Isaías 55.(6-9)10-12a

Auxílio Homilético

06/02/1983

Prédica:Isaías 55.(6-9)10-12a
Autor: Wilfrid Buchweitz
Data Litúrgica: Domingo Sexagesimae
Data da Pregação: 06/02/1983
Proclamar Libertação - Volume: VIII


I — Delimitação da perícope

O texto se refere a uma situação bem especifica de Israel. Chegou a hora de o povo voltar do exílio babilônico para Jerusalém. O profeta comunica essa notícia. O povo tem muita dificuldade para aceitar a novidade. O profeta alerta para o poder da Palavra.

Se a perícope ficasse restrita aos vv.10-12a, ela poderia facilmente ser abordada como verdade geral. Os vv. 6-9 ajudam a localizá-la na história de Israel. Para acentuar ainda mais esse aspecto, sugiro estender a perícope até o fim do v. 13.

II — Considerações exegéticas

O texto apresenta uma dificuldade de certo peso. O v.7 não encaixa normalmente no todo. O estilo é diferente, está no singular, quando todo o restante do trecho está no plural. Em termos de conteúdo também não há uma passagem lisa do v.6 para o v.7, nem do v.7 para o v.8. Entre os exegetas há a opinião de que o versículo foi inserido por algum leitor. Mas há também a opinião de que o v.7, ou os vv.6 e 7 poderiam ser uma citação usada pelo próprio autor do livro. No todo do texto, no entanto, o v.7 não tem tanto peso que pudesse alterar muito o conteúdo numa ou noutra direção, ainda mais, porque não há outras dificuldades maiores na tradução do texto.

O trecho representa o fim da segunda parte do Livro de Isaias, o assim chamado Dêutero-lsaías, que compreende os caps. 40 a 55 do livro. O início e o fim de Dêutero-lsaías contêm a mesma temática: Israel voltará para casa, voltará para sua terra e para Jerusalém. O profeta revela esta palavra de Javé. A volta será uma volta alegre. Até a natureza participará desta festa. As montanhas manifestarão alegria e as árvores baterão palmas.

Para Israel a palavra do profeta deve ter causado surpresa e até dúvida e descrença. O desterro é castigo merecido por Israel. A saída de Jerusalém aconteceu há tanto tempo, que Israel se acostumou à nova situação. O povo israelita se instalou na nova terra, casaram, construíram casas, fixaram-se profissionalmente. A Babilônia é um reino forte que não os deixará sair simplesmente.

A tudo isso o profeta reage, dizendo que esse tipo de raciocínio e argumentação é tipicamente humano, mas que Deus tem ideias e planos diferentes. Deus enxerga muito mais longe. Onde os caminhos humanos parecem desembocar num beco sem saída, Deus ainda consegue achar um caminho para eles. Deus olha do alto, e do alto as coisas são diferentes do que vistas ao nível do chão. E, quando não são diferentes, Deus pode fazê-las diferentes. Deus pode construir caminhos onde na visão de Israel eles não existem. A Palavra de Deus é poderosa. Ela constrói e transforma. Ela não fica sem efeito. Ela não volta vazia. É assim como a chuva. A chuva e a neve descem do céu, molham e fecundam a terra e fazem brotar a semente que dá pão ao semeador. Assim a Palavra de Deus cria situações novas, faz acontecer coisas que aparentemente não poderiam acontecer.

Israel sairá da Babilônia para Jerusalém. A Palavra de Deus tem poder para que isso aconteça. O tempo da provação será encerrado e começará um tempo de alegria, do qual até a natureza participará. Todo o mundo de Israel será renovado. Tudo vai mudar, para o bem de Israel e para a glória de Deus.
Israel deve crer na promessa de Deus, deve buscá-lo, deve invocá-lo. A saída para Israel está em deixar seus próprios pensamentos e caminhos e voltar-se a Javé, converter-se para Deus e seu caminho. Deus se compadecerá de Israel.

III — Meditação

A Palavra de Deus é poderosa, muito poderosa, todo-poderosa. Esta é uma ideia importante do texto, talvez a mais importante. A Palavra de Deus é mais poderosa do que potências mundiais, que aparentemente governam o mundo e tentam tirar proveito de seu poder. A Palavra de Deus é mais poderosa que Satanás, que tenta impor o mal ao mundo. A Palavra de Deus é mais poderosa que estruturas eclesiásticas, que às vezes se tornam um fim em si e que inibem ou impedem a ação do Evangelho de Jesus Cristo. A Palavra de Deus é suficientemente forte para tornar a IECLB constantemente uma Igreja de serviço e para ajudá-la a fazer isso de maneira crescente, em e para terras brasileiras, no e para o mundo.

