João 12.1-8

Auxílio Homilético

07/04/2019

Evelyne Regina Goebel
Adriana Weege
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Prédica: João 12.1-8
Leituras: Isaías 43.16-21 e Filipenses 3.4b-14
Autoria: Evelyne Regina Goebel e Adriana Weege
Data Litúrgica: 5º. Domingo na Quaresma
Data da Pregação: 7 de abril de 2019
Proclamar Libertação - Volume: XLIII

Somos Marta ou Maria?

1. Introdução

O texto previsto para a pregação neste 5º Domingo na Quaresma (João 12.1-8) relata a unção de Jesus por Maria, irmã de Marta e Lázaro. A versão joanina difere em alguns aspectos do relato paralelo de Mateus e Marcos, por exemplo, em relação à localização no tempo e ao ambiente onde a cena acontece. O texto de João 12.1-8 ainda não foi trabalhado em nenhuma publicação do Proclamar Libertação (PL).

O texto do profeta Isaías (43.16-21) traz uma comparação com o êxodo do Egito, afirmando que a nova libertação será um acontecimento bem mais grandioso, pois as pessoas crentes testemunharão a ação de Deus na história, e isso será algo incomparável.

Na Carta aos Filipenses (3.4b-14), Paulo se declara um judeu nato: foi circuncidado e seguia as leis fielmente. Poderia se orgulhar disso, mas afirma que  todos os méritos religiosos e hereditários são, para ele, como perda. Seus valores e suas convicções já não são os mesmos, pois ele foi convertido pelo próprio Cristo. Os três textos, numa rápida leitura, parecem que não se relacionam. Mas uma análise mais detalhada mostra que eles se completam. Isaías mostra ao povo de Israel que a ação de Deus é incomparável. Paulo, por sua vez, afirma algo semelhante ao dizer que após a sua conversão Deus o transformou em outra pessoa. Já no texto do evangelho, Maria demonstra, através de um gesto de cuidado e carinho com Jesus, todo o cuidado de Deus para com ela. Deus age, Deus transforma e, em amor, servimos a Deus através de gestos diaconais.

2. Exegese

O texto localiza a cena em Betânia, como nos sinóticos, mas traz detalhes que dão a entender que Jesus está na casa de Lázaro, o ressuscitado, seis dias antes da Páscoa. Quem servia as refeições era Marta, sua irmã, e, enquanto comiam, Maria pegou nardo puro e derramou aos pés de Jesus, secando-o com seus cabelos. Esse ato, descrito em João 12.3, demonstra que às vezes era costume as pessoas recostarem-se em divãs para comerem descalças. É o que Jesus e os seus discípulos estão fazendo. Maria vê aqui uma oportunidade de demonstrar seu amor. O texto original grego diz que ela tomou uma “libra de nardo genuíno”. Uma libra romana seria algo como 327 gramas. O nardo era um óleo aromático feito a partir do caule esmagado da planta do nardo, nativa do norte da Índia, usada medicinalmente. Ao dizer que o nardo era puro, o texto demonstra sua qualidade e seu valor.

Ao realizar esse gesto de espalhar perfume sobre Jesus, Maria provoca duras e cruéis críticas por parte de Judas. Esse diz que o perfume poderia ter sido vendido por trezentos denários. Um denário, na época de Jesus, equivalia a um dia de salário de um trabalhador comum. Judas, no texto, é apontado como o tesoureiro, como o responsável pela guarda dos recursos do grupo, reservados para as necessidades. Mas o texto também formula um juízo ao chamá-lo de ladrão. Possivelmente já se aponta aqui para os atos da traição e da venda de informações por 30 denários (Jo 13.29). Essa indignação de Judas em relação ao desperdício do nardo chama muito a atenção das pessoas e torna tenso o momento. Ela serve, em verdade, para encobrir ou levantar sua miserabilidade. A palavra contra o desperdício, que parece ser uma indignação ética, demonstra apenas a hipocrisia de quem quer ficar com tudo para si e não dar nada a ninguém. A fala serve de alerta: onde há apego ao dinheiro, abre-se acesso ao mal, a projetos pessoais, como no caso de Ananias e Safira (At 5.1-11).

