Eleições 2018 - Carta Pastoral

16/08/2018

 

ELEIÇÕES 2018

CARTA PASTORAL

Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo propósito debaixo do céu: (...) tempo de rasgar e tempo de coser; tempo de estar calado e tempo de falar (Eclesiastes 3.1,7).

Ser membro na IECLB, participar e viver a paixão pela Missão de Deus nesta Igreja é, também, um exercício de cidadania a partir da vivência comunitária. A IECLB engaja-se na Missão de Deus com o firme propósito de “propagar o Evangelho de Jesus Cristo, estimulando a sua vivência pessoal na família e na comunidade, promovendo a paz, a justiça e o amor na sociedade brasileira e no mundo”. É para esse testemunho e para o exercício dessa cidadania que nos convida o Tema do Ano de 2018: Igreja, Economia, Política, sob a palavra bíblica de Êxodo 20.2a: Eu sou o SENHOR, teu Deus.

Na argumentação de Lutero, Igreja, Economia e Política são as três ordens da Criação. Deus as utiliza como instrumentos para efetivar sua vontade no mundo. É uma perspectiva que está na contramão do que popularmente ouvimos de forma pejorativa: “futebol, política e religião não se discute”; “política é coisa suja”. O Tema do Ano afirma o contrário! Igreja, Economia e Política são instrumentos que Deus coloca ao nosso dispor para buscarmos o bem, contra o mal (Amós 5.14).

A Missão de Deus abrange todos os espaços do nosso viver: a casa (indivíduo, família, trabalho, amizades), a comunidade de fé (comunidade local, sinodal, nacional e ecumênica), a sociedade civil (bairro, cidade, estado, país, governo, economia, política), a Criação inteira (meio ambiente e recursos naturais). Pelo correto desempenho em cada ordem, nós servimos (ou não!) e cooperamos (ou não!) com Deus no engrandecimento da vida. Portanto, o mesmo Deus que instituiu as ordens, chama e vocaciona, tornando-nos responsáveis pelo cuidado da Criação.

Vivemos em contexto brasileiro grave. A rede de sustentação da civilidade está com muitos fios rompidos. O combate à corrupção sinaliza que o pavio da justiça ainda fumega. Já o poço da corrupção parece não ter fundo. O papel da autoridade está desacreditado. Governos e parlamentos perdem a confiança em vista dos seus atos de escárnio contra o povo brasileiro.

Nesse ambiente, religião, política e economia lançam-nos num confronto raivoso, marcado por ódio, polarização e uma visão reducionista do “nós X eles”. As redes sociais veiculam opiniões de quem quer provar que a sua é a verdade absoluta. Por isto, cada qual se autoriza a difamar, acusar sem provar, e a desrespeitar quem pensa diferente. Para tal, até mesmo recorre a versículos bíblicos selecionados segundo critérios questionáveis. O mais fácil parece ser terceirizar a culpa. Afinal, pensar, refletir, exercitar a autocrítica e entender a complexidade da realidade exige mais e requer humildade. Odiar é mais fácil! Cabe a pergunta: o que toda essa “tagarelice virtual” edifica? Transparece aí alguma proposta evangélica, que não seja o extermínio de quem não pensa como eu?

Essa lógica perversa também pauta o dia a dia das Igrejas. Por isto, há quem exige que “a IECLB se manifeste com clareza”. Esta reivindicação pode ser legítima. O trágico é que, em geral, não se quer ouvir o que a Igreja (enquanto instituição) tem a dizer – e o que ela vem dizendo há décadas! Exige-se que a Igreja diga “o que eu quero ouvir”. Daí a pergunta que se impõe é outra: espera-se que a IECLB esteja de qual lado? Do lado do nosso ódio ou do lado do ódio deles? Do lado dos pecados de cá ou do lado dos pecados de lá?

Como não entrar nessa lógica do ódio, da intolerância, do confronto que fragiliza e coloca em rota de colisão e de fragilização crescentes a família, a comunidade de fé, a Igreja e a sociedade? Como não reprisar o preconceito, o ódio e a exclusão que as primeiras famílias luteranas vindas ao Brasil (a partir de 1824) – nossos antepassados – sentiram na própria carne? Tendo consciência disso e, em fidelidade ao Evangelho e coerentes com a história da nossa Igreja, o que fazer para que a compreensão e a perspectiva de fé, esperança e testemunho evangélico-luteranos sustentem nossa argumentação e nossa atuação responsáveis nas ordens da criação?

A IECLB tem definido seu projeto de Igreja! Ao lado da Missão, nossa Visão é a de sermos Igreja de comunidades atrativas, inclusivas e missionárias, fiéis ao Evangelho de Jesus Cristo, que testemunham o amor de Deus. Somos Igreja a serviço do Evangelho. Empenhamo-nos em favor da dignidade humana e do respeito à Criação. Queremos crescer na direção de comunidades que sejam espaço seguro para todos e todas, até porque carregamos na nossa memória a IECLB marcada pela pluralidade étnica, cultural, social, teológica e política. Queremos nos firmar na contramão da lógica do ódio que move nossa sociedade. Nosso projeto de Igreja carrega a marca da paixão pela missão de Deus, da justiça, da ética. Inspira-se no agir de Jesus Cristo, no seu amor incondicional em defesa da vida, que não é conivente com a servidão que desumaniza e joga irmãs e irmãos uns contra os outros.

