Isaías 9.1-6

Auxílio Homilético

25/12/1992

Prédica: Isaías 9.1-6
Leituras: Tito 2.11-14 e Lucas 2.1-20
Autor: Marga Janete Ströher
Data Litúrgica: Dia de Natal
Data da Pregação: 25/12/1992
Proclamar Libertação - Volume: XVIII
Tema: Natal

 

“Faz escuro, já nem tanto
Faz escuro, mas eu canto
Porque amanhã vai chegar...”
(Thiago de Melo)

1. Introdução

Isaías 9.2-7 faz parte da unidade dos capítulos 6-9, emoldurada pelos ais proféticos (5.8-14 e 10.1-4). Surge na época da Guerra Sírio-Efraimita (714/3 a. C). “Os assírios 'inundavam' (8.5ss.) e subjugavam os povos da Palestina. Isaías o anunciara. Mas não fora ouvido. Fora rejeitado. Agora que seu anúncio se vai realizando, o profeta se apresenta, junto com seus amigos (9.6 fala em 'nós'), com uniu no vá palavra (Milton Schwantes. Natal — Isaías 9.2-7, pp. 295-6).

2. A aflição da escuridão

O nosso texto nos dá algumas pistas sobre quais são as trevas do povo o jugo e o porrete do opressor, as botas do soldado e as roupas ensanguentadas (a guerra). Desde o capítulo l vemos os sinais de trevas, apontados pelo profeta. São as trevas produzidas pela dominação internacional sobre o país e pela própria opressão interna da sociedade israelita.

As roças foram destruídas por estranhos (1.7), a indicação da presença forte de militares no país (2.7; 8.8), o imperialismo (5.8; 10.13-14), a invasão ou ameaça de invasão do país por nações ou forças políticas estrangeiras (7.1,6; 8.8; 10.7. 13-14) são algumas referências da dominação internacional denunciada pelo profeta. Mas o profeta não deixa de ser duro com o povo, especialmente com as lideranças, por causa do caos interno. São os próprios líderes do povo que favorecem a dominação de fora ou, pelo menos, são coniventes com ela. Os teus príncipes são rebeldes e companheiros de ladrões; cada um deles ama o suborno e corre atrás de recompensas.. Não defendem o direito do órfão e não chega perante eles a causa da viúva. (1.23.) Os anciãos e príncipes do próprio povo é que roubam do pobre (3.14), as mulheres ricas expõem seus vestidos e jóias (3.16ss.), os guias do povo são enganadores (9.15-16), decretam leis injustas, negam justiça aos pobres, roubam dos órfãos e das viúvas (10.1-2), defendem o mau por suborno e negam justiça aos justos ( 5.23). Também a hipocrisia religiosa (1.10ss) e a idolatria (2.8) são atacadas pelo profeta. A terra está tomada por angústia, escuridão e sombras de ansiedade; densas trevas ameaçam o povo (8.22).

3. Das trevas para a luz

Mas para a terra que estava aflita não continuará a obscuridade (Is 9.1).

No meio da noite,
um resto implorando caminho!
O que vê?
A necessidade de caminhar,
porque a Luz-Guia
se faz clarão ao andar...

(Josimo Morais Tavares)


A escuridão não permanecerá. A aflição chega a seu fim. O povo que andava em trevas viu grande luz, e aos que viviam na região da sombra da morte esplandeceu-lhes a luz.

As trevas e a sombra da morte rondavam o povo. Mas uma grande luz resplandeceu. Javé transforma as trevas em luz. Ele próprio é a luz. Sua presença e proximidade podem ser indicadas pela luz (Ex 13.21-22; Dn 2.22; Sl 89.15; cf. tb. l Jo 1.5). Do seu rosto vem a luz (Sl 4.6; Nm 6.25). A presença de Javé e sua ação transformam as trevas da história em luz de salvação. Nos vv. 3 e 4, a fala é com o próprio Javé — oração —, e há, a partir disso, o reconhecimento de que a luz vem da parte dele. É Javé que está agindo para transformar as trevas e que traz alegria ao povo.

O texto nos fala de alguém que ainda vai chegar e que vai ser esta luz. No Segundo Isaías, também se fala de alguém que vai representar a luz: o servo do Senhor é chamado em justiça para ser mediador da aliança com o povo e luz para os gentios, a fim de abrir os olhos aos cegos, tirar da prisão os cativos e do cárcere os que estão em trevas (Is 42.6-7). As trevas são históricas, concretas. A luz da libertação virá para transformar as trevas e restabelecer o direito à vida.

