Marcos 1.1-8

Auxílio Homilético

07/12/2008

Prédica: Marcos 1.1-8
Leituras: Isaías 40.1-11 e 2. Pedro 3.8-15a
Autor: Alfredo Jorge Hagsma
Data Litúrgica: 2º. Domingo de Advento
Data da Pregação: 07 de dezembro de 2008
Proclamar Libertação - Volume: XXXIII
Tema: Advento

1. Introdução

É a terceira vez que este texto (Mc 1.1-8) é sugerido como motivo de pregação na série Proclamar Libertação (PL). O texto foi tratado nas edições XXII (p.14ss) e XVIII (p.13ss) do PL. Nessas mesmas edições, os v. 4-11 também foram tratados, de forma que esse é um texto bastante explorado, no entanto certamente jamais esgotado. Trata-se de um texto clássico. “Os evangelhos foram escritos com a finalidade de testemunhar sobre a vida, a atuação, a morte e a ressurreição de Jesus Cristo. Não obstante, todos são unânimes em principiar seu relato com João Batista. Indubitavelmente, isso tem sua razão de ser. É claro que João Batista merece ser mencionado pelo simples fato de Jesus se deixar batizar por ele antes do início de sua atuação pública.” Os quatro evangelistas fazem menção à biografia e à pregação de João Batista. No entanto, o Evangelho de Marcos inicia com a mensagem de João Batista. Eis a importância dessa mensagem para o autor desse evangelho. A prepara- ção do caminho para a chegada de Jesus é a mensagem central desse texto.

Os dois textos auxiliares, Isaías 40.1-11 e 2 Pedro 3.8-15a, têm estreita relação com o texto em questão. Enquanto Isaías anuncia a nova realidade (v. 10-11) a ser experimentada com a chegada do Messias, Pedro ressalta a importância de estar sempre preparado para essa chegada. Ninguém sabe quando esse novo dia vai chegar. No entanto, por ser promessa de Deus, essa nova realidade não é apenas um sonho distante, mas uma realidade que já bate à nossa porta: “Deus prometeu, e nós estamos esperando um novo céu e uma nova terra, onde mora a justiça” (2 Pe 3.13). Penso que os três textos podem se relacionar a partir do tripé: promessa-espera/preparação-nova realidade. A promessa que foi feita é aguardada com ansiedade. Estamos no tempo entre a promessa e o seu cumprimento, ou seja, no tempo da espera, da preparação, tempo de Advento.

2. Da exegese à mensagem

O Evangelho de Marcos é considerado pela maioria dos pesquisadores o mais antigo de todos os evangelhos. No entanto, a sua datação não é consenso entre os pesquisadores. Ched Myers pensa que “uma data anterior a 70 e durante a revolta (portanto, depois de 66) é essencial à coerência da ideologia política e econômica da narrativa de Marcos. A forte crítica que Marcos lança ao estado do templo e à sua economia política teria evidentemente sido supérflua se o templo já tivesse sido destruído”. Myers acredita que a resistência à datação anterior a 70 pelos estudiosos seja para suprimir os aspectos econômicos e políticos em favor dos teológicos. De acordo com esse autor, tão importante quanto o conteúdo teológico dessa cena é a descrição de João Batista. E, de fato, Marcos dá muita importância em detalhar a vestimenta e o estilo de vida de João, e isso não deve ser por acaso. Para os leitores de Marcos, o estilo de João evocava o grande profeta Elias (2 Rs 1.8), ou seja, seu estilo tinha conotações políticas. Segundo alguns textos do historiador Flávio Josefo, João era considerado pela corte de Herodes uma ameaça subversiva, sem, no entanto, dar motivos explícitos para tal. Desse modo, podemos pensar que, para o Império Romano, o estilo de ser de João Batista falava mais do que sua mensagem propriamente dita. A relação que o povo fazia entre João e o profeta Elias preocupava mais do que sua mensagem em si. Sobre a mensagem de João não há dúvida. Ela é teologicamente clara, coerente, é profética, mas não atingia diretamente o Império. Penso aqui não apenas na versão do evangelista Marcos, mas também de Mateus, Lucas e João. As palavras de João eram duras e diretas. Aos fariseus e saduceus ele disse: “Raça de cobras venenosas! Quem disse que vocês escaparão do terrível castigo que Deus vai mandar. Façam coisas que mostrem que vocês se arrependeram dos seus pecados” (Mt 3.7b). Ou seja, João cobrava coerência das pessoas, atitude compatível com o arrependimento. João apontava para o caminho da salvação ao proclamar o arrependimento. Esse arrependimento não era uma questão subjetiva: apontava para a realidade, desafiava para a prática: “Quem tiver duas túnicas que dê uma a quem não tem nenhuma, não cobrem mais do que a lei manda etc”.

