João 16.12-15

Auxílio Homilético

10/06/2001

Prédica: João 16.12-15
Leituras: Provérbios 8.22-25 e Romanos 5.1-5
Autor: Nilton Giese
Data Litúrgica: 1º Domingo após Pentecostes (Trindade)
Data da Pregação: 10/06/2001
Proclamar Libertação - Volume: XXVI

1. A Doutrina da Trindade

Quando eu fiz o exame teológico na Faculdade de Teologia em São Leopoldo, o assunto era sorteado. A banca se reunia com dois estudantes de cada vez. Havia um copo em cima da mesa. Dentro dele havia pequenos bilhetes onde constavam os assuntos a serem abordados. Lembro-me que eu peguei o bilhete em que constava: A Doutrina da Trindade. O estudante tinha, então, 30 a 45 minutos para falar sobre o tema diante da banca examinadora. Isso significava falar algo dos 15 volumes que Agostinho escreveu entre 399 e 419 d.C. sobre a Trindade, lembrar do homousios (de uma só essência), de Orígenes e de sua dogmática, de Ário, dos três capádoces (Basílio, o Grande; Gregório de Nissa e Gregório Nazianzeno) e, é claro, dos Concílios de Nicéia e Constantinopla, este último em 381 d.C., que concluiu o Credo Niceno-Constantinopolitano.

Muitos de nós estudantes nos perguntávamos então: Doutrina da Trindade? Onde vou aplicar isso no meu pastorado? Quando entrei no pastorado, percebi que muitas vezes usava a fórmula trinitária no Batismo (Mt 28.19-20), no início dos cultos (Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo). No final do salmo lido, logo no início do culto, a comunidade é convidada a cantar louvores ao trino Deus e ela responde: Glória seja ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo. Como era no princípio, agora e sempre e por todos os séculos. Amém. Ao iniciar a prédica muitos pastores/as ainda usam a saudação de 2 Co 13.13 (A graça de nosso Senhor Jesus Cristo, ao amor de Deus Pai e a comunhão do Espírito Santo estejam com todos vós). Por fim, ao terminar o culto, a bênção final também expressa a fórmula trinitária. Por que essa fórmula trinitária é importante? Por acaso são palavras mágicas? Não! A fórmula trinitária quer trazer à memória da comunidade o centro oculto, isto é: o início, o meio e a finalidade de toda comunidade cristã. Jesus diz em Jo 10.30 : Eu e o Pai somos um e em 16.15: Tudo quanto o Pai tem é meu. A comunhão entre Pai e Filho produz uma abertura nova e incondicional, que libera o Espírito Santo, o qual convida e integra outras pessoas nessa comunhão do Pai com o Filho. O Espírito Santo é o mestre de obras na edificação da comunidade. Ele tem sua origem na comunhão do Pai e do Filho. Pela comunhão do Pai e do Filho, o Espírito Santo aplica à comunidade cristã sua essência missionária, sem a qual ela deixa de existir. Portanto, ao invocar a Trindade, estamos trazendo à memória o início, o meio e a finalidade da comunidade cristã.

2. Os textos para este Domingo da Santíssima Trindade
Salmo responsorial: Salmo 8.4-9.
Ó Senhor, Senhor nosso, quão magnífico em toda a terra é o teu nome!

Primeira leitura: Provérbios 8.22-31.
Antes de começar a criação, a sabedoria já estava presente.

Segunda leitura: Romanos 5.1-5.
Caminhamos para Deus em Cristo, no amor derramado em nossos corações pelo Espírito Santo.

Evangelho e texto para pregação: João 16.12-15. O Espírito da verdade vos guiará a toda verdade, porque não falará de si mesmo, mas de tudo que tiver ouvido.


