - A Fé para Adultos. São Paulo. 1969.


 


Autor(a): Edson Saes Ferreira
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 14º Domingo após Pentecostes
Testamento: Novo / Livro: Marcos / Capitulo: 3 / Versículo Inicial: 31 / Versículo Final: 35
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1980 / Volume: 6
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 18257
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