Filipenses 2.5-11

Auxílio Homilético

23/03/1986

Prédica: Filipenses 2.5-11
Autor: Norman K. Bakken
Data Litúrgica: Domingo de Ramos
Data da Pregação: 23/03/1986
Proclamar Libertação - Volume: XI


I — O texto litúrgico

É óbvio que neste texto temos um exemplo que pode ampliar e implantar a mensagem implícita no Evangelho para o dia. Lá nós percebemos que aquele que entrou em Jerusalém, sobre quem todo mundo falava, chegou de maneira bem surpreendente e imprevista. Como poderoso? Não. Bem humilde. Como rei? Não. Mais parecido aos que foram apontados para levar cargas pesadas, cargas comuns, pesos sem valor excepcional. A chegada dum homem montado num jumentinho parece como um símbolo improvável do Reino que vem, o Reino do nosso pai Davi? Um sinal marcadamente diferente. Como podemos construir esperanças grandes, gritando Hosana! Bendito! em vista duma pessoa obviamente identificada com os camponeses, com o povo da terra? É óbvio que neste texto temos mais um exemplo da glória escondida nas vestes modestas.

II — O texto no contexto literário

É óbvio também que a inclusão do versículo cinco em nosso texto foi feita intencionalmente. O assim chamado Hino Cristológico (2.6-11), provavelmente tem a sua origem nas tradições cristãs conhecidas e apropriadas por Paulo. Mas, no contexto da carta e da situação comunitária, o v. 5 pode servir como chave à intenção do uso do hino e também, talvez, como chave ao sentido escondido na proclamação cristã.

Paulo quis que todos os filipenses pudessem unir-se juntamente pelo conforto que há em Cristo, pela consolação que há no amor, pela comunhão do espírito, por toda ternura e compaixão... (2.1). Ele quis que os membros pudessem ter a mesma inclinação, o mesmo amor, numa só alma, num só pensamento, sem competição e vanglória, com humildade, julgando cada um os outros superiores a si mesmo... (2.2s). E todas estas características essenciais pela vida comunitária de cada um em relação ao outro foram reveladas no evento de Cristo Jesus. O hino representa para Paulo um relato magnificente do ser humano, do ser humano de acordo com a Intenção do próprio Deus, e quê pode incluir toda a comunidade da fé. A moeda que tem a figura de Cristo num lado tem, no outro, a figura dos seus amados que podem tornar-se ...irreprováveis e puros, filhos de Deus, sem defeito, no meio de uma geração má e pervertida (ver 2.15). O contexto tem ambos os lados.

III — Interpretações contextuais

Ninguém pode negar que, como paradigma da fé ou como representante do próprio Deus, Jesus tem função sem rival. E o nosso texto aponta nesta direção. No fim ele recebeu o título Senhor, o nome que está acima de todos os nomes (2.9-11). Ninguém quer contestar aquele sentido óbvio da carta. Queremos celebrar, em fé, que aquele que foi o homem mais humilde tornou-se o mais augusto. E nós nos podemos conhecer como irmãos e irmãs dele. O outro lado de cada moeda cristológica tem a ver com um sentido antropológico.

