Efésios 5.1-9

Auxílio Homilético

09/03/1980

Prédica: Efésios 5.1-9
Autor: Arnoldo Maedche
Data Litúrgica: Domingo Oculi
Data da Pregação:09/03/1980
Proclamar Libertação - Volume: V


I - Observações em torno do texto

Em favor de uma concentração sugiro que se reduza a leitura do texto aos w. 8 e 9. O catálogo trevoso aqui citado pode facilmente provocar no ouvinte a transferência do enfoque pessoal para terceiros. No entanto, éreis trevas - não há como escapar. Talvez seja mais útil atualizar este catálogo com situações nossas encontradas na comunidade local e nacional. De outra parte, vamos reencontrar no andai como filhos da luz (v. 8), os vv. 1 e 2. Também encontramos nos vv. 8 e 9 o tema do amor, ao qual os seguidores de Cristo devem vincular-se. Em cima dessas observações penso ficar justificada a redução do texto aos dois versículos finais.

II - Éreis trevas, porém agora sois luz

A comunidade de Éfeso deve conscientizar-se de sua situação anterior. E essa situação vamos encontrar explicitamente registrada na própria carta, no cap. 2.11, ... lembrai-vos de que outrora vós, gentios na carne, chamados incircuncisão..., e ainda em 4.22, ... quanto ao trato passado, vos despojeis do velho homem.... O contexto permite pois realçar e compreender a intenção do autor da carta. A lembrança do passado, situação em que aparentemente eram permitidas atitudes inconvenientes, serve como parâmetro do que hoje não deve mais acontecer. A comunidade de Cristo tem suas exigências, seus frutos, suas contestações. A imitação de Deus exige santidade e separação. E nessa nova situação residem os sinais práticos da unidade que em Éfeso é ameaçada.

Nesse sentido a cristandade atual continua precisando desta mensagem dirigida a Éfeso - também hoje ela se encontra ameaçada pelo testemunho dado ou, então, não dado pêlos que se dizem de Cristo. A unidade se quebra na vivência ética. A cisão latente em todas as igrejas se caracteriza pela discordância de comportamento diante do que é trevas e do que significa luz (vide 1 Pe 2.9).

Aqui também devemos nos indagar pelo acontecimento da mudança. É a metamorfose (Bonhoeffer) que resultou numa total reviravolta pessoal (Rm 12.12) em direção ao andar como filhos de luz (v.8). Não se trata, como bem diz Bonhoeffer, de apenas superar o passado. Muito mais, de uma ação nos termos do novo homem trazido por Cristo. Uma atuação de vida que não pode estar baseada na simples intuição ou na adequação ingénua do que vem repentinamente ao coração e à mente. A verdade de Deus já tem o seu parâmetro - Jesus Cristo. Não vivemos diante de um conjunto de regras, princípios, de redundâncias psicológicas do momento - mas diante de uma pessoa. O andar na luz pode estar muito bem escondido, diante de inúmeras possibilidades. Esse recado aprendemos de Jesus nos evangelhos; ele exige que consideremos muito a situação em que nos encontramos. Aqui está a verdade evangélica de que estamos engajados numa atuação sempre nova e viva de Deus na história da humanidade.

Na vivência de metamorfose (ou conversão, como alguns preferem) reside uma certa dificuldade do cristão batizado como infante. Ele nasceu numa família cristã. Sua experiência jamais poderá ser totalmente igual à dos gentios de Éfeso. Aqui se localiza uma dificuldade, também, para o pregador fixar a situação anterior. Seria hoje essa situação anterior o acomodamento e o desinteresse pelas coisas da igreja? Seria a cumplicidade passiva e mesmo ativa com as estruturas de opressão social e política? Seria uma vida imoral frente aos costumes vigentes? Então se pergunta: Frente a que,ocorreria a metamorfose? Ocorreria ela aos poucos ou repentinamente? Na igreja ou fora? Estas são questões que o pregador deve ter claramente respondidas, em sua pastoral e abordagem evangelística. Creio que Bonhoeffer nos ajuda ao indicar o primado da situação da comunidade, de cada ouvinte e de cada texto a ser abordado. Mas que isto não sirva para se fugir de uma definição clara neste assunto. Dela dependerá, também, a clareza e lógica para o ouvinte.

III - Bondade, justiça e verdade

Se existem dificuldades em situar o como e o quando do surgimento do novo homem, o mesmo não acontece com o que vem depois. Os frutos (v. 9) são indicativos de um imperativo - andai. Poderíamos aqui reduzir a questão anteriormente levantada, e afirmar que mais importante é estar na nova situação do que explicá-la em sua feitura. O texto ao menos oferece essa possibilidade ao apontar para o andar na bondade, na justiça e na verdade. Aqui temos critérios claros de observação. Aqui não se pode enganar tão facilmente. Certamente cada qual quer construir sua bondade, sua justiça e sua verdade de acordo com suas conveniências mentais e materiais. Para alguns, pagar impostos e não ter problemas com a polícia já é uma vida santificada. Para outros, é ali que esse andar apenas começa (vide Mt 5.20).

