João 11.1-5,17-21

Auxílio Homilético

01/11/2016

 

Prédica: João 11.1-5,17-21
Leituras: Isaías 25.1,8-9 e Romanos 8.31-39
Autoria: Uwe Wegner
Data Litúrgica: Dia de Finados
Data da Pregação: 02/11/2016
Proclamar Libertação - Volume: XL 

O amor: mais forte do que a morte

1. Introdução

As leituras adicionais para o texto da prédica são Isaías 25.1,8-9 e Romanos 8.31-39. Ambos os textos estão indiretamente relacionados com a história da ressurreição de Lázaro, pois também falam diretamente sobre ressurreição.

Isaías 25.1,8s apresenta uma bonita palavra de esperança, também reproduzida em Apocalipse 21.4: “Tragará a morte para sempre e assim enxugará o Senhor Deus as lágrimas de todos os rostos...” (v. 8). No Antigo Testamento, a fé na ressurreição recebeu contornos mais claros somente após o exílio, em que se aguardava uma ressurreição do pastor Davi (Ez 34.23ss; 37.24-28) e, depois, também de todo o Israel (Ez 37.1-4). Textos do Antigo Testamento comumente vinculados à ressurreição são ainda Isaías 53.10ss (servo sofredor), Jó 19.25-27 e os textos apocalípticos de Isaías 26.19 e Daniel 12.2; nesse último se fala de uma dupla ressurreição (“uns para a vida eterna, outros para horror e vergonha eternos”). Além disso, temos finalmente também o testemunho da ressurreição presente em alguns salmos, entre os quais os Salmos 16.10s; 49.14-16; 73.26.

Romanos 8.31-39 é talvez a mais bela confissão de fé na ressurreição dentro das cartas do Novo Testamento. Seu nexo com João 11 dá-se também pelo fato de o texto referir-se diretamente ao amor (Jo 11.3, 5, 36), afirmando que nada, nem mesmo a morte, poderá separar os cristãos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor (Rm 8.39).

2. Exegese

Nos v. 1-6, o evangelista introduz o cenário. O texto não diz exatamente qual era o lugar “em que Jesus estava” (11.6). O cenário, de qualquer forma, dá-se no pequeno povoado de Betânia, a aproximadamente três quilômetros da cidade santa (15 estádios [1 estádio = 200 metros] = 3 km; cf. 11.18). Lázaro é abreviação do nome hebraico Eleazar e significa “Deus ajuda”. Ele se encontrava enfermo (um detalhe que, por ser repetido nos v. 2, 3, 4 e 6, talvez queira destacar a gravidade da enfermidade), sem que se especifique a natureza mais exata da doença.

No v. 2, o evangelista faz uma apresentação mais detalhada de Maria, reportando-se a coisas que aparentemente são do conhecimento dos seus leitores. Maria seria aquela que “ungiu com bálsamo o Senhor” (história relatada em Mc 14.3-9 e logo depois no capítulo 12.1-8 de João) e que “lhe enxugou os pés com seus cabelos” (referência à narrativa de Lc 7.36ss, cf. 7.38).

O v. 3 relata que as irmãs mandaram avisar Jesus sobre a doença de Lázaro, que Jesus amava. Aliás, o narrador insiste nesse amor de Jesus a Lázaro também no v. 5 (e 36), no qual são incluídas também as duas irmãs.

No v. 4, de posse da notícia, Jesus responde que a enfermidade “não é para a morte”, mas para a glória de Deus e para que o Filho de Deus seja por ela glorificado (semelhantemente em Jo 9.3). Uma vez que Lázaro efetivamente morreu, a expressão “não é para a morte” deve ser interpretada à semelhança de várias frases com “não... mas...”, ou seja, no sentido de “não só ... mas também” (cf. F.F. Bruce, João, p. 207). O v. 4 sugere uma mudança de foco: normalmente nos fixamos nas doenças e tragédias das mortes e não raro ficamos atolados na pergunta: por quê? Nosso versículo muda a perspectiva e mostra o “para que”, ou seja, para a glória de Deus e de Jesus. Os milagres praticados por Jesus eram expressão do grande poder de vida que Deus possui. Por isso eles glorificavam a Deus. Em nosso caso, a glorifi cação é ainda maior, pois se trata da manifestação de um poder que supera, inclusive, a morte.

