Mateus 22.34-40

Auxílio homilético

14/10/1979

Prédica: Mateus 22.34-40
Autor: Silvio Meincke
Data litúrgica: 18º Domingo após Trindade
Data da Pregação: 14/10/1979
Proclamar Libertação - Volume: IV


I - Considerações iniciais

Dois textos seguidos (Mt 22.23-33 e Mt 22.34-40) apresentam-nos dois grupos inimigos de Jesus, os saduceus e os fariseus. Com perguntas traiçoeiras tentam colocar-lhe tropeços, para ridicularizá-lo perante o povo e apresentá-lo como mentiroso. Os saduceus constituem o grupo dos comerciantes economicamente bem situados. Mantêm comércio com outros povos e rejeitam a ideia da escolha divina de Israel, os escritos da Antiga Aliança, a ressurreição dos mortos e os cultos de sábado nas sinagogas. Mantêm boas relações com os romanos e enriquecem à sombra da opressão, como testas de ferro. Apreciam a cultura grega, em voga na época, em relação à qual a ideologia nacionalista e a fé na escolha especial de Israel lhes parece estreita demais. Com a pergunta sobre a situação absurda de uma mulher na eternidade, que teria casado com sete irmãos em vida, querem levar Jesus ao tropeço e ridicularizar a ele e a ressurreição. O Mestre lhes responde com o testemunho da promessa divina de que na ressurreição as pessoas nem casarão e nem se dar em casamento.

Depois dos saduceus aproximam-se os fariseus. Estes são crentes e cumprem a lei. Tomam-na ao pé da letra e Jesus os acusa de hipócritas. Distanciam-se do povo simples em orgulhosa piedade. Tentam embaraçar Jesus com uma pergunta de caráter acadêmico, a qual, esperam, ele não saberá responder: Qual o mandamento mais importante? Compare 22,15ss!

Jesus não cai na armadilha. Perscruta seus adversários e responde o que não podem contestar, com o duplo mandamento do amor a Deus e ao próximo.

Os fariseus recorrem a uma pergunta tão importante como esta pelo maior mandamento e usam-na como arma contra Jesus.

Ele, porém, permanece tranquilo, responde e faz como se não percebesse a intenção maliciosa. Só a partir do texto seguinte (v. 41 ss) ele passa a desnudar a hipocrisia dos seus interlocutores.

II – Meditação

Não levando em conta a intenção maliciosa dos fariseus, constatamos que a sua pergunta é extremamente importante e atual. O que fazer? Em que nos orientar? Qual o critério para as nossas decisões e os nossos posicionamentos? Como discernir entre tantas vozes que querem conquistar os nossos ouvidos? Com que medida medir os nossos valores? O que é importante em primeiro lugar e acima de tudo? Isto são perguntas que dizem respeito a todos, e cada um encontra as suas respostas.

Para nós interessa encontrar a resposta dentro da orientação do Cristo. No nosso texto temos a sua orientação. Ela diz: amor a Deus e ao próximo, acima de tudo, em primeiro lugar; este, pois, deverá ser o critério para nossas palavras, ações, atitudes, decisões e posicionamentos.

Como agir no nosso relacionamento com o vizinho? Com o filho desobediente? Com o aluno revoltado? Com o toxicômano? Com o criminoso político (cujo crime foi pensar diferente e que está apodrecendo na cadeia)? A resposta de Jesus é clara: amor a Deus e ao próximo! Qual o critério para as decisões de um político? Fidelidade partidária, estratégia eleitoral, ou obediência (amor) a Deus e benefício (amor) ao povo? Como tratar os presos? Jogá-los em masmorras infectas, ou proporcionar-lhes meios de recuperação? Qual o critério para a questão fundiária brasileira? Grandes empresas para exportação e pagamento de dívidas que o povo não fez, ou terra para os 8.000.000 de bóias-frias que vivem em condições subumanas? Que critérios usar na administração pública? O critério será o frio esquema de burocratas e computadores, ou será o critério o (amor ao) homem. Qual o critério no trabalho de uma Igreja? De uma Comunidade? Instituição forte, ou amor ao homem?

A proposta de Cristo é muito clara: amor a Deus e ao próximo!

Amor a Deus e ao próximo estão estreitamente relacionados, sem serem sinônimos, como querem alguns. Amor a Deus não se esgota em amor ao próximo, muito menos se resume em humanismo, assim como Deus não acontece na comunhão e nela não se resume. Ele está acima e leva à comunhão. Amor ao próximo brota e nasce do amor a Deus. Aquele é consequência deste.

