Estudo 14 - A política. Serviço a Deus nos seres humanos ( XVI )

Estudos da Confissão de Augsburgo

15/01/1980

ESTUDO 14
A POLITICA
SERVIÇO A DEUS NOS SERES HUMANOS

(CA XVI)

Albérico Baeske 

1. Introdução 

A. Por vezes parece mais difícil definir o que é política do que evangélico luterano. Por isso sugiro fazer primeiro uma enquete entre os participantes no estudo, referente à política. Por exemplo: 

Qual o significado da palavra política? 

O que é política e o que não é? 

Em política são necessários partidos políticos? 

O que é política boa e política ruim? 

É possível se abster de política? Abster-se de política faz bem ou mal à coletividade? 

B. Quando se fala em política, muitos membros da IECLB suspeitam de que se manifesta uma certa ideologia ou o dito catolicismo vermelho que subvertem moral e religião da gente. Na ocasião, vale lembrar o Catecismo (Menor) de Martim Lutero! Eis algumas indicações com o fim de animar a descoberta de outras: 

na explicação do Primeiro Artigo do Credo: Creio que Deus . me deu e ainda conserva.., vestes e sapatos, alimentos e morada... campo, gado; 

na explicação da Quarta Prece do Pai Nosso: Que significa pão de cada dia? Tudo o que pertence ao sustento.. ., por exemplo: comida, bebida, calçado, casa, lar, campo, gado, dinheiro... superiores piedosos e fiéis, bom governo; 

na explicação do Quinto Mandamento: Devemos.. . ajudá-lo e favorecê-lo (o nosso próximo) em todas as necessidades corporais, e do Sétimo: Devemos ajudá-lo (o semelhante) a melhorar e conservar os seus bens e o seu meio de vida. 

A política visa exatamente prover a todas as necessidades corporais e melhorar o meio de vida. Política tem a ver com a fé no Deus Triúno e o mandamento deste. Não existe área autônoma para a fé evangélica luterana. Ela é de tal maneira abrangente que encerra desde os sapatos até o bom governo. 

2. Aprofundamento 

Justamente sobre a nossa relação para com a autoridade civil encontramos um trecho expresso em outra escritura confessional das Igrejas Evangélicas Luteranas, a saber, no Artigo XVI da Confissão de Augburgo (CA): 

A respeito das autoridades civis, ensinam (as Igrejas Evangélicas Luteranas) que legítimas autoridades civis são boas obras de Deus e é permitido aos cristãos exercer cargos públicos, sem que isto seja pecado, proferir sentenças, julgar conforme as leis imperiais e outras leis em vigor, executar a pena capital por justa causa, fazer guerra por justa causa, combater, fazer negócios dentro da lei, possuir propriedade, prestar juramentos quando mandado pelas autoridades, casar. 

Condenam (as Igrejas Evangélicas Luteranas) os anabatistas que ensinam ser anticristão tudo isto. 

Condenam também os que ensinam que perfeição cristã é abandonar o lar, a mulher e os filhos, ou se abster das coisas mencionadas. A perfeição evangélica consiste no verdadeiro temor de Deus e na ver-verdadeira fé em Deus. Pois o evangelho não ensina uma vida exterior e temporal, mas interior e eterna, e requer justiça de coração, não desfazendo a política e a convivência em família e sociedade; ao contrário, e muito mais, exige conservar as mesmas como ordens de Deus e em tais ordens comprovar o amor cristão. Por isso é dever dos cristãos obedecer às suas autoridades e às leis, se isto pode acontecer sem pecado. Onde, porém, é impossível, deve-se obedecer mais a Deus que aos homens (Atos 5). 