Nesse aspecto, o Império Romano poderia perceber em João uma espécie de auxiliador. Ele não falava contra os impostos, mas contra a corrupção dos coletores. Também a orientação aos soldados reforçava a ideia de concordância com o Império Romano, pois ele dizia: “Contentem-se com o salário que ganham”. Qual patrão não gostaria de que alguém ordenasse isso a seus subordinados? Em síntese, a mensagem de João tem destino específico e clama por uma mudança pessoal. Ela clama por uma mudança concreta: “Façam coisas que mostrem que vocês se arrependeram”. Segundo W. G. Kümmel, João Batista adotou o chamado profético à “meia-volta”. Segundo Kümmel, a palavra em aramaico que no português foi traduzida por arrependimento pode significar mais do que isso, a saber: designa uma mudança de rumo, o abandono do caminho falso e um trilhar no caminho certo. Por isso João também fala da atitude pós-arrependimento (Mt 3.8). A confissão só faz sentido e deixa de ser hipócrita quando a ela seguem atitudes compatíveis com o arrependimento. Caso contrário, a confissão não passa de mero formalismo litúrgico. Praticamente em todos os cultos, as liturgias contemplam uma confissão de pecados, ou seja, a comunidade reunida reconhece o erro e deseja mudar de vida. E Deus, em sua bondade, concede essa nova oportunidade não apenas mais uma vez, mas todos os dias, por toda a vida.

Os cristãos da comunidade antiga percebiam no arrependimento e no batismo o preparo para o caminho do Senhor. Batismo e arrependimento são inseparáveis. Ou seja, conforme afirmou Martim Lutero, a vida cristã nada mais é do que batismo diário.

3. Imagens para a prédica

3.1 – Uma festa junina (joanina) no Advento

a – Num primeiro olhar, não vamos encontrar nesta perícope (Mc 1.1-7) grandes novidades para a pregação nesta segunda semana de Advento. Ad- vento significa tempo de espera, de preparação para a chegada de Jesus. Como de costume, as pessoas, as famílias e as comunidades estão vivendo esse tempo de uma maneira convencional. O chamado ao arrependimento, à conversão, à mudança de rumo é a tônica comum. Todos os anos, essa é a ênfase no Advento. No entanto, creio que não podemos ficar unicamente na dimensão bíblica/teológica do arrependimento. Pois, como disse Kümmel, “arrependimento é muito mais do que um sentimento”. Está de mãos dadas com a atitude. A mudança que esse arrependimento implica precisa ser leva- da muito a sério. A pregação precisa apontar para essa mudança concreta. Algo extraordinário seria voltar ao mês de junho e relembrar as festas juninas ou joaninas. Nessas festas, a mudança se materializa, ganha rosto, roupa e alimentos. Ainda que de uma forma simbólica, mas acontece uma mudança concreta, se sai do subjetivo. As pessoas fantasiam-se, mudando completa- mente o seu jeito de ser. A preparação para o Natal deveria passar necessariamente pela corporeidade. Nesse sentido, seria interessante enfeitar o templo como se estivéssemos numa festa junina. Colocar bandeirinhas ao redor da coroa de Advento, em torno do altar e nas janelas. Na recepção, junto com o hinário e bíblias, distribuir algumas guloseimas próprias das festas juninas, como rapadurinhas, pés-de-moleque, pipoca, batata-doce etc. Também seria interessante ter entre as pessoas algumas vestidas conforme a vestimenta das festas juninas. Essa dinâmica vai criar, num primeiro momento, um desconforto, uma certa incompreensão por estar descaracterizando o tempo de Advento. No entanto, mudança para valer somente acontece quando se está disposto a sair da zona de conforto. Essa simbologia vai apontar para uma mudança concreta. Uma mudança que é percebida pelo olhar e pelo gosto. Sem mudanças reais, pessoais e comunitárias, o presépio não passará de um enfeite temporário no canto da sala ou no altar da igreja.

