Marcos 6.30-34

13/08/2000

Prédica: Marcos 6.30-34
Leituras: Jeremias 23.1-6 e Efésios 2.13-22
Autor: Ivo Schoenherr
Data Litúrgica: 9° Domingo após Pentecostes
Data da Pregação: 13/08/2000
Proclamar Libertação - Volume: XXV
Tema: Pentecostes


1. Observações introdutórias

Marcos 6.30-34 é o texto principal indicado para motivar a mensagem no 9° Domingo após Pentecostes. Há um estudo do texto com boas informações exegéticas em Proclamar Libertação, vol. XIX, p. 206-210, um trabalho de Carlos Luiz Ulrich e Claudete Beise Ulrich. Sugerimos ler essas informações. Concordamos com ambos que o ponto central do texto é o ensino. Gostaríamos de propor a ampliação do texto. Propomos a inclusão dos versículos 31-44, pois os mesmos mostram a prática de ensino de Jesus. Esses versículos esclarecem o conteúdo e a forma do ensinamento de Jesus. O ensinamento dele não se constitui num conjunto de conhecimentos bem elaborados e teoricamente refletidos, mas numa prática de vida. Jesus ensina a respeito do amor de Deus, da compaixão de Deus e pratica o amor e a compaixão de Deus.

Jeremias 23.1-6 e Efésios 2.13-22 acompanham como textos de leitura. O texto de Jeremias denuncia a irresponsabilidade das lideranças de Israel que não cuidaram das ovelhas de Deus, isto é, do povo de Deus. Esses pastores dispersaram e afugentaram as ovelhas de Deus, pois não tinham compaixão do povo. Ao mesmo tempo, anuncia a intervenção de Deus. Ele vai recolher as suas ovelhas e levantar entre o povo um pastor que vai trazer salvação, segurança e justiça. Deus tem compaixão do povo. Por isso, esse pastor também terá compaixão do povo. O texto de Efésios anuncia a ação de Deus em Jesus Cristo, que reconciliou todos os povos num só corpo. Fez isto por amor ao povo. Por isso, todos somos concidadãos e somos da família de Deus.

Jesus ensina o povo. Que são essas muitas coisas que Jesus ensina? Como Jesus ensina? O que nós, comunidades, vamos ensinai'.' Como nós, comunidades cristãs, podemos ensinar? Estas perguntas vão nortear as nossas reflexões.

2. Ouvir e ver

Os apóstolos retornam da missão e relatam tudo a Jesus. E Jesus ouve o relato da ação e do ensinamento dos apóstolos. Ele ouve os seus apóstolos com atenção. Também olha para os mesmos. Percebe que eles estão cansados. Reali¬zaram muito trabalho. Eram muitas as pessoas que tinham necessidades. Por isso, muitos iam e vinham ao encontro dos apóstolos. Jesus percebe a realidade que experimentam os seus apóstolos, pois ele ouve e vê. Jesus também vê a grande multidão. Olha para essa multidão com um coração cheio de amor. Ele ama o povo. Tem compaixão do povo. Jesus não olha para a multidão com os olhos da condenação nem da reprovação. Este é o primeiro passo da prática de ensino de Jesus. Ele ouve e vê. Ouve o que as pessoas falam e sentem. Vê em que realidade vivem as pessoas.

Nós ouvimos uns aos outros nas nossas comunidades? Nós, como comunidades e como pessoas cristãs, ouvimos o que dizem e sentem as pessoas que nos cercam? Nós, comunidades, olhamos para o povo e vemos a situação em que vive? Ouvimos, olhamos e conhecemos a realidade em que vivemos como cristãos? Nem sempre ouvimos e olhamos com atenção para a realidade que nos cerca. Muitas vezes nem conhecemos bem a situação dos próprios companheiros e companheiras. Quantas vezes já nos surpreendemos com dificuldades e problemas de colegas de presbitério e ministério! Precisamos aprender com Jesus, tanto nós os pastores como todas as lideranças das nossas comunidades. É muito importante ouvir e ver a realidade e a situação das pessoas antes de falar alguma mensagem ou proposta. Muitas vezes estamos tão preocupados conosco mesmos, com a nossa família, com a nossa comunidade e com os nossos objetivos que não percebemos a verdadeira situação em que vivem as pessoas que nos cercam. E assim muitas vezes também erramos o alvo. A nossa mensagem não chega. Jesus nos ensina a ouvir e ver.