Estabelece-se um diálogo, em que cada um expõe sua descoberta nesse texto. Caminhando com os participantes neste estudo, se deveria, por esta vez, cooperar no intento de chegar às seguintes descobertas:

A. A descoberta chocante. 

Os confessores de Augsburgo, por duas vezes, condenam os que, na questão em apreço, têm outra fé e prática de fé. Solenemente professam que estes teimosos se separam da Igreja de todas as épocas e de todos os lugares. E, por seu turno, se afastam deles. Estes se excomungam a si próprios, a CA só torna público o fato. Isto para evitar que sejam, da parte deles e da sua subvenção da fé, perturbadas consciências nas comunidades. Para os confessores urge conscientizar as comunidades. Os que com seriedade querem ser cristãos (Lutem) necessitam saber quem, insofismavelmente, se exclui da Igreja universal e de sempre, ressurgida nas escrituras confessionais evangélicas luteranas. 

Excluem-se os que qualificam de perfeição cristã aban-donar sua usual atividade profissional e sua família já constituída. 

Excomungam-se os que se comportam como se fosse an-ticristão preocupar-se com política e assumir responsabilidade na vida pública. 

Desse jeito arquitetam perfeição que eles almejam, temor a Deus que convém a eles e fé em Deus que eles se imaginam. Rejeitam, pois, a perfeição evangélica que consiste no verdadeiro temor de Deus e na verdadeira fé em Deus; em outras palavras: rejeitam aquilo que Deus quer e espera ver comprovado por nós em profissão e família, em sociedade e estado. 

Ser, por convicção de fé, um solitário Robinson Crusoé é um contra-senso. Viver como eremita cristão é estabelecer própria devoção e espiritualidade inventada (Lutero). Tais pessoas se opõem à vontade clara de Deus. Elas não se encontram na Igreja universal e de sempre, e não podem mesmo estar nela. 

B. A descoberta surpreendente. 

Os confessores de Augsburgo constatam que legítimas autoridades civis são boas obras de Deus. 

Para eles inexiste a pergunta abstrata pela natureza da autoridade civil. Não a professam como valor absoluto, divino. Não é sua essência que lhes importa, mas a sua instituição para determinada tarefa: ser legítima, criar e defender o que é legítimo. 

Para a CA nem toda autoridade civil — municipal, estadual, nacional ou internacional -- é boa obra de Deus. Ela professa a legítima como boa obra de Deus. A legitimidade de uma autoridade não se resume ainda na sua legalidade. O que é legal não precisa ser legítimo e leis podem ser ilegítimas. Legítimo é o que gera e protege, facilita e aperfeiçoa a convivência humana. A legitimidade de uma autoridade se mostra no seu empenho pelo estado de direito e sua conservação e pela conjuntura econômica que beneficia a todos; no seu zelo de possibilitar e animar todos os cidadãos a participar nas responsabilidades e decisões da vida pública. 

Os confessores vêem agir, em tal autoridade, a bondade de Deus, o sempre criador. Não é a autoridade a louvada por seus feitos, mas Deus que, por meio dela, quer e faz bem às suas criaturas. A autoridade: um instrumento, uma larva (Lutero) de Deus no curso do seu plano para com os homens — isto é a sua tarefa específica, embora oculta, para os demais, manifesta para os cristãos. 

C. A descoberta encorajadora. 

Os confessores de Augsburgo crêem que é permitido aos cristãos obedecer; mais ainda: eles têm de obedecer à legítima autoridade civil e às suas deliberações legítimas. Também quando isto tenha conseqüências desagradáveis ou até prejudiciais para eles particularmente, no sentido de perderem privilégios, serem exigidos com corpo, bens e honra (Lutero), para serviço à coletividade, por exemplo. Obediência é, neste ponto, obediência a Deus mesmo, que está por trás desta autoridade. 

A CA confessa que cristãos podem ocupar funções de legítima autoridade civil, sem que isto seja pecado. Sim, eles devem comprovar amor cristão ao próximo, exercendo cargos políticos e desempenhando responsabilidades públicas. Sabendo que Deus usa governantes e administradores públicos, juízes, militares e negociantes para os seus derradeiros fins, os cristãos prestam, nessas e noutras incumbências, serviço ao próprio Deus. São os seus verdadeiros cooperadores (Lutero). Não há melhor ou maior vocação que, na vida pública, servir a Deus nos seres humanos.

