João 1.(1-9) 10-18

Auxílio Homilético

04/01/2009

Prédica: João 1. (1-9) 10-18
Leituras: Jeremias 31.7-14 e Efésios 1.3-14
Autor: Erni Drehmer
Data Litúrgica: 2º. Domingo após Natal
Data da Pregação: 04 de janeiro de 2009
Proclamar Libertação - Volume: XXXIII


1. Introdução

O texto já foi trabalhado por mim no Proclamar Libertação 29, também para o mesmo tempo: o 2º Domingo após Natal. As leituras de Jeremias e Efésios ajudam a entender a ação de Deus, revelando-se a nós e adotando- nos como seus filhos e filhas, como seu povo. Dessa adoção nascem o louvor e a gratidão por tudo não depender de nossa ação, mas da ação amorosa de Deus. No tempo após o Natal, depois de um verdadeiro bombardeio de apelo às compras, às festas e ao consumo, é muito bom poder reafirmar que a festa realizada, melhor ainda, a frustração pela festa não-realizada, pelos presentes não-comprados, pela comunhão familiar desejada, mas não realizada, que tudo isso não importa diante do que realmente interessa: Deus vem ao nosso encontro, adota-nos como filhos e filhas e faz isso tentando reconstruir o verdadeiro sentido de nossa vida, de nossa comunhão, de nossa vivência de fé e vida.

2. Informações exegéticas

Em Gênesis 1.1, inicia-se com as mesmas palavras: “no começo”. Lá definia o tempo de início de tempo com a criação. Aqui se afirma que a palavra com que Deus cria já estava com ele e sempre era identificada com ele. Reafirma-se que o universo é criação do nada pelo poder da Palavra. A criação coloca o ser humano como conceito e alvo central. Para as pessoas (v. 4) vem a luz, que não é simplesmente um fenômeno da natureza, mas a iluminação da existência do ser humano como um todo. Assim também as trevas, citadas logo a seguir, não são especuladas quanto à sua origem, mas simplesmente estão aí, como oposição, como o contrário da luz.

João Batista é destacado no texto quanto a seu papel, poderíamos dizer, quanto à sua missão. Enquanto Marcos 1.4-6 detalha mais a ação e Marcos
1.7-8 concentra-se mais na pregação messiânica de João Batista, João concentra-se em destacar a importância dele como quem dá testemunho a respeito da luz que se realizou na encarnação do verbo, da Palavra. O testemunho a respeito da luz é retomado após uma breve informação a respeito do personagem João Batista. Essa retomada destaca um duplo interesse do evangelista nesse contexto: 1 – ressaltar a relação da manifestação da luz com o testemunho de João Batista; 2 – afirmar que o testemunho de João Batista não quer ser apenas referência ao passado, mas a fatos que se tornam presentes para o cristão na fé. Aliás, pela primeira vez, é mencionada a fé. A fé é a resposta à Palavra, que tem origem fora do ser humano, isto é, em Deus.

A afirmação de que João Batista não era a luz, mas veio para falar a respeito dela (v. 8), levanta uma questão importante e merecedora de destaque: ele era testemunha, não figura messiânica ou apocalíptica. Essa afirmação é tão importante, que o evangelista interrompe a sequência do relato sobre o verbo. A testemunha não é mais importante do que aquele a respeito de quem testemunha. Uma bela, constante e, muitas vezes, esquecida lição: o pregador e a pregadora não são mais importantes do que a Palavra que pregam. Mais e mais essa lição se atualiza, à medida que tecnologias de ponta são adotadas para tornar cultos mais “atraentes, emocionantes, cativantes”, transformando pregadores e pregadoras em centros da atenção do espetáculo, com suas belas roupas, aparência impecável e capacidade de enfileirar interpretações fantasiosas e agradáveis dos textos bíblicos. Na Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), não estamos isentos desse risco e também dessa realidade. Não somos o centro das atenções, e sim aquele a quem anunciamos.

