Marcos 1.21-28

Auxílio Homilético

29/01/2012

Prédica: Marcos 1.21-28
Leituras: Deuteronômio 18.15-20 e 1 Coríntios 8.1-13
Autora: Aline Danielle Stüewer e Joel Haroldo Baade
Data Litúrgica: 4º. Domingo após Epifania
Data da Pregação: 29/01/2012
Proclamar Libertação - Volume: XXXVI

1. Introdução

A temática sugerida pelo texto da prédica para este domingo é controversa e, em certa medida, até polêmica, qual seja: a possessão demoníaca. Justamente por isso, cabe um cuidado todo especial na interpretação e preparação da mensagem, para que não se chegue a um beco sem saída. Para auxiliar, poderíamos fazer a seguinte relação entre os três textos de leitura. O profeta do qual fala o texto de Deuteronômio 18.15-20 possui todas as características com as quais se descreve Jesus no texto de Marcos 1.21-28: alguém a quem as pessoas ouvirão; que provém do meio do povo, Jesus é de Nazaré, ele é judeu; e em sua boca está a palavra de Deus. A relação com o texto de 1 Coríntios 8.1-13 é mais subjetiva, de modo que proponho tomá-lo como chave de leitura para o texto da pregação, visto que a temática sugerida pelo evangelista Marcos é controvertida. Nesse sentido, poderíamos relacionar a possessão demoníaca, mencionada por Marcos, com a prática de comer carne sacrificada aos ídolos, referida pelo apóstolo Paulo. Assim como a prática de não comer carne sacrificada aos ídolos é comum entre os pequeninos na fé, ocorre também com a crença na possessão demoníaca. Além disso, não se pode ignorar as consequências de uma eventual interpretação literalista do texto de Marcos, no sentido de ver no “espírito mau” (Nova Tradução na Linguagem de Hoje) ou “espírito imundo” (Almeida, Revista e Atualizada) uma entidade divina ou semidivina antagônica ao Deus cristão, pai de Jesus Cristo. Novamente Paulo nos ajuda ao dizer que, como cristãos, cremos num único e verdadeiro Deus, pois “sabemos que o ídolo, de si mesmo, nada é no mundo e que não há senão um só Deus” (1Co 8.4).

2. Exegese

O texto de Marcos 1.21-28 possui apenas um paralelo em Lucas 4.31-37, sendo que Marcos serviu de fonte para a composição de Lucas. Os acréscimos e omissões de Lucas em relação a Marcos devem-se, possivelmente, ao contexto distinto de composição dos respectivos evangelhos e ao estilo de cada autor e não incidem sobre a mensagem central do texto. Essa, a nosso ver, está em Marcos 1.24 e Lucas 4.34, sendo que aí não há qualquer diferença entre os dois evangelistas Vejamos agora uma análise mais detalhada do texto de Marcos 1.21-28. Foram comparadas as traduções de quatro versões portuguesas (NTLH, Almeida RA, Jerusalém e Pastoral).

V. 21 – Dá conta do local onde se desenrola a cena. Não há uma diferença substancial entre as diferentes versões do texto. Nas versões de NTLH e Pastoral, há uma explicitação dos sujeitos da ação. NTLH menciona Jesus e os discípulos, e a versão Pastoral cita Jesus. Nas demais versões, bem como no texto grego, os sujeitos permanecem ocultos. A referência ao sábado e à sinagoga é importante, pois são centros em torno dos quais se articula a religiosidade judaica da época.

V. 22 – As pessoas ficaram impressionadas com a maneira de Jesus ensinar. Seu jeito era diferente daquele praticado pelos escribas e fariseus. O que marcava as pessoas não era tanto o conteúdo do ensino de Jesus, mas o seu jeito de falar. Ele conhecia o que falava, falava com autoridade. Do ponto de vista antropológico, a autoridade é fundamental para que o ser humano aceite uma nova ideia ou ensino. Falar com autoridade significa expressar-se não apenas com palavras, mas também com gestos e ações.

