Jornal Evangélico Luterano

Ano 2015 | número 782

Sexta-feira, 29 de Março de 2024

Porto Alegre / RS - 03:17

Unidade

Lutero - Reforma: 500 anos Bíblia: Palavra de Deus!

   A Palavra de Deus cria vida boa: Ele criou o mundo com tudo aquilo que nele há – e viu Deus tudo o que criou e eis que era muito bom – como um belo jardim. Criou o ser humano para nele habitar e cuidar dele, mas, por causa das suas falhas e desobediências, as pessoas sofreram as consequências, como a perda do paraíso, o dilúvio e a confusão linguística. Contudo, Deus não desistiu da sua vontade de criar vida boa. Protegeu Caim, salvou Noé e o mundo animal, criou o seu povo e com ele fez uma aliança de fidelidade e amor. Abençoou-o a fim de que fosse uma bênção para as nações, mas, frequentemente, os ouvidos e os corações do seu povo tornaram-se insensíveis à vontade de Deus.

   Apesar de tudo isso, Deus não desistiu da sua vontade de criar vida boa, por isso Ele chamou e enviou profetas para que anunciassem a vontade de Deus, em forma de Lei que denuncia e Evangelho que liberta dos poderes do mal e da não vida para o compromisso com a promoção de vida boa para tudo e todos. Contudo, o seu povo não se mostrou fiel à aliança estabelecida.

   Finalmente, Deus não mais viu outro jeito do que Ele mesmo tornar-se pessoa em Jesus Cristo. Esse, sim, tornouse sinal visível, concreto e palpável do amor de Deus que cria vida. Ele denunciou todas as manifestações de não vida e morte. Promoveu vida boa, em forma de sinais concretos e palpáveis, onde não mais se poderia esperar nada de bom. Justificou e aceitou a quem não o merecia. Tornouse o ser humano ‘segundo a imagem de Deus’. Na cruz, Ele se sacrificou em favor do mundo ‘para que todo aquele que nEle cresse não perecesse, mas tivesse a vida eterna’.

   Ressuscitando Jesus dentre os mortos, deu razão à vontade primeira e última de Deus: promover a vida boa que não mais morre. Cristo subiu ao céu, a fim de preparar lugar eterno para os seus e interceder por eles, para que a fé não desfalecesse. Enviou o Espírito Santo a fim de despertar, manter e consumar a fé dos seus e congregá-los em Comunidade e Igreja. Até hoje, Ele está unindo as pessoas batizadas na grande família, ou seja, no povo universal de Deus, a comunhão dos santos. Ela está aí para testemunhar os grandes feitos de Deus – que Ele fez, faz e vai fazer.

   No final dos tempos, Cristo voltará para criar os ‘novos céus e a nova terra, nos quais habita a justiça’. Naquele dia, Ele ressuscitará os seus com novo corpo que não mais morrerá. Então, veremos o nosso Deus, de face a face, e o louvaremos sem fim.

   Que história maravilhosa de amor é essa! Toda a Bíblia, do início ao fim, o testemunha de muitas maneiras diferentes. Lutero ficou tão entusiasmado com ela que traduziu a Bíblia toda para o vernáculo, de modo que o povo alemão pudesse ler a Bíblia. Com muita inspiração, traduziu o Novo Testamento do original Grego e o Antigo Testamento do original Hebraico. Também com o intuito de despertar a fé nas pessoas, Lutero introduziu no culto a prédica, baseada em determinados textos bíblicos. Estava convicto de que ‘a fé vem pela pregação’. Desse modo, Lutero queria formar o ‘sacerdócio universal de todos os crentes’.

   Hoje, a pesquisa científi ca nos evidenciou que a Bíblia foi escrita, ao longo de aproximadamente mil anos, por muitas pessoas, de diferentes tempos, culturas e idiomas. Dependendo do tempo, do lugar e da cultura, os autores utilizaram os recursos e meios do seu próprio contexto, para que os seus contemporâneos pudessem entender e assimilar este amor de Deus que cria a vida. Para isso, o Espírito Santo inspirou tanto as pessoas que deram testemunho oral e posteriormente escrito, quanto ouvintes e leitores. O testemunho se dava, pois, de maneira humana e contextualizada. Se assim não fosse, ninguém conseguiria entender o testemunho. Isso corresponde bem ao amor de Deus, que encarnou em Cristo e quer encarnar nos seus seguidores.