Uma segunda afirmação, feita logo a seguir (v. 9), traz outra lição preciosa. Se o texto aponta para a “verdadeira” luz, obviamente quer fazer diferença em relação a falsas luzes. Só há um Salvador; as outras aparições enganam, são falsas e mentirosas. No mercado religioso amplamente difundido por canais de televisão, por luzes brilhantes e atraentes, por promessas de bem-estar, cura e prosperidade, há que se apontar com clareza contra os “salvadores da pátria”. Esses aparecem de forma proporcional ao tamanho das crises, ansiedades e frustrações de um povo. Cabem duas perguntas: Será que a cantada religiosidade do povo brasileiro é uma busca autêntica de uma relação de fé com Deus, ou será uma caminhada errante e desesperada em busca de algo em que se agarrar diante das tantas frustrações enfrentadas no dia-a-dia? Em que sentido nosso testemunho em palavra e ação está consciente dessa situação e anuncia o único e verdadeiro Salvador, a única luz que de fato ilumina os caminhos em direção à vida abundante?

Os v. 12a e b podem ser considerados a coroação do hino. Tornar as criaturas de Deus seus filhos e suas filhas é, ao mesmo tempo, a última e a nova criação. Deus tem por objetivo final para sua criação a filiação. O hino do verbo tem um propósito claramente soteriológico, isto é, está voltado para a salvação da humanidade, que é sua criatura.

No v. 16, o evangelista reforça que a participação na vida eterna jamais é conquista nossa, mas dádiva de Deus, puro ato de graça do Salva- dor. Um reforço para a pregação sobre a graça, rejeitando as tendências de achar que “orações fortes e carregadas de teor emocional”, ofertas generosas em dinheiro ou sacrifícios pessoais possam apressar a participação na vida eterna.

Quando o evangelista afirma (v. 18) que a única forma de ver Deus é através da revelação do Filho (ou “o Deus unigênito”), ele quer ressaltar que Deus jamais está disponível ou pode ser acessado pelo ser humano, a não ser em sua revelação através do Filho. Dar-se a conhecer é graça e presente de Deus, não conquista da ciência e dos saberes humanos. O Filho é revelação de Deus, que se torna ser humano para morar em meio a seu povo.

3. Meditação

Desde a reflexão sobre esse texto em 2003, até hoje pouca coisa mudou, ao menos em termos de cenário mundial. A guerra do Iraque teve um final, comemorado pelo presidente dos Estados Unidos, mas que lhe rendeu duras críticas por parte de vários países do mundo pela falta de motivos para a “justificada” guerra. Os agricultores da região noroeste do Rio Grande do Sul amargam uma quebra na safra de soja devido à seca após ter comemorado uma safra anterior excepcional. E descobrem, aos poucos, que o cultivo das sementes geneticamente modificadas não produz todo aquele milagre prometido pelas empresas detentoras da patente do produto. Aos poucos, boa parte dos agricultores se convence de que sua situação precária e sua insegurança não estão tanto ligadas ao baixo preço do produto, mas aos preços extorsivos praticados pelas empresas multinacionais dos insumos necessários para a produção. Ao mesmo tempo, experimenta-se um aumento brusco e violento nos preços dos alimentos em nível mundial e culpa-se o excesso de áreas usadas para a produção de biocombustíveis. Enquanto isso, o barril de petróleo atinge preços exorbitantes no cenário mundial.

Esse panorama, local e mundial, está fazendo com que mais pessoas comecem a descobrir o quanto o conhecimento humano pode contribuir para manipular dados, distorcer informações, criar factóides, tudo com o objetivo de fazer crer que propostas de determinados grupos ou nações são soluções milagrosas para os males da humanidade. Em meio a tudo isso ressurge com força a pergunta pela verdadeira luz, pela verdade.

A igreja é colocada diante do crescente desafio de deixar claro seu testemunho e sua pregação. Guiados pelo medo de sermos legalistas, muitas vezes deixamos de ser como João Batista, ou seja, não apontamos claramente para a verdadeira luz. Mais e mais casais não querem oficializar seu matrimônio inspirados por modelos de outros, em boa parte divulgados pela mídia e tornados mais e mais conhecidos através da programação que chega via satélite (= antena parabólica) aos mais distantes rincões. E com a preocupa- ção de “não perder membros”, obreiros e obreiras (muitas vezes por pressão de presbitérios) acabam fazendo concessões sobre concessões. Assim acontece em outras áreas da vida comunitária. Não raras vezes, a própria prega- ção é marcada pela suposta “necessidade de adaptação” à realidade do século 21, quando deixamos de destacar o que João Batista faz com clareza e ênfase: apontar para o Cristo, apontar para Deus como o criador da vida, dizer que não são as nossas verdades e “sábias” conclusões que importam, mas importa quem é o centro do que pregamos e anunciamos: Cristo, a ver- dadeira luz.