O v. 5 reafirma mais uma vez que Jesus amava Marta, Maria e Lázaro. Essa insistência no amor de Jesus pelos seus é um marco de nossos primeiros versículos. Parece sugerir: o amor de Jesus é a base sobre a qual se fundamenta o pedido das irmãs pela cura. Recorre-se a Jesus, pois ele ama os seus.

Os v. 17-21 narram a chegada de Jesus a Betânia e palavras de Marta dirigidas a Jesus. Quando Jesus chegou, Lázaro já se encontrava enterrado há quatro dias. O v. 20 mostra uma comunidade solidária: há vários judeus na casa consolando as irmãs.

Ouvindo sobre a presença de Jesus, Marta vai a seu encontro, enquanto Maria fica sentada em casa. Marta faz uma linda confissão de fé no poder de vida que Jesus tem: “Se tivesses estado aqui, meu irmão não teria morrido!”. Aqui se confessa que o poder de Jesus é mais forte do que a morte. Em meio à sua tristeza, Marta acrescenta ainda outra confissão de fé, desta vez não diretamente no poder de vida de Jesus, mas no fato de que Deus atende tudo o que Jesus pede a ele. Essa segunda confissão mostra a total abertura de Deus para tudo o que Jesus lhe pede em oração. Em si, a segunda confissão prepara as palavras de Jesus imediatamente antes de ressuscitar Lázaro: “Pai, graças te dou porque me ouviste. Aliás, eu sabia que sempre me ouves...” (11.41-42). Esses versículos pressupõem que a ressurreição de Lázaro, narrada logo a seguir (11.43-44), tenha sido o resultado de uma prece de Jesus, dirigida e atendida por Deus.

3. Meditação

Historicamente, de acordo com a Wikipédia, “desde o século II, alguns cristãos rezavam pelos falecidos, visitando os túmulos dos mártires para rezar pelos que morreram. No século V, a igreja dedicava um dia do ano para rezar por todos os mortos, pelos quais ninguém rezava e dos quais ninguém lembrava. Desde o século XI, os papas Silvestre II (1009), João XVII (1009) e Leão IX (1015) obrigam a comunidade a dedicar um dia aos mortos. No século XIII, esse dia anual passa a ser comemorado em 2 de novembro, porque 1 de novembro é a Festa de Todos os Santos” (verbete “Dia de Finados”).

Segundo Leonardo Ramlow, “com a Reforma, desencadeada por Martim Lutero, os cristãos luteranos também elegeram um dia para refletir sobre a morte. Isso ocorre no último domingo do ano eclesiástico (Domingo da Eternidade). Dessa forma, a cada ano, nesse dia, não se realizam cultos pelos mortos, como era costume católico, mas lembra-se dos limites da vida humana e do poderio de Deus sobre ela. Acredita-se, inclusive, que os mortos continuavam a fazer parte da comunidade, pois, juntamente com os vivos, continuam esperando a vinda do Senhor Jesus. Isso ajuda a compreender o antigo costume de algumas comunidades da Alemanha, onde os mortos são sepultados em volta da igreja. Em muitas comunidades da IECLB, o cemitério está anexado à igreja” (Portal Luteranos, pregação sobre Isaías 35.1-10 para o Dia de Finados).

Características: O dia dos mortos é um dia de muita sensibilidade. Quem vai ao culto nesse dia geralmente o faz porque espera receber alguma mensagem relacionada com a perda e morte de algum ente querido. As situações que envolvem a perda de pessoas pela morte são variadas. Em muitos casos, a morte é um conforto para os enlutados, pois representou o término de longo e demorado sofrimento, e o ente querido realmente pôde descansar. Em outros casos, a perda é abrupta, inesperada, e a dor e o luto são mais profundos e as cicatrizes demoram mais para sarar.

Podem-se fazer os seguintes destaques em nosso texto:

1. Tanto Marta como Maria estão cientes de que Lázaro, que morreu, não é pessoa qualquer para Jesus, mas que Jesus o amava (cf. em 11.3,5 e 11.36: os que veem Jesus chorando diziam: “vejam como ele o amava”). Elas não teriam mandado avisar ou chamar Jesus quando Lázaro ficou doente se não estivessem certas de que Jesus o amava. O amor é o primeiro elemento que explica o fato de Jesus ter ressuscitado Lázaro da morte. Ninguém se esforça para salvar pessoas da morte pelas quais não nutre nenhum sentimento de amor.