   Quando nós, hoje, lemos a Bíblia, pedimos pela iluminação do Espírito Santo. Ele nos faz atentar ao contexto em que e para o qual determinado texto foi escrito. Ele nos faz perguntar: Quem era o autor? Quem era o endereçado? O que o autor quis testemunhar naquele contexto em forma de Lei que denuncia e Evangelho que liberta das amarras do mal para o compromisso de promover vida boa? Assim, percebendo a intenção, ou seja, o espírito do texto, ele se abre para a nossa situação e o nosso contexto e os nossos leitores e ouvintes. Assim, o testemunho sobre o amor de Deus não se repete literalmente, mas toma forma de hoje, encarna em nossa vida concreta, torna-se contextual. Afi nal, é este o jeito do amor de Deus que encarna em nosso mundo. A sua encarnação culminou na vinda de Jesus Cristo e quer encarnar, de maneira multiforme, em nós hoje.

   Para tanto, a nossa análise do contexto de então e do contexto atual é importante para não lermos o texto de maneira literalista e fundamentalista. Se assim fizermos, ele perderá a sua força libertadora, mas nos escravizará e se transformará em camisa de força, pois resultará na eternização de leis que, no contexto do passado, faziam sentido, mas não mais hoje. Basta lembrar-nos de apenas um exemplo, como o caso da mulher não dever falar em público na Comunidade. Na sociedade patriarcal, em que os apóstolos ainda viviam, tal recomendação fazia sentido para proteger as mulheres, mas, já no Antigo Testamento, esse sistema, por vezes, foi quebrado. Pensemos apenas no cântico da Débora ou no Novo Testamento no cântico de Maria.

   Hoje, vivendo em sociedade que procura ser igualitária, salvo algumas exceções, como a do mundo islâmico, a mulher não mais precisa de tal proteção. Pelo contrário, ela precisa de espaços para participar ativamente das decisões em casa, no estudo e no trabalho, na política, bem como na Comunidade e na Igreja. Eis como uma análise contextual pode contribuir para uma leitura libertadora! Tal análise contextual, naturalmente, requer estudo qualifi cado que é pré-requisito para a pregação em público. Para tanto, a IECLB prepara e ordena Ministros e Ministras.

   A fim de que pessoas sem essa qualificação e ordenação também possam ler e entender melhor a BíBíblia no seu signifi cado de Palavra de Deus que liberta, a IECLB oferece cursos de formação de leigos, jornais eclesiásticos, devocionais diários e outras literaturas.

   Independente disso, importa lembrar que o Espírito Santo sopra e age de mil maneiras para despertar, manter e consumar a fé, por meio da leitura bíblica diária, se possível acompanhada por uma meditação interpretativa.

   A Bíblia é um testemunho sobre o amor libertador de Deus, que ele já manifestou, quer manifestar hoje e vai manifestar no fim bem-aventurado. A Bíblia fala disso em inúmeros símbolos e fi guras. Lembremos apenas de alguns exemplos: a visão de Isaías 65 sobre os novos céus e a nova terra, onde lobo e ovelha pastarão juntos, a visão de Miqueias 4 sobre a transformação de espadas em relhas de arado, a visão sobre o Bom Pastor em Salmo 23 e João 10, a visão em João 14 sobre Jesus Cristo, que, junto ao Pai celeste, nos prepara lugar eterno e por nós intercede, a visão sobre Deus, que, conforme Apocalipse 21, na eternidade vai enxugar todas as lágrimas de nossos olhos.

   Esses são apenas alguns dos símbolos e das figuras, em linguagem bem humana. Eles falam sobre a eternidade. Não são uma descrição nem uma fotografia dela. Contudo, são inspirados pela eternidade e para ela apontam. Com frequência, querem ser, portanto, contemplados e meditados com os olhos interiores, com o coração, e lá se aninhar. Desse modo, podem fortalecer a nossa esperança diante da finitude da nossa vida – quem sabe, talvez mesmo quando estivermos em situação de coma. Esse milagre nenhuma análise meramente contextual é capaz de fazer. Somente a meditação iluminada pelo Espírito Santo o pode operar.

   Necessitamos, pois, da orientação do Espírito Santo, tanto para a frutífera análise contextual quanto para a meditação e a contemplação dos textos bíblicos. Ambas não se excluem, mas se complementam e se necessitam mutuamente. Desse modo, pode acontecer o milagre de percebermos a Palavra de Deus, libertadora e transformadora, em palavra de homens e o Espírito Santo nos tornará instrumentos do amor de Deus, que cria vida boa em nossos contextos distintos, em forma de sinais concretos e palpáveis.

 

P. em. Günter Karl Fritz Wehrmann, formado no Missionsseminar em Hermannsburg, na Alemanha, atuou nas Paróquias gaúchas de Sapiranga e Canela, além da Paróquia de Pomerode/SC, foi Professor de Teologia Aplicada na EST, em São Leopoldo/RS, Assessor Teológico na Região IV, Assessor Teológico da Presidência da IECLB e Secretário das Relações com a América Latina na Obra Missionária Evangélica Luterana (OMEL), em Hermannsburg

 

 

 

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