1 Coríntios 12.1,4-11

Auxílio Homilético

19/01/1992

Prédica: 1 Coríntios 12.1,4-11
Leituras: Isaías 62.1-5 e João 2.1-11
Autor: Heinz Ehlert
Data Litúrgica: 2º Domingo após Epifania
Data da Pregação: 19/01/1992
Proclamar Libertação - Volume: XVII

1. Considerações exegéticas

Aparentemente se trata da introdução a um tema que requer uma explanação mais abrangente. É possível que, como muitos admitem, o apóstolo procure esclarecer perguntas e dúvidas surgidas a respeito da vida comunitária e de culto nesta igreja (= comunidade) nova na cidade portuária de Corinto.

Logo no começo do texto enuncia o assunto que vai tratar e no qual os cristãos não podem ser ignorantes: dos espirituais, que Almeida traduz como dons espirituais. Talvez fosse um termo técnico usado para designar os dotados com ou os iluminados pelo Espírito Santo, assim considerados por si mesmos ou por outros.

Fala primeiro do efeito da ação do Espírito Santo para depois dissertar, em especial, sobre os fenômenos caracterizados como dons, serviços e realizações (vv. 4-6).

Para melhor compreensão do texto indicado para a prédica é, a meu ver, indispensável, levar em consideração os vv. 2 e 3 (não entendo, por que foram excluídos!).

Gera confusão aos cristãos de Corinto que fenómenos conhecidos no seu passa do pagão, nas religiões de mistérios, p. ex., cair em êxtase (ficando fora de si) se ré petem agora na comunidade cristã, alegando-se, ainda, que isto é sinal da presença do Espírito Santo! Por isto o apóstolo faz questão de enfatizar o critério para reconhecer a ação do Espírito Santo: a confissão clara Senhor é Jesus! e nunca mal dito seja Jesus. Em êxtase alguém pode estar dominado por algum espírito demoníaco, como acontecia no passado, quando eram arrastados aos ídolos mudos.

Os cristãos têm um só Senhor a temer e a seguir: Jesus Cristo, o Redentor. O senhorio dele não escraviza ninguém, mas liberta. O Senhor é o próprio Espírito Santo. (2 Co 3.17.)

Uma vida, no dia-a-dia da comunidade sob este senhorio se caracteriza por uma diversidade de dons, serviços e realizações. Assume, pois, uma forma concreta, consistindo numa riqueza e pluralidade de manifestações do Espírito Santo. O tempo do Messias (= Cristo) é tempo de Espírito Santo que por sua vez é tempo da ação salvífica de Deus. A múltipla revelação do Espírito Santo é ação de Deus em Cristo.

Não deve pairar nenhuma dúvida: a origem das diferentes manifestações espirituais é uma só: O Trino Deus, aqui colocado na sequência Espírito, Senhor, Deus.

A finalidade de tudo isto é destacada claramente, quando diz que ... é concedida a cada um, visando um fim proveitoso (v. 7). Com outras palavras: contribui para o bem da comunidade e não apenas de alguns privilegiados espirituais (p. ex., o egoísmo dos que ficam em êxtase).

O que vem a ser proveitoso (ou útil) para a comunidade, não é especificado, mas deve esclarecer-se pelo que segue e é desdobrado adiante. O que seja proveitoso para todos deverá ser o critério e indicará o lugar e o valor a ser atribuído, numa escala eventual, aos diferentes dons. O dom de variedade de línguas em todo caso não está no topo desta escala.

Convém ainda assinalar que ... é concedida a cada um .... Não depende, pois, de nenhum treinamento ou técnica espiritual, mas é mesmo dom, livre doação, carisma (= dom de graça). É dado a cada um pelo Espírito Santo, como ele quer (v. 11). Vv. 8-11 — Sabedoria e conhecimento é um binômio bastante conhecido entre os habituados à reflexão da filosofia grega e agora empenhados a adaptá-la à teologia e piedade cristã.

O apóstolo tem a coragem de utilizar a terminologia, declarando que se trata de dons espirituais, embora tenha polemizado contra a sabedoria humana em contraposição à sabedoria divina que consiste no Cristo crucificado (2.1-9).

Não fica definida uma distinção clara entre sabedoria e conhecimento. Deve tratar-se de uma percepção e compreensão profunda do mistério contido no evangelho de Cristo.

Chama atenção que entre os dons aqui enumerados esteja a fé. Não pode ser a fé que dá acesso à salvação, que justifica perante Deus (Rm 1.16-17; 3.28). Antes se poderia pensar na fé que remove montanhas (13.2) ou numa medida especial de fé (Rm 12.6).

Melhor do que dons de curar (Almeida) seria dons de realizar curas (isto é, algumas curas e não o dom permanente de curar qualquer doença). Realização de milagres poderia referir-se a curas também ou a milagres como os narrados em Atos, acontecendo esporadicamente.