b – O último censo revelou que o Brasil é uma nação predominantemente cristã. Será? Jesus dizia que pelos frutos os conhecereis. Que frutos predominam em Brasília, em nossa cidade, em nossa comunidade de fé ou em nossa casa? Ou seja, a fé professada não ganha corpo. O verbo não se encarna. Sem essa mudança radical, estaremos mais uma vez romanceando o nascimento de Jesus, perfumando a estrebaria. Todo mundo se emociona. Muitas pessoas quase vão às lágrimas nas celebrações de Advento e Natal. Um novo ano começa. Alguns vão para a praia, outros não, e a história se repete. Os jornais vão trazer as mesmas notícias: corrupção e violência em toda a parte. E a gente logo se acostuma. Não estamos livres dessa teimosa realidade, mas não há dúvida de que a comunidade cristã precisa ser mais enfática na preparação do caminho do reino. A partir da mensagem poderiam ficar alguns desafios bem concretos. Cada comunidade poderia identificar tais desafios em seu contexto. Isso pode- ria acontecer num estudo anterior ou posterior ao culto.

4. Recursos litúrgicos

Confissão dos pecados:

Querido e amado Deus. Já estamos na segunda semana de teu Advento. Como povo que se reúne em teu nome, queremos preparar-nos da melhor maneira para a tua chegada. Como parte de nossa preparação, precisamos arrepender-nos pelas falhas cometidas na caminhada. São tantas, amado Deus, que nem as conseguimos enumerar. O que importa é que tu conheces cada uma delas. Confessamos que o nosso arrependimento muitas vezes não tem saído do coração, não tem passado de palavras vãs. Reconhecemos isso diante de ti e pedimos que através de teu Espírito Santo possas nos dar mais uma oportunidade. É o que pedimos em nome de teu filho Jesus. Amém.

Absolvição:

A todas as pessoas que sinceramente se arrependem eu proclamo a graça e a alegria do perdão da parte de Deus, lembrando as palavras de Jesus Cristo, que disse: “Nem todo aquele que me chama Senhor, Senhor, entrará no reino do céu, mas aquele que faz a vontade de meu Pai que está no céu” (Mt 7.21). Amém.

Oração de coleta:

Bondoso Deus, mais uma vez nos reunimos e arrependidos pedimos teu perdão. Como resposta à nossa confissão, ouvimos de tua parte: Os teus pecados foram perdoados. Estamos limpos, livres e ansiosos por tua palavra, que orienta e conduz nossas vidas por caminhos seguros. Que o teu Espírito Santo abra nossos ouvidos e transforme nosso ouvir em atitudes que, de fato, mostrem o nosso arrependimento e o nosso desejo de uma nova vida. Por Cristo, que com o Pai e o Espírito são um. Amém.

Bibliografia


MYERS, Ched. O Evangelho de São Marcos. São Paulo: Edições Paulinas, 1992
KÜMMEL, Werner Georg. Síntese Teológica do Novo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 1983.


 


Autor(a): Alfredo Jorge Hagsma
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Advento
Perfil do Domingo: 2º Domingo de Advento
Testamento: Novo / Livro: Marcos / Capitulo: 1 / Versículo Inicial: 1 / Versículo Final: 8
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2008 / Volume: 33
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 18568
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