Isaías 51.1-6

Auxílio Homilético

24/08/2008

Prédica: Isaías 51.1-6
Leituras: Mateus 16.13-20; Romanos 12.1-8
Autor: Eloir Enio Weber
Data Litúrgica: 15º Domingo após Pentecostes
Data da Pregação: 24/08/2008
Proclamar Libertação - Volume: XXXII


1 Introdução
Palavras de esperança para um povo desesperançado! Eis a minha primeira impressão ao ler a perícope com a intenção de produzir um auxílio homilético para o PL. O texto de Isaías (Is 51.1-6) é direcionado a um povo exilado. Seu intuito é motivar as pessoas a erguer a cabeça e seguir confiando nas promessas de Deus. A promessa tem vinculação direta com a volta do povo a Jerusalém: a sua terra, a sua pátria, a sua religião, enfim, a sua vida. Libertação e esperança são sentimentos fortes, expressos nesse texto e colocados nos corações das pessoas exiladas.
O texto da pregação vem acompanhado pelos textos de leitura, que nos auxiliam a trazer essa mensagem de esperança às pessoas de nossa comunidade neste final de agosto de 2008. O evangelho do dia (Mt 16.13-20) traz duas perguntas de Jesus: “Quem o povo diz que o Filho do Homem é?” e “E vocês? Quem vocês dizem que eu sou?”. A afirmação de Pedro diz: “Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo”. O Messias é a realização ampliada da palavra de esperança do Antigo Testamento. O Messias é libertação plena e esperança viva, encarnada pelo próprio Deus. A igreja, edificada sobre a base sólida da vontade de Deus, é hoje a promotora da esperança dele neste mundo.
A palavra do apóstolo Paulo em Romanos (Rm 12.1-8) vem para fazer a relação da mensagem de esperança pela libertação do exílio com a nossa realidade. A igreja é um corpo que, por intermédio dos diferentes dons, coloca sinais de esperança no mundo. O texto chama pessoas a colocar seus dons a serviço e anima pessoas desesperançadas a erguer a cabeça e esperar vida e salvação na promessa da Nova Aliança.
A meu ver, temos um cenário bem definido para o direcionamento da temática de toda a celebração. É um conjunto de três textos, que se complementam e nos auxiliam a trazer a mensagem para as pessoas que se reúnem em nossa comunidade, a fim de buscar, na palavra e no sacramento, fortalecimento para enfrentar a dura realidade na qual vivemos.

2 Exegese
2.1 – O livro
É consenso que o livro do profeta Isaías é, na verdade, uma obra de três profetas diferentes, que viveram em épocas distintas. Os capítulos 1 a 39 são atribuídos ao Isaías do século VIII a.C. Os capítulos 40 a 55 são de um profeta anônimo, uma “voz que grita” durante o exílio na Babilônia, por volta de 540 a.C, que é chamado de “Segundo Isaías” ou “Dêutero-Isaías”. Os capítulos 56 a 66 seriam obra de um discípulo que teria escrito depois do exílio, por volta de 520 a.C.
Nosso texto, portanto, é parte do escrito do Segundo Isaías e retrata a época do exílio na Babilônia. Um livro com uma mensagem de fé para um tempo de depressão e crise. O autor levanta questões angustiantes para si mesmo sobre a eficácia de seu Deus em salvar o povo. Ele vai buscar em sua fé e nas recordações da história passada as raízes de sua esperança para hoje. Não é sem motivo que os autores do Novo Testamento utilizaram esse tesouro, no qual se descobre a ternura de um Deus com coração amável, que torna concreta a boa-nova – o evangelho – da libertação. Um Deus identificado com o sofrimento que traz a esperança na libertação. Não raras vezes, os cristãos viram na figura do servo sofredor os traços do Cristo sofredor, que foi torturado pelos pecados do mundo.