Essa clareza de pregação acaba tendo dupla consequência: é palavra profética e de juízo para quem não crê ou para quem supostamente crê a fim de poder distorcer a verdade para sua própria vantagem e dominação sobre pessoas ou grupos. Ao mesmo tempo, é palavra de consolo e ânimo para quem crê ou para quem se sente enfraquecido em sua fé diante da confusão criada em sua vida com as inúmeras ofertas de verdade e luz, trazidas quase que diariamente não apenas a seus ouvidos, mas a todos os demais sentidos. Cabe-nos reafirmar com muita clareza: Cristo é a verdadeira luz; Deus é o criador e mantenedor da vida, e é ele quem nos oferece os parâmetros para vida em abundância digna para todos e todas. Todo o nosso saber em nada pode mudar isso, ao mesmo tempo em que ele pode ser colocado à disposição desse testemunho, como instrumento valioso e muito eficaz.

4. Imagens para a prédica

a – Apontar para sinais visíveis das frustradas tentativas do ser humano em querer gerir os caminhos da humanidade com seu próprio conhecimento. Exemplo: o lixo gerado com a disseminação do uso do plástico. (Em centros maiores poderia ser usado o exemplo do lixo virtual.) Sob o pretexto de criar comodidades ou sob o único pretexto do lucro e do consumo, a humanidade cria condições cada vez mais restritas a sua própria sobrevivência.

b – Rejeitar Deus e optar por parâmetros próprios de organizar a vida não envolve apenas questões pessoais. Acaba gerando tensões sociais (discriminações diversas, violência contra crianças e mulheres, contra idosos e pessoas portadoras de necessidades especiais), políticas (mau uso do cargo para privilegiar classes e indivíduos) e econômicas (exploração da terra, exploração da força de trabalho, submissão a empresas multinacionais por do- minar o mercado através de acordos internacionais).

c – A própria igreja não está imune de deixar de apontar para a verdadeira luz quando se preocupa mais em administrar sua própria estrutura, tal- vez seu patrimônio ou, pior, sua imagem agradável diante da sociedade, do que pregar e viver de acordo com a vontade de Deus, mesmo que isso implique “perder membros” ou não ser aplaudida de pé.

d – De qualquer maneira, a pregação deve encerrar trazendo uma pala- vra de ânimo para a comunidade. E qual é a palavra de ânimo? Apesar de alguns terem rejeitado a verdadeira luz, há pessoas que creram nele e a essas Deus adotou como seus filhos e filhas. A comunidade reunida (quer seja em culto, quer em qualquer outra atividade) atende ao convite de Deus. Isso não a torna melhor ou mais qualificada do que aqueles e aquelas que não vieram. Mas certamente a essa comunidade reunida Deus reafirma seu amor e sua presença. E isso é palavra de consolo e esperança, ao mesmo tempo em que é palavra de envio para que essa experiência seja compartilhada com todos e todas que ainda, erradamente, preferem confiar apenas em seu próprio saber.

5. Subsídios litúrgicos

Versículo de entrada:

“Nações, escutem o que eu, o Eterno, estou dizendo e anunciem as minhas palavras nas ilhas e terras distantes. Eu espalhei o povo de Israel, mas vou ajuntá-lo de novo e guardá-lo como um pastor guarda o seu rebanho” (Jr 31.10).

