Jornal Evangélico Luterano

Ano 2013 | número 758

Terça-feira, 16 de Abril de 2024

Porto Alegre / RS - 16:55

Unidade

Lutero - Reforma: 500 anos

   As pessoas se reúnem espontaneamente por grupos de interesse: se gostam de futebol, se têm crianças pequenas, se apreciam esportes ao ar livre, se sentem prazer em conviver enquanto partilham uma refeição, se apreciam o trabalho solidário voluntário. Neste sentido, com tantas diferenças de dons, vivências, culturas e de gerações presentes em uma comunidade cristã, o que caracteriza a sua unidade? Qual é a essência de uma comunidade cristã?
   Somos batizados! O Batismo é a porta de entrada na vida comunitária. É a nossa experiência comum! A comunidade cristã é a comunhão das pessoas batizadas. O Batismo se realiza por ordem do nosso Senhor Jesus Cristo, conforme Mateus 28.19 (Vão a todos os povos do mundo e façam que sejam meus seguidores, batizando esses seguidores em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo [...]) e Marcos 16.16 (Quem crer e for batizado será salvo, mas quem não crer será condenado). Mais do que isso: o Batismo acontece em nome de Deus. Sendo assim, quem realiza o Batismo é Deus. A unidade da comunidade cristã acontece, pois, por meio do Batismo, pela ação do próprio Deus no Espírito Santo.
   A palavra baptismos, do grego, significa submergir algo por completo na água, banhá-lo ou lavá-lo. Martim Lutero falava sobre o Batismo como um banho regenerador pela ação do Espírito Santo. Não que a água utilizada no Batismo tenha algo mágico em si. Segundo Lutero escreveu no Catecismo Maior, ‘a água do Batismo não é mais pura que qualquer outra água, mas é que vão unidos a ela a palavra e o preceito divinos. Porque o essencial da água do Batismo é a palavra, o mandato e o nome de Deus [...]. Só a fé coloca a pessoa em condições de receber dignamente os benefícios da água saudável e divina’. No Batismo, submerge o velho ser humano, caracterizado por egoísmo, ganância, arrogância e toda a sorte de atitudes que brotam de um coração distante de Deus e emerge, pela ação do Espírito Santo, um novo ser humano. O Batismo caracteriza a transição do cativeiro do pecado para uma vida em liberdade, com Cristo. Salvação! Aliás, no Batismo morremos para o pecado, porque somos unidos com Cristo, em sua morte, e ressurgimos para uma vida nova com Cristo, diz o apóstolo Paulo na carta aos Romanos (Romanos 6.1-11). Nosso horizonte, na fé, é a ressurreição, por conta do Batismo!

Somos batizados! O Batismo é a porta de entrada na vida comunitária. É a nossa experiência comum!
A comunidade cristã é a comunhão das pessoas batizadas. 



   
   Sendo a comunidade cristã a comunhão dos batizados, significa que nela se encontram congregadas pessoas, ao mesmo tempo, justificadas e ainda pecadoras. Isto tem implicações para a vida comunitária. Vejamos: ainda que o Batismo nos liberte do fardo do pecado pela justiça de Deus, continuamos sujeitos ao pecado até que morramos, de fato, e ressurjamos, com Cristo. Significa que o relacionamento entre as pessoas batizadas na comunidade não será pleno até o dia da ressurreição, porque ainda que Deus não impute sobre nós os nossos pecados por conta da sua justiça, permanecemos pessoas vulneráveis ao pecado e às falhas, por isso o Batismo, ainda que seja único, datado e localizado temporalmente na história de cada pessoa, precisa ser vivido diariamente. A cada dia morre o velho ser humano em nós e renasce um novo ser humano! Nesse morrer e renascer em novidade de vida, é fundamental o arrependimento. Comunidade de pessoas batizadas é comunidade que reconhece, diariamente, o seu pecado, se arrepende, espera humildemente pela graça de Deus, dá meia volta no seu agir e volta para junto do irmão e da irmã, no qual e na qual Cristo se faz presente, não por sua força, mas pela ação do Espírito Santo! O Espírito Santo é quem nos mantém unidos em comunidade (1Coríntios 12.12s)!
   A vida da pessoa cristã consiste, pois, na vivência diária do Batismo ou, como disse Martim Lutero, ‘O Batismo se destina ao princípio e ao curso de toda a vida’. Isto só é possível em comunidade porque a comunidade cristã é o lugar de anúncio, por excelência, do Evangelho de Jesus Cristo, por cuja razão existe e subsiste a comunidade. Longe da comunidade e da pregação da palavra de Deus, a fé esfria! Assim o expressa o apóstolo Paulo na carta aos Romanos: Deus é o mesmo Senhor de todos e abençoa muito todos os que pedem a sua ajuda. [...] Mas como irão pedir, se não creem nele? E como poderão crer, se não ouvirem a mensagem? E como poderão ouvir, se a mensagem não for anunciada? [...] Portanto, a fé vem por ouvir a mensagem, e a mensagem vem por meio da pregação a respeito de Cristo (Romanos 10.12ss). O Espírito Santo é quem faz com que a Palavra seja anunciada, ele nos permite compreendê-la e nos fortalece na vivência diária do Batismo pela prática do amor, mandamento maior do nosso Senhor.
   É por isso que a comunidade cristã é espaço de participação ativa de toda pessoa batizada! Já a primeira comunidade cristã experimentou a vida comunitária na reunião de irmãos e irmãs, no anúncio da Palavra pelo ensino dos apóstolos, na comunhão, na oração e na partilha do pão (Atos 2.43-47). Lutero se referiu à vivência do Batismo dizendo que ‘a pessoa cristã não vive em si mesma, mas em Cristo e em seu próximo ou então não é cristã. Vive em Cristo pela fé, no próximo, pelo amor’. Isto não significa buscar a salvação ou o perdão de Deus por mérito de obras, mas ser livre, em Cristo, para amar e servir. Neste espaço de participação de cada um e cada uma e de todos e todas, ao mesmo tempo, em uma multiplicidade de dons, a comunidade vivencia o sacerdócio geral de todas as pessoas crentes.
   No seu escrito Do Cativeiro Babilônico da Igreja, Martim Lutero se referiu ao sacerdócio como sendo apenas um e de igual valoração diante de Deus: ‘Não aconselho a ninguém, mas desaconselho a todos o ingresso em alguma ordem ou sacerdócio, a não ser que estejam providos da ciência que os faça compreender que as obras dos monges e dos sacerdotes, por sagradas e difíceis que sejam, absolutamente em nada se distinguem, ante os olhos de Deus, das obras de um lavrador que trabalha no campo ou de uma mulher que atende os seus afazeres domésticos, mas que, ante o Senhor, todos são medidos somente pela fé [...]’. A diferenciação de valor do Ministério ordenado e do Ministério de toda a comunidade, para Lutero, traz confusão e ‘ofende a graça batismal’, permitindo a tirania de uns sobre os outros. ‘Aqui desaparece a fraternidade cristã’, diz o Reformador.