V. 23 – A tradução correta para pneuma akatharton é “espírito impuro” e não “espírito mau”, como as versões Pastoral e NTLH traduzem. A impureza, nesse caso, era em sentido ritual e cultual. Uma pessoa era considerada impura quando, por exemplo, entrava em contato com coisas, seres ou lugares impuros. Um “espírito impuro” impedia que a pessoa atingisse santidade plena e abrangente. No tempo de Jesus, uma pessoa era considerada impura por tocar em leprosos, comer com publicanos, comer sem lavar as mãos etc. Qualquer pessoa que a tocasse era contaminada. Uma pessoa que era declarada impura não podia mais estar diante de Deus no Templo nem receber a bênção. Ela deveria antes se purificar.

V. 24, 25 e 26 – Também o homem dominado pelo “espírito impuro” reconhece em Jesus alguém diferente. Jesus não fala como qualquer um e não é qualquer um, mas é o “Santo de Deus”. Apesar da visão dualista da época, o evangelista Marcos parece usar as crenças em demônios e, no caso, espíritos impuros e as contrapõe a Jesus. Jesus, ao mesmo tempo em que respeita a crença das pessoas, também mostra a elas que esses espíritos não têm poder nenhum.

V. 27 e 28 – Essa atitude de Jesus teve grande impacto sobre o povo, pois as pessoas perceberam que, em Jesus, aquele “espírito impuro” não tinha poder; ao contrário, até mesmo ele o temia. Jesus passou a ser conhecido em todos os lugares por sua maneira diferente de ser e por seu poder.

3. Meditação

Acredito que é importante explicar para a comunidade o significado da palavra “espírito impuro”, para que fique mais claro o significado do ato de Jesus. Ou seja, Jesus não está lutando contra uma divindade, mas está se opondo a atitudes e ações que nos afastam de Deus.

É interessante destacar que, para Marcos, o primeiro milagre de Jesus foi justamente a expulsão de um “espírito impuro”. Para Marcos e para as pessoas da época, um “espírito impuro” era um poder do mal, algo hostil a Deus. As pessoas viviam com medo, sempre ameaçadas por coisas e pessoas que colocavam as suas vidas em perigo. A pessoa possuída pelo “espírito impuro” não poderia estar em comunhão com Deus, nem mesmo com as outras pessoas. Por isso elas eram afastadas e excluídas do convívio social.

Nesse sentido, cabe perguntar hoje pelos poderes que nos afastam do convívio com as pessoas e com Deus. O poder que nos tem afastado do convívio com Deus e com as pessoas é o pecado. O pecado, além de nos afastar de Deus, amarra-nos e nos torna dependentes. Assim, podemos destacar diversos poderes que nos tiram do convívio com Deus.

Na sociedade em que vivemos, há vários poderes que prejudicam nosso relacionamento com Deus e com o próximo. Numa sociedade em que crescemos ouvindo que o importante é ter e não ser, é comum vermos pessoas se perderem de si mesmas para conseguir ter o que querem. Dentro desse contexto, a ganância acaba levando as pessoas a mentir e a pisar em outras para adquirir o que desejam.

Nessa sociedade capitalista, as pessoas acabam se tornando escravas do dinheiro e também do trabalho. Como é comum ouvirmos pessoas reclamarem que não têm mais tempo para nada! Quando o ser humano se torna escravo do trabalho, então a família acaba sofrendo a ausência e a falta de atenção do pai, da mãe, da esposa, do esposo. A instrução e a educação dos filhos e filhas diante disso são relegadas a terceiros, preponderantemente à escola, levando ao estranhamento dos membros da família e à sua desintegração.

Além disso, a dificuldade de perdoar tem levado muitas pessoas a se afastar de seus amigos e até familiares. Quantas histórias de famílias que ficam anos sem se falar, porque ninguém quer dar o braço a torcer. O orgulho é mais forte do que o amor. Assim, essas pessoas são dominadas pela raiva, pelo rancor e pelo ódio.

