Lucas 3.7-18

Auxílio homilético

14/12/2003

Prédica: Lucas 3.7-18
Leituras: Sofonias 3.14-18a e Filipenses 4.4-7
Autor: Claus Dreher
Data Litúrgica: 3º Domingo do Advento
Data da Pregação: 14/12/2003
Proclamar Libertação - Volume: XXIX
Tema: Advento

1. Considerações exegéticas

A pregação de João Batista

João Batista anuncia a proximidade do juízo da ira. O juízo final está muito próximo; e o juiz não pergunta por obras, mas pelo bom fruto (v. 7b e 9). O centro da pregação de João Batista é um chamado radical ao arrependimento. O pé que é somente palha será queimado no fogo. Por isso o pé que não produz frutos precisa ser transformado em pé que produz frutos. Pois o trigo será guardado no depósito (v. 17). Tal transformação é para João Batista a conversão, a metanoia.

Metanoia ou o verbo metanoein no grego não-neotestamentário significa: modificar a mente, arrepender-se. Nos sinóticos, o termo tem um significado diferente. No grego do judaísmo palestino, a palavra metanoia era usada para reproduzir o termo hebraico schub, que significa inverter a direção. Segundo os profetas do Antigo Testamento, o chamado ao arrependimento era para que Israel voltasse a seu Deus. Adotando este sentido, a terminologia sinótica utiliza metanoien sempre significando: modificar a atitude, não apenas o modo de pensar, e sempre: modificar a atitude frente a Deus, e não apenas como melhoria moral. Neste sentido se traduz metanoia por arrependimento.

Características do chamado ao arrependimento de João Batista: 1) o arrependimento de todos; pois todo o povo de Israel se afastou de Deus; 2) o chamado ao arrependimento face à proximidade do juízo final; 3) o arrependimento, pregado por João Batista, é uma renúncia única e total frente ao que houve até agora; 4) João Batista não reúne uma comunidade especial, mas chama, como os profetas canônicos, todo o Israel a entrar no movimento de arrependimento frente ao fim que está iniciando, frente ao encontro escatológico definitivo com Deus. Os discípulos de João Batista não formavam uma comunidade especial, mas um círculo de alunos, como os discípulos de Jesus.

A exigência de um arrependimento total corresponde à oferta do batismo com água, juntamente com o anúncio do batismo com o Espírito, que está por vir. O batismo de João não é apenas palavra de promissão, mas ainda não é a realização da transformação, que só acontece com o Espírito e com o fogo. O Espírito criará o novo coração, o novo ser humano e o novo povo de Deus. João deixa claro que ninguém será salvo pelo seu batismo; a consumação da esperança não virá com ele. João Batista aponta para o Messias, Jesus Cristo.

Exegeticamente, para o nosso texto, ainda é interessante mencionar que a pesquisa considera historicamente menos fidedignas as tradições particulares de Lucas: a pregação aos grupos, em Lc 3.10-14, e a narrativa do nascimento de João Batista, em Lc 1 (cf. GOPPELT, Leonhard, p. 71-79).

2. Meditação

Advento é tempo de preparação, avaliação; é tempo de arrumar a casa, tempo de preparativos para o Natal de Jesus Cristo. Já estamos no 3° Domingo de Advento e, pelo menos exteriormente, tudo está praticamente arrumado, enfeitado, preparado. Mas no corre-corre do dia-a-dia, também é possível que ainda não tenha havido tempo para iniciar os preparativos, parar para meditar preparando o Natal.

A ornamentação de nossos lares e das lojas dá muito o que fazer e traz consigo alguma alegria. E nós? Como cada um de nós se prepara interiormente? Advento é tempo de preparação, avaliação; é tempo de confissão de pecados.

O Ano da Igreja está iniciando e, assim como no início de cada culto, precisamos nos sondar, curvar nossas cabeças diante de Deus e confessar-lhe a nossa culpa.