2.2 – O texto
O texto em questão é composto de palavras de conforto na situação de exílio em que o povo vive. Vamos buscar na leitura do texto uma aproximação ao sentimento central que ele procura produzir na vida das pessoas.
V. 1 – O texto inicia falando dos destinatários da palavra de esperança, ou seja, “vós, os que procurais a justiça, os que buscais o Senhor”. A busca pela justiça está estreitamente relacionada com a presença do Senhor. Deus é o próprio promotor da justiça. “Ouvi-me (...) Olhai.” É necessário ter os olhos e os ouvidos atentos às promessas de Deus, pois dos ensinamentos dele brota a libertação.
O povo exilado não é um povo sem história, sem raízes, sem passado ou futuro. É um povo “cortado de uma rocha e cavado de um poço”. A rocha significa base sólida e proteção. O salmista fala, repetidas vezes, que Deus é uma rocha. O poço é esperança de vida. A vida continua e é assegurada. A secura do exílio não pode secar a esperança de retorno à terra querida.
V. 2 – As pessoas exiladas são lembradas de que a esperança do povo de Israel tem vínculo com aquilo que Deus fez a seus antepassados. Abraão e Sara são citados como modelos de pessoas, que pela fé mantiveram a esperança mesmo quando não havia mais indícios de que algo de bom estava guardado para eles. Na esperança e na fé mantiveram-se firmes, e ele os “chamou, abençoou e multiplicou”.
V. 3 – A misericórdia e a piedade de Deus alcançam os filhos de Abraão e Sara em qualquer lugar ou situação. Não há ruína material ou espiritual que Deus não possa restabelecer. Não há assolação que Deus não queira transformar. A saída do exílio é descrita como um deserto transformado em jardim do Éden.
O “jardim do Éden ou jardim do Senhor” é um novo começo. No princípio de tudo (Gênesis) havia o jardim Éden, que servia de morada para os seres humanos. O pecado humano acabou tirando a possibilidade dos seres humanos continuarem morando nesse jardim. O pecado das pessoas de Israel acabou culminando com o exílio, tirando o povo de sua terra, de seu jardim, de sua morada. A volta à pátria e o fim do exílio são comparados à volta ao paraíso. O Deus misericordioso dá uma nova oportunidade de recomeço, ou seja, o perdão de pecados é o passe para o paraíso. A piedade de Deus dá motivos de “ações de graças e som de música”, ou seja, gratidão, alegria e celebração.
V. 4 – Deus chama o povo a ficar atento. A salvação aproxima-se, e o “restabelecimento do direito” é como uma luz que se espalha entre os povos. Na Bíblia, a luz sempre está em contraste com a escuridão. A presença de Deus é luz que dá clareza, discernimento e ilumina o que estava às escuras – o pecado sendo perdoado e o perdão transformando modos de viver.
V. 5 – Se a volta do exílio é “justiça de Deus”, o exílio conseqüentemente é injustiça humana. Toda forma de escravização e perda de liberdade sempre é fruto da injustiça humana. No caso do exílio babilônico, o povo de Israel foi escravizado por suas próprias injustiças (pecado). Sem, de forma nenhuma, isentar os tirânicos babilônios de sua culpa, pois aquele que escraviza sempre é injusto e nada justifica a escravidão. O versículo assegura que a “salvação está próxima e os braços de Deus dominarão”. O braço é símbolo de presença, de poder, de domínio. O poder não mais estará nas mãos dos injustos, mas estará na justiça restabelecida e na presença do próprio Deus.
V. 6 – A terra, o céu e os povos passarão, mas a salvação de Deus vai durar para sempre e a justiça de Deus não mudará. A esperança do povo não está vinculada a algo mutável ou mutante. O sofrimento no exílio é passageiro, mas a glória de Deus permanece. O texto, que no v. 3 apontou para a origem e a criação do mundo ao citar o jardim Éden, agora volta seu foco à eternidade, para frente. Deus domina desde o início até o fim. O tempo, a história e a eternidade lhe pertencem. A esperança do povo está alicerçada nessa realidade.