Amor ao próximo não se pode forçar com boa vontade e autodomínio Neste caso não mais seria amor. mas lei Amor ao próximo nasce da experiência do amor de Deus por nós, onde a pessoa se sabe amada, aceita, guardada, segura. Este sentimento de saber-se amado liberta o homem da necessidade de guardar-se a si mesmo, de garantir a sua vida por meios próprios, de conquistá-la com punhos e cotovelos, de autojustíficar-se, de elevar-se às custas dos outros, de munir-se de escudos, couraças e máscaras para defender-se, enfim, de amar--se a si mesmo em primeiro lugar (veja Mt 10.39). Sabe que outro o defende, outro o garante e assim fica com as duas mãos livres para amar.

Sem esta libertação todo pretenso amor não passará de mascara, estratégia, demagogia, golpe, negócio, meio de opressão. Os fariseus eram piedosos, mas não amavam. Procuravam conquis¬tar a vida pelo cumprimento das leis. Faltava-lhes confiança para abandonarem-se nas mãos do Senhor. Por isto estavam ocupados consigo mesmos. Eram convertidos, mas não estavam libertos e por isto sua piedade montou um esquema ideológico e político de opressão. A necessidade de cada um conquistar a vida estruturou-se, oficializou-se em esquema opressor (compare esquemas opres¬sores que tomam a máscara de Cultura Ocidental e Cristã - Índole Pacifista do Povo Brasileiro - Esquema de Combate ao Comunismo - Eliminação do Perigo da Subversão, máscaras que se coloca em esquemas de opressão de todos aqueles que se manifestam em favor de uma maior justiça na distribuição das riquezas, em favor da eliminação das torturas nas prisões, etc.).

Sem a libertação que nasce da confiança no amor de Deus também o amor do pastor será esquema para ser benquisto; o amor do político será estratégia eleitoral; o amor do presidente de Paróquia será meio de obter prestígio; a contribuição do comerciante para a festa da Comunidade será isca para conquistar freguesia; o amor do advogado recém formado e que entra no presbitério será golpe para conquistar a clientela evangélica da cidade.

Tudo depende do amor a Deus, do qual brota o amor ao próximo Só a confiança do amor de Deus liberta, transforma corações, capacita para o amor, cria nova criatura. Torna-se, portanto, necessário que ouçamos a boa nova do amor, permitamos que ela penetre em nós, nos atinja, mexa conosco, aja em nós, nos liberte de nós mesmos, nos contamine, acenda em nós a chama do amor.

Acesa a chama, liberto o homem, transformado o coração, nascida a nova criatura, os corações transformados estarão também capacitados para serem fermentos de transformação de situações. Ora, esta é uma questão que os evangélicos devem aprender. Devemos saber que os grandes problemas de desamor e injustiça não se solucionam de indivíduo para indivíduo. Não adianta levar um homem para o asilo, quando neste espaço de tempo são fabricados milhares de novos carentes por um sistema económico, político elitista e concentrador de renda. O amor que se movimentar unicamente no terreno da ajuda a indivíduos isolados não será eficiente na solução de problemas globais. E o cristão que diz não ter nada a ver com os problemas da ordem social, das normas de convivência humana, estará querendo praticar um amor castrado. Porque o desamor estruturou-se em esquemas, oficializou-se em ideologias, montou esquemas para proteger-se, espalhou boatos para justificar-se. O desamor, a corrupção e a injustiça costumam oficializar-se e tomar ares de legitimidade e legalidade. Por isto o amor cristão, depois de transformar corações quer usar estes corações libertos e transformados para transformar normas de convivência humana injustas. Para isto é necessário que pessoas libertas unam-se em grupos de pressão, desmascarem as injustiças. denunciem o desamor, resistam pacificamente à opressão, sejam voz dos que não têm voz e não são ouvidos, tomem o partido do fraco que se esmaga.

O amor de Deus transforma corações e quer, através de corações transformados, transformar situações e normas de convivência social, onde elas devem ser mudadas para melhor.


Autor(a): Silvio Meincke
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 19º Domingo após Pentecostes
Testamento: Novo / Livro: Mateus / Capitulo: 22 / Versículo Inicial: 34 / Versículo Final: 40
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 1979 / Volume: 4
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 14604
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Ó Senhor Deus, o teu amor chega até o céu e a tua fidelidade vai até as nuvens. A tua justiça é firme como as grandes montanhas e os teus julgamentos são profundos como o mar.
Salmo 36.5-6
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