Ao pedir que a deixassem em paz (12.7), Jesus valoriza o gesto de Maria e protege seus sentimentos. Ungi-lo com o óleo seria um bom gesto, já que ele está às portas da paixão, enquanto as pessoas pobres sempre estariam disponíveis para receber ajuda. Logo, de certa forma, Jesus estava dizendo que a unção já era uma antecipação dos atos fúnebres, como informa o texto paralelo de Mateus (26.12).

A unção dos pés transforma-se num gesto profético, além de ser um gesto de hospitalidade. O ato de secar com os cabelos é um gesto abnegado de amor. O perfume que enche toda a casa lembra que o amor de Jesus não tem como não preencher o ambiente em que ele se encontra (confira 2Co 2.14). O amor esbanja, não indaga pela utilidade, o amor apenas se assenta aos pés de Jesus, para contemplá-lo e ouvi-lo. O amor não quer ficar “devendo” nenhum gesto de carinho. Judas, ao contrário, exerce no texto a voz do desamor: ele só vê o desperdício, fica devendo amor, é moralista, apegado à cobiça e ganância.

Uma comparação com os textos paralelos de Mateus e Lucas, e com o texto similar de Lucas 7.36-40, mostra algumas diferenças. Mateus e Marcos dizem que os discípulos reclamam do desperdício. Aqui é Judas quem reclama e é apontado como tesoureiro e ladrão. No relato de Lucas se diz que a cena acontece na casa de um fariseu, Simão. Ali se fala de uma mulher pecadora, de má fama, que derrama perfume nos pés de Jesus e os enxuga com os cabelos. Esse texto enfatiza o perdão de pecados. A caracterização da mulher como pecadora (hamartolos, em grego), dada ao pecado, não indica necessariamente que ela fosse uma prostituta, como normalmente se pensa. É por isso que esse texto foi muitas vezes relacionado à Madalena, como uma prostituta arrependida (Hinos do Povo de Deus 1, nº 115).

Em Marcos 14.3-9, a cena é localizada em Betânia, dois dias antes da Páscoa (Mc 14.1), na casa de Simão, mas a mulher não é identificada. Ela é criticada pelos discípulos pelo desperdício.

Em Mateus 26.6-13, a cena também acontece na casa de Simão, chamado de “o leproso”. Faltam dois dias para a Páscoa, e uma mulher não identificada derruba perfume na cabeça de Jesus, talvez se referindo a uma unção messiânica. Os sinóticos não trazem o nome da mulher, mas Jesus enfatiza que por todas as gerações futuras ela será lembrada pelo seu gesto.

3. Meditação

Jesus tinha um carinho todo especial por Lázaro e suas irmãs Maria e Marta. Em algumas ocasiões ele esteve com essa família, além de ter ressuscitado Lázaro. Jesus também tinha o costume de sentar-se à mesa com as pessoas, como no caso de Zaqueu, de Simão e de pessoas consideradas pecadoras e de má reputação. Tinha ali momentos de intimidade com as famílias que visitava, assim como hoje, pois não convidamos qualquer pessoa para vir à nossa casa e sentar-se à nossa mesa. A comunhão de mesa, para muitas famílias, ainda é um momento sagrado, como também o era para Jesus.

No texto de João 12, Jesus está na casa de Lázaro, que fora devolvido à vida. Marta está servindo a mesa. Em outro relato, ela também aparece como a pessoa responsável pela organização da casa (Lc 10.38-42), sempre agitada e preocupada com muitas coisas, pois Jesus era alguém considerado muito importante para a família. Naquela ocasião, Maria havia escolhido ficar aos pés de Jesus para ouvi-lo. Na narrativa de João, Maria faz algo inusitado: em vez de sentar-se aos pés de Jesus, ela derrama um perfume precioso em seus pés. A pergunta é: por quê? Com que propósito? Quem sabe, essa foi a forma de agradecer por todos os ensinamentos que ouviu de Jesus ou de agradecer por ele ter ressuscitado seu amado irmão.