Preocupa saber que algumas pessoas querem tornar a confissão de pecados um elemento litúrgico dispensável. Para pessoas evangélicas de confissão luterana, é difícil imaginar o início dos cultos sem o momento da confissão de pecados e da absolvição.

Lutero escreve a respeito da confissão comum de todas as pessoas cristãs: “Que é nossa oração senão confessar o que não temos e que não fazemos o que é de nosso dever, desejando graça e uma consciência alegre? Tal confissão deve e tem que acontecer incessantemente, enquanto vivemos. Pois, na verdade, o ser cristão consiste em reconhecer que somos pecadores e pedir misericórdia” (LUTERO, Martinho, Obras Selecionadas, vol. 7, p. 443).

Wilhelm Löhe diz a respeito da confissão de pecados no início do culto: “Queres, com a comunidade, aproximar-te do Senhor. O que deves fazer antes de mais nada, sejas tu pastor ou ovelha? Fazes o que todas as religiões simbolizam em suas abluções como necessidade das almas, isto é, lava os pés, que ficaram empoeirados nas andanças diárias. Em outras palavras: prepara-te para o culto pela confissão de pecados e a santa absolvição. Tua primeira devoção é, portanto, o Confiteor [= eu confesso], que não se pode manifestar numa forma mais bonita do que a alternada, na qual o sacerdote e a comunidade se consolam mutuamente” (LÖHE, Wilhelm, in: WANKE, Sigmund, Questões Litúrgicas, p. 22).

A confissão de culpa e posterior absolvição são uma necessidade da pessoa cristã que “deseja graça e uma consciência alegre”. É a possibilidade que Deus nos oferece de uma mudança de atitude para com ele e o próximo. Especialmente no final de uma caminhada e no início de uma nova, é importante que haja avaliação e preparo, arrependimento, para que, libertos dos erros cometidos, possamos seguir a caminhada. O Advento é um tempo especial para tanto, como período de transição no início de um novo ano da Igreja.

O arrependimento em João Batista (metanoia) se apresenta em mudanças bem concretas de atitude no dia-a-dia (v. 10-14). Deixar de lado o acúmulo, a ganância e partilhar os bens, roupa e comida. Deixar de lado a exploração do povo, a cobrança abusiva de impostos. Deixar de lado a extorsão e a difamação e buscar o sustento de modo honesto. O desejo de voltar para junto do Pai provoca mudança de atitude na relação com o próximo e com o meio em que vivemos. O sinal da cruz é bom exemplo: a reconciliação com o Pai, traço vertical; traz reconciliação com o próximo, traço horizontal.

Que mudanças concretas de atitude precisam acontecer hoje?

Certamente a culpa não é algo só individual, mas também coletivo; ela faz parte de nossas relações viciadas. Seria bom se em família, por exemplo, pudéssemos nos reunir e avaliar o que não está bem, onde erramos em conjunto. Este também parece um bom exercício para a equipe de trabalho, para o presbitério.

Parte integrante do momento de confissão é a absolvição. A respeito dos dois elementos, Lutero escreve: “A confissão consiste de duas partes. A primeira parte é obra e ação nossa: que lamenta meus pecados e anela consolo e alívio para minha alma. A outra parte é uma obra que Deus realiza, absolvendo de meus pecados, pela palavra que colocou na boca do ser humano. Esta, aliás, é a obra mais sublime e nobre, que torna a confissão tão deleitosa e consoladora” (LUTERO, Martinho, Obras Selecionadas, vol. 7, p. 444).

Mais uma vez transparece a alegre gratidão de Lutero pela possibilidade de confissão de pecados, pela possibilidade de sermos aliviados do fardo que nos pesa.

Nas comunidades onde atuamos, o abraço da paz, juntamente com o voto: “A paz de Cristo seja contigo!”, segue a absolvição como gesto concreto de mudança de atitude. É um momento em que, após a confissão e absolvição, experimentamos “graça e uma consciência alegre”.