Da profecia o apóstolo vai tratar mais adiante, na dissertação sobre o falar em línguas (l Co 14). Ali fica claro que se trata do serviço da Palavra (que não é exclusividade de especialistas), do anúncio da salvação e da vontade de Deus para o momento presente, em palavras compreensíveis, dando condições aos ouvintes de conferir a sua autenticidade evangélica.

O discernimento de espíritos é essencialmente necessário, quando há tanta variedade de dons, e quando se multiplicam os que têm vários tipos de línguas (ou falar em línguas). Os que conseguem a interpretação das línguas serão uma ajuda para o discernimento dos espíritos.
Admira a riqueza dos dons. Certamente não quer ser completa. A unidade na origem dos dons é, mais uma vez, acentuada (v. 11).

2. Meditação

O tema de fenômenos (dons) excepcionais é atual no contexto brasileiro, ainda mais com vistas ao quadro religioso.

De vez em quando jornais e revistas trazem manchetes a respeito. Também surgem pesquisas, analisando-os à luz da ciência.

Ao refletir sobre o trecho, logo se nos impõe lembrar o que nos é conhecido. De um lado, nos cultos do movimento pentecostal (como denominações cristã) e, de outro, do espiritismo e, principalmente, de cultos afro-brasileiros (Umbanda, Candomblé). É ali que encontramos fenômenos de êxtase.

O apóstolo rejeita claramente que o simples fato de estar fora de si, seja indício irrefutável de estar sob o domínio do Espírito Santo. Pelo contrário: pode ser fator extremamente complicador para a singeleza da fé. A pessoa pode ser arrasta da por espíritos malignos, a exemplo do que acontecia naquela época nos cultos de mistérios. Hoje isto é prática frequente nos cultos afro-brasileiros, mas também no espiritismo (médiuns). Por que isto impressiona? O êxtase, sem dúvida é um dos fatores. Mas, da mesma forma o que alegam poder oferecer: solução de todos os problemas: amor, dinheiro, negócios, relacionamentos e, sobretudo, curas. Além disso, comunicação com entes queridos falecidos (espiritismo). Mas também contato com o sobrenatural (Umbanda) e galgar ao reino da luz ou vida melhor (um tipo de auto-salvação), através de várias reencarnações (espiritismo). Verdadeira comunhão em Cristo, perdão dos pecados, amor desinteressado não estão em primeiro plano!

E o fenômeno pentecostal? Impressiona pelo empenho de seus adeptos, pelo fervor e também alegria de sua fé, vida cúltica, agressividade missionária. Sua atividade entre as classes mais humildes. Ali existe êxtase. Ali se insiste no falar em línguas como sinal genuíno e inconfundível da ação do Espírito Santo. Curas milagrosas até pelo rádio (algumas denominações pentecostais se especializam nisso — Missionário David Miranda). Como se posicionar? O apóstolo concede que, por exemplo, o dom de tipos de línguas ou falar em línguas, pode ser autêntico cristão. Os fenómenos carismáticos nas diferentes igrejas históricas são aceitos hoje. A forte crítica do apóstolo Paulo em l Co 14 continua válida. Aponta o perigo do sectarismo e de perder-se outra vez no paganismo.

A confissão Senhor é Jesus significa compromisso com sua obra. A livre e gratuita distribuição de dons pelo Espírito Santo compromete os agraciados a empenhar-se no serviço da comunidade. Se há uma hierarquia dos dons, então o amor está em primeiro lugar. O amor flui do amor de Deus (triúno) cf. l Co 13. O que nos deve preocupar é o fim proveitoso (v. 7). O que vem a ser isso? No espírito do texto é quando todos têm vez, ninguém é destacado (privilegiado), nem menosprezado. Quando todos são edificados, recebendo consolo, orientação, ânimo, esperança, bem-estar para uma vida em comunhão com Deus e os homens — a serviço do evangelho que resulte em serviço ao próximo (diaconia) e evangelização (profecia).

A situação histórica dos coríntios é relevante. Os cristãos daquela cidade portuária grega eram, em geral, pobres e simples. Muito suscetíveis a influências mirabolantes. Impressionavam-se facilmente. Como a nossa gente de hoje.

O povo brasileiro, seja no interior, seja nas cidades e grandes metrópoles, sofre o impacto de um sistema econômico injusto. Há miséria, privações de todo tipo pela falta de alimentação devida, assistência médica, educação e ainda exploração c opressão por parte dos económica e politicamente mais poderosos.

Sofre igualmente o impacto de agressão religiosa de seitas, religiões neopagãs, de cultos sincretistas, mas também de messianismos políticos, todos querendo arrastar para o seu lado: Venha a nós, e você estará salvo, terá bem-estar!, assim poderíamos interpretar a atração religiosa. Vote conosco (ou: em nós) e você terá um futuro melhor para si e seus descendentes — messianismo político.