3. Julgar

Jesus faz um julgamento da situação dos seus discípulos. Eles estão cansa¬dos. Não têm tempo nem para comer. Sempre estão ocupados e envolvidos com o povo. Muita gente vai e vem. As pessoas precisam dos discípulos. Jesus avalia os seus discípulos com amor, com carinho, com compaixão. Jesus também faz um julgamento da situação da multidão. Eram como ovelhas sem pastor. Pastores incluem todas as lideranças de Israel. Pastores são os governantes, os sacerdotes, os integrantes do sinédrio, os escribas, as autoridades romanas. O povo está sem pastor porque as autoridades do seu tempo não fazem aquilo que cabe aos pastores do rebanho, do povo. Não olham o povo com compaixão. Não organi¬zam o povo para a vida. As ovelhas estão desnorteadas, sem rumo, sofrendo limito. Jesus olha para o povo com compaixão. Ele olha e sofre junto com aqueles que estão sofrendo. Avalia, porém, negativamente a atuação dos pastores, tias lideranças. Não se ocupam verdadeiramente com o povo. Não sofrem junto com o povo. Não têm compaixão. Jesus ouve e vê os outros como sujeitos e não como objetos. Ele olha e vê as pessoas e o povo com compaixão, com amor, com compreensão e carinho. Este é o segundo passo da prática de ensino de Jesus. Como nós nos avaliamos mutuamente? Olhamos uns para os outros com amor e carinho? Como nós avaliamos a nossa atuação como comunidades'/ Como olhamos para os membros engajados nos trabalhos da comunidade? Como olhamos para a situação do nosso povo? Olhamos com compaixão? Fazemos a nossa avaliação com amor e carinho? Como nós avaliamos a atuação das nossas lideranças hoje? Muitas vezes julgamos as pessoas com os nossos critérios e valores sem procurar entender por que sua atuação é assim. Quantas vezes olhamos nossos semelhantes com olhos de reprovação, de condenação, de desconsideração, com indiferença, com arrogância! Quão poucas vezes olhamos com compaixão uns para os outros e para o povo! Precisamos aprender com Jesus a ouvir e a ver com compaixão, com amor e carinho. É assim que Jesus julga as pessoas e as situações.

4. Agir

Jesus tem propostas de ação. Essas propostas de ação resultam de uma observação e de um julgamento feitos com amor, como alguém que sofre junto com os que sofrem. Por isso, ele tem uma proposta para os apóstolos. Diz que venham repousar um pouco à parte num lugar deserto. Ela se concretiza. O texto constata: Foram sós no barco para um lugar solitário. Jesus tem também uma proposta para o povo. E passou a ensinar-lhes muitas coisas. A proposta de Jesus para o povo é o ensinamento. O povo precisa saber das coisas. Precisa aprender para poder enfrentar a situação. Qual o conteúdo do ensinamento? O ensinamento de Jesus é prático. Tem a ver com vida. A proposta de Jesus é participativa. Os discípulos participam na prática do ensino. Seu ensinamento é participativo. Sua prática é participativa. Certamente Jesus fala do amor de Deus para as pessoas. Fala também do amor ao próximo. Certamente fala também da partilha. Certamente fala da organização do povo a partir das bases com a participação de todos. Não há problema sem solução. Precisamos enfrentá-los com os recursos que possuímos. Mas Jesus também pratica esse ensinamento com o povo. Ele toma as providências para ensinar o povo. Este é o terceiro passo da prática de ensino de Jesus.

O ensinamento acontece numa situação vivencial do povo: a fome. Está anoitecendo. As pessoas precisam comer. Estão com fome. Os discípulos vêem a realidade. Possuem 200 denários. O grupo todo tem dois peixes e cinco pães Como resolver o problema da fome?

Os discípulos de Jesus só vêem uma solução individual para o problema da fome. Sugerem que Jesus despeça o povo. Que cada um vá comprar para si o que comer. Que cada um vá resolver o seu problema. Eles ensinam o amor de Deus e o amor ao próximo, mas não vivem o amor de Deus e ao próximo. Vivem o amor a si mesmos. Dizem: Iremos comprar 200 denários de pão para dar-lhes de comer? Mas isto é muita despesa. São 200 dias de trabalho. Não querem gastar o dinheiro da sua caixinha. Nós muitas vezes pensamos assim também. Cada um que resolva como vai arrumar o seu pão de cada dia! Pouco nos preocupamos realmente com os desempregados da nossa comunidade ou das nossas cidades. Que dêem um jeito. O nosso dinheiro precisamos para nós mesmos. Os nossos 200 denários precisamos para nós mesmos, para a nossa família e para a nossa comunidade.

Jesus tem outra proposta. Ela é coletiva. É comunitária. Ele propõe a organização em pequenas comunidades. Comunidades compostas de 100 e 50 pessoas. Ele propõe a partilha do todo. A multidão de pessoas possui pouco. Só cinco pães e dois peixes. Nós muitas vezes também achamos que temos muito pouco para repartir. Não temos o suficiente para nós. Mas o pouco repartido é o suficiente para todos. Nós muitas vezes falamos e anunciamos o amor de Deus para as pessoas. Motivamos as pessoas para a prática do amor ao próximo, mas falta-nos a prática verdadeira deste amor. Falta-nos a vontade para a partilha. Temos dificuldades até para uma partilha interna na comunidade. Temos dificul¬dades para apoiar causas que defendam uma proposta comunitária de partilha. Precisamos nos conscientizar da proposta de Jesus e falar dela com entusiasmo para as pessoas. Precisamos junto com a comunidade encontrar formas práticas para concretizar a partilha.

