Mateus 16.21-28

Auxílio Homilético

31/08/2008

Prédica: Mateus 16.21-28
Leituras: Jeremias 15.15-21; Romanos 12.9-21
Autor: Werner Wiese
Data Litúrgica: 16º Domingo após Pentecostes
Data da Pregação: 31/08/2008
Proclamar Libertação - Volume: XXXII


1 Introdução
Anunciar a palavra de Deus é uma tarefa desafiadora e gratificante, pois não sabemos quem virá ao culto. Desconhecemos a realidade específica de cada pessoa no templo. Esses desafios não nos desmotivam. São gratificantes, pois, já antes de prepararmos o sermão, há pessoas esperando por ele, porque necessitam da palavra de Deus como orientação para sua vida. Lembremo-nos de que não anunciamos uma palavra como todas as outras palavras, mas que é diferente de todas elas, porque é a palavra de Deus proclamada por boca humana. Aqui, o texto de Mateus 16.21-28, previsto para a prédica de hoje, tem suportes que podem ajudar a estabelecer elos de comunicação com as pessoas presentes no culto: as expectativas, os sofrimentos e a reação humana diante dos mesmos. O sofrimento humano das mais diversas origens e natureza é uma realidade muito presente nas pessoas. As demais leituras bíblicas para a celebração de hoje (Jr 15.15-21 e Rm 12.9-21) podem ser vinculados ao texto da prédica pelo viés do sofrimento, das aflições e das reações que causam.

2 Elementos exegéticos
2.1 – A composição do texto
Ele é composto de duas subunidades literárias ligadas entre si. A primeira abrange os v. 21-23 e fala da morte e ressurreição de Jesus. A segunda subunidade inclui os v. 24-28 e trata, essencialmente, do preço do seguimento de Jesus. Em Mateus 16.21s., Jesus prediz pela primeira vez sua morte e ressurreição (Mc 8.31-33; Lc 9.22). Isso ocorre mais duas vezes de forma explícita (Mt 17.22-23 par; Mt 20.17-19 par). Em Mateus, também há indicações indiretas à morte e ressurreição (por exemplo: Mt 12.14; Mc 3.6; Mt 12.38-42). Portanto, morte e ressurreição são núcleo inerente ao ministério de Jesus de Nazaré.

2.2 – O contexto literário
É importante observar que o texto não está solto no ar, pois ajuda a entender o impacto dele sobre as pessoas diretamente envolvidas: os discípulos, com destaque para o nome de Pedro. No texto precedente, Jesus pergunta a seus discípulos: “Mas vós... quem dizeis que eu sou?” (v.15). Pedro – porta-voz dos doze – responde sem hesitar: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” (v. 16). Essa é a mais precisa definição e confissão teológica a Jesus Cristo feita por alguém no evangelho (Jo 6.68-69). Ela é confirmada por Jesus como revelação de “meu Pai, que está nos céus” (Mt 16.17) e é acompanhada da mais profunda promessa feita a alguém na terra (Mt 16.18-19). Imediatamente após o texto para a pregação, Mateus traz o episódio da transfiguração, no qual a realidade de Deus irrompe de forma extraordinária na realidade humana. Portanto o texto da pregação é sustentado pela realidade da revelação.

2.3 – Vínculos internos
“Desde esse tempo, começou Jesus Cristo a mostrar a seus discípulos que lhe era necessário... sofrer...” (v. 21). Essas palavras provocam uma reação em cadeia: Pedro protesta com veemência (v. 22). Jesus, por sua vez, contra-reage com palavras fortíssimas: “... Arreda, Satanás!” (v. 23a). Arreda (opisô moy) é linguagem de chamamento ao discipulado (Mt 4.19). Ademais, as duas subunidades literárias (v. 21-23 e v. 24-28) estão estreitamente ligadas entre si pelo advérbio “então”. Ligação semelhante acontece entre o texto da confissão de Pedro e nosso texto: “Desde esse tempo” (v. 21a). Portanto o advérbio “então” sugere que os v. 24-28 surgiram a partir do protesto de Pedro contra o sofrimento de Jesus.

2.4 – Destaques teológicos
a – Falar do caminho à cruz e da ressurreição é iniciativa de Jesus: “Começou Jesus Cristo a mostrar a seus discípulos...” Por trás do “mostrar” está a realidade teológica do servo sofredor do Senhor (Is 42.1s.; 53.1s., especialmente v. 10; Os 6.2. Cf. Lc 24.44-46). A expressão “que lhe era necessário” destaca que o destino de Jesus não é mero resultado de um processo político da época. Por trás de seu ministério está a necessidade de Deus (Jo 4.4) para salvar a humanidade do círculo vicioso do maligno e da violência. Esse círculo se vence fazendo o bem. Aqui Romanos 12.9-21 é esclarecedor.
b – O protesto de Pedro. A mesma boca que confessa “Tu és o Cristo...” profere o diametralmente oposto à necessidade de Deus no ministério de Jesus.
c – “Arreda, Satanás” realça que a boa intenção de Pedro periga tornar-se motivo de tropeço (skándalon) para Jesus: Pedro – o portador da promessa (Mt 16.18-19) – incorpora a forma do tentador. Jesus opõe-se a essa voz com o mesmo ímpeto com que se opõe à voz do tentador em Mateus 4.1-11, especialmente o v. 10. Pedro é recolocado na condição de seguidor; Jesus não o deixa na condição de condutor do discipulado (v. 22).
d – O seguimento a Jesus (v. 24-28) difere da lógica da vantagem: “Ganhar o mundo inteiro” (cf. Lc 9.57-62).