Prometem tirar os miseráveis da miséria, salário compensador para o trabalho, educação para todos, saúde e bem-estar. Mas os senhores e as senhoras representantes do povo cuidam, antes de tudo, de seus próprios salários polpudos.

Os dons espirituais, como poderiam ajudar-nos! Palavras de sabedoria, conhecimento, profecia, discernimento de espíritos! Também na área política e econômica.

A promessa do Espírito Santo vale até hoje (Lc 11.13; Atos 1.8). Nele o próprio Cristo está presente e nos acompanha (Mt 28.20) até o fim dos tempos.

Em sua companhia temos nova comunhão — com Deus e com o próximo. Aí há lugar para o arrependimento, o perdão, o amor — nova vida em Cristo. Aí se aprende a repartir e socorrer como nos primórdios da cristandade. E os dons não faltam como mostram exemplos de hoje. De repente, aparecem líderes desinteressados, prontos para por a cabeça a prémio. Surgem formas de celebração e estudo da Palavra, onde todos participam. Importa o compromisso sério com sua obra, e o Espírito Santo nos guiará.

3. Indicações para a pregação

3.1. Querem nos atrair

Começar por descrever uma reunião cúltica diferente, mas conhecida da comunidade, p. ex., culto de Umbanda na favela. Ou um dos cultos numa das capelas da bênção, seja no interior, seja na cidade — alto-falantes, música, cântico, gritos, etc. Ou um comício. Um político se dirige à multidão aos berros. Os adversários são aproveitadores. Ele, o partido dele têm as soluções. Querem nos atrair. Prometem, prometem. Há gente, nossos conhecidos, instando-nos a vir, seguir.

3.2. Deus chama e nos oferece suas dádivas em nossa própria comunidade

Não coisas mirabolantes, mas maravilhosas. Falar do evangelho da reconciliação, mediante perdão, nova vida em Cristo: comunhão verdadeira com ele e os demais membros. Um lugar onde você pode ser fraco e confessar os fracassos e pecados e receber consolo e solidariedade desinteressada. O Espírito Santo confere dons. Coragem para confessar o Senhor no seu ambiente e em público e para fazer uso dos dons no serviço da comunidade. Detalhar com exemplos.

3.3. Deus, o Pai, compromete

Os chamados (Batismo, Santa Ceia, Palavra) e agraciados por ele têm compromisso com ele. Lembrar confirmação.

Enxergar as necessidades em nosso redor e agir e falar, testemunhando o evangelho e anunciando a vontade do Pai (profecia). Dar exemplos. Não só denúncia das injustiças, mas também desafios à ação de solidariedade, colocando-se ao lado dos sofredores para ajudar, estimular a sair do marasmo.

Também um novo departamento: você é missionário, enviado a falar da esperança em Cristo. Inclusive em caso de doença. Ele nos acode e inspira a ... trabalhar não pela comida que perece, mas pela que subsiste para a vida eterna (Jo 6.27) os seguidores de Cristo usufruem dos dons e têm futuro.

4. Subsídios litúrgicos

4.1. Confissão de pecados: Bondoso Deus e Pai, invocamos-te por Jesus Cristo. volta-te para nós. Reconhecemos a nossa culpa. Faltamos com o amor. Deixamos iludir-nos por bem-falantes. Tivemos boa vontade, mas faltou perseverança: Tem piedade de nós, Senhor!

4.2. Absolvição: O Pai celeste ouve nossas súplicas, porque diz: Invoca-me no dia da angústia e eu te livrarei e tu me glorificarás. Glória a Deus nas maiores alturas!

4.3. Oração de coleta: Pai celeste, agradecemos por tua promessa de estar conosco. Contamos com tua presença neste culto. Congrega-nos e nos ilumina. Afasta de nós todo o egoísmo e inveja. Abre nosso coração e mente para a tua mensagem. Amém

4.4. Intercessão: Consultar participantes sobre motivos de oração. Lembrar a missão entre índios e outros campos de missão da Igreja. Interceder pelos governantes e pelos incumbidos com funções de liderança na Igreja.

5. Bibliografia

BALZ, H. R. Christus in Korinth. 1. ed., Kassel, 1970.
MALSCHITZKI, H. Missão, l Co 12. In: Proclamar Libertação. Vol. XIII, São Leopoldo, 1987, p. 34.
MOSIG, O. Meditação sobre l Co 12.1-11. In: Gepredigt den Völkern. Vol. II, Breklum, 1967.
VOIGT, G. Meditação sobre l Co 12.4-11. In: Das heilige Volk. Göttingen, 1979.
WENDLAND, H-D. Die Briefe an die Korinther. In: Das Neue Testament Deutsch, 5. ed., Göttingen, 1948.


Autor(a): Heinz Ehlert
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Epifania
Perfil do Domingo: 2º Domingo após Epifania
Testamento: Novo / Livro: Coríntios I / Capitulo: 12 / Versículo Inicial: 4 / Versículo Final: 11
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1991 / Volume: 17
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 17971
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