No Evangelho, o Enviado de Deus é o sol nascente das alturas, que vem visitar o povo/humanidade para alumiar os que estão nas trevas e na sombra da morte e para dirigir o povo por um caminho de paz (Lc 1.78s.).

A luz é vida. As trevas são o que aniquila a vida. Luz significa as coisas bo¬as da vida. A luz é Jesus. Luz quer dizer que o Reino de Deus está começando.

4. Boa nova de grande alegria

O texto fala que Javé multiplicou o povo. Povo multiplicado é povo fortalecido (Ex 1.7). E este recebe uma alegria especial. Está feliz como na época da colheita. A colheita é o ápice de um processo que começa com a preparação da terra, o ato de semear, a espera pelo crescimento. É coisa de roça pequena, do mundo rural simples. A colheita sempre envolve mais pessoas da família do que as outras etapas do cultivo. Não é difícil ter vizinhos presentes no mutirão. Toda colheita é um chamado para se ajudar. O final dos mutirões geralmente culmina com uma festa. Difícil pra nós é se alegrar com a colheita se a gente pensa nos preços. Mas sempre dá uma alegria na gente na hora da colheita, sempre tem aquela esperança de melhorar as coisas.

A alegria da colheita vai acontecer de novo. As rocas vão ser recuperadas (Is 1.7: roças estão destruídas, e a terra está devastada).

A alegria de quem reparte os despojos: uma imagem de final de guerra. Somente depois da batalha ganha é que se repartem os saques e sobras. Javé tem a batalha ganha. O opressor foi vencido. O seu jugo, sua vara e seu porrete vão ser quebrados. A guerra vai acabar. E todos os seus vestígios devem ser apagados. As botas dos soldados e a roupa ensanguentada devem ser queimadas, servir de pasto para o fogo. Com o fim da guerra, a alegria do saque que pertencia ao opressor vai ser devolvida ao povo.

5. Uma criança nos nasceu

Criança é vida. É alegria; é futuro; é esperança. A criança aqui (neste texto) é a luz.

Uma criança vai nascer. É a contradição de Deus, do ponto de vista humano Deus entra em nosso mundo pela porta da fraqueza, da fragilidade, da criança (op. cit., p. 299). Deus se revela como criança, com a aparência frágil e socialmente sem valor. Mas esta criança terá poder sobre os seus ombros e vem para este povo que tem os ombros feridos pela vara do opressor. Para o povo que está como cego, perdido na escuridão, no vale da sombra da morte, esta criança será maravilhosa conselheira. Para o povo que está enfraquecido pelo jugo do opressor, com a vida ameaçada, esta criança será como Deus Forte, Pai da eternidade. Para o povo que está no tumulto da guerra, esta criança será como um príncipe da paz. Ela vai restaurar o direito e a justiça para que haja paz sem fim.

6. Impulsos para a pregação

6.1 A luz vem trazer alegria

A luz que vem é revelação de Deus. Ela vem para trazer vida para o povo. Ha significa alegria, esperança, reanimação. Porque a alegria da colheita vai retornar. As roças do povo vão ser recuperadas.

Nós vivemos num tempo de muito pessimismo e incertezas, sob o jugo de um governo opressor e totalmente descomprometido com as necessidades da vida do povo. E parece que a gente mais sente a escuridão do que a vê. As trevas, muitas vezes, aparecem muito difusas, à meia-luz. Ou, então, elas se escondem atrás de luzes fortes e artificializadas, que conseguem ofuscar os olhos do povo.

Natal é festa de luz. Não as luzes de holofotes ou de néon. São as aconchegantes luzes de velas que compõem um cenário mais vivo do Natal. E também as centenas de luzes dos olhos do povo, que espera ansiosamente pela redenção.

Desafio para a comunidade: ser luz, acreditar na teimosia da luz que uno quer apagar. Natal é momento de fortalecer e ajeitar este pavio que ainda fumega e dar-lhe um pouco de combustível. É momento de animar a comunidade a não desistir da roça do Reino, a não desistir da semeadura. No momento histórico atual talvez seja tempo de não arriscarmos demais em grandes projetos revolucionários. Não podemos nos fechar em nossas comunidades. Mas precisamos ser sensíveis ao fato de que, para a maior parte de nossas comunidades, a esperança não passa de um pavio que fumega. Não podemos abafar ou apagar este pavio com uma prédica carregada. Este pavio deve receber combustível novo. São os pequenos gestos de solidariedade entre as pessoas, os pequenos pontos de luz que vemos nas roças comunitárias, nos mutirões, nas pequenas associações, que vão alimentar a chama da esperança. Mas, mesmo com os pequenos sinais, não se pode perder a perspectiva maior do Reino de Deus: o estabelecimento da justiça e do direito e o triunfo da paz. O Reino de Deus, talvez, pode ser visto na perspectiva da luz da aurora: Vai brilhando mais e mais até ser dia perfeito (Pv 4.18). A perspectiva da luz pode servir para a comunidade se fortalecer na luta contra as trevas que estão por aí: fome, violência, injustiça, desemprego, crianças abandonadas, destruição da Criação, falta de assistência à saúde e à educação, falta de terra disponível para quem nela trabalha.

