A Paixão do Mundo: Crise e Esperança

08/04/2009

Pasolini, comunista italiano, marcou época no cinema daquele país. Fez filmes antológicos como Teorema e outros. Mas o que mais me impressionou foi O evangelho segundo São Mateus (1964). Nele um Jesus magrinho e sem glamour percorre as poeirentas estradas da Palestina espalhando sua mensagem sem alarde, mas resolutamente. Como é possível que um intelectual como este tenha feito um dos filmes mais pungentes a respeito de Cristo?

Pasolini admirava Cristo! Um poema dele sobre o Cristo na cruz é simplesmente desconcertante: “Todas as suas feridas estão abertas ao sol/ e Ele morre sob os olhos/ de todos: inclusive Sua mãe/ sob Seu peito, ventre e joelhos/ observa Seu corpo sofrer./ O alvorecer e o crepúsculo lançam luz/ sobre Seus braços abertos e abril/ abranda Sua exibição de morte/ a olhares que O queimam. Por que Cristo foi EXPOSTO na Cruz? [...]”.

A cruz na história e no centro da fé cristã é algo que desconcerta. Ela é e continuará a ser a crise do cristianismo, das igrejas, do mundo que crucificou o justo e compassivo profeta de Nazaré. Ela é o mais radical questionamento deste mundo mau e corrupto, do qual todos nós fazemos parte. Ela nos convida não apenas a um mea culpa. Atitudes meramente piedosas diante da cruz podem desviar-nos do que realmente está em questão: reconhecimento e conversão ou mudança de vida radical.

A cruz foi um escândalo para judeus, gregos, romanos e cristãos. O oficial romano que assistiu à morte aos pés da cruz (Marcos 15.39) fez uma declaração que ainda hoje ressoa no mundo: “Verdadeiramente este homem era Filho de Deus”. Ele não só fala do pobre crucificado. Ele diz muito mais. “Ver-se naquela máscara tornou-se para o centurião aquela ‘transparência espelhante’ que lhe mostrou sua própria condição. Ele reconheceu a si mesmo no momento em que reconheceu Deus e reconheceu Deus porque veio a conhecer quem ele era” (Vítor Westhelle).

Na semana da Paixão de Cristo temos um convite a nos olharmos no espelho da cruz. Ali está quem Deus escolheu para anunciar uma nova realidade: o reino de Deus. Mas “os seus não o receberam”. E no decorrer da história o dilema continua. É difícil aceitar que Deus se mostre através dessa máscara de fraqueza, infâmia e pobreza. O apóstolo Paulo afirmou que aquela cruz é “loucura e escândalo” (1 Coríntios 1). Mas justamente naquele que não parece ser Deus, aí mesmo Deus se oculta e se revela. E quem quiser compreendê-lo e amá-lo deverá passar antes pela cruz!

A crise que vivemos no mundo no início do século 21 compromete a vida de milhões de pessoas. Estas são as pessoas crucificadas dos nossos dias. Nelas Deus se oculta e se revela como também se ocultou na cruz de Cristo. Haverá esperança? É o que muitos se perguntam e anseiam. Acredito que sim, desde que, como as mulheres seguidoras de Jesus, saibamos acompanhá-lo na morte e no caminho do túmulo para que então, com ele, saibamos viver hoje gestos de Ressurreição. Na aurora da manhã de Páscoa ressurge com Cristo a Esperança. Mas é bom dar-se conta que não existe Páscoa sem Cruz. E o compromisso de caminhar com o crucificado junto aos desvalidos deste mundo.

 

Dr. Roberto E. Zwetsch

Professor de Teologia Prática e Missiologia nas Faculdades EST – Escola Superior de Teologia em São Leopoldo, RS. Secretário Executivo de CETELA – Comunidade de Educação Teológica Ecumênica Latino-Americana e Caribenha. É autor de diversos livros e artigos, entre os quais Missão como com-paixão. Por uma teologia da missão em perspectiva latino-americana. São Leopoldo: Sinodal; Quito; CLAI, 2008.


Autor(a): Roberto Ervino Zwetsch
Âmbito: IECLB
Natureza do Texto: Artigo
ID: 6874
REDE DE RECURSOS
+
Portanto, já que vocês aceitaram Cristo Jesus como Senhor, vivam unidos com ele. Estejam enraizados nele, construam a sua vida sobre ele e se tornem mais fortes na fé.
Colossenses 2.6-7
© Copyright 2024 - Todos os Direitos Reservados - IECLB - Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil - Portal Luteranos - www.luteranos.com.br