O trabalho de Marta e o reconhecimento de Maria mostram como a comunidade de Jesus é feita de pessoas com vários dons e talentos. O servir é necessário, o trabalho na seara do Senhor é necessário, representado aqui por Marta. Mas o parar, aquietar-se, o ouvir, o engrandecer o nome de Jesus, também são necessários na comunidade. Marta, ao encontrar-se com Jesus antes dele ressuscitar Lázaro, faz uma belíssima confissão de fé: Eu creio que o senhor é o Messias, o Filho de Deus, que devia vir ao mundo (Jo 11.27). Maria, aqui, quer dizer a mesma coisa, só que o diz através de uma ação concreta: a de lavar os pés de Jesus com um perfume caríssimo e de secá-los com seus próprios cabelos. É um ato de humildade dessa mulher, demonstrando assim toda a sua fé naquele homem gentil, que lhe permitiu ouvir os seus ensinamentos e lhe mostrou esperança na vida eterna.

O que chama atenção neste texto é que Judas, alguém tão próximo a Jesus, que testemunhou milagres, ouviu parábolas, vivenciou muitas situações, não professou sua fé nem com palavras nem com ações. Pelo contrário, reprovou o ato inesperado de Maria, questionando o desperdício do perfume caro. Judas só vê o ato em si, não percebe a profundidade daquele gesto, não percebe o que está implícito naquela cena. Sua reação é negativa. Sua alegação é que o perfume deveria ter sido vendido e que o dinheiro tivesse sido entregue aos pobres. Mas sua verdadeira intenção é expressa na informação de que era o tesoureiro do grupo que costumava desviar o dinheiro para finalidades próprias.

Judas representa a dureza de algumas pessoas na atualidade, que não sabem compreender por que se há de ter cuidado pela causa do reino de Deus. Algumas acham que é desperdício investir na missão da igreja e na propagação do evangelho. E questionam: “Qual o sentido da Campanha Vai e Vem?”. Não dão um real para a causa, ainda censuram quem contribui. E se justificam dizendo que já ajudam a socorrer os pobres, e que isso basta! O que nós temos para oferecer a Jesus? Qual é o nosso gesto para demonstrar amor por tudo o que ele fez e faz por nós?

Vivemos num tempo em que o trabalho nos faz sucumbir, em que muitas pessoas não tiram tempo para um dia diferente com a família, e muito menos tiram tempo para ir à igreja. O trabalho nos sobrecarrega. Quando têm tempo, preferem dormir: “O culto é muito cedo!”. Neste sentido, podemos motivar a comunidade a refletir sobre o tempo que dedicamos a Deus, o que oferecemos a ele como ação de graças por tudo o que tem feito em nossa vida.

Marta confessou sua fé no servir a mesa, na sua confissão a Jesus: Tu és o Messias. Maria demonstrou o seu amor e fé no ato inusitado de reverenciar Jesus. O que nós, como membros da IECLB, fazemos para demonstrar o nosso amor a Cristo? Somos como Maria e Marta? Ou, por vezes, somos como Judas?

4. Imagens para a prédica

Ao final da prédica, sugerimos que as pessoas molhem as mãos com perfume, com água de pétalas ou com um óleo aromático, e apertem as mãos umas das outras como sinal de hospitalidade, de espalhar amor, de propagar a boa presença de Cristo. Outra opção é fazer uma comparação entre coisas úteis e coisas imprescindíveis, tendo dois cestos, destacando que o imprescindível é tudo que vem e que leva a Cristo, e que Maria assim soube reconhecer.

5. Subsídios litúrgicos

Destacar nas orações o pedido para que Deus nos salve dos atos de desamor; que não nos apeguemos simplesmente à “utilidade” das coisas ou das pessoas, mas que possamos reconhecer o valor além dos preços; que possamos ser mais desapegados dos valores deste mundo e mais apegados aos valores de Cristo.

Bibliografia

BOOR, Werner de. Evangelho de João II. Curitiba: Esperança, 2002.
CHAMPLIN, Russel Norman. O Novo Testamento interpretado versículo por versículo. São Paulo: Hagnos, 2002. v. II.

 


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Autor(a): Evelyne Regina Goebel e Adriana Weege
Âmbito: IECLB
Área: Governança / Nível: Governança - Rede de Recursos / Subnível: Governança-Rede de Recursos-Auxílios Homiléticos-Proclamar Libertação
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo da Páscoa
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2018 / Volume: 43
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 50281
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Salmo 33.11
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