A este sentido, o sentido humano, nós queremos dirigir a nossa atenção. Se nós concordamos com a tradução da Bíblia de Jerusalém do versículo 6, tudo bem: Ele tinha a condição divina... Seremos humanos têm esta condição — feitos na imagem de Deus, filhos de Adão, ...pouco menos do que deuses, a quem foi dada autoridade a dar nomes (i. é., para governar) a todas as coisas da criação (cf. Gn 1.26-31 e SI 8.5s). Mas a tradução mais literal, ele que se encontrava na forma (imagem, semelhança) de Deus, existe como uma nota ecoando a estrofe do Gn 1.26s: Façamos o homem à nossa imagem, como nossa semelhança, e que eles dominem sobre os peixes do mar, as aves do céu, os animais domésticos, todas as feras e todos os répteis que rastejam sobre a terra... O poder conferido aos seres humanos no inicio da criação é implantado e ampliado no fim das épocas em Cristo Jesus. O primeiro Adão que, de acordo com as narrativas poéticas, questionou Deus, que não creu na sua palavra, que quis ser versado no bem e no mal, que quis ser como Deus e, por isso, caiu, morreu e deu espaço ao reino da morte(cf. Gn 2.16s, 3.1-7; Rom 5.12-14; 1 Co 15.21s); tem em seu lugar o segundo Adão (cf. 1 Co 15.21s, 15.45-59; Gl 6.15; 1 Co 7.31). Aparentemente Paulo teve em mente a transformação da direção humana. Ele quis inverter a intencionalidade do ser humano no rumo ou na orientação que foi visualizada na obra de Cristo. Paulo contrapunha ao quadro de Adão um retrato verbal, paradigmaticamente substituindo Jesus de Nazaré que não considerou o estado de Igualdade com Deus como uma presa (que não se deve largar, ou, que se deve agarrar). Ele esvaziou-se a si mesmo (a pretensões na direção a tornar-se Deus). Ele teve a forma de servo (Paulo não diz nada sobre assumir a condição (cf. Bíblia de Jerusalém), e ele foi (não tomou) a semelhança humana. E, mais, achado no esquema (divino) como homem, ele humilhou-se e foi obediente até à morte, morte de cruz (Fp 2.7s). Até aqui Paulo falou somente sobre a humanidade de Jesus e a natureza dele. Paulo lembrava a condição humana comum. Mas a ação comum a Jesus é contraposta a ações normalmente associadas conosco como seres humanos. Ele aceitou a sua função designada, não como algo mau mas como algo derradeiro, como algo que foi compartilhado ao ser humano por e sob Deus. Jesus não questionou a sua função humana, a função de ser criatura. Ele não desviou-se ou afastou-se dessa obrigação, uma obrigação privilegiada porque expressa a alta e digna intenção de Deus por nós. Jesus identificou-se conosco e, mais, com aqueles que não têm neste mundo uma compreensão da dignidade real e mais alta deles, a dignidade a ser responsáveis como soberanos da terra e de tudo que está nela.

Jesus exemplificou na sua vida e na sua morte o oposto exato ao esquema pervertido do homem que quer fazer-se algo mais do que ele ó com todas as potências e potencialidades sob o seu controle no mundo inteiro. Acho que Jesus, por Paulo, foi a Adão que Deus intencionou, que Deus quer criar, desenvolver e aperfeiçoar no mundo. Jesus representou a plenipotência de Deus no ser humano.

Neste sentido Jesus chegou ao ponto que nós todos devemos assumir, o ponto da plenipotência do ser humano obediente a Deus. Neste sentido ele foi agraciado com o nome que está sobre tudo. Hoje Jesus funciona, em nome de Deus, como plenipotenciário da criação. Para que? Para a glória de Deus. Através de quem? Através daqueles que o amam. Ele chegou ao ponto do homem intencionado por Deus no princípio. Nós recebemos um novo início.

IV — Possibilidades para a prédica

Desta maneira nós podemos apontar a Jesus como o primogé¬nito entre muitos irmãos. E mais, nós devemos lembrar que os que o amam, que são conhecidos de Deus, são predestinados a serem conformes à imagem do seu filho... (cf. Rm 8.28s). Desta maneira pode¬mos entender o sentido de Paulo quando ele diz aos filipenses: Tende em vós o mesmo sentimento de Cristo Jesus.

Ninguém pode imitar Jesus. Ele é único, sem igual. Mas em conformidade com a sua imagem nós podemos entender a direção boa e justa na qual nós podemos apontar e unir as nossas vidas integralmente nas comunidades da fé cristã. Nós não devemos esquecer ou substituir o Cristo humilde, o camponês, cujo destino é servir com dedicação a todos até o fim. A nossa tentação é ultrapassar esta pessoa que tem a ver com tentação, sofrimento, conflito, isolação, julgamento e morte, em direção ao que tem poder, glória e autoridade sem Igual; que tem majestade, riquezas e maravilhas do tipo fora do alcance humano. A nossa tentação é passar diretamente do Domingo de Ramos à Páscoa, sem humilhação e morte. Desta maneira nós, os seus discípulos, podemos nos tornar traidores iguais à instituição implantada no lugar da religião verdadeira. A nossa tentação é negar inteiramente a humanidade de Jesus porque nós queremos mais contemplar a sua divindade, uma divindade construída de acordo com os valores do Adão primitivo, do homem ainda no início do caminho real.