3 Meditação
Quais são nossos exílios hoje? Viver numa metrópole é viver o exílio dentro da própria casa. É ter a liberdade limitada pela situação de violência. É viver com saudades dos “tempos de infância”, quando se brincava livremente sem preocupação, sem medo. O único medo era o do escuro, do Papai Noel e de personagens das estórias contadas pelos adultos. Não era medo de algo real, mas imaginário. Esse medo é diferente do medo dos dias atuais, pois o de hoje é real, cruel e limitador.
Criar filhos sempre foi um desafio. Quais eram os medos de meus pais em relação aos filhos? O medo de que caíssem de uma árvore, que se machucassem jogando bola, que se descuidassem nas perigosas águas do rio, que adoecessem, que fossem mal-educados com alguém mais velho, que comessem frutas misturadas etc. Sou pai e vejo que, além de alguns dos medos citados que permanecem até hoje, há uma série de outras questões que não eram uma ameaça, mas hoje são.
Eu cresci numa localidade do interior, perto de um rio. Não havia a preocupação se a água estava poluída. Os banhos de rio faziam parte da diversão dominical. O jogo de futebol era seguido de um banho de rio. As crianças de hoje vão crescer sem saber o que é tomar banho num rio porque a água é poluída. A vida abundante nos rios está sendo transformada em morte constante. São exílios que os próprios seres humanos criam; são exílios reais e ameaçadores.
Virou moda falar do aquecimento global, da crise futura quanto à água potável e aos poluentes expelidos por todos os lugares. Esses assuntos dão uma insegurança muito grande, pois sabemos que a produção de riquezas está colocada sobre uma matriz de desmatamento, destruição e poluição. Os seres humanos, por outro lado, mostram-se incapazes de indicar caminhos alternativos, até porque os maiores poluidores não querem e não fazem força para achar alternativas.
A situação financeira de boa parte da população é cada vez mais caótica e dramática. Somam-se a isso as necessidades financeiras cada vez maiores. A sociedade de consumo leva ao endividamento. A venda de sonhos de consumo tentam e cercam o indivíduo por todos os lados. A “solução fácil” apresentada pela verdadeira agiotagem legalizada – leia-se: financeiras – leva cada vez mais famílias para uma vida de exílio, de dependência e desagregação social.
Por que estou enumerando tudo isso? Porque essa é a realidade para dentro da qual vamos trazer esta mensagem de esperança, proposta no texto de Isaías. As pessoas que vêm para nossas celebrações trazem tudo isso. Trazem todas essas marcas dos tempos atuais. A partir dessa vida, dessa realidade é que interpretam o que ouvem. As necessidades de celebrar a vida e a fé são desenhadas a partir dos sentimentos provocados no dia-a-dia de suas vidas.
Para as pessoas do nosso tempo é que vamos traduzir essa mensagem. O povo de Deus teve a sua esperança e a sua fé alimentadas nessa promessa de libertação do exílio e a conseqüente volta à sua pátria. A mensagem do Antigo Testamento perpassa o evangelho. No texto do evangelho deste domingo, Pedro diz: “Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo”. A confissão de fé de Pedro traz uma nova configuração de esperança. A nossa confissão de fé traz consigo o comprometimento com a realidade, ou seja, os dons recebidos por Deus precisam estar a serviço (texto de Romanos). A diversidade de dons na comunidade perfaz o corpo de Cristo. A igreja foi munida para se fazer presente e ativa na vida das pessoas e na sociedade na qual é chamada a proclamar o evangelho.

4 Imagens para prédica
Uma sugestão de caminho possível para a pregação:
a) Perguntar para a comunidade: “O que é exílio?” – Explicar.
b) Explicar o que foi o exílio na Babilônia e a situação do povo de Israel nesse contexto.
c) Ler o texto de Isaías.
d) Explicar o texto.
e) Nós temos exílios hoje... Quais são? Onde buscar esperança? Para quem nós podemos anunciar esperança?
f) Estória: Tenho a sugestão de uma estória que pode auxiliar na reflexão. Rubem Alves escreveu no livro Estórias de Bichos (Edições Loyola, 9. ed.), nas páginas 28 a 32, a estória “O pintassilgo e as rãs”. Conta a estória que as rãs viviam num poço e sempre viveram lá, desde os tempos mais remotos. A vida se resumia àquela lama, àquele poço. Fora dele, conforme a crença das rãs, não havia possibilidade de vida. Certo dia, um pássaro (pintassilgo) visitou as rãs e falou das belezas do mundo, e as rãs começaram a ter vontade de conhecer o mundo fora daquele poço. Aquilo provocou uma série de sentimentos e mexeu com a estrutura social do poço.
g) Encerrar a pregação colocando ênfase na esperança que podemos ter em Cristo.

5 Subsídios litúrgicos
A partir do dia 15 de agosto de 2008 estará disponível uma liturgia completa no site: www.salvador.org.br (link: Paróquia). Essa liturgia permanecerá até o fim do mês de agosto.

Bibliografia
VAN DE KAMP, Peter. O Profeta Isaías. São Leopoldo: Editora Sinodal, 1987.
WIÉNER, Claude. O Segundo Isaías – O Profeta do Novo Êxodo. Lisboa: Difusora Bíblica, 1990.
 


Autor(a): Eloir Enio Weber
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 15º Domingo após Pentecostes
Testamento: Antigo / Livro: Isaías / Capitulo: 51 / Versículo Inicial: 1 / Versículo Final: 6
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2007 / Volume: 32
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 24322
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Salmo 24.1
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