Mateus 7.21-29

Auxílio Homilético

13/06/1993

Prédica: Mateus 7.21-29
Leituras: Deuteronômio 11.18-21,26-28 e Romanos 3.21-25a
Autor: Valdemar Lückemeyer
Data Litúrgica: 2º Domingo após Pentecostes
Data da Pregação: 13/06/1993
Proclamar Libertação - Volume: XVIII


1. Introdução

Mateus apresenta Jesus nos capítulos 5 a 7 como o Messias da palavra, agrupando palavras e ditos de Jesus no conhecido Sermão do Monte, e nos capítulos 8 e 9 como o Messias da ação, narrando milagres, especificamente curas. Praticamente as mesmas palavras são usadas para formar e delimitar o complexo redacional do Messias da palavra e da ação: 4.23 é repetido quase que literalmente em 9.35.

A nossa perícope encerra o Sermão do Monte — assim como também em Lucas estas palavras encerram o Sermão da Planície (Lc 6). Com isso, estas palavras querem resumir e acentuar a importância do que foi dito antes.

2. Observações exegéticas

Vv. 21-22: Mateus usa, frequentemente, a expressão vosso Pai ou nosso Pai para designar Deus. Aqui, porém, Jesus fala pela primeira vez de Deus como meu Pai. Através dele, este mesmo Deus se torna o vosso Pai, isto é, Deus e Pai dos que o ouvem e o seguem.

A expressão meu Pai, como tratamento de Deus, deve ter suas raízes nas orações de Jesus; ali ele se dirige como filho a Deus. Mateus usa também muito a expressão o Pai que está no(s) céu (s). Esta terminologia é linguagem da sinagoga, que quer diferenciar claramente o pai natural e terreno do pai celestial e, ao mesmo tempo, dar lugar de destaque a Deus. Deus vem do seu lugar de honra e de destaque para morar e viver com as pessoas, marcando-as com a sua diferença, com sua celestialidade. Os filhos refletirão as qualidades do Pai; dele tem seu comportamento, sua ética. Quem ouve Jesus e f az o que ele ensina encontra em Deus seu Pai e Senhor e vê no próximo seu irmão, a quem trata com misericórdia (6.4). Somente o Filho que revela a vontade do Pai e fala em seu nome, ou melhor, em seu lugar, tem autoridade — e não os falsos profetas e todos os que clamam Senhor, Senhor, mas não cumprem a vontade do pai.

A exclamação Senhor, Senhor refere-se ao Senhor exaltado, no juízo final — isto é sublinhado pelas palavras aquele dia. O Antigo Testamento expressa, em diversas passagens, a esperança pelo Dia do Senhor (Am 5.18 e Jl 2.1), que, no Novo Testamento, é descrito como o Dia do Filho do Homem (Lc 17.24) ou o Dia do Senhor (l Ts 5.2). Será o dia do grande juízo, em que o próprio Jesus será o juiz.

Os dons espirituais, tais como a profecia, expulsão de demônios e milagres, são obras carismáticas, obras espirituais, mas que por si só ainda não são suficientes ou não comprovam nada. Foram obras praticadas pela fé em Jesus e a serviço da Igreja! Mas elas ficam como que extrapoladas da própria vida, pois eles mesmos não fizeram a vontade de Deus... (W. Trilling, p. 189).

V. 23: A condenação é pronunciada contra os que praticam a iniquidade, conforme Almeida, ou melhor, contra os que agem e vivem ilegalmente, contra a lei (Sl 6.8), os que não cumprem com a lei até a intenção última e maior da lei, que, conforme Mateus, é o amor a Deus e ao próximo (Mt 22.34ss). A lei justamente quer evitar o esfriamento do amor ao próximo, que, nos fins dos tempos, na proximidade de sua volta (Mt 24.12), vai aumentar. Por isso, anunciar a mensagem e expulsar demónios, se não acompanhados do amor ao próximo, não bastam para que o Senhor declare e aceite estas pessoas como os seus e os afastará de si. Por isso é que também os fariseus e escribas, observadores fiéis da lei, podem, sob esse ponto, viver contra a lei, praticar iniquidade. As obras carismáticas não podem substituir aquilo que a lei ordena,visto que o amor, carisma maior, excede a todos e permanece. Observa-se aqui a semelhança entre estas palavras de Mateus e as do apóstolo Paulo em l Co 13.1ss.

