João 6.(22-23)24-35

Auxilio Homilético

07/08/1994

Prédica: João 6.(22-23)24-35
Leituras: Êxodo 16.1-5 (6-11), 12-21 (22-30) e Efésios 4.17-24
Autor: Nilton Giese
Data Litúrgica: 11º. Domingo após Pentecostes
Data da Pregação: 07/08/1994
Proclamar Libertação - Volume: XIX

1. Cadê Jesus?

Os vv. 22-25 giram em torno dessa pergunta. As evidências estão claras. Havia um só barco na praia. Os discípulos foram nele. Jesus ficou para trás. No entanto, cadê Jesus? Sumiu! Não está em nenhuma parte! Talvez tenha entrado em algum dos barquinhos que chegaram mais tarde (v. 23). No entanto, é melhor continuar procurando. É preciso encontrar Jesus... Finalmente o encontram. Que alívio! Mas, Mestre, quando chegaste aqui? (v. 25.)

A resposta de Jesus segue nos vv. 26-29. Na verdade, ele não responde à pergunta das pessoas, mas diz por que estão procurando por ele. Querem mais pão. Querem o pão facilitado. O milagre da multiplicação dos pães (6.1-15) foi muito forte. Impressionou a multidão (6.14). E isso é próprio de João. Nos outros Evangelhos, são apenas os discípulos que reconhecem o milagre. Em João, a multidão reconhece o milagre e quer que esse milagreiro do pão fique com eles. É por isso que o procuraram. Mas quem procura por Jesus, quando o encontra, também é desafiado por Ele. E Jesus desafia a multidão que saiu à sua procura.

2. Quem é essa multidão?

A comunidade joanina é localizada pelos exegetas ao redor dos anos 90-96 d.C. O. Cullmann fala de dois tipos de judaísmo na Palestina: o oficial, representado pelos fariseus, escribas e saduceus, e o esotérico, do qual um representante é a comunidade de Qumran. O judaísmo esotérico é encontrado em outras partes da Palestina e também na Síria (At 6.9; 11.19s.). Esses judeus esotéricos atribuíam um papel primordial ao conhecimento e a toda sorte de batismos. Tinham um vocabulário que lembra o sincretismo helenista. Alguns exegetas identificam a comunidade joanina oriunda do judaísmo esotérico.

Para a comunidade joanina, a glória de Cristo já é manifesta (1.14; 2.11), a salvação já está adquirida (5.24), o mundo já está julgado (3.18s.) e o príncipe deste mundo já está expulso (12.31; 16.33). Com a morte de Cristo, a história do mundo alcançou seu auge. A escatologia já está realizada.

No entanto, o passar do tempo traz problemas para essas convicções. Por isso, a pretensão do evangelista é buscar traçar uma linha que ligue o Jesus histórico com o Cristo da Igreja. É possível suspeitar que a comunidade joanina já conheça os sinóticos, que já estão prontos há alguns anos. Por isso, o interesse do evangelista5 não é tanto o Jesus histórico, mas atualizar a presença desse Cristo para dentro da Igreja, que já vive a segunda geração e é fortemente influenciada pelo helenismo sincretista. Portanto, como o Cristo continua presente em sua Igreja? Ou ... Que sinal fazes para que o vejamos e creiamos em ti? Quais são os teus feitos? (V. 30.)

A partir dessas perguntas é que o milagre de Canaã (2.1-12) e a multiplicação dos pães (6.1-15) prefiguram o sacramento da Santa Ceia; a cura do paralítico de Betesda (5.1-14) e do cego de nascença (9.1-4) anunciam o batismo; o discurso sobre « pão da vida (6.22-59) seria uma exposição doutrinal sobre a Eucaristia e a conversa com Nicodemos (3.1-21), uma catequese pré-batismal. Além disso, acentua-se muito, no quarto Evangelho, que a continuidade da presença de Cristo na Igreja está no paráclito, na presença do Espírito Santo (caps. 14-17). Ele permitirá compreender o sentido da vida e das palavras de Jesus. Aliás, o termo vida ocupa em João o mesmo lugar que é reservado ao tema Reino de Deus nos sinóticos. A vida é, ao mesmo tempo, um bem divino a ser esperado no fim dos tempos e um bem a estar presente desde agora.

