... mas que droga! A Colômbia quer viver em paz!

01/12/2011

... mas que droga! A Colômbia quer viver em paz!

P. Silvio Schneider

Paz! É o que mais necessita e deseja o povo colombiano depois de mais de 50 anos de luta armada. Não há família que não tenha sido tocada pelo conflito, perdido um ente querido ou sido expulsa de suas terras e comunidades de origem. A gente está farta! E quer a paz!

Um país em crise humanitária

Na Colômbia persiste a única crise humanitária da América Latina. Em relação ao resto do mundo, o país ocupa o segundo lugar em número de refugiados internos, depois apenas do Sudão. Os atores fundamentais do conflito armado colombiano — um dos mais antigos do planeta —são grupos armados organizados e as forças armadas. Todos eles foram e continuam sendo causadores do deslocamento e expulsão de 3,5 a 4,9 milhões de pessoas de suas casas e comunidades de origem. Entre outros elementos o conflito entre irmãos é integrado por lutas ideológicas, narcotráfico e apropriação de terras. A crise adquiriu uma dimensão regional e ultrapassou as fronteiras nacionais, originando um importante fluxo de pessoas com necessidade de proteção internacional.

Os refugiados internos chamam-se desplazados, e entre eles a maioria são mulheres, crianças e idosos vitimados pela violência dos atores armados. Nos últimos dez anos, a cada ano aproximadamente 300.000 novos desplazados somam-se aos já existentes. O desplazamiento é preponderantemente do campo para a cidade. Os grupos mais afetados são as comunidades afro-colombianas e os povos indígenas, cujos territórios coletivos contemplados na Constituição colombiana são o principal objeto de conquista e causa de expulsão.

São vários os atores armados envolvidos no conflito: grupos guerrilheiros, paramilitares, traficantes de drogas, as Forcas Armadas e a Polícia Nacional. O efeito cumulativo de 50 anos de guerra civil tem sido devastador para a população civil e para as estruturas políticas e sociais que devem sustentar a vida quotidiana. Os grupos armados ilegais — e por vezes também os legais - são responsáveis por sérios abusos e violações de Direitos Humanos e do Direito Internacional Humanitário. Entre 2002 e 2009, mais de 1.000 defensores de Direitos Humanos foram vítimas de agressões, assassinatos, ameaças, detenções arbitrárias e torturas, e somente em 2010 foram mortos 32 defensores de Direitos Humanos. E a mais recente brutalidade ocorreu com o assassinato de uma juíza em Saravena, Departamento de Arauca, fronteira com a Venezuela. Ela investigava o estupro seguido de execução de uma menina de doze anos e de seus dois irmãos de nove e seis anos de idade, cometidos por um oficial do Exército colombiano. A corrupção se encontra presente em todos os níveis de serviço público.

Com o apoio dos Estados Unidos o Governo implementou o Plano Colômbia injetando seis bilhões de dólares americanos para aumentar o contingente e equipar as Forcas Armadas da Colômbia. O objetivo é, através da Política de Segurança Democrática, recuperar territórios controlados pela guerrilha e pelo narcotráfico, e promover ações de desenvolvimento através de políticas públicas e assegurar investimentos estrangeiros. Atualmente os setores de segurança absorvem 459.687 posições (FFAA e polícia) de um total de 566.084 funcionários públicos, consumindo 3,4% do PIB colombiano. Já os grupos armados ilegais contam com aproximadamente 15.000 atores entre guerrilheiros e paramilitares financiados pelo tráfico de drogas.

A situação religiosa

Do ponto de vista religioso, a Colômbia é um país cristão com absoluta maioria de católico-romanos. Possui muitas e belas igrejas desde os tempos coloniais, e mantém uma prática bastante conservadora do catolicismo, com um intenso culto a Virgem Maria em suas mais variadas expressões. Os evangélicos — em sua maioria pentecostais de origem norte-americana e neo-pentecostais de origem brasileira - tem pouca visibilidade e presença social ou expressão política. Ainda assim, estão em fase de crescimento numérico. As chamadas igrejas históricas, entre as quais a Igreja Evangélica Luterana na Colômbia (IELCO) com aproximadamente 1.500 membros após 75 anos de presença no País, está definindo suas estratégias de crescimento e buscando apresentar-se como alternativas ao catolicismo conservador e ao neopentecostalismo da prosperidade.

Atuação da FLM

A Federação Luterana Mundial — Serviço Mundial está presente na Colômbia a convite da IELCO desde 2005 e atua em nome da comunhão luterana para ajudar a responder aos desafios gerados pela crise humanitária colombiana. Seu programa no país chama-se PROMOÇÃO DE DIREITOS HUMANOS, DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E AÇÕES HUMANITÁRIAS NA COLÔMBIA (2010-2015). Está localizado no Departamento de Arauca (fronteira com a Venezuela), onde atua junto a comunidades de pequenos agricultores e de indígenas, ameaçados ou expulsos de suas terras pelo conflito; no Departamento de Chocó, na Costa Pacífica, com população predominantemente afro-colombiana, e no Departamento de Cundinamarca, apoiando organizações de defesa dos Direitos Humanos e de promoção de segurança alimentar no meio urbano.

O programa trabalha com uma abordagem a partir de direitos. Ele visa à defesa, a promoção, a proteção de direitos humanos e cidadãos e dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais através de formação, atenção, consultorias e assistências jurídicas, denúncias, documentação de casos, incidência e participação na formulação de políticas públicas por meio do fortalecimento de atores locais. Como segundo objetivo estratégico a FLM/DSM-CO promove meios de vida sustentáveis com enfoque em segurança e soberania alimentar, agricultura familiar orgânica, apoio à consolidação de organizações de base e defesa dos seus territórios, e o cuidado com o meio ambiente. E, não por último, por sermos uma organização historicamente comprometida com ajuda humanitária e estarmos em um contexto de crise humanitária invisível aos olhos do mundo, o programa ainda promove ajuda humanitária em termos de atenção e prevenção de emergências sociais e naturais e presta ajuda a vítimas do conflito armado e de desastres naturais, através de atenção psicossocial, rotas de emergência, planos de contingência, gestão de riscos, educação e prevenção de minas unipessoais.

Pobreza, fome, falta de escolas e de professores e de assistência à saúde, como estratégia o como consequência da guerra civil, continuam a expor as múltiples formas da crise humanitária esquecida na Colômbia. As vítimas, sobretudo entre a população civil, sofrem ameaças de morte, ataques diretos e indiretos e são submetidas ao permanente exercício de poder dos atores armados.

A polarização entre governo (que durante um longo período contou com o apoio de paramilitares) e as guerrilhas tem pouca perspectiva de diminuir ou ser administrada com a colaboração de atores da sociedade civil, incluindo as igrejas. Por isso é importante que os países vizinhos pressionem todos os atores armados envolvidos neste longo conflito para buscar uma solução política e negociada, salvando vidas, sobretudo de jovens soldados e guerrilheiros que, afinal, são irmãos e pertencentes a um mesmo povo.

O autor é pastor da IECLB e representante da Federação Luterana Mundial no seu programa de auxílio na Colômbia, onde ele também reside (www.lwfcolombia.org.co)


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Autor(a): Silvio Schneider
Âmbito: IECLB
Título da publicação: Anuário Evangélico - 2012 / Editora: Editora Otto Kuhr / Ano: 2011
Natureza do Texto: Artigo
ID: 31861
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