2. Marta faz uma impressionante confi ssão a respeito de Jesus. Ela afi rma: “Senhor, se estivesses aqui, não teria morrido o meu irmão”. Como pode Marta afi rmar tal coisa? Nesse caso, só o amor não explica toda a sua convicção. Para entendê-la, precisamos admitir que Marta tinha que ter também fé no poder de cura de Jesus. Também nós amamos muito pessoas queridas, mas ninguém afi rma de nós: “Se estivesses aqui, essa doença não teria terminado em tragédia”. Jesus realmente tinha poder sobre as doenças, e, como doenças levam à morte, pode-se presumir que ele era poderoso também diante da morte! A confissão que encerra as palavras de Marta no v. 21 é, pois: onde há presença do Senhor Jesus, a morte é vencida, a vida prevalece; onde Jesus encontra-se ausente, o que prevalece é a morte. No fundo, a confi ssão de Marta confi rma à sua maneira as próprias palavras de Jesus: “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10.10).

3. Pode-se perguntar: donde Jesus tira esse seu poder de vencer a morte? A resposta está naquela segunda confi ssão de Marta e referida no v. 22: “Mas também sei que, mesmo agora, tudo quanto pedires a Deus, Deus to concederá”. É, pois, dos seus pedidos a Deus, de suas orações ao Pai que Jesus tira o seu poder de conceder vida e vencer a morte. Jesus e Deus vivem uma grande unidade, em que a vontade de um é a vontade do outro, o poder de um é o poder do outro: “Quem vê a mim, vê aquele que me enviou” (12.45); “quem me vê a mim, vê ao Pai” (14.9).

4. Marta acredita que Lázaro irá ressuscitar no dia do juízo final com todas as demais pessoas (11.24), não que Jesus pudesse ressuscitá-lo ali mesmo naquela situação de luto. O surpreendente da história é que Jesus ressuscita Lázaro ali mesmo, apesar de ele já ter sido sepultado há quatro dias. Essa ressurreição é, sem dúvida, apenas uma revivificação, mas mostra que o poder de vida que Deus tem já pode e deve ser sentido aqui neste mundo, e não só num futuro distante.

5. Os primeiros cristãos encaravam a morte como um sono (Lázaro “adormeceu”: 11.11; cf. 1Co 11.30; 15.6,18,20,51; 1Ts 4.13s). Isso é diferente de achar que com a morte tudo termina. Se a morte é um sono, haverá, depois dela, um despertar. Os cristãos creem nesse despertar depois da morte. A ressurreição de Jesus na Páscoa e o amor de Deus às suas criaturas são os maiores fundamentos dessa esperança.

4. Sugestão para prédica

1. Descrição da morte como o que há de mais certo na vida: como fim da vida, seja fim trágico, seja final doloroso, seja como forma de pessoas chegarem finalmente a um descanso depois de longos sofrimentos.

2. Indicar que, ao contrário do que ocorre para muitas outras pessoas, para os cristãos a morte tem concorrência: refletir sobre o ditado “o amor é forte como a morte”. A concorrência da morte é o amor. O amor, para a Bíblia, é aquela prática, aquele sentimento, aquele compromisso que vai permanecer apesar de todas as outras coisas terem um fim (“O amor jamais acaba”: 1Co 13.8).

3. A história da ressurreição de Lázaro é a história bíblica sobre a vitória do amor de Jesus por Maria, Marta e Lázaro sobre a morte. É porque Jesus amava Lázaro que o ressuscitou. Jesus fez outras ressuscitações da morte: do filho da viúva de Naim (Lc 7), da filha de Jairo (Mc 5). Quando a gente se sabe amado por alguém, não é assim que a gente confia que esse alguém não vai nos abandonar, não vai nos deixar a sós, vai fazer de tudo para nos tirar da doença e morte? Pois é isso que se dá com o amor de Jesus e de Deus por nós. Ele é tão grande que nem a morte consegue vencê-lo (cf. Rm 8.31-39). Carlos Mesters: A fé na ressurreição nasce da palavra amiga que Alguém pronuncia em nosso favor. Assim como a palavra do amigo pode confirmar uma pessoa, restituir-lhe a consciência de si e reanimá-la para uma nova esperança, assim a palavra amiga de Deus atinge a pessoa humana na sua raiz, restitui-lhe a consciência de si mesma, ressuscita-a para uma nova vida e a faz viver para sempre (Carlos Mesters, Deus, onde estás?, p. 205).