Ao voltar para junto de Deus, no compromisso da mudança de atitude frente ao próximo, no dia-a-dia, podemos, agora sim, festejar. As leituras bíblicas de Sofonias e Filipenses nos convidam para tanto nesse tempo de Advento, na proximidade iminente do Natal.

O testemunho concreto, fruto da graça imerecida, faz com que vejamos e percebamos que há esperança, que Deus está conosco (Emanuel). O texto de Lc 3 diz: “As esperanças do povo começaram a aumentar” (v. 15).

A expectativa da vinda iminente do Messias, anunciada por João Batista, faz com que gradualmente aconteça metanoia, concretamente (v. 10-15). E com isto a alegria vai aumentando.

É preciso viver o tempo de Advento por inteiro. Este é o tempo em que gradativamente vamos nos preparando, avaliando e mudando de atitude. Na coroa de Advento, as velas vão sendo acesas, uma de cada vez. É importante que a luz não venha de supetão, toda de uma vez; mas que o anúncio da vinda do Salvador tome conta de nós e nos transforme. Este é o tempo propício para quebrar com a lógica que nos atropela dia após dia. Não vamos permitir que o Natal chegue e passe rápido demais; tão rápido que não nos permita parar para refletir e mudar de atitude; tão rápido que nem nos toque e dê a oportunidade de confessar.

Confissão de pecados e absolvição,
um constante anúncio do Evangelho

3. Elementos litúrgicos

Confissão de pecados –

O: Ouve, Senhor, estamos clamando, tem piedade de nós e nos responde.
C: /: Ouve, Senhor, estamos clamando; tem piedade de nós e nos responde. :/

Anúncio da graça –

O: Deus realmente nos ouve e nos responde, porque está escrito: “Ó Deus, não há outro deus como tu, pois perdoas os pecados e as maldades daqueles do teu povo que ficaram vivos. Tu não continuas irado para sempre, mas tens prazer em nos mostrar sempre o teu amor” (Mq 7. 18). Glória a Deus nas alturas e paz entre nós.
C: Glória, glória, glória a Deus nas alturas. Glória, glória, paz entre nós, paz entre nós.
O: Reconciliados com Deus, também o estamos uns com os outros.
A paz do Senhor seja conosco! (Mt 28.9; Lc 24.36)
C: Amém.

Abraço da paz –

O: Vamos anunciar a paz de Cristo também uns aos outros por meio de um abraço ou de um aperto de mão, dizendo: “A paz de Cristo seja contigo!”.

Sugestão de hinos – Hinos do Povo de Deus, vol. 2, n° 308 – Advento é tempo de preparação (se não for possível cantar este hino, talvez se possa fazer sua leitura.); Hinos do Povo de Deus, vol. 1, n° 1 – Como hei de receber-te.

Bibliografia

GOPPELT, Leonhard. Teologia do Novo Testamento. Teológica, 2002. p. 70-79.
LUTERO, Martinho. Obras Selecionadas. Sinodal/Concórdia, 2000. vol. 7. p. 442-446.
MESTERS, Carlos; LOPES, Mercedes. O Avesso é o Lado Certo – Círculos Bíblicos sobre o Evangelho de Lucas. CEBI/Paulinas, 1998. p. 49-52.
VOIGT, Gottfried. Die Grosse Ernte – Homiletische Auslegung der Predigttexte der Reihe V. Vandenhoeck & Ruprecht, 1976. p. 23-30.
WANKE, Sigmund. Questões Litúrgicas. Sinodal, 1996. p. 21-28.

Proclamar Libertação 29
Editora Sinodal e Escola Superior de Teologia


Autor(a): Claus Dreher
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Advento
Perfil do Domingo: 3º Domingo de Advento
Testamento: Novo / Livro: Lucas / Capitulo: 3 / Versículo Inicial: 7 / Versículo Final: 18
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2003 / Volume: 29
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 7102
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