5. O que pregar?

Primeira proposta

Sugerimos colocar como tema da pregação o ensino nas nossas comunidades.
Podemos num primeiro momento propor para a comunidade fazermos um questionamento do conteúdo do nosso ensinamento e da nossa maneira de ensinar nas comunidades. Começamos com duas questões: 1) Qual o conteúdo do nosso ensinamento? Qual o conteúdo do ensinamento da Igreja? 2) Como ensinamos nas nossas comunidades? Como olhamos para os outros? Como vemos os outros? Com que espírito nos ouvimos e vemos mutuamente? Após um pequeno momento de reflexão em pequenos grupos de três ou quatro pessoas, comparti-lhamos as nossas respostas com todos.

Agora, num segundo momento, vamos fazer a leitura do texto e falar da proposta de Jesus, do conteúdo do seu ensinamento. Vamos falar da compaixão de Deus. Vamos falar desse Deus que se encarnou em Jesus Cristo, mostrando todo o seu amor por nós. Ele veio para sofrer junto com os que sofrem. Vamos mostrar que Jesus é o bom pastor, que sofre junto com os sofredores. Vamos falar de sua proposta de partilha e organização popular.

Num terceiro momento vamos falar que o ensinamento de Jesus é prático. Ele mesmo o faz e vive. Tem compaixão do povo. Organiza o povo. Não manda ninguém embora de mãos vazias.
Num quarto momento vamos falar da nossa atuação como comunidades. Vamos nos propor a ouvir e a ver as ovelhas desgarradas, desviadas, perdidas, desesperadas, desorientadas das nossas comunidades e das nossas cidades. Vamos nos propor a ver essas ovelhas com os olhos da compaixão, daqueles que sofrem junto com os sofredores. Vamos nos propor a criar condições para que a partilha se torne uma realidade nas nossas comunidades, cidades e país.

Segunda proposta

Propomos partir de uma situação concreta para fazer a reflexão sobre o nosso ensinamento. A situação escolhida será a situação da má distribuição da comida e a realidade da fome.

Propomos num primeiro momento fazer uma dinâmica para facilitar a pregação. O coordenador do culto leva um pão pequeno para o culto. Faz circular esse pequeno pão entre os participantes do culto e solicita que cada tire um pedaço para si, sem dizer quanto cada um pode pegar. Depois que o pão circulou entre todos os participantes o pregador poderá constatar duas situações. Uma: cada um pegou um pedaço pequeno e ainda sobrou pão. Outra: alguns consegui¬ram pegar um pedaço e outros ficaram sem pão. Após a constatação de uma desta situações o pregador fará uma reflexão com a comunidade. No primeiro caso o pregador perguntará por que todos conseguiram pegar um pedaço e ainda sobrou pão. No segundo caso o pregador partirá dessa experiência e perguntará pelo motivo por que alguns ficaram sem pão. Promoverá então uma reflexão sobre a distribuição do pão em nosso mundo.

Num segundo momento fará a leitura do texto de Mc 6.30-44. Falará do conteúdo do ensinamento de Jesus. Falará da compaixão de Deus. Falará da proposta de partilha de Jesus. Falará também da proposta de organização de Jesus em pequenas comunidades que partilham.

Num terceiro momento falará das experiências de partilha já existentes na comunidade e criará junto com a comunidade novas propostas para a partilha, concretizando assim a compaixão de Deus pelas ovelhas que não têm pastor.

Bibliografia


ALEGRE, Xavier. Marcos ou a correção de uma ideologia triunfalista. São Leopoldo : Centro de Estudos Bíblicos, 1988. (A Palavra na vida, 8).
CEBI-GO. Rumo ao novo milénio com o Evangelho de Marcos. São Leopoldo : Centro de Estudos Bíblicos, 1997. (A Palavra na vida, 110).
DELORNE, J. Leitura do Evangelho segundo Marcos. São Paulo : Paulinas. 1985. (Cadernos bíblicos, 11).
MOSCONI, Luís. O Evangelho segundo Marcos. São Leopoldo : Centro de Estudos Bíblicos, 1989. (A Palavra na vida, 24).
SCHNIEWIND, Julius. Das Evangelium nach Markus. Berlin : Evangelische Verlagsanstalt, 1958. (Das Neue Testament Deutsch, 1).

Proclamar Libertação 25
Editora Sinodal e Escola Superior de Teologia


Autor(a): Ivo Schoenherr
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 9º Domingo após Pentecostes
Testamento: Novo / Livro: Marcos / Capitulo: 6 / Versículo Inicial: 30 / Versículo Final: 34
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1999 / Volume: 25
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 12825
REDE DE RECURSOS
+
O santo povo cristão é reconhecido exteriormente por meio da salvação da santa cruz.
Martim Lutero
© Copyright 2024 - Todos os Direitos Reservados - IECLB - Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil - Portal Luteranos - www.luteranos.com.br