3. Comentários com vistas à pregação

Deus realizou todas as obras com perfeição. A primeira leitura revela que desde o princípio a sabedoria (que Lutero identifica como o Espírito Santo em ação) (Schmidt, p. 87) foi companheira permanente e colaboradora em sua obra criadora. Deus a tudo concebeu e estabeleceu para que todos os seres vivessem em plenitude e nós, humanos, fôssemos capazes de assumir o compromisso de cuidar da Vida (Gn 1.28). Os israelitas assumiram desde o princípio que Deus e um grande sábio, que graças à sua palavra criadora (dabar) criou o céu e a terra. Para o povo de Israel pensar na criação significa pensar no seu criador. Por isso, a leitura sapiencial na Bíblia assumiu a Deus, dentro do marco do pensamento israelita, como o Criador, que com a sua palavra e a sua sabedoria criou o mundo sem nenhuma confusão e sem nenhum problema. Isso diferenciava bastante de outros deuses pagãos nas culturas vizinhas, onde as divindades tinham que combater com outros deuses menores para, dessa forma, poder criar o universo. O Deus invisível do Antigo Testamento se faz visível na pessoa e na obra de Jesus de Nazaré. Jesus não é uma criatura de Deus, mas é da mesma essência de Deus (homousios). Jesus foi transparente ao amor de Deus e assumiu a causa da humanidade, como bandeira primordial de seu ministério na terra. A antiga sabedoria de Deus, companheira de todas as suas obras, agora veio acampar no meio dos seres humanos para nos revelar que Deus deseja a vida de seus filhos e filhas e de suas criaturas, a vida de todos que ele ama. Portanto, a palavra criadora (dabar) não apenas atua como fazedora de coisas novas, no passado, mas também se encarna na história e nos acontecimentos e assume nossa realidade para transformá-la, segundo o plano original de Deus, do desvio proveniente do ser humano e de seu egoísmo.

Essa obra não está consumada. E os discípulos não têm a capacidade de entender todas as coisas. Por isso, mesmo sem a presença físi¬ca de Jesus entre as pessoas, será o Espírito Santo que continuará mostrando às pessoas o verdadeiro rosto de Deus naqueles que mais so¬frem, nos que estão oprimidos, naqueles que lutam pela terra e nos que vivem excluídos da sociedade. O Espírito que Jesus prometeu será para nos manter fiéis à causa primeira de Deus, que deseja dignidade de vida para todos os seres viventes.

Jesus recorda aos seus discípulos que ele não lhes disse tudo. O Pai, por meio do Espírito Santo, seguirá animando a comunidade e lhe seguirá mostrando o caminho para que a comunidade não perca o rumo marcado pelo criador. O Espírito Santo fará que a comunidade siga consumando a vontade do Pai, manifesta em Jesus, despertando na comunidade dons e carismas.

Para Lutero, a função do Espírito Santo é transmitir a nós, que vivemos na posteridade, a salvação que só há em Cristo. Pois, é só pelo Espírito Santo que a pessoa pode chegar à fé, isto é, a Deus.

Cada qual deve reconhecer em si o templo do Espírito Santo, porque se sente amor em relação à palavra e aprecia ouvi-la, expressá-la, dita Ia e escrevê-la, precisa saber que isto não é obra da vontade humana ou da razão; que isso é impossível de acontecer sem o Espírito Sanlo. (Schmidt, p. 85 ou WA40 I, 574,3ss).

Junto com isso, Lutero também acentua que o Espírito Santo nunca atua diretamente sobre a pessoa, mas que ele se vinculou inteiramente à palavra que é lida, refletida, reverenciada e cantada na comunidade. Essa vinculação à palavra deve ser entendida com todas as suas consequências. Pois Deus age conosco, através do Espírito Santo, de dois modos: uma vez exteriormente e, por outro lado, interiormente. Exteriormente, ele atua sobre nós através da comunidade, pela palavra oral, através dos sinais corporais, como o Batismo e a Santa Ceia. Interiormente, ele age conosco através do Espírito Santo e da fé, além de outras dádivas.

Mas tudo isso de maneira e ordem tal que as partes exteriores devem e precisam ter precedência e as interiores vir depois e através das exteriores, uma vez que ele decidiu não dar as partes interiores a pessoa alguma sem a palavra e sinal exterior, por ele instituídos para isso. (Schmidt, p. 86 ou WA 18,136,9ss).