Ninguém pode imitar Jesus. Ele é único. Mas ele mesmo identifica-se conosco. E nós somos únicos também, criados e planejados a ser criaturas e criadores ao lado do seu domínio, fiéis à intenção última de Deus.

V — Subsídios litúrgicos

1. Confissão de pecados: Confessamos a nossa tentação de esquecer a humanidade humilde e obediente de Jesus por causa do nosso desejo de substituí-lo por um rei poderoso do tipo existente de acordo com os valores comuns no mundo. Confessamos a nossa tentação de ignorar os com quem Jesus se identificou, os camponeses, o povo da terra, os que são humildes, fracos e sem distinções marcantes. Tem piedade de nós, Senhor!

2. Oração de coleta: Oramos, Deus pai, pela graça de não negarmos a nossa função como discípulos de Cristo cujas responsabilidades incluem o sofrimento e a morte no caminho dos que querem ficar fiéis a sua imagem como Deus gracioso, suportando-nos nas nossas necessidades e elevando-nos às nossas potencialidades no seu reino. Dá-nos graça para espelharmos o outro lado da moeda que tem a figura do nosso Senhor, Jesus Cristo, humilde e montado num jumentinho, chegado para servir, pronto para dar-se integralmente. Amém.

3. Assuntos para a oração final: Que cada um de nós possa assumir a forma dada a nós como criaturas, mas, também, como criaturas feitas à imagem do próprio Deus, Que cada um de nós possa assumir a sua responsabilidade no mundo como aqueles que não querem dominar um ao outro masque querem servir de acordo com a disposição do Cristo crucificado. Que cada pessoa que tem poder no governo do país ou no mundo possa dedicar-se a um caminho justo onde a regra dominante é o domínio de amor, de compaixão e afirmação mútua que vem da certeza de que todas as nossas possibilidades, todos os bens e todas as nossas potências devem ser subjugados a vontade misericordiosa de Deus. Que cada ação deste dia possa ser feita na direção de transformação individual e social, e que estas transformações possam ter como efeito uma sociedade mais justa e uma vida mais integrada. Dá graça aos que estão doentes, que não têm trabalho, que carecem de necessidades básicas, duma vida saudável no espírito, na inteligência e no corpo. Eleva os humildes, dá fortuna aos que querem dedicar-se à justiça, paz e ao bem estar de outros e subjuga ao teu poder toda pessoa rebelde, egoísta ou desesperada. Dá-nos graça para aceitar o bem e o mal duma maneira capaz de criar e recriar uma visão da sua soberania, direcionada a níveis sempre mais amplos e fascinantes, de acordo com a tua intenção no princípio, refletindo mais claramente a tua imagem sobre todas as coisas.

VI — Bibliografia

- BARRETT, C.K. From First Adam to Last, Nova Iorque, 1962.
- BULTMANN, R. Man in God's Design, Newcastle, 1952.
- BULTMANN, R. Theologie des Neuen Testaments, 4a ed., Tuebingen, 1961.
- FULLIER, R. Foundations of New Testament Christology, Nova Iorque, 1965.
- RUBENSTEIN, R.L The Last Adam. My Brother Paul. Nova Iorque, 1972.
- SMITH, R.G. The New Man, New York, 1956.


Autor(a): Norman K. Bakken
Âmbito: IECLB
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo da Páscoa
Área: Governança / Nível: Governança - Rede de Recursos / Subnível: Governança-Rede de Recursos-Auxílios Homiléticos-Proclamar Libertação
Natureza do Domingo: Quaresma
Perfil do Domingo: Domingo de Ramos
Testamento: Novo / Livro: Filipenses / Capitulo: 2 / Versículo Inicial: 5 / Versículo Final: 11
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1985 / Volume: 11
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 13269
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