3 Meditação do texto
Entre a confissão de fé proferida em comunidade no culto e a realidade do dia-a-dia existem enormes tensões. A reta confissão de fé não é garantia para sucesso e expectativas correspondidas. Os embates da vida – decepções, sofrimentos inesperados, problemas existenciais – podem tornar-se provas perigosas para nós mesmos. E pior: nós podemos tornar-nos perigosos para nossos semelhantes. Somos tentados a usar a fé cristã para colocar Deus diante da carruagem de nossas imaginações, piedosas ou não. Naturalmente, fazemos isso com as melhores das intenções. Mas é aqui que reside o perigo: nenhuma intenção, por melhor que seja, é capaz de transformar um erro em algo certo, uma mentira em verdade. A pior das tentações é aquela que vem da boca de gente amiga. Carecemos da correção de terceiros. A palavra de Deus chama-nos de volta ao nosso lugar: seguir a Jesus e não correr na frente e conclamá-lo a vir atrás.
Perguntas: 1) Como viver a fé em Jesus Cristo à vista da moda da fé? “Ter fé” virou status, é negócio que faz funcionar tudo. 2) Como viver a fé em Jesus Cristo à vista da indiferença da fé? A fé em Jesus Cristo tornou-se irrelevante sob nossos olhos. As questões fundamentais do dia-a-dia são decididas muitas vezes a bel-prazer, como se elas nada tivessem a ver com o ser cristão. 3) Como viver a fé em Jesus Cristo à vista de tantos sofrimentos e injustiças? 4) Que preço estamos prontos a pagar para viver a partir do evangelho que rompe o círculo vicioso do mal e da violência? Não deveríamos fugir dessas indagações nem omiti-las às pessoas que vêm à casa de Deus a fim de receber orientações para viver.

4 Imagens para a prédica
Um conhecido provérbio diz: “Quem avisa amigo é”. Ou: “Prefiro um adversário que me diga a verdade a um amigo que a omite”. Esses provérbios podem ajudar a construir a ponte entre o texto e a convivência humana na comunidade e fora dela. Procuremos identificar amigos no texto e dizer quem é amigo de quem. Ao abrir o jogo em relação a seus sofrimentos, ao alertar quanto às conseqüências do discipulado, Jesus é amigo de seus seguidores? Certamente Pedro quis ser amigo de Jesus ao tentar poupá-lo do caminho da dor. Como fica o provérbio “Quem avisa amigo é”? Dialogue entre a realidade retratada em Mateus 16.21-28 e nosso dia-a-dia. Para refletir:

Só há um número
o número um
só uma certeza
só um poder
no meio das inumeráveis conchas.
Uma confissão
e uma bandeira
uma coragem
e um só amor
só há um número
não obstante
a multiplicação.
Ao amar
nego o amor
a minha negação
é minha afirmação.
Ao trabalhar
esqueço o amor
e ao despedir a vida
a recupero.
Ao amar
me desencontro
e ao me negar
no meu trabalho
vejo que sou
apenas mão e ato falho.
(Jaci Maraschin. Rastro de São Mateus. São Paulo, 1998. p. 69, 71)

5 Subsídios litúrgicos
Confissão de pecados:
Senhor, nosso Deus, dirigimo-nos a ti porque tu nos convidas para tal. Porém reconhecemos e confessamos que a motivação com que nos voltamos a ti nem sempre está isenta de interesses próprios. É-nos difícil reconhecer e aceitar tua vontade. Vivemos centrados em nós e usamos o teu nome para proveito próprio. De fato, não te amamos de todo o coração, de toda a nossa alma e com toda a nossa força e nem nosso próximo como a nós mesmos. Pecamos em palavras e ações e nos apropriamos indevidamente da tua criação. Pedimos-te, Senhor, não nos deixes seguir o nosso próprio caminho, mas atrai-nos de volta para ti, perdoa-nos e abre um novo espaço para vivermos na tua presença e aprendermos a seguir-te todos os dias de nossas vidas. Kyrie eleison! Amém.

Oração da coleta:
Senhor, tu vieste a este mundo e sofreste não só como nós, mas sofreste na cruz por nossos pecados e nos chamas para te seguir. Agradecemos-te que não precisamos andar na escuridão de nossos próprios caminhos, mas podemos andar na tua luz. Ajuda-nos a colocar tudo o que somos e temos na tua presença. Amém.

Oração de intercessão:
Senhor, nosso Deus, agradecemos-te que nos encorajas a interceder também pelos outros. Pedimos-te por tua igreja, espalhada sobre a face da terra, de modo especial rogamos pelas comunidades que vivem como minorias em situações precárias e sob ameaça de vida. Chama, capacita e guarda obreiros e obreiras da tua igreja no mundo inteiro e na IECLB. Intercedemos pela nação brasileira e suas autoridades. Concede-nos dirigentes tementes a ti, cientes de suas responsabilidades públicas e sábios para legislar e governar de modo que a vida seja respeitada em todos os seus níveis. Senhor, olha pelas pessoas em nosso município e olha com misericórdia por nossa comunidade, que nos acolhe e na qual somos servidos e aprendemos a servir a ti e às pessoas. Assiste os enfermos e enlutados... Senhor, tudo mais que nos move e comove expressamos com as palavras que Jesus Cristo nos ensinou a orar: Pai nosso ... Amém.

Bibliografia
BORN, A. van den. Dicionário Enciclopédico da Bíblia. Petrópolis: Vozes.
SPELLMEIER, A. I. Meditação sobre Mateus 16.21-26, in: Proclamar Libertação 21, p. 223-228.
 


Autor(a): Werner Wiese
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 16º Domingo após Pentecostes
Testamento: Novo / Livro: Mateus / Capitulo: 16 / Versículo Inicial: 21 / Versículo Final: 28
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2007 / Volume: 32
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 24323
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