D. A descoberta desafiadora. 

Os confessores de Augsburgo crêem que as legítimas autoridades civis são boas ordens e obras de Deus. Com isso professam que estas não são autônomas; muito ao contrário, são e continuam sendo de Deus. Ele é a sua autoridade, que coloca medida e prazo a elas. Ele exige prestação da legitimidade das conseqüências práticas desta na sua atuação. E, no seu dia, Deus as dispensará para, no seu Reino, morar e lidar diretamente com os homens. 

Conseqüentemente, a CA é sóbria e crítica perante as legítimas autoridades civis. Desconhece empolgação por sua causa. Insiste na análise objetiva do seu desempenho. Sempre leva a perguntar — seja ao cidadão, seja ao integrante da autoridade — se ela faz jus à sua tarefa, sobretudo: se é ainda boa obra de Deus. A CA quer saber, sem rodeios, se a obediência às autoridades e a participação nelas podem acontecer sem pecado. Caso isto for impossível, deve-se obedecer mais a Deus que aos homens. Isto supõe que, ao se encaminhar tal situação, os cristãos denunciam, de imediato, os indícios, exigindo, em tempo, a sua eliminação e a dos seus geradores. 

Os confessores de Augsburgo professam como pecaminosa a obediência à autoridade civil e participação nela, quando esta se torna ilegítima, quer dizer: quando exigir obediência incondicional; quando se arvora de dona de toda a verdade; quando se julga no direito de determinar o que se deve pensar, sentir, crer, e o que não; quando apresenta compostura exclusivista, arbitrária e autoritária; quando dificulta e perverte, sufoca e destrói a convivência humana; quando se empenha na desmontagem do estado de direito; quando zela pelos privilégios políticos e econômicos de uns poucos à custa da maioria da população; quando faz guerra contra o seu próprio povo. Aí a fé evangélica luterana não só proíbe oferecer a mão, mas exorta a contestar e resistir. A resistência é, em verdade, a outra face do comprometimento dos evangélicos luteranos com a autoridade civil, no intuito de ela voltar a ser legítima e boa obra de Deus. 

3. Pontos de reflexão — animação para ação 

a) Somos nós ainda evangélicos luteranos em relação à política e vida pública? 

b) Como se entendem os políticos de fé evangélica luterana?

c) Como nós os encaramos? 

d) O que os confessores de Augsburgo diriam das manifestações contrárias à MENSAGEM DE NATAL EM 1973 do Conselho Diretor? 

e) Qual é a nossa atitude perante as autoridades? 

f) As nossas autoridades civis são legítimas? 

g) A CA professa fazer guerra por justa causa. Poderíamos nós professar fazer revolução por justa causa? 

h) Por que somos tão vagarosos nestas questões todas? 

(A falta de fé faz com que vejamos subjugadas a palavra de Deus, a verdade e a justiça, reinando, no entanto, a injustiça e permanecendo nós bem parados e quietos: sem censurar, sem falar sobre isso e sem resistir, mas, sim, deixando acontecer o que acontece. Por quê? Temos medo de que nos ataquem e nos tornem pobres, que morramos de fome e fiquemos humilhados para sempre. — Lutero) 

4. Hinos sugeridos 

Nr. 253: Ó terras, todos celebrai.
Nr. 81: Espírito, Verdade, em nós vem habitar.


Veja:

Confessando Nossa Fé – Estudos da Confissão de Augsburgo

A Confissão de Augsburgo (sem notas e comentários)
 


 


Autor(a): Albérico Baeske
Âmbito: IECLB
Área: Missão / Nível: Missão - Sociedade
Título da publicação: Confessando Nossa Fé - Estudos da Confissão de Augsburgo / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1980
Natureza do Texto: Educação
ID: 19803
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