4. Essa vitória sobre a morte, advinda do amor divino para conosco, pode começar já aqui nesta vida. No momento e à medida que nós encararmos e combatermos com amor aqui e agora todas as forças, poderes e valores que conduzem à morte de pessoas, grupos ou da natureza (por exemplo, no momento em que combatermos o ódio e a intolerância, que geram brigas e separações, quando combatermos o uso de álcool ao volante, que ocasiona milhares de mortes por ano, quando advogarmos pelo cuidado com os recursos naturais e contra o uso abusivo de defensivos agrícolas etc.), estaremos dando um testemunho de nossa fé na força que o amor tem para gerar e preservar a vida, estaremos sendo testemunhas da ressurreição. Citamos mais uma vez Carlos Mesters: A única prova verdadeira da ressurreição que convence é a vida que hoje ressuscita e se renova [...]. Esse é o comprovante de que, no homem, atua uma força mais forte do que a morte, a força de Cristo ressuscitado. Onde estão esses sinais da ressurreição na nossa vida, para que a nossa palavra sobre a ressurreição de Cristo possa ter um comprovante? (Deus, onde estás?, p. 207).

5. Imagens para a prédica

Frases sobre a morte:

“Morrer é o apagar da lâmpada ao nascer do dia, não o apagar do sol.” (Tagore)

“Feliz o homem que no final da vida não tem senão o que deu aos outros.” (Armando Fuentes Aguirre)

“O amor é forte como a morte.” “A morte despe-nos dos nossos bens para nos vestir das nossas obras.”

“A morte, fechando as portas da vida, abre as da eternidade.”

“Nada mais certo do que a morte e nada mais incertos do que o dia e a hora em que ela virá.” (Cícero)

Imaginário sobre a morte em nossas comunidades:

Ildo Franz, em prédica sobre Jo 11 no Dia de Finados de 2013 (Portal Luteranos), informa o seguinte: “Certa vez, um pastor realizou uma pesquisa sobre o que pessoas pensam em relação à morte e qual a sua esperança diante da morte. Esse pastor obteve seis tipos de respostas diferentes. 1) “Para mim não há vida depois de passarmos desta. Morreu, terminou; acabou tudo; termina como tudo aqui termina!” 2) “O que morre é o corpo, a alma reencarna noutro corpo e volta a viver na terra.” 3) “Eu continuarei vivo, se fizer grandes e boas obras em favor da humanidade durante o tempo que vivi; continuarei vivo se eu permanecer na lembrança dos outros.” 4) “Eu continuarei vivo no sangue e corpo dos meus descendentes.” 5) “Quando eu morrer, a alma vai para o céu. O que morre é o corpo.” 6) “Eu creio como confesso no Credo Apostólico: ‘Creio... na ressurreição do corpo e na vida eterna’! Eu vou morrer, mas hei de ressuscitar com um novo corpo, como ressuscitou o meu Senhor Jesus Cristo!”.

6. Subsídios litúrgicos

Duas orações muito pertinentes para a data – uma mais para o início e a outra para o final do culto – podem ser encontradas nos subsídios litúrgicos para o Dia de Finados do PL 37, p. 323 (Flávio Schmitt).

Bibliografia

KONINGS, J. Evangelho segundo João: amor e fidelidade. Petrópolis/São Leopoldo: Vozes/Sinodal, 2000.

MESTERS, C. Deus: onde estás? Belo Horizonte: Editora Vega, s.d. p. 195-208.

 


Autor(a): Uwe Wegner
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Dia de Finados

Testamento: Novo / Livro: João / Capitulo: 11 / Versículo Inicial: 1 / Versículo Final: 21
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2015 / Volume: 40
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 35210
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