Jornal Evangélico Luterano

Ano 2015 | número 781

Sábado, 20 de Abril de 2024

Porto Alegre / RS - 06:37

Unidade

Lutero - Reforma: 500 anos Jesus Cristo, a Palavra

Pois aquilo que parece ser a loucura de Deus é mais sábio do que a sabedoria humana,
e aquilo que parece ser a fraqueza de Deus é mais forte do que a força humana.
(1Coríntios 1.25)

 

Deus age pelo contrário, pelo avesso das coisas

   Com esta frase (1Coríntios 1.25), o apóstolo Paulo descreve um dos mistérios mais profundos da fé. Martim Lutero não cansava de dizer que Deus age ‘pelo contrário’.

   O ‘normal’ e o que nos dá mais resultado, assim parece, é apostar no poder, na força. Assim pensa a maioria das pessoas e por isso também age em busca do poder. No entanto, Deus, ao contrário, se revela na fraqueza. Que surpreendente! O seu Filho nasceu em uma estrebaria e morreu pregado a uma cruz. O Império Romano deu-lhe, assim pensava, um fim, um fim vergonhoso, mas foi a esse quem Deus ressuscitou e vive ainda hoje no coração de milhões de pessoas. Que maravilha! Ele é aquele a quem confessamos como quem ‘era, é e há de vir’, o nosso Senhor Jesus Cristo.

   Hoje, quando a corrupção se escancara a nossos olhos, parece-nos que o dinheiro tudo pode. A ganância não tem limites. Ela é insaciável. Em um sistema econômico globalizado, a riqueza do mundo se concentra em cada vez menos mãos. Uma estatística recente revelou que logo, logo 1% da população do mundo deterá tantos recursos quanto todos os outros 99%. Uma centena de bilionários têm tanto dinheiro e bens quanto metade da população do mundo.

   Sejamos sinceros, quantos de nós, lá no fundo, não gostariam de ser uma dessas pessoas ‘afortunadas’? Assim, muitas, muitas pessoas estendem as suas mãos, na tentativa de alcançar igual riqueza. A Mega-Sena que o diga: uma pessoa leva o prêmio, milhões de outras pessoas o pagam, mas todas queriam ser aquela pessoa ‘sortuda’.

   Aquele Jesus Cristo, porém, proclamou que não podemos seguir a dois senhores: a Deus e as riquezas. Em seu lugar, pregou o Reino de Deus e a sua justiça, que deve ser colocado em primeiro lugar. Confira-se Mateus 6.24 e 33.

   Para dar outro exemplo: quantas pessoas neste mundo apostam no poder das armas, seja para impor a sua vontade a outros países, em guerras, ou a outras pessoas, em assaltos, mas também na própria tentativa de se proteger contra quem nos ameace de verdade ou na nossa imaginação?

   Entretanto, o apóstolo nos conclama a tomarmos o capacete da salvação e a espada do Espírito, que é a Palavra de Deus (Efésios 6.17), por isso também Lutero afirmou: ‘Toda a vida e substância da Igreja se encontra na Palavra de Deus’.

   Portanto, a arma da Igreja é tão somente a Palavra, ou melhor, nunca deve ser nem nunca deveria ter sido outra do que a simples Palavra. Nunca deveria ter sido o poder da espada de aço, como infelizmente foi em largos espaços da história. Isso porque essa espada de aço pode ferir de morte um coração humano, mas a Palavra pode alcançar o coração humano e transformá-lo.

   A fé vem pela pregação, e a pregação, pela Palavra de Cristo (Romanos 10.17). Claro, também podem ser pronunciadas palavras más, e muitas palavras más são pronunciadas a cada dia nas ruas, nos lares, no trabalho e na política, por isso devemos orientar-nos por aquele que é a Palavra, ou seja, o próprio
Jesus Cristo. Aliás, foi pela Palavra que Deus criou o mundo e tudo que nele há (Gênesis 1). Assim, na Palavra, a fé encontra o próprio Deus e, quando se encontra com Jesus Cristo, reconhece: o Verbo (isto é, a Palavra) se fez carne e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade (João 1.14).

Quem é esse Jesus Cristo?

   Vejamos isso em dois hinos do Reformador Martim Lutero. Ele não foi apenas um Teólogo profundo e um exímio Pregador, mas, entre outras coisas, também um talentoso Músico, que soube colocar em seus hinos a mensagem evangélica que tão intrepidamente propagou.

   Vejamos primeiramente o hino 155 do hinário da IECLB, Hinos do Povo de Deus I. A melodia é uma alegre música popular da época, adotada por Lutero, mesmo se hoje temos alguma dificuldade em cantá-la no mesmo tom alegre. A primeira estrofe reflete toda a alegria de quem se sabe abrigado em Deus:

Cristãos, alegres jubilai, felizes exultando;
com fé e com fervor cantai, a Deus glorifi cando.
O que por nós fez o Senhor,
por seu divino excelso amor,
custou-lhe a própria vida.

