Motivações e Diretrizes para o Trabalho com Crianças e Adolescentes Empobrecidos na IECLB - 1993

15/05/1993

Os meus olhos estão gastos de tanto chorar, estou muito aflito. A tristeza acabou comigo por causa da destruição do meu povo, e porque vejo crianças e bebês morrendo de fome nas ruas da cidade.

Estas crianças dizem: Mamãe estou com fome! Mamãe, estou com sede! Elas caem pelas ruas, como se estivessem feridas, e morrem aos poucos nos braços de suas mães. (Lamentações de Jeremias 2. 11-12)

Como pessoas chamadas por Deus, vemos milhões de crianças em miserabilidade.

Somos Igreja em um país cheio de contradições e injustiças. Em virtude de uma política injusta e concentradora de riqueza; morrem a cada ano 500.000 crianças de doenças facilmente evitáveis; 10% da população detêm 56% do Produto Interno Bruto (PIB); mais da metade da população integra famílias cuja renda per capita é de 1/2 salário mínimo. O Brasil é o quinto produtor de alimento do mundo e, ao mesmo tempo, está em 70º lugar em qualidade de vida. O povo morre de fome. Somos um país rico com uma nação po-bre.

Dentro deste contexto, a criança e o adolescente, filhos da classe empobrecida e marginalizada, são os que mais sofrem, violados em seus direitos básicos, sem acesso à escola, à saúde, à habitação digna, ao lazer.

Também nossos olhos se enchem de lágrimas e o nosso coração se despedaça.

Jesus consumiu a sua vida no serviço ao próximo, assumindo com radicalidade esse servir em amor, a ponto de ter morrido por nós.

Nós, como cristãos da IECLB, somos chamados a testemunhar este amor (Jo 13.35) de forma concreta.

A realidade das crianças e adolescentes empobrecidos tem sido cruel. Justamente neste momento de crueldade e de crise é que o nosso testemunho terá que ser dado com clareza e nitidez.

É nossa tarefa valorizar os sem valor e dignificar os desprovidos de garantias humanas básicas.

Como IECLB queremos fazer isto não por e para nós mesmos, mas para testemunhar o amor de Deus por nós. Amamos, porque ele nos amou primeiro. (I Jo 4.19)

Sendo experimentadores da reconciliação de Deus para conosco, somos impulsionados a esquecer as coisas que ficam para trás e avançar para os desafios que estão diante de nós (Fp 3.13). Neste sentido, precisamos, neste momento histórico em que é formulado e encaminhado este documento, colocar-nos ao lado das crianças e adolescentes empobrecidos, como sinal na busca do Reino de Deus. Isto não quer dizer que a IECLB, até hoje, não tenha uma caminhada neste sentido. Porém, é de se convir de que este trabalho sempre foi feito de forma bastante isolada. Abre-se, agora, a possibilidade de uma caminhada conjunta.

Vale sublinhar que a criança, que também no tempo de Jesus era rejeitada, serve como critério central de Cristo e seu Reino (Mc 10. 13-16). Por isso, desafiamos a todos para uma ação concreta.

A partir do desafio a nós colocado pelo Evangelho em sermos Igreja Missionária a Serviço da Vida, e da motivação dada pela pedagogia de Jesus, entendemos que o referencial metodológico para nossa ação junto à criança e ao adolescente empobrecido é determinado pelos seguintes pressupostos:

* A realidade em que vive a criança e o adolescente empobrecido é fruto de uma estrutura sócio-político-econômica injusta e excludente.

* A criança e o adolescente são sujeitos de direitos.

* A criança e o adolescente devem ser respeitados na sua condição peculiar de ser em desenvolvimento.

A partir destes pontos, destacamos os princípios metodológicos, os quais devem nortear nossa ação.

* Possibilitar à criança e ao adolescente a reflexão sobre sua situação e o porquê da mesma, desenvolvendo uma consciência crítica.

* Possibilitar a participação da criança e do adolescente no processo educativo, a fim de desmistificar a ideologia de que uns sabem e outros não.

* Priorizar a ação que possibilita a convivência familiar e comunitária.

* Desenvolver ações que levem à construção de novas relações de fraternidade, solidariedade e justiça.

* Respeitar os valores e a cultura da criança e do adolescente, com o qual estamos trabalhando.

* Ouvir, amar, respeitar a criança e o adolescente, a fim de que se tornem, de fato, sujeitos de seu processo histórico.

* Desenvolver nossa ação de forma orgânica e articulada com outras instituições e movimentos populares, com vistas à defesa dos direitos e construção da cidadania das crianças e dos adolescentes.

* Desenvolver um trabalho interdisciplinar na perspectiva de atender a criança e o adolescente como um todo (aspectos físicos, psicológicos, espirituais, sociais e culturais).

* Desenvolver ações de denúncia da violação dos direitos da criança e do adolescente, reivindicando o cumprimento do ECA/Estatuto da Criança e do Adolescente, articulada a outros organismos afins, sem perder de vista o papel e o compromisso do Estado.

* Criar espaços na Igreja, em todos os níveis, para a compreensão e abertura ao diferente.

* Realizar uma constante avaliação de nossa ação.

Igreja que prioriza a criança e o adolescente é Igreja que se renova.

Curitiba, 15 de maio de 1993

Consulta Nacional da IECLB sobre Crianças e Adolescentes Empobrecidos
Conselho Diretor da IECLB
 

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