6.2. O sonho do Natal

Para a maioria das pessoas de nossas comunidades — empobrecidas, precisamos acordar! —, o Natal representa uma oportunidade quase única no ano para festejar. Todas as famílias se esforçam em ter um almoço um pouco melhor e em presentear, pelo menos, as crianças. Nem que seja apenas um pacotinho com balas e pirulitos.

No Natal é permitido sonhar. Não podemos apagar este sonho, que é tão caro para o povo. Nossa tarefa é dar ênfase à comunhão e à partilha, praticadas no Natal, para que sejam uma prática constante em nossa vida comunitária.

6.3. Uma criança nos nasceu: o Deus-criança

O Natal traz, mais uma vez, à memória que Deus se faz gente através de uma criança. Uma criança que, pelas circunstâncias do nascimento, estaria condenada a morrer.

A misericórdia de Deus se manifesta em nós através de uma criança que nasce bem longe do Templo — considerado, por excelência, o lugar da manifestação da misericórdia divina. Seria muito difícil convencer que aquela criança seria o Messias esperado pelo povo.

A festa do Natal quer sempre mostrar que a vida, a salvação, a esperança estão nas mãos de uma pobre criança nascida num curral na vila de Belém. O Natal mostra, também, que a esperança e a vida ainda estão nas mãos das crianças, das nossas crianças. Faz lembrar que a vida e a esperança já fugiram das mãos de milhões de crianças. Abandonadas à própria sorte, elas não têm casa nem família, tampouco pão. Perambulam pela vida.

7. Subsídios litúrgicos

1. Canto: Salmo 118, Celebrações do povo de Deus, p. 119. Nós celebramos este culto de Natal em nome de nosso Deus Criador, em nome de Jesus Cristo e em nome do Espírito Santo. Amém.

2. Intróito: Jesus diz: Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará nas trevas, pelo contrário, terá a luz da vida (Jo 8.12). Nós queremos cantar louvores ao nosso Deus, que é a luz da vida: Glória seja ao Pai...

3. Confissão de pecados: Nosso Deus, estamos reunidos neste culto de Natal como tua comunidade. E confessamos que nem sempre temos vivido como tua comunidade. Impedimos que a tua luz brilhe em nós. Há muitos sinais de trevas entre nós. Há também egoísmo, ganância e inveja entre nós, que somos pequenos e pobres. Deixamos de lado o sofrimento das outras pessoas e nos acomodamos diante da miséria. Perdoa-nos a falta de tempo e espaço para nossas crianças na família, na igreja e na sociedade. Dá que possamos recomeçar a nossa vida na tua graça e tem piedade de nós, Senhor.

4. Palavra da graça: Graça ao misericordioso coração de nosso Deus, que nasce do alto nos visitará, para iluminar os que vivem nas trevas e na sombra da morte; para guiar nossos passos no caminho da paz. (Lc 1.78-79.)

(Crianças trazem velas, que são acesas uma a uma. Os porta-velas podem ser confeccionados de papelão colorido, na Escola Dominical. As velas devem ser grandes o suficiente para permanecerem acesas sobre o altar durante o culto.) Enquanto as crianças acenderem as velas, a comunidade canta, quantas vezes for necessário:

5. Glória: Celebrações..., p. 10.

6. Oração: Neste tempo de Natal, tu queres nos mostrar novamente que- o teu Reino é das crianças e de quem se tornar criança. Nós queremos também agradecer, porque pelo teu Espírito somos congregados, somos a tua comunidade, que queres renovar na tua comunhão. Pedimos-te que nos dês a tua luz, para que possamos ser luz para o mundo. Amém.

7. Canto: Canção de Maria. Leituras: Lucas 2.1-20 — Tito 2.11-14.

(A leitura do primeiro texto bíblico é feita em três partes, com três pessoa-, diferentes e uma motivação que antecede à leitura.)

8. Motivação: Maria e José moravam em Nazaré. Eram migrantes. José ou natural de Belém. O imperador criara uma lei de recenseamento. Todos os homens tinham que se inscrever, juntamente com suas famílias, no lugar de nascimento. É para Belém que José deve ir com Maria. E é em Belém que Jesus vai nascer. Vamos ouvir como isso nos é contado no texto bíblico.