Confissão de pecados:

Deus criador, mantenedor da vida, doador de toda a boa dádiva. Muitas vezes na vida já ouvimos falar de teu amor por nós e como nos adotas carinhosamente para ser teus filhos e tuas filhas. Mesmo assim, seguidamente ignoramos tudo isso e preferimos tocar a nossa vida por conta própria. E acabamos colhendo frutos amargos dessa decisão: desentendimentos, exploração, preconceitos, envenenamento do planeta e das relações. Mais uma vez, bondoso Pai, nos colocamos diante de ti para confessar nossa culpa e implorar por teu perdão. Envia teu Espírito Santo para que ele nos abra os olhos para a verdadeira luz, a tua Palavra. Por amor de Jesus Cristo, teu filho, nosso Salvador, imploramos por perdão cantando:
Comunidade (canta): Perdão, Senhor, perdão.

Anúncio da graça:

“Pois, pela morte de Cristo na cruz, somos libertados, isto é, os nossos pecados são perdoados. Como é maravilhosa a graça de Deus, que ele nos deu com tanta fartura” (Ef 1.7-8).

Oração do dia:
Senhor Deus, tu enviaste pessoas que falaram de teu amor revelado em Jesus Cristo, nossa verdadeira luz. Faz com que tua palavra continue nos ensinando o caminho da verdade do evangelho e nos ponha a caminho para um testemunho claro e vigoroso de teu amor. Por Jesus Cristo, que contigo e com o Espírito Santo reina por todos os tempos. Amém.

Oração geral da igreja:

Amoroso Deus e Pai, rendemos graças por poder contar contigo em nossas vidas. Rendemos graças por insistires conosco, convidando-nos a participar da vida da comunidade. Rendemos graças por tua palavra e teu amor que não mudam, apesar de nossa infidelidade e insegurança. Expressamos nossa gratidão, cantando:

Comunidade (canta): Damos graças ao Senhor, damos graças, graças pelo seu amor.

Intercedemos por este mundo em que vivemos, tão machucado e destruído, em boa parte por nossa omissão e silêncio, para que por nossa ação possa voltar a ser o mundo que tu queres para tua criação.
Intercedemos por nossas autoridades, para que nos governem com justiça e responsabilidade, orientadas por tua palavra, que é luz verdadeira e palavra fiel.
Intercedemos por todas as pessoas que sofrem: doentes, enlutadas, depressivas, abandonadas, injustiçadas. Também pelas pessoas que convivem com essas pessoas e que acabam sofrendo juntamente com elas. Dá-lhes a certeza de tua presença e usa nossos pés, mãos e lábios para que elas saibam que tu não as abandonaste.
Intercedemos por todas as pessoas que não crêem e que muitas vezes carregam, sem perceber ou admitir, o peso terrível de não ter com quem repartir suas angústias mais profundas e doloridas. Abre seus olhos, Senhor, para que experimentem também a paz de poder contar contigo.
Intercedemos por nossa igreja e pela igreja cristã espalhada pelo mundo. Que nosso testemunho seja vigoroso, corajoso e claro! Que não tenhamos nenhum outro norte a não ser tua palavra, a verdadeira luz para os nossos caminhos! E quando sofrermos perseguição por causa de nosso testemunho, dá-nos sempre a certeza de que estás conosco e que nossa vida não é o centro, mas sim o evangelho de Jesus Cristo.
Tudo isso imploramos, bondoso Deus, cantando:

Comunidade (canta): Ouve Senhor, eu estou clamando. Tem piedade de mim e me responde. Ouve-nos, Deus Pai, Filho e Espírito Santo, em tua bondade e misericórdia, quando nos unimos como teus filhos e tuas filhas, orando:

Comunidade: Pai nosso...

Bibliografia

SCHULZ, Siegfried. Das Evangelium nach Johannes. Das Neue Testament Deutsch.Vandenhoeck & Ruprecht, 1972.
LEE, Witness. Leben im Johannesevangelium. Stuttgart: Der Strom, 1980. DIVERSOS. Evangelho de João e Apocalipse. São Leopoldo e São Paulo:
CEBI e Paulus, 2000.
MESTERS, Carlos; LOPES, Mercedes; OROFINO, Francisco. Raio-X da Vida. Círculos Bíblicos do Evangelho de João. São Leopoldo: CEBI, 2000.


 


Autor(a): Erni Drehmer
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Natal
Perfil do Domingo: 2º Domingo após Natal
Testamento: Novo / Livro: João / Capitulo: 1 / Versículo Inicial: 10 / Versículo Final: 18
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2008 / Volume: 33
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 18576
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