Mesmo quando a gente, a partir da fé e da vida, tem certa confiança na Palavra de Deus, mesmo assim a gente fica pensativo diante das palavras do parágrafo anterior. É verdade isso? Dá para conferir isso no nosso mundo? Dá para entender muito bem a reação de Israel diante das palavras do profeta. Poderes outros que o de Deus parecem ler nas mãos o mundo em que vivemos. Sem dúvida, há sinais dos valores que a Palavra de Deus apregoa: amor, paz, justiça. Mas o desamor, a guerra e a injustiça ocupam um espaço muito maior nas páginas de todos os jornais. Na própria Igreja a força da palavra humana, de interesses humanos, de valores que antes oprimem do que libertam parecem estar mais na ordem do dia do que a Palavra de Deus e seus frutos. Na minha própria vida e na minha própria fé parece haver mais planos meus, valores meus, sentimentos de impotência e frustração do que alegria, ânimo e esperança. Na IECLB parece haver muito pessimismo, luta de poder (principalmente entre pastores), agressão, rivalidades, preconceito, e menos confiança, disposição de serviço, vontade de usar os dons junto com os dons diferentes do outro e esperança de que Deus possa usar esta Igreja no mundo em que ela vive. E verdade que a IECLB é uma Igreja pequena em um Brasil enorme, cheio de problemas sociais, políticos e religiosos. O quadro fica ainda mais desfavorável, quando se leva em conta que as causas de uma porção dos problemas que vivemos estão fora do Brasil, nas mãos de forças que, muitas vezes, nem estamos em condições de identificar.

A Igreja de hoje está numa situação diferente que Israel em seu tempo. Israel foi chamado a viver o Reino de Deus em Jerusalém e arredares. A partir do Novo Testamento, a Igreja é enviada ao mundo todo para proclamar e viver o Reino de Deus. Creio que não se pode dizer que o objetivo seja diferente, mas a estratégia é diferente. Israel voltou à sua terra para viver sua condição de povo de Deus na terra que Deus lhe tinha dado. A Igreja do Novo Testamento é enviada mundo afora para estabelecer a realidade do Reino de Deus por este mundo afora, não numa terra fixa ou a partir de uma terra fixa, mas em terras sempre novas, onde a realidade de Jesus Cristo não é conhecida e/ou onde essa realidade não é vivenciada concretamente.

No caso de Israel, a Palavra de Deus se mostrou poderosa. Apesar de todas as aparências em contrário, Israel voltou para casa. Ciro, o imperador persa, permitiu que Israel voltasse para casa. Na Bíblia, no AT e no NT, há outros exemplos de como a Palavra de Deus vence obstáculos difíceis de serem vencidos. Também na história da Igreja e de povos há sinais de vitória da Palavra sobre poderes que desafiavam os valores de Deus. Mas nenhum desses exemplos, na Bíblia ou fora dela, pode ser visto como prova lógica e intelectual para este tipo de fenómeno. Nenhum dos exemplos pode ser arrolado como prova da ação de Deus através de sua Palavra. Tanto o exemplo de nosso texto, quanto os de outros textos bíblicos, quanto os de fora do texto da Bíblia, podem ser sinais apenas para a fé. Só a fé tem olhos para a ação de Deus na história de Israel e de nossos dias. Por isso, também todos os sinais de desamor e de injustiça no mundo não são prova contra a ação de Deus no mundo. A fé não se deixa vencer por provas lógicas, intelectuais, matemáticas, nem a favor, nem contra.

Por isso pode-se e deve-se ouvir a Palavra de Deus, apesar de todas as aparências em contrário. Pode-se e deve-se procurar Deus, apesar de todas as aparências lógicas em contrário. E, em fé, a gente então faz experiências na vida, através das quais se percebe que a mão de Deus põe sentido na vida da gente, onde, pela nossa lógica, isso não era possível.

Em fé, então, podemos nos deixar enviar pela Palavra de Deus a este Brasil. Há sinais de que a IECLB está disposta a isso nas prioridades estabelecidas pelo atual Conselho Diretor: evangelização, índio, problema da terra. Há a preocupação de unir, em torno desses objetivos, toda a Igreja, todas as suas forças, todas as suas correntes. Há na IECLB dois movimentos de renovação que a desafiam para uma visão e ação mais dinâmicas. Acho que se deve agradecer a Deus pelos dois principais movimentos de renovação dentro da IECLB: o movimento evangelical e o movimento sócio-político. Acredito que o Espirito Santo está soprando nestes dois movimentos. Não deve surpreender que eles venham cheios de unilateralidade e imperfeições humanas. Cada Igreja é, ao mesmo tempo, justa e pecadora. Os dois movimentos querem partir do lugar, no qual a IECLB viveu até agora, para um novo lugar que Deus venha a indicar e que Deus nos desafia a procurar e achar. Infelizmente há setores na IECLB que não estão fazendo nada para sair da Babilónia, que ali se instalaram e não querem sair.