Por isto, no tempo presente, a IECLB reafirma e conclama:

Diante de eleições, cabe lembrar que “há princípios básicos que norteiam a pessoa cristã em seu discernimento ético e na avaliação das propostas políticas em debate na nação” (http://www.luteranos.com.br/conteudo/eleicoes-2010-1). Recorramos a esses referenciais para jogar luzes – nos diálogos, encontros, debates – e identificar pistas que conduzam ao fortalecimento da democracia e da defesa da dignidade de toda a população brasileira! Também o Tema deste Ano ajuda nessa tarefa. Lutero, por exemplo, nos deixou critérios para avaliar quem governa:

“Precisamos de soberanos e autoridades que tenham olhos e ânimo para instaurar e manter a ordem em todos os negócios e transações comerciais, para que os pobres não sejam sobrecarregados e oprimidos, tendo que arcar com pecados alheios”. “Enquanto a terra existir, tem que haver autoridade, governo, poder e tronos. Mas Deus não tolera por muito tempo que abusem deles e os usem em oposição a ele, para praticar injustiça e violência. O bem-estar de muita gente depende de um príncipe tão importante, quando ele é governado pela graça de Deus. Por outro lado, dele depende a desgraça de muitos, quando ele se volta para si próprio e não é governado pela graça”.

“Em nosso país, cresce a confusão entre Igreja e Estado. Essa confusão aumenta em tempos de eleições. A IECLB preconiza a defesa do Estado laico, incentiva sempre a participação em partidos políticos como canais institucionais que expressam valores e ideologias presentes na sociedade brasileira” (http://www.luteranos.com.br/conteudo/ eleicoes-2014-o-exercicio-da-fe-cidada). Viver no Estado laico requer sabedoria para não misturar e confundir religião com política. Porém, quem é membro da IECLB assume o seu direito e o seu dever de fazer do voto um instrumento de cidadania em favor da democracia, em vista da paz e da justiça. E isso é extensivo ao quadro ministerial da IECLB, conforme está definido no EMO – Estatuto do Ministério com Ordenação, Art. 44: “Em questões político-partidárias, a Ministra ou o Ministro atuará com o devido resguardo do seu Ministério e do seu CAM, sem, entretanto, renegar a tarefa de promover o bem-estar do ser humano à luz do Evangelho. As preferências partidárias pessoais da Ministra e do Ministro não deverão prejudicar o bom relacionamento dos membros da comunidade, entre si, e a sua convivência.”

A fé evangélico-luterana opõe-se aos vícios nefastos presentes na cultura política brasileira e capacita para ocuparmos nosso lugar nas ordens da criação e exercitarmos responsavelmente a cidadania. Eleição é tempo oportuno para testemunhar em alto e claro tom: Meu voto não está à venda! Nossa Comunidade não troca o compromisso com o Evangelho por favores de campanha eleitoral! Nossa Igreja não se identifica com bancada X ou Y! Não me basta saber que você é candidata ou candidato cristão. Eu quero conhecer sua ficha limpa e seu compromisso histórico com a ética na política. Não quero mais ouvir promessas fantasiosas de campanha. Quero saber como você vai se engajar para que, em nosso país, governos, justiça e juízo (Amós 5.24) resultem em teto, trabalho, salário, escola, saúde, vida, dignidade.

Membros da comunidade cristã exercem sua cidadania. Não fazê-lo é irresponsável. Diante de uma eleição, a IECLB insiste no diálogo e no respeito à opinião divergente em favor da apresentação de propostas de governo exequíveis, promotoras da justiça e do direito, pressupostos para a paz social.

Igreja, Economia, Política são ordens da Criação. Nelas estamos! Ali somos cidadãos e cidadãs! Move-nos o amor de Deus por sua Criação! Exercitamos a cidadania que brota da fé! Participamos da vida política como resposta à vocação de Deus!

Dr. Nestor Paulo Friedrich
Pastor Presidente da IECLB-Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil
 


Autor(a): Nestor Paulo Friedrich
Âmbito: IECLB
Área: Missão / Nível: Missão - Sociedade / Instância Nacional: Presidência
Natureza do Texto: Vários
Perfil do Texto: Carta
ID: 48382
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Há algo muito vivo, atuante, efetivo e poderoso na fé, a ponto de não ser possível que ela cesse de praticar o bem. Ela também não pergunta se há boas ações a fazer e, sim, antes que surja a pergunta, ela já as realizou e sempre está a realizar.
Martim Lutero
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