Lucas 2.41-52

Auxílio Homilético

01/01/1995

Prédica: Lucas 2.41-52
Leituras: Jeremias 31.10-13 e Hebreus 2.10-18
Autor: Renato Luiz Becker
Data Litúrgica: 1º Domingo após Natal (Ano Novo)
Data da Pregação: 01/01/1995
Proclamar Libertação - Volume: XX


1. Uma história

Seu Boanerges acordou cedo naquele último dia de 1994. Não conseguira mais dormir depois das 5 h da manhã. Dona Helga já estava acostumada com esse jeito de ser do companheiro de longa data. No começo, forçava os olhos para tentar enganar o organismo e continuar mergulhada no sono. Acabava desistindo desse intento, logo depois. Os barulhos que nasciam na cozinha eram sinais carinhosos de quem ansiava por companhia. Seu marido amava a vida. Esse amor fazia-o refletir cada vez com mais profundidade sobre as coisas. Via-se isso nos seus olhos. Foi por isso que levantou-se, pé ante pé.

O silêncio no quarto ao lado era indicador de que o João e a Aríete ainda dormiam, preguiçosamente, depois da festança ocorrida à noite. Tinham que descansar, sim. Trabalhavam duro durante o ano, tocando aquela lanchonete no centro de Curitiba. Lá na sala, sobre os colchões sobressalentes, espreguiçavam-se o Ernesto, a Glaci e o netinho Elias. Tinham vindo de Porto Alegre na tarde anterior para visitar o vovô e a vovó.

Sempre discreta, dona Helga pendurou um cobertor na janela da sala. Queria tentar manter uma espécie de penumbra dentro da mesma, que parecia estar louca por deixar-se possuir pela luz do sol. Na cozinha, sorvos exagerados de chimarrão catarina garganta abaixo.

Sob cochichos, comentários daqui e opiniões dali, acabaram resolvendo a questão: já que tanto os filhos como as noras gostavam de camarão, Seu Boanerges iria comprá-lo de um pescador e, depois, com arte e cerveja, faria o seu preparo. Dona Helga iria participar do culto dominical. A vizinha, Dona Chica, havia dito que o pastor Aristeu faria a pregação. Colocou o vestido novo, alinhou o cabelo e já estava pronta para sair quando foi abraçada por trás pelo filho porto-alegrense, que, com um sorriso matutino nos lábios, fez menção de fazer-lhe companhia. Felicidade ímpar...

O templo estava lotado. Eram muitos os que vinham cumprimentar Dona Helga para desejar-lhe Feliz Ano Novo. No fundo, bem no fundo também queriam trocar uma palhinha com o Ernesto, o ex-líder da JE, moço sonhador e entusiasta, que fora buscar novos rumos para sua vida na capital gaúcha, dentro do ramo farmacêutico. Tocaram os sinos. Os diálogos foram murchando.

Enquanto rolavam os cânticos entremeados pelas palavras estudadas que eram trazidas pelo pastor, Ernesto fitava a tudo e a todos. Por um momento deteve-se no penteado e, por outro, no preto espetacular do sapato daquele que usava talar. Procurava ser envolvente e, para tal, usava de gestos que denotavam uma certa pré-fabricação. Não!... Não queria se deter nesses detalhes. Tinha vindo ali com sua mãe com o objetivo de ouvir, meditar e depois reagir em cima da palavra de Deus. Esforçou-se. Gravou cada um daqueles vocábulos na winchester do seu cérebro. Deu de si para focar olhar e atenção naquele que falava de cima do púlpito...

2. No meio de uma prédica

Irmãos e irmãs! Os festejos natalinos tiveram sua vez. Os jantares festivos já aconteceram. As luzes dum multicolorido quase artificial já começam a ceder o seu lugar para a claridade ofuscante da rotina diária. Não resta mais a menor dúvida de que estamos invadindo o ano de 1995, alicerçados na luz que não apaga e que sempre é: refiro-me à pessoa de Jesus Cristo. Por causa dele podemos considerar-nos felizes eternamente; podemos dançar de alegria, conforme propõe o profeta.

Pois muito bem! Convido todos para, juntos, abrirmos nossas bíblias no Evangelho de Lucas. Quero apoiar esta prédica sobre o capítulo 2, versos 41 até 52. Lucas 2.41-52...