Vv. 24-25: A tora do Antigo Testamento encerra com a promessa de bênção, por um lado, e a ameaça de castigo e maldição, por outro, para os que cumprem ou não cumprem com a lei (Lv 26 e Dt 28). Assim também a lei que Jesus apresenta no Sermão do Monte encerra com a promessa de salvação ou a ameaça de condenação. O ponto decisivo está no ouvir e praticar (!) as palavras de Jesus — as que antes foram consideradas e ditas. Apenas o ouvir não basta! Quem apenas ouve será comparado a uma pessoa sem juízo.

A decisão ou o julgamento acontecerá no juízo final — aí então se revelará a diferença entre as duas casas. Isto leva a afirmar que a aparência das duas é a mesma, que por ora não há diferença. A diferença será revelada e, quando revelada, não haverá mais possibilidade de reconstrução. O que faz, ou então fará, a diferença é o fundamento sobre o qual se constrói, ou seja, o peso não está na construção da casa, mas na escolha do bom fundamento para ela.
Chuva torrencial e vendavais lembram o dilúvio. Os profetas falam, ao se referirem ao juízo final, de uma chuva forte e pesada que arrasa tudo e que não pode subsistir diante de Deus (Ez 13.10ss). É a imagem do grande cataclisma do fim dos tempos. E então a decisão da sorte da casa é única e definitiva. Ninguém poderá começar a construir novamente. Desaba a casa, jamais surgirá das ruínas. (W. Trilling, p. 192).

Vv. 26-27: A parábola da construção (ou dos dois fundamentos), que aqui Jesus usa para alertar seus ouvintes, utiliza uma figura muito comum no judaísmo e no Antigo Testamento (Jr 1.10; Dt 20.5 e 6). Momentos antes, Jesus tinha comparado seus ouvintes a uma árvore. Plantação e construção — símbolos e comparações usadas para falar do povo de Deus. Nesta sua plantação ou construção, Deus, vai no tempo oportuno, arrancar e derrubar, vai erguer e separar.

Vv. 28-29: Mateus usa uma fórmula, quase que fixa, para encerrar grandes unidades literárias, como por exemplo os grandes discursos de Jesus: a multidão fica admirada (13.53 e outros), e Jesus passa adiante, seguindo para outro lugar.

O que provoca admiração e exclamação nos ouvintes (na multidão) não é apenas a mensagem, ou seja o conteúdo, mas também a própria autoridade de Jesus. Esta autoridade de Jesus é destacada em relação a dos escribas. Jesus fala em nome de Deus; as suas palavras são as de Deus, seu Pai.

3. Meditação

Mateus se dirige à comunidade cristã, aquela que ouve a palavra. Isto fica claro no uso do termo senhor, confissão dos crentes. Em resumo, pode-se dizer que o evangelista quer advertir a comunidade, à qual ele se dirige, para que ela não seja apenas ouvinte, mas também praticante da vontade de Deus.

Interessante observar que Mateus vê também na comunidade pessoas que, apenas de sua fidelidade em ouvir a palavra e dos seus dons espirituais, não cumprem com a vontade de Deus, pois lhes falta o principal: coerência, vivência integral e completa da vida cristã.Isto as deixa culpadas diante de Deus.

Quem apenas ouve as palavras de Jesus ainda não construiu sua casa, isto é, sua vida no lugar bom e seguro, mas somente aquele que ouve e pratica estas palavras. Jesus emprega duas alegorias para colocá-las como espelhos diante dos olhos de seus ouvintes. A quem quereis comparar-vos durante a construção de nossa vida? Um deles é considerado pêlos homens prudente e precavido, o outro, tolo e justamente castigado. O mesmo se dá com a minha doutrina: Quem a ouve e observa é um homem prudente; quem a ouve sem observá-la, um tolo. (W. Trilling, p. 191).