No Batismo, submerge o velho ser humano, caracterizado por egoísmo, ganância, arrogância e toda a sorte de atitudes
que brotam de um coração distante de Deus e emerge, pela ação do Espírito Santo, um novo ser humano. 



   
   Toda pessoa batizada é sacerdote e sacerdotisa e a ela foi confiado o Ministério da pregação, ainda que haja Ministérios específicos a serviço (!) do Ministério de toda a comunidade. Em 1Pedro, lemos: Mas vocês são a raça escolhida, os sacerdotes do Rei, a nação completamente dedicada a Deus, o povo que pertence a ele. Vocês foram escolhidos para anunciar os atos poderosos de Deus, que os chamou da escuridão para a sua maravilhosa luz (1Pedro 2.9s). Daí resulta, na comunidade, o reconhecimento dos diversos dons, da multiplicidade de funções a serviço da comunidade, da responsabilidade da liderança (Presbitério) no pastoreio da comunidade e da aceitação da participação e do envolvimento de todos: quer homens, mulheres, crianças, pessoas adultas ou idosas, recém-integradas à comunidade ou nascidas no seio de família evangélico-luterana, provenientes de qualquer origem étnica e econômica. A comunidade forma uma casa onde Deus vive por meio do seu Espírito (Efésios 2.22) e todos são chamados, igualmente, ao sacerdócio em resposta àquele que nos serviu primeiro (Marcos 10.43-45).
   Aqui seja dito: esta comunidade cristã não tem um fim em si mesma. O mesmo Senhor da Igreja com quem morremos e renascemos pelo Batismo, que nos chama ao sacerdócio, nos envia como sal para a humanidade e luz para o mundo todo (Mateus 5.13s). O privilégio de ouvir a Palavra de Deus e experimentar o seu amor não pode ficar restrito à comunidade cristã. Há clamores – e são tantos! – mundo afora. Somos enviados e capacitados pelo Espírito Santo para dar testemunho de Jesus, cuja base de governo é o direito e a justiça, conforme anunciou o profeta Isaías (Isaías 9.6).
   Com oração e ação, podemos viver comunidade de forma contagiante, atrativa e inclusiva e dar testemunho de Jesus Cristo, sem receio, porque Deus está conosco: Eu sou o seu Deus. Eu lhes dou forças, ajudo e protejo com a minha forte mão (Isaías 41.10).

Pa. Ms. Scheila dos Santos Dreher, Bacharel em Teologia e Mestre em Teologia, com ênfase em História, pela Faculdades EST, em São Leopoldo/RS, atuou como Pastora na Paróquia Bom Pastor, em Bom Retiro do Sul/RS, e na Paróquia de Lajeado/RS. Atualmente, exerce o Ministério Pastoral na Paróquia do Parecis, em Campo Novo do Parecis/MT, no Sínodo Mato Grosso. Algumas das publicações no seu nome perpassam o viés da História, das mulheres na Teologia e do teatro cristão.
 

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