3. O pão do céu

No AT, o pão é o símbolo do alimento humano (Pr 30.8; SI 146.7; Lv 26.5; Ecl 31.27). No Evangelho de João, pão é tudo o que traz segurança e clareza para a ameaçadora incerteza da existência (Jo 6.35,41,48,50ss.). A refeição cultual especial da comunidade primitiva era o partir o pão, que, sabemos, era uma refeição completa (l Co 11.17-22). As refeições em comum tinham também seu condicionamento social, pois se exigia o abandono das bases econômicas por parte dos adeptos. Essas eram entregues à comunidade. O partir o pão era alimento físico e espiritual. Sustento da vida física e certeza da presença de Cristo na comunidade. Portanto, a vida humana está ligada a uma infra-estrutura material. É essa vida que precisa ser feita material de oração e de súplica. Por mais altos que sejam os voos de espírito, por mais profundos que sejam os mergulhos da mística, por mais metafísicos que sejam os pensamentos abstratos, o ser humano sempre depende de um pouco de pão, de um copo de água, enfim, de uma pequena porção de matéria (L. Boff). O Novo Testamento nos ensina que é no pão, na água, nas vestes, na solidariedade que se joga o destino eterno das pessoas (Mt 25.31-46; Tg 2.14ss.). As necessidades individuais continuam. Jesus desafia a comunidade para que busque satisfações comunitárias para essas necessidades individuais. A satisfação individual traz quebra de fraternidade. Quem é fiel não quer apenas matar a fome e sobreviver de qualquer maneira.

O erro está em achar que, quando falamos do pão material, estamos falando apenas em trabalho humano. Na verdade, para conseguir esse pão material, depen¬demos de tantas condições prévias, diante das quais cada pessoa se sente impotente e se vê obrigada a remeter isso para a providência divina. Afinal, é Ele que nos dá estações favoráveis de sol e chuva; é Ele quem nos garante as forças com as quais podemos trabalhar; é Ele quem misteriosamente faz crescer a semente; é Ele o Senhor da Criação. Por isso, em cada pedaço de pão material há mais presença da mão de Deus do que da mão de pessoas. É por isso que o fiel tem sua razão em pedir o pão do céu, e apenas os ateus não sabem a quem agradecer pelo alimento cotidiano.

4. Para rezar hoje

(Suspeitas para procurar o Cristo na comunidade, para que Ele nos dê o pão da vida.)

a) Jesus abre o caminho para uma nova relação direta com Deus: o verdadeiro pão do céu é meu Pai quem dá, porque o pão de Deus é o que desce do céu e dá vida ao mundo (vv. 32 s). Essa relação é anterior a todas as relações inter-humanas.

b) Jesus aponta, ao mesmo tempo, para a relação com o próximo, a qual exige demonstração de amor. Amar é demonstrar amor. A esperança do Reino também precisa da materialização de sinais dessa esperança. Essa materialização deve-se dar através da demonstração de amor. A vida precisa ser feita material de oração e de súplica. É no pão, na água, nas vestes, na solidariedade que se joga o destino eterno das pessoas.

c) Com isso, Jesus aponta também para uma nova maneira de relacionamento social. Aqui seu novo conceito é servir. Esse termo é para Ele uma imagem e para a comunidade deve ser um conceito básico. Jesus abre os movimentos religiosos, mostrando que o único e verdadeiro poder da Igreja é o poder de servir (v. 35). É Deus que nos serve de vida, de perdão, e, por isso, a nova ética de comportamento de Jesus fala de servir. É servindo que a comunidade se alimenta de pão futuro, preparado na mesa celeste do Reino de Deus. Esse pão futuro deve ser objeto constante de nossa súplica comunitária: Senhor, dá-nos sempre desse pão (v. 34).


Autor(a): Nilton Giese
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 11º Domingo após Pentecostes
Testamento: Novo / Livro: João / Capitulo: 6 / Versículo Inicial: 24 / Versículo Final: 35
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1993 / Volume: 19
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 16166
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