9. Leitura de Lc 2.1-7.

10. Canto: Cantar o refrão: De cepa brotou a rama, da rama brotou a flor
Da flor nasceu Maria, de Maria o Salvador.

11. Motivação: Quem iria acreditar que aquela criança nascida naquele lugar pequeno e simples fosse o próprio Deus? Os pastores de ovelhas, um grupo de pessoas marginalizadas e desprezadas, consideradas pé-de-chinelo. São as primeiras pessoas a ouvir e ver a grande novidade. São as primeiras pessoas convidadas a ver a criança.

12. Leitura de Lc 2.8-14.

13. Canto: Glória, Celebrações..., p. 10.

14. Motivação: Talvez, os pastores de ovelhas seriam um dos poucos grupos de pessoas que iriam correr atrás de uma notícia tão louca. Talvez porque só os pequenos poderiam levar a sério tão grande acontecimento de Deus.

15. Leitura de Lc 2.15-20.

16. Canto: HPD 20 ou 16.

Queremos ouvir o segundo texto bíblico previsto para leitura no culto de Natal, que fala da manifestação da graça de Deus para a salvação de todas as pessoas.

Leitura de Tito 2.11-14. (Observação: Versículo 11, em vez de homens ler pessoas.)

17. Voto: Eis que o Senhor fez ouvir até os confins da terra estas palavras: Dizei à filha de Sião: Eis que vem o teu Salvador; vem com ele a sua recompensa, e diante dele o seu galardão. (Is 62.11.)

18. Aleluia: de Sinclair, Celebrações..., p. 131.

19. Canto: Nossa vida no Senhor, Celebrações..., p. 133.

20. Convite para o abraço da paz: Nós desejamos que este dia seja de festa plena de amor, de paz e de alegria. Vamos nos abraçar para manifestar esta alegria e paz que Deus nos concede. Vamos nos dar o abraço da paz.

21. Credo: Como irmãos e irmãs unidos na mesma fé, queremos confessar esta nossa fé (Credo Apostólico).

22. Canto: Seu nome é maravilhoso (cantado por um grupo de crianças).

23. Canto: HPD 12.

24. Mensagem / Pregação (no caso de fazer uso desta proposta litúrgica e, especialmente, se for culto com Santa Ceia, esta parte deve ser bastante breve).

25. Canto: Dizei aos cativos: saí.

26. Coleta / Avisos.

27. Oração: Convidar várias pessoas da comunidade, com antecedência, para participarem da oração final. Sugestão de intercessões: crianças, pessoas idosas, doentes, jovens, pobres e oprimidos, enlutados, saúde, justiça, paz, etc.

28. Envio: Vocês são a luz do mundo. Não se acende uma lamparina para colocá-la debaixo de uma vasilha, e sim para colocá-la no velador, onde ela brilha para todos os que estão em casa. Assim também brilhe a luz de vocês diante das pessoas, para que elas vejam as boas obras de vocês e louvem ao Pai de vocês que está no céu (Mt 5.14s.).

29. Benção.

30. Canto: HPD 28.

8. Bibliografia

ALLMEN, Jean-Jacques von. Vocabulário Bíblico. 2ª. ed.. São Paulo. ASTE, 1972, 453 pp.
CROATTO, J. Severino. Isaías — A palavra profética e sua releitura hermenêutica — Vol 1: 1-39: o profeta da justiça e da fidelidade. Petrópolis/São Bernardo do Campo/São Leopoldo, Vozes/Imprensa Metodista/Sinodal, 1989, 247 pp.
SCHWANTES, Milton. Natal — Isaías 9.2-7. In: Proclamar Libertação.. Vol. 5, pp294-303. São Leopoldo, Faculdade de Teologia, 1979.

Outras reflexões sobre a pregação natalina se encontram no próximo auxílio homilético, em especial nos pontos 3, 5 e 6.

Proclamar Libertação 18
Editora Sinodal e Escola Superior de Teologia


Autor(a): Marga Janete Ströher
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Natal
Perfil do Domingo: Dia de Natal
Testamento: Antigo / Livro: Isaías / Capitulo: 9 / Versículo Inicial: 1 / Versículo Final: 6
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1992 / Volume: 18
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 6966
REDE DE RECURSOS
+
O que importa é a fé que age por meio do amor.
Gálatas 5.6b
© Copyright 2024 - Todos os Direitos Reservados - IECLB - Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil - Portal Luteranos - www.luteranos.com.br