Precisava ceder a mão à palmatória. Havia vida naquela comunidade. O barulho de papel oriundo das folhas daqueles inúmeros livros sagrados, que eram movidas por dedos de todos os matizes, impressionava. Sua mãe mal disfarçava o orgulho por tê-lo sentado ao lado. Sentia-se como uma espécie de troféu exposto em vitrina de ótica. Prestaria atenção naquelas palavras que estavam sendo ridas em coro. Era o pastor quem falava...

Ouviram?! Informações como essa sobre o Jesus pré-adolescente só encontramos em Lucas. Ele escreve que Maria, José e Jesus foram participar da grandiosa festa da Páscoa. Jesus teve a oportunidade de ir junto, uma vez que já tinha 12 anos de vida. Com essa idade os jovens judeus já eram considerados adultos. Rezava a lei que todo judeu adulto que vivesse a 30 km de Jerusalém tinha que estar presente a esse evento. Foi a primeira Páscoa de Jesus na cidade santa.

Jerusalém deve ter sido fascinante para ele, que, até ali, só tinha estado envolvido com as coisas da marcenaria. Ali estava o famoso templo de Salomão, estavam os rituais sagrados, estavam aquelas pessoas citadinas tão diferentes das do interior. Não deu outra: emaranhou-se na urbe.

Quando a excursão festiva acabou, era hora de regressar. As mulheres voltavam na frente e os homens caminhavam algumas horas atrás. Ao contactarem-se, já era noitinha. No momento da arrumação da barraca, Maria e José finalmente constataram a ausência do seu querido. Cada um dos dois pensou que o menino estivesse na companhia do outro. Procura daqui e procura de lá, já havia desgaste. Desgaste que os levou a voltar pra cidade, onde encontraram o menino no templo.

O Sinédrio ainda discutia questões teológicas na presença de quem se dispunha a escutar. Com o rabo do olho, os pais viram Jesus escutando as discussões e buscando o conhecimento com ávido interesse, a partir de perguntas inteligentes. Por um momento ficaram estáticos, mas logo assumiram uma postura mais ativa:

— Mas qual é, Jê! Eu e o teu pai já estamos há um bocado de tempo atrás de ti. Queremos uma boa explicação para essa atitude fora de propósito.

— Qual é digo eu! O lugar onde eu devo estar é na casa do meu Pai.

Aquele pastorzinho da Região 2 até que conseguia manter as pessoas despertas. Fazia mímica. Não era carrancudo e parecia ter um olhar de amigo, daqueles que alegram o coração. Dava gosto escutá-lo. Pela entonação, agora, seria o ponto alto da reflexão. Prestaria mais atenção ainda...

Vocês notaram que Jesus retirou a palavra pai de José, aplicando-a a Deus? Pensem nisso... Ninguém vai encontrar Jesus entre amigos e vizinhos, nem em qualquer outro lugar fora do ministério da Palavra. É impossível dar de cara com Jesus entre as coisas que são mundanas. Ele só pode ser achado nas coisas que são do Pai. O templo é uma dessas coisas. Ele é o santuário, a santa morada do Pai. É nele que Deus faz-se ouvir pela sua santa Palavra.

Maria e José enganaram-se. Eles pensaram encontrar Jesus em primeira mão naquilo que os homens são e possuem. Calcados em sabedoria, pensamentos e esperanças falhos, procuraram-no de um lado e de outro, sem encontrá-lo. É que não o procuraram como deviam ter procurado. Procuraram-no como fazem carne e sangue. Ora, para encontrar-se Jesus, deve-se deixar tudo de lado: amigos, conhe¬cidos, toda a cidade de Jerusalém, toda arte e sabedoria, tudo o que a gente é e todos os homens. Claro! O consolo não está nisso tudo. José e Maria encontraram-no na casa do Pai. Foi lá que o seu coração achou a paz.

A comunidade estava atenta. O ex-professor Hermedo diria que o feedback estava ótimo. Pena que a fala dava-se de cima para baixo. Por que os púlpitos sempre tinham que ser tão altos? Será que uma falação dessas não ficaria melhor se fosse num nível mais horizontal? A cena encaminhava-se para o fim.

E o Evangelho continua. Ele nos fala que Jesus era submisso aos seus pais. Isso significa que a juventude de Jesus foi marcada pela humildade, pela obediência ao seu pai e à sua mãe. A verdade é que Jesus levava a sério o quarto mandamento: buscava água, pão e carne; cuidava da casa e varria o pátio, enfim, fazia todas as coisas que seus pais ordenavam, coisas que aparentemente eram tarefas bem simples, insignificantes e humildes. Jesus não se aborrecia com esses detalhes.