   As duas estrofes seguintes olham para o passado, antes da fé, indicando o cativeiro e o desespero de quem se sabe condenado por causa do pecado:

Fui prisioneiro de Satã, a noite me envolvia.
A minha vida, triste e vã, nas trevas se esvaía.
Abismo horrível me tragou,
o mal de mim se apoderou;
perdi-me no pecado

As obras nunca poderão livrar-me do pecado.
O livre arbítrio tenta em vão guiar o condenado.
Horrível medo me assaltou, ao desespero me levou,
lançando-me ao inferno.

   As estrofes quatro a dez apresentam a grande reviravolta na vida de quem chega à fé, em forma de uma história da salvação. Lutero não considera importante relatar a sua experiência pessoal, mas, sim, narrar a história da salvação por Cristo:

O eterno Deus se apiedou de mim, o infortunado.
De sua graça se lembrou, voltou-se ao condenado.
O seu paterno coração deu,
para minha salvação,
o que há de mais precioso.

   Nas estrofes seguintes podemos observar caracteristicamente como o Filho ‘desce’ do Pai para vir a nós e mais: na condição de alguém pobre e desprezado, com poder oculto, traz a salvação e a nova vida em Cristo:

Ao Filho disse o Pai no céu: o tempo está chegado;
à terra desce, ó Filho meu e salva o condenado!
Liberta-o de pecado e dor,
morrendo, sê-lhe o Redentor:
que tenha nova vida!

Obedeceu de coração o Filho ao Pai amado.
Tornou-se em tudo meu irmão,
e, pobre e desprezado,
ele ocultou o seu poder e um simples homem veio a ser:
lutou por minha causa.

E disse em sua compaixão: a minha mão segura.
Alcançarás a salvação, eu venço a luta dura.
Pois eu sou teu e tu és meu;
onde eu estou, terás o céu.
Nada há de separar-nos.

   A oitava estrofe indica o preço pago para libertar as pessoas condenadas:

Derramarei o sangue meu, serei à cruz pregado,
somente em benefício teu; aceita-o confi ado!
Em inocência hei de sofrer,
que possas vida eterna obter
e bem-aventurança.

   A nona aponta para o amparo que provém do Jesus ressurreto e exaltado para o crente que vive a cruz:

Ao Pai no céu eu voltarei,
porém, não te abandono:
O Espírito te enviarei
do meu celeste trono.
Em todo o sofrimento e dor
ampara-te o Consolador,
guiando-te à verdade.

Finalmente, a décima estrofe conclama à fé e ao seguimento:

Tudo o que fi z e que ensinei
também o faze e ensina!
Farei crescer a minha grei
por minha luz divina.
A luz dos homens é falaz,
enganadora é sua paz.
Confi a em mim somente!

   Esse hino, com as suas dez estrofes, de certo modo, é um resumo de toda a Teologia de Lutero. O mesmo ocorre também com o mais famoso hino do Reformador, Castelo Forte, hino 97 do hinário da IECLB. Cito aqui a terceira estrofe:

Se inúmeros demônios vêm, querendo exterminar-nos:
Sem medo estamos, pois não têm poder de superar-nos.
Pois o rei do mal, de força infernal, não dominará;
já condenado está por uma só palavra.

   A supremacia de Deus não pode ser expressa de maneira mais contundente. Todos os poderes do mundo, ao fim das contas, nada são e nada podem, mas, para Deus, uma só Palavra (no original Alemão, uma ‘palavrinha’) basta. Se uma única palavrinha lhe é sufi ciente, por que haveríamos nós de temer em dor e aflição, quando dele recebemos tão abundantes promessas de salvação?

Essa conclusão é tirada na quarta estrofe:

O Verbo eterno vencerá as hostes da maldade

   Recordemos, por fi m, a explicação de Lutero, no Catecismo Menor, ao Segundo Artigo do Credo Apostólico, aquele que se refere a Jesus Cristo. Em vez do texto corrido, coloco o mesmo de forma estruturada, que nos mostra a lógica do pensamento de Lutero: ‘Jesus Cristo... é meu Senhor,... para que eu lhe pertença’.

Creio que

Jesus Cristo,

verdadeiro Deus nascido do Pai desde a eternidade,
também verdadeiro homem, nascido da Virgem Maria,

é meu Senhor,

que me remiu a mim, homem perdido e condenado,
me resgatou e salvou de todos os pecados, da morte e do
poder do diabo,
não com ouro ou prata, mas com seu santo e precioso san-
gue e sua inocente paixão e morte,

para que eu lhe pertença

e viva submisso a ele, em seu Reino,
e o sirva em eterna justiça, inocência e bem-aventurança,

assim como ele ressuscitou da morte, vive e reina eternamente

Isto é certissimamente verdade.

   Foi pela Palavra que Deus criou o mundo e tudo que nele há (Gênesis 1). Assim, na Palavra, a fé encontra o próprio Deus e, quando se encontra com Jesus Cristo, reconhece: o Verbo (isto é, a Palavra) se fez carne e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade (João 1.14).

 

 

P. Dr. Walter Altmann, Teólogo, Professor Pesquisador na Faculdades EST, em São Leopoldo/RS, ex-Pastor Presidente da IECLB e ex-Moderador do Conselho Mundial de Igrejas (CMI)

 

 

 

 

 

 

 

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