O fato de participar da comunidade não dá garantias para nada — à salvação e abolição no grande juízo. Importa o cumprimento, até o fim, da vontade de Deus aqui e agora. O momento é decisivo, o momento é agora! Não será possível reconstruir a casa/a vida; ela não tem volta. Cada momento, cada dia é único.

A comunidade cristã, construção do próprio Deus, é composta de pedras vivas; nela não permanecerão pedras mortas. A comunidade cristã é plantação de Deus; Ele-mesmo cuida desta sua vinha, no qual o indivíduo é o ramo que, por sua natureza e vontade do Criador, produz frutos ou então será eliminado.

Este apelo é ouvido pela comunidade nas palavras do próprio Filho de Deus; Ele se preocupa com sua comunidade, ao revelar-lhe a vontade do Pai. A comunidade, pois, precisa ouvir a palavra de Deus. Sem o estudo, sem o confronto constante com esta palavra, não há comunidade. E, por outro lado, o ouvir, o estudar só se completa com o exercício e a prática desta palavra. Ouvir e agir. Culto e diaconia. Enfim, o Evangelho é para ser vivido.

A atitude evangelizadora de Jesus era de palavras e atos,

identificando-se com os pobres,

arriscando-se e comprometendo-se até a morte.
Nosso trabalho evangelizador:
Tomar uma atitude de palavras e atos;
Comprometermo-nos ao serviço dos necessitados de nossos bairros;
Não temer atuar;
Identificarmo-nos com os pobres, presos, enfermos etc.;
Criar consciência na igreja para que viva o que prega.
(Colheita de Esperança, Igreja: a caminho de uma esperança solidária, p. 88).

4. Pistas para a prédica

Vejo a seguinte possibilidade de pregar sobre o texto:

1. Introdução: falar de alguns déficits ou fraquezas nossas, tais como a falta de uma vivência mais autêntica e coerente com o evangelho, de um compromisso mais corajoso da comunidade local diante de desafios atuais, da frieza de fé de muitos membros.

2. A importância do ouvir. Sem ouvir a Palavra não há comunidade. Por isso, precisamos achar novos meios e novas formas para animar as pessoas: à leitura e releitura da Bíblia; à meditação pessoal; à formação e educação cristã.

3. A importância do agir. Sem ação não há comunidade viva. A fé não é sentimento, mas posicionamento que compromete, é mola impulsora, é confiança que se reflete na ética, é esperança que age. O Senhor da Igreja provoca a sua igreja a estar presente, a ser ação.

4. A importância do ouvir e agir. As duas coisas não podem ser separadas, pois andam juntas, ainda que a ação seja consequência e reação ao ouvir. A comunidade ouve, por isso ela age, ou seja: os cristãos ouvem o seu Senhor e por isso vão agir assim como Ele. Os cristãos também não agem como bem entendem ou como outros o entendem, mas agem porque ouvem o Senhor, as suas palavras.

5. Bibliografia

- GRUNDMANN, Walter. Das Evangelium nach Matthäus, 5. Auflage, Evangelische Verlangsanstalt Berlin, 1981.
- KARTZEL, Herwig. Mt 7.14-27. In: Neue Calwer Predigthilfe, Calwer Verlag Stuttgart, 1981, p. 119 a 126.
- SCHWEIZER, Eduard. Das Evangelium nach Matthäus, NTD, Göttingen, Vandenhoeck & Ruprecht, 1976.
- TRILLING, Wolfgang. O Evangelho Segundo Mateus, Parte I, Petrópolis, Vozes, 1968.


Autor(a): Valdemar Lückemeyer
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 2º Domingo após Pentecostes
Testamento: Novo / Livro: Mateus / Capitulo: 7 / Versículo Inicial: 21 / Versículo Final: 29
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1992 / Volume: 18
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 13548
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