Há, porém, um campo objetivo de verificação. Os frutos reclamados pelo NT não podem ser escondidos ou mascarados o tempo todo. Principalmente quando vivemos num contrato social que joga interesses e privilégios de homens sobre homens. Neste dito capitalismo selvagem os conceitos previstos nas leis dos homens, como Direitos Humanos, constituição, democracia, patriotismo, já permitem, por si só, julgamentos seculares onde trevas e luz são definidos com clareza. Muito melhor deveriam os cristãos saber distinguir o andar dos filhos de Deus. É certo: cristãos continuam caindo em trevas e sombras, são pecadores, mas não vivem mais sobre sua violência. Como andantes da luz, são lembrados e exortados a respeito de sua nova situação. Eles são santificados por Jesus Cristo através do Espírito Santo. Seria uma volta ao farisaísmo desconhecer essa realidade constante das trevas e de suas ameaças. Mas, na mesma medida, é inadmissível aceitar após o batismo comportamentos estanques que ignoram a vontade de Jesus Cristo, assentada e proclamada como sinais de Deus para o seu Reino, e que encontramos nos evangelhos.

IV - Meditação

Em Gl 5.19 vamos encontrar uma lista muito bem detalhada que nos impede de escapar ilesos de uma reprimenda pessoal. Deus não quer que esqueçamos nossa situação conquistada por Cristo. Facilmente, no burburinho diário da vida, estamos ameaçados de esquecer a vigilância constante de nossos atos e de suas consequências para os outros. Talvez, no máximo, transferimos essa luta feroz do bem contra o mal, na apreciação do debate e da realidade da grande política nacional e internacional. Dependendo do partido pelo qual optamos, jogamos ali a preocupação pela luta do bem contra o mal. O texto quer levar-nos a um comprometimento pessoal, em sua exigência. E em todos nós existem ambas as realidades. Elas entram em conflito, e são atenuadas (ou camufladas) diante do orgulho e da necessidade de sobrevivência a qualquer custo.

Podemos manter essa aparência enquanto fizermos do cristianismo apenas um campo de reflexão e de ponderações. (E enquanto o pregador entender seu ministério como uma ocupação profissional.) À medida, porém, que vermos na fé um movimento de libertação da humanidade caída, de oposição às ditaduras de todos os matizes, de uma nova Jerusalém a ser edificada através do homem - então não podemos evitar culpa ou remissão.

Para sermos bondosos, justos e verdadeiros precisamos aprender daquele que viveu isso até às últimas consequências. Precisamos ter um mestre e situarmo-nos num plano de aprendiz. Precisamos ver os outros como Jesus os via. Não esquecendo que em todos ele via filhos de Deus. Ser justo só acontece quando realmente outros são ajudados. Ali não se pode medir com critérios de igualdade. Jesus viveu o verdadeiro critério, que se chama: misericórdia! A verdade a ser vivida deverá chegar naquilo que Cristo procurava: E a verdade vos libertará... (Jo 8.32)

Para a realização desse andar, é preciso que a luz do Mestre penetre nossa escuridão e elimine nossos tropeços e desvios. A responsabilidade dessa busca é de cada qual. Não pode ser delegada aos especialistas da religião. Os pregadores podem apenas insistir nesse ponto, ser veículos do Espírito Santo, profetas da denúncia e trabalhadores humildes da seara.

Onde houver consciência desses frutos, ali existe luz, ali o impossível passa a ser possível. O imutável, mutável. No meio do sufoco, a vida. É como ressurgir dentre os mortos. Tão ameaçadora é a realidade, mas tão revitalizadora é a proposta do Mestre.

Andai como filhos da luz em meio à vida que Deus vos deu. A arrancada de esperança foi dada pelo primogênito. É preciso pois aderir, embarcar e jogar-se nessa empreitada de corpo e alma.

V - Proposta para a pregação

1. Dar uma ideia do conjunto (o texto é ajudado pelo contexto): a comunidade de Éfeso se vê ameaçada por comportamentos inadmissíveis entre seus membros. A unidade está em perigo. Resposta: ser de Cristo significa assumir o andar na luz.

2. A situação da cristandade atual que não viveu ruptura idêntica à de Éfeso e, no entanto, também se encontra em perigo: explicar a vivência de fé numa família cristã. A prática eclesiástica tradicional que não visa um despertamento de choque. A observação de que cristãos encontram-se acomodados e indecisos quanto a que fazer, principalmente quando a própria sociedade favorece o disfarce da luta de classes.

Nesta situação, o v. 9 torna-se um escopo, uma luz: a bondade, a verdade e a justiça são atitudes éticas definíveis. Jesus em cada situação teve a liberdade de contradizer leis e regras religiosas para ser misericordioso (por exemplo: a prostituta ameaçada de apedrejamento; Jesus e o sábado; diversas parábolas). Situar essa ação misericordiosa em nossa realidade comunitária e de povo.

Uma frase de peso: ver os outros como Jesus viu. Em cada um, um filho de Deus.

VI - Bibliografia

- BÄUMER, F. Prédica sobre Efésios 5.1-9. In: Predigten in den Kirchen der DDR. 2a. ed., Hamburg, 1973.
- BONHOEFFER, D. Ethik. 7a. ed., München, 1966.
- BONHOEFFER. D. Nachfolge. 8a. ed.. München, 1964.


Autor(a): Arnoldo Mädche
Âmbito: IECLB
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo da Páscoa
Área: Governança / Nível: Governança - Rede de Recursos / Subnível: Governança-Rede de Recursos-Auxílios Homiléticos-Proclamar Libertação
Natureza do Domingo: Quaresma
Perfil do Domingo: 3º Domingo na Quaresma
Testamento: Novo / Livro: Efésios / Capitulo: 5 / Versículo Inicial: 1 / Versículo Final: 9
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1979 / Volume: 5
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 18271
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