Crianças! Essa palavra também é para vocês. Imitem o exemplo de Jesus e façam o que os pais mandam fazer. A Bíblia diz que Jesus cresceu de forma equilibrada em sabedoria, estatura e graça. Que ele desenvolveu-se harmoniosamente diante de Deus e dos homens. É por isso que acabou tornando-se essa grande figura do Novo Testamento. Um homem com ideias claras, convicto de seus propósitos, disposto a pagar o preço do sonho do reino de Deus.

Quero terminar com uma advertência amorosa: busquemos o Senhor Jesus no lugar certo. Neste ano da graça de 1995, ele ainda pode ser encontrado. A paz física e espiritual ainda pode ser vivenciada por cada um de nós, também no seio desta comunidade. Que assim seja... Convido todos vocês para uma palavra de oração...

Fazia tempo que experimentara aquela sensação pela última vez. Fora nos tempos da JE, quando o pastor Marques ainda estava por ali. Não tinha mais tido tempo de ir aos cultos. Uma espécie de voz mínima agredia-o por dentro. Estocava-o no sentido de que essa tal falta de tempo era desculpa da grossa. Para o encontro semanal com os colegas do Bar Ranço, ou ainda para a horinha do futebol de salão nas sextas-feiras, ele sempre achava espaço.

O Elias estava crescendo tal e qual uma abóbora. Para que se desenvolvesse de modo saudável, ele também teria que experimentar o que seu pai experimentara. Trabalharia para que seu rebento também ficasse encharcado dos conteúdos da fé evangélica. Teria que rearticular sua vida. Buscar reencontrar Jesus lá onde ele de fato pode ser reencontrado. Pensando essas coisas ainda ouviu aquele coral tão bem afinado. Seu canto invadia-o até as entranhas. Os sinos começaram a tocar e acordaram-no para a vida. De um ímpeto, abraçou Dona Helga. Nunca a tinha abraçado assim. Esgueiraram-se pelo corredor dando bom dia aqui e ali, sempre com um sorriso nos lábios, mais uma pitada de palavra qualquer, e foram para casa.

Caminharam quietos. Ouviam seus passos na terra poeirenta. Dona Helga parecia entender que o momento era de calar. Em casa, cheiro de camarão ao hafo. Cascos escuros de cervejas recém saídas do freezer já eram verdade. A lesta do Ano Novo ainda estava no ar. O João, a Aríete mais a Glaci, o Elias e Seu Boanerges estavam a mil. A palavra ouvida pela manhã teria que ser vivida ali, entre eles, sob contextualização. Nada de ermitizar-se, mas sim explicitar-se. Dar-se a conhecer com a alegria de quem deixou-se marcar pelo Espírito Santo, para dentro de um momento novo.

Quando tiveram oportunidade de cruzarem os olhares, Ernesto e Dona l leiga entenderam-se.

Desse entendimento brotaram palavras, ao natural...

— Pai! Passa o prato de camarão... Feliz 1995, gente! Que Deus abençoe vocês em Curitiba, nós em Porto Alegre e o pai e a mãe aqui em Floripa — sonhou o Ernesto com aquele sorriso largo, encharcado da vontade de dançar de alegria, alegria detonadora de descoberta verdadeiramente ímpar.

3. E ainda uma sugestão

Crie uma peça teatral a partir desses dados, com o seu grupo de JE ou grupo de confirmandos. Ouse a novidade a partir de oito personagens. Apresen¬te-a no culto de 1Q de janeiro de 1995. Bom ano novo, irmãs e irmãos!

4. Bibliografia

BARCLAY, William. Lucas. Buenos Aires, La Aurora, 1974. 290 p.
LUTERO, Martinho. A glória de Deus sobre a criança e Era-lhes submisso. In: Castelo Forte. São Leopoldo, Sinodal; Porto Alegre, Concórdia, 1983.09/01/83 e 10/01/83.
MORRIS, Leon L. Lucas. São Paulo, Mundo Cristão, 1990. 330 p.


Autor(a): Renato Luiz Becker
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Natal
Perfil do Domingo: 1º Domingo após Natal
Testamento: Novo / Livro: Lucas / Capitulo: 2 / Versículo Inicial: 41 / Versículo Final: 52
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1994 / Volume: 20
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 17733
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