Deus quer usar a IECLB para evangelizar o Brasil e o mundo, para tornar conhecida a sua Palavra e para promover seu amor, sua justiça e sua paz, a fim de que o povo brasileiro possa conhecer as palavras e os conteúdos do Evangelho de Jesus Cristo. A IECLB pode ser um instrumento na transformação da sociedade brasileira. Ela não vai construir o Reino de Deus. Mas ela pode contribuir para que a atual sociedade não permaneça dominada por valores tão flagrantemente contrários ao Reino e à vontade de Deus, como está acontecendo atualmente.

IV — A caminho da prédica

1. Pode-se refletir sobre a pergunta se a IECLB se encontra num cativeiro babilônico e qual seria esse cativeiro.

2. Pode-se perguntar pelo lugar, para o qual a Palavra de Deus está enviando a IECLB.

3. Que caminhos a IECLB deve abandonar? Onde ela precisa se converter? Onde e como ela pode e deve buscar o Senhor?

4. Nenhuma Igreja se renova totalmente de uma hora para outra. Cada Igreja deve, normalmente, ser conservadora e inovadora ao mesmo tempo. O que a IECLB pode conservar? O que deve conservar? Onde deve inovar? Onde deve inovar, sob pena de se tornar desobediente à Palavra?

5. Onde é que os movimentos de renovação na IECLB devem ser apoiados e incentivados? O que pode ser aprendido deles? Onde devem ser questionados e corrigidos?

6. Como a IECLB pode assegurar que a Palavra esteja sempre presente na sua vida e que toda a sua vida tenha como fonte a Palavra? Como ela se pode proteger, para não ser vitima de indivíduos ou grupos que a querem usar para outros fins que os do Reino de Deus?

7. Que pode fazer a IECLB, para que os valores da Palavra de Deus possam tornar-se realidade para o povo brasileiro, em meio ao qual dominam, de forma tão cruel e violenta, os valores que Deus não quer que vigorem?

8. Como pode a IECLB ser instrumento do Reino de Deus fora do Brasil, junto com outras Igrejas, e combater os poderes do mal que escravizam as nações?

V — Subsídios litúrgicos

1. Confissão de pecados: Querido Deus e Pai, nós te confessamos que, muitas vezes, queremos uma Igreja que nos confirme e satisfaça em todas as nossas necessidades religiosas. Queremos uma Igreja cómoda. Não queremos ser questionados pela Igreja. Queremos uma Igreja que nos sirva. Mas nós não queremos servir através de nossa Igreja. Queremos uma Igreja segura. Não queremos uma Igreja que vá para terreno desconhecido, porque não conseguimos confiar muito na tua Palavra. Perdoa e ajuda-nos, Pai! Tem piedade de nos, Senhor.

2. Oração de coleta: Agradecemos-te, Pai celeste, porque nos dás uma Igreja^ Dá que saibamos que tu és quem garante esta Igreja. Ajuda-nos a sermos teus cooperadores fiéis. Por Jesus Cristo, que contigo e com o Espirito Santo reina eternamente! Amém!

3. Assuntos para a intercessão na oração final: que a IECLB possa ser Igreja de Jesus Cristo no Brasil de maneira crescente; que ela possa visar palavra e ação em seu ministério; que os movimentos de renovação possam contribuir para o bem da Igreja toda e que não levem a uma separação de suas forças; que a Igreja ache formas e linguagem adequadas, bem como coragem para denunciar as injustiças no país e no mundo; que a Igreja ache liberdade para confessar seus próprios pecados; que se encontrem formas de expressão do ministério pastoral, de outros ministérios e do ministério de todos os crentes.

VI — Bibliografia

- GENTHNER, F. Meditação sobre Isaias 55.6-7 In: Proclamar Libertação. Vol. 6. São Leopoldo, 1980.
- TRAUB, H. Meditação sobre Isaias 55.6-11.Göttinger Predigtmeditationem, Göttingen, 23(1): 100-106,1969.
- WARTH, W. Meditação sobre Isaias 55.6(-11)-13. In.: Calwer Predigthilfen. Vol. 2, Stuttgart, 1963.
- WESTERMANN, C. Das Buch Jesaja — Kap. 40-66. In: Das Alte Testament Deutsch. Vol. 19. Göttingen, 1966.


Autor(a): Wilfrid Buchweitz
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Epifania
Perfil do Domingo: 6º Domingo após Epifania
Testamento: Antigo / Livro: Isaías / Capitulo: 55 / Versículo Inicial: 10 / Versículo Final: 12
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1982 / Volume: 8
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 18188
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