O MILAGRE DA VÉSPERA DE NATAL

29/11/2013

A história verdadeira de Fritz Vinckens publicada pela Neue Revue No.52 de 20/12/2001 (Tradução: Martin Weingaertner)

24 de dezembro de 1944 foi um dia lindo. O céu sem nuvens pertencia ao sol e aos aviões aliados que rumavam com sua carga de bombas para a Alemanha. Era muito frio. Com a escuridão veio o silêncio e no céu cintilavam novamente as estrelas sobre nossa clareira coberta de neve. Eu estava sentado com minha mãe numa cabana isolada na floresta. Meu pai tinha nos escondido aqui. Até que a guerra acabar, disse ele que lutava na Frente Ocidental. E as linhas inimigas chegavam sempre mais perto da nossa cabana. Eu já podia ouvi-las. Tínhamos suficiente estoque de batatas, trigo, massas e flocos de aveia. Preocupávamo-nos apenas com o galo que encontrei em uma de minhas andanças pelo vale. Ele engordara e cantava sempre mais alto. Será que trairia nosso esconderijo?

Na véspera de Natal minha mãe o silenciou. Eu estava sentado na penumbra, enquanto a mãe colocava lenha no fogão no qual cozinhava a sopa com nosso galo. De repente, alguém bateu na porta. Apressadamente apagamos a vela. Em seguida, bateram de novo. Fomos abrir. Diante de nós estavam dois soldados americanos semicongelados, um terceiro jazia ferido na neve. Eles estavam armados. Seus olhos imploravam para poder entrar. Entrem, disse minha mãe. Os americanos acomodaram o seu companheiro ferido sobre o meu colchão de palha. Eles não falavam alemão, mas um falava francês. Assim, ele podia comunicar-se com minha mãe. Os Ianques provavelmente pensavam que fossemos belgas.

O moço corpulento chamava-se Jim, o outro mais magro, Ralph e Harry, o ferido que repousava agora na minha cama. Eles eram retardatários, tinham perdido sua unidade e, por dias, andaram errantes na floresta das Ardenas (situadas entre a Bélgica e a Alemanha). Sem as armas e os casacos grossos, pareciam meninos crescidos. Minha mãe também os tratou como tais. Ela pôs mais seis batatas com casca na sopa. Descascá-las, naquela época, era desperdício.

Eu estava pondo a mesa, quando mais alguém bateu na porta. Mais americanos, pensei, e fui abrir. Sim, eram soldados, quatro homens e todos fortemente armados. Mas, depois de cinco anos de guerra, seu uniforme me era familiar. Eram soldados da Wehrmacht; eram nossos soldados. Chocado eu fiquei paralisado. Mesmo com doze anos eu sabia: Quem ajuda o inimigo, perde sua vida.

Eu não podia ver o rosto da minha mãe, mas sua voz era calma: Mas os senhores estão trazendo um frio danado! Querem comer com a gente? Os soldados nos saudaram com simpatia e estavam felizes para encontrar alemães nesta fronteira entre as linhas de batalha. Podemos aquecer-nos um pouco? perguntou o superior do pelotão, um sargento. Ele provavelmente pensava no caldo de galinha, cujo cheiro saía pela porta. Naturalmente, respondeu minha mãe, mas pelo amor de Deus não façam nenhum alvoroço. Já há três semicongelados aqui, que não representam perigo. O sargento imediatamente compreendeu o que se passava. Seu olhar ficou sério. Mas minha mãe foi severa, Escutem aqui, vocês poderiam ser meus filhos, bem como os que estão lá dentro! Um deles levou um tiro na perna, os outros estão cansados e famintos como vocês. Hoje é véspera de Natal e aqui ninguém vai atirar! Deponham suas armas e entrem, do contrário os outros vão comer tudo.
Façam o que ela disse, ordenou o sargento.

O perigo não tinha passado despercebido aos americanos lá dentro. Eles já estavam prontos para defender-se.
Mas minha mãe imediatamente os desarmou, ordenando: Agora vamos comer! Americanos e alemães sentados ao redor de uma mesa. Era apertado e todo mundo estava meio perplexo. Como comportar-se em tal situação? Seus instrutores não lhes haviam ensinado. Mamãe cortou mais algumas batatas na sopa. Um dos alemães pôs seus óculos e inclinou-se sobre a ferida do americano. Felizmente, não está inflamado. Ele só precisa de descanso e alimento nutritivo, disse ele. O sargento pegou pão e vinho da sua mochila. Em cima da mesa estava a panela de sopa fumegante. Todos os olhos voltavam-se para minha mãe. Demo-nos as mãos e ela fez uma oração que concluiu, dizendo: E, por favor, acabem com esta guerra. Ao comer, eu vi lágrimas nos olhos dos soldados. Mas agora eles já não eram guerreiros, agora eles eram filhos. Depois da sopa, fizemos um forte Nescafé americano e saboreamos um pudim de abacaxi em pequenas latas de conserva que Jim tinha tirado do seu casaco. Depois trocaram cigarros, Eckstein por Chesterfield.

Fumemos lá fora, disse o soldado alemão preocupado com o Harry ferido. Diante da cabana o frio era de rachar. Minha mãe desafiou-nos a olhar para a estrela mais brilhante do céu: Este é Sírio, a nossa Estrela de Belém. Anuncia paz.

Da escuridão da noite ouviam-se os estrondos abafados da artilharia. Depois fomos dormir. De manhã os alemães e americanos fizeram uma maca para o Harry. O sargento mostrou, em um mapa, o caminho para as linhas americanas para Jim e Ralph. Uma bússola alemã mudou de mãos. Na despedida, todos se abraçaram e prometeram: Vamos rever-nos, quando estiver tudo acabado. Então eles partiram. Cada um em sua guerra. Minha mãe e eu acenamos até que eles desapareceram na floresta. Sabíamos que tínhamos experimentado um milagre. Um milagre de Natal.

Nota da redação: Fritz Vincken emigrou em 1958 para os EUA. Seu pai morreu em 1963, sua mãe, três anos depois. Fritz procurou por anos pelos soldados daquela véspera de natal. Em 1966 ele econtrou Ralph e Jim. Ralph ainda tinha a bússola. Entrementes ambos morreram. Os soldados alemães, ele não encontrou mais. Por isto Fritz escreveu a história, publicada pela Neue Revue. Mas seu maior desejo de ainda encontrar um dos soldados alemães não cumprirá mais, pois Fritz Vincken faleceu em 9/12/2001.

Para refletir: Jesus disse: “Vocês ouviram o que foi dito: 'Ame o seu próximo e odeie o seu inimigo' (Lv 19,18).
Mas eu lhes digo: Amem os seus inimigos e orem por aqueles que os perseguem, para que vocês venham a ser filhos de seu Pai que está nos céus. Porque ele faz raiar o seu sol sobre maus e bons e derrama chuva sobre justos e injustos. Se vocês amarem aqueles que os amam, que recompensa vocês receberão? Até os publicanos fazem isso! E se saudarem apenas os seus irmãos, o que estarão fazendo de mais?(Mateus 6.43-48)

Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu; o governo está sobre os seus ombros; e o seu nome será: Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz;(Isaías 9.6)

Paróquia Evangélica de Maravilha - SC


Autor(a): Pastor Leandro Ristow
Âmbito: IECLB / Sinodo: Uruguai
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo do Natal
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Meditação
ID: 25940
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Ninguém deve fazer tudo o que tem direito a fazer. Cada qual deve olhar para o que é útil e o que é benéfico para o seu irmão, para a sua irmã.
Martim Lutero
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