Por isso, é só na comunidade que se pode celebrar a festa da Trindade. Pois a comunidade é o lugar onde Deus quer ser celebrado. E isso através da renovação de nosso compromisso de fazer comunidade no mundo e fazer do mundo uma comunidade. Na Santíssima Trindade, Deus mostra que ele não é um ser solitário e egoísta e, por isso, a solidão, o isolamento, o desamor, o ódio, a desunião não estão apenas fora do projeto de Deus, como também emperram o projeto de Deus. Assim, comunidade cristã fechada em si mesma ou cristão que não vive a solidariedade e o amor são uma trava, um impedimento para a manifestação da vontade de Deus.

Deus se revela em Jesus Cristo, através de sua Palavra que é buscada em comunidade. Nessa busca em comunidade atua o Espírito Santo. Para buscar a Deus precisamos vivenciar comunidade. Como diz Teilhard de Chardin: Tudo o que ascende converge.

Por isso, a festa da Trindade nos convida a contemplar a história de Deus com a nossa comunidade. A festa da Trindade nos quer levar à reflexão sobre o projeto de Deus para a nossa comunidade. Será que Deus tem conseguido guiar a comunidade e os grupos nela existentes com seu Espírito Santo? Ou os costumes (sempre foi assim) têm prevalecido sobre a vontade de Deus? Que dons o Espírito Santo tem despertado na nossa comunidade, que nos ajudam a ir aplicando o projeto de Vida de Deus?


4 .Auxílios para celebração

Oração final: (dar-se as mãos)
Por todos os que se esforçam para criar comunidade, que trabalham pela união das pessoas, roguemos ao Senhor.
Por todos os que estão sozinhos, isolados ou se sentem inúteis neste mundo, sem grupo, sem comunidade, ou distantes de todos que amam, para que procurem um grupo, uma comunidade que supere seu isolamento e solidão, roguemos ao Senhor.
Para que a Igreja seja um modelo de comunidade, onde reinem a fraternidade, a participação, a comunhão, roguemos ao Senhor.
Para que Deus nos avive através do seu Espírito Santo para que nos sintamos convocados a defender a Vida plena para todos os que dela são excluídos, roguemos ao Senhor.
(Podem-se acrescentar aqui outras orações da comunidade)

Pai-Nosso.

Bênção final:
O Senhor
O Pai de Jesus Cristo
O Deus dos pequenos, dos pobres e dos fracos O amigo daquele de quem quase ninguém gosta,

Ele te abençoe
Dando-te alegria e salvação, e te permita crescer como ser humano.
Ele te proteja No medo, no perigo e na necessidade.

O Senhor faça resplandecer o seu rosto sobre ti
Lá onde estiver escuro ao teu redor,
Para que consolado possas continuar o teu caminho
E não percas de vista o teu objetivo.

O Senhor tenha misericórdia de ti
Quando agires de forma injusta com o teu próximo,
O Senhor te corrija quando agires mal e te mostre sempre a sua vontade.

O Senhor levante o seu rosto sobre ti
E veja o que te falta,
O Senhor te dê atenção todas as vezes que o procurares.
Ele cuide de ti, assim como uma mãe olha para o seu filho.

O Senhor te dê a paz,
Que a paz reine dentro de ti e ao teu redor.

Assim te abençoe o nosso Deus que é Pai, Filho e Espírito Santo. Amém.

Bibliografia

LOHSE, Bernard. A fé cristã através dos tempos. 2. ed. São Leopoldo : Sinodal, 1981.
MÖLLER, Christian. (Re)construindo comunidade : carta aos presbíteros. São Leopoldo : Sinodal, 1995.
SCHMIDT, Kurt Dietrich. A doutrina de Lutero acerca do Espírito Santo. In: A presença de Deus na História. São Leopoldo : Sinodal, 1982.


Autor(a): Nilton Giese
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 1º Domingo após Pentecostes - Domingo da Trindade
Testamento: Novo / Livro: João / Capitulo: 16 / Versículo Inicial: 12 / Versículo Final: 15
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2000 / Volume: 26
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 14558
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