Na sociedade em que vivemos, muitas pessoas se perdem em si mesmas e, num ato desesperado, procuram algo que as afaste do “poder do mal”. Cada vez mais percebemos o quanto as pessoas estão se apegando a crenças e fazendo delas o seu deus. Acreditam que, fazendo simpatias, podem reconquistar um amor perdido ou até mesmo resolver os conflitos em casa. Acreditam que os horóscopos podem mostrar o seu futuro e oferecer-lhes orientação. Fazem de amuletos e fitinhas o seu deus protetor. Sempre que o ser humano coloca a sua confiança em algo além de Deus, está se afastando do Deus verdadeiro e passa a viver possuído de “outros espíritos”.

Somente Jesus tem o poder de combater o poder do pecado. Perto de Jesus, nenhum mal tem poder. Somente Jesus tem o poder de afastar-nos do mal e aproximar-nos de Deus. Jesus veio exatamente para restabelecer a nossa comunhão com Deus.

Quando ouvimos os ensinamentos de Jesus, então reaprendemos o verdadeiro sentido da vida e somos libertos daquilo que nos domina. A palavra de Jesus tem o poder de transformar as nossas vidas e libertar-nos dos poderes que ameaçam a nossa liberdade.

4. Imagens para a prédica

A estória a seguir pode ajudar a ilustrar o domínio que o vício pode ter sobre uma pessoa e o poder de transformação da palavra de Deus:

“Um soldado lutava desesperadamente contra a bebida. Ele havia chegado até tenente-coronel. Mas, por causa da bebida, ele foi rebaixado e rebaixado. No final, ele voltou a ser apenas um soldado. Ele sabia que, se fosse achado de novo bêbado, iria para a cadeia. Um dia, ele estava deitado no quartel quando um monge entrou. O velho frade passou entre os soldados distribuindo literatura. Quando ele chegou ao soldado, ele percebeu sua aflição. O soldado mandou-o embora, dizendo que não acreditava em Deus. Mas o frade continuou a falar. Ele disse que ele também havia lutado contra a bebida. Ele falou que conhecia um poder que poderia libertá-lo. Ele deu um pequeno Novo Testamento para o soldado com as seguintes instruções:

‘Cada vez que você sentir vontade de beber, tome seu Novo Testamento e leia o evangelho. Antes de você terminar, o desejo passará’.

O soldado agradeceu, mas, quando o frade foi embora, ele jogou o Novo Testamento na cabeceira e foi dormir. Mais tarde, ele acordou com um desejo infernal de beber. Ele sentiu aquela força incontrolável, aquele desejo de mergulhar na bebida.

Quando ele estava se arrumando para ir ao bar, lembrou das palavras do frade. Ele viu a Bíblia, pegou-a e começou a ler. Em menos de meia hora, ele havia lido vários capítulos. E – o mais incrível – ele não queria mais beber. Daquele dia em diante, cada vez que ele sentia desejo de beber, ele pegava a Bíblia e começava a ler o evangelho. Em pouco tempo, ele deixou de vez de beber e ficou curado.” (Autor desconhecido)

5. Subsídios litúrgicos

Como a temática do culto fala de libertação dos poderes que nos dominam e nos escravizam, poderia haver um momento em que as pessoas vão até a frente e pedem que o poder de Jesus as liberte de tudo aquilo que as afasta de Deus e das pessoas. Esse momento poderia acontecer com a unção com óleo, e o ministro ou a ministra podem dizer as seguintes palavras: “O poder de Jesus te liberta e te reaproxima de Deus”.

Bibliografia

MESTERS, Carlos; LOPES; Mercedes. Caminhando com Jesus: Círculos Bíblicos do Evangelho de Marcos. 2. ed. São Leopoldo: CEBI, 2008.
WEGNER, Uwe. Demônios, maus espíritos e a prática exorcista de Jesus segundo os evangelhos. Estudos Teológicos, São Leopoldo, ano 43, n. 2, p. 82-103, 2003.
 


Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Epifania
Perfil do Domingo: 4º Domingo após Epifania
Testamento: Novo / Livro: Marcos / Capitulo: 1 / Versículo Inicial: 21 / Versículo Final: 28
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2011 / Volume: 36
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 25619
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