Quanto pior, melhor. Para quem?

09/11/2015

Querida Comunidade

A história do Antigo Testamento sobre a viúva de Sarepta (1 Rs17.8-16) e a história do evangelho (Mc 12.41-44) indicado como leitura para este domingo tem muitas semelhanças. A pergunta que surge é sobre as motivações que levaram essas mulheres a agirem dessa forma. O que motivou essa solidariedade e, até mais do que solidariedade, o que fez tornar o seu coração tão grande?

A viúva deu abrigo e comida a um profeta que precisava fugir por causa de sua profecia subversiva. Abrigar e dar comida a fugitivos e revolucionários era sempre perigoso. No século XIX muitas igrejas – também luteranas, nos Estados Unidos tinham lugares secretos onde escondiam os escravos fugitivos. Essa atitude subversiva gerou a discussão e a criação de uma lei que passou a considerar as igrejas como santuários. Isso significa que eram lugares de refúgio. Qualquer pessoa que buscasse abrigo numa igreja, não podia ser tirado de lá à força.

Escutamos que o profeta Elias é um fugitivo. Jezabel, a esposa do rei Acabe (1 Rs 16.31), seguidora das divindades sidônias, Baal e Asera, liderava um movimento que pretendia oficializar o culto a Baal, deus da chuva e da fertilidade em Israel.. O profeta Elias tinha destituído publicamente o poder de Baal sobre a natureza (1 Rs 17.1). Reivindicou para o Deus de Israel o domínio sobre chuva e seca, sobre fertilidade e esterilidade. E pediu a Deus que não enviasse mais chuva sobre Israel, para castigar o pecado de Jezabel.

Hoje conhecemos essa estratégia política como: quanto pior, melhor, isto é, promover e alimentar situações de crise para castigar quem está no poder. O problema é que quando se quer castigar os poderosos usando essa estratégia, quem acaba pagando a conta são os mais pobres. A crise política e econômica – acaba diminuindo as condições de vida das pessoas. Por exemplo, hoje no Brasil, com a promoção da crise política e econômica - exceto os políticos, os juízes e os bancos - todos ficaram mais pobres.

No texto bíblico, a viúva e seu filho, além de sua condição naturalmente vulnerável (por ela ser viúva e o filho ainda criança), encontram-se em situação de extrema miséria devido à seca prolongada e à fome decorrente dela. Essa seca não é – natural - mas é consequência da falta de vontade política para exercer um bom governo. Quando os governantes (não somente a presidente, mas também os senadores deputados, prefeitos e vereadores) passam todo o tempo brigando entre si, não governam e nem legislam pelo bem estar do povo, a consequência é o sofrimento e o aumento da pobreza. A pobreza gera desigualdade. A desigualdade gera violência. A violência é como a dengue, atinge a tod@s (pobres e os não pobres).

Hoje a seca nos campos e a falta de água nas cidades é mais uma vez um grande problema. O primeiro pensamento vai para Deus. Só Deus pode resolver esse problema de forma imediata, fazendo chover. E é verdade.

Mas os governantes também podem agir hoje para que daqui a 5 anos não tenhamos o mesmo problema, mesmo que não chova por alguns meses. A solução está em favorecer investimento nas pequenas propriedades, na valorização da agricultura de subsistência, da agricultura familiar, da reforma agrária e da preservação do meio ambiente (inclusive das fontes de água). Não há nada de natural nas secas. A culpa pelos problemas com a falta de chuva não é do EL NIÑO, mas a culpa é do EL HOMBRE. Com o desmatamento das matas, tem menos evaporação de água. Por isso, as nuvens não tem agua para derramar em forma de chuva. Deus nos deu a ciência para saber onde estão as causas da maioria de nossos problemas.

Algumas pessoas e o próprio governo têm ouvido esse chamado e levado projetos como as cisternas da Coordenadoria Ecumênica de Serviços (CESE), projetos de geração de renda através da economia popular solidária, do Bolsa Familia, etc... Mas, além dessas medidas importantes e necessárias, ouvimos também outras vozes proféticas como as que vem do Conselho Mundial de Igrejas, que alertam o seguinte: “O modelo de desenvolvimento mundial está ameaçando as vidas e os meios de subsistência de muitas pessoas, especialmente entre as pessoas mais pobres do mundo, e destruindo a biodiversidade. A visão ecumênica é de superação desse modelo baseado no excesso de consumo e na ganância” (Disponível em: http://www.oikoumene.org/en/ what-we-do/climate-change).

Já não é suficiente apontar para o consumo desenfreado como a principal saída para a crise econômica. As mudanças climáticas nos querem chamar a atenção sobre as nefastas consequências desse modelo do “descartável” e do “provisório”. A ação de Elias com a viúva de Sarepta e seu filho indica que pequenas ações podem dar grandes sinais. Para que isso aconteça, precisamos de pessoas que aceitem o desafio de compartilhar a farinha e o óleo através de relacionamentos alternativos, a promover a valorização do meio ambiente urbano e rural, o consumo consciente.

Tanto no meio rural como urbano há exemplos de formas de vida que valorizam o ambiente através da agricultura orgânica, reaproveitamento, reciclagem, valorização do meio ambiente. Alguns, inclusive, são projetos em que há participação das igrejas. A superação da fome não está nos grandes projetos, mas nos pequenos projetos, nos projetos da base, que tem a força da semente transformadora. Quando a semente é vigorosa, ela cria seus próprios meios, ela dá espaço para a autonomia.

É por isso que partilhar e compartilhar é mais profundo do que servir. Abrange as dimensões do amor cristão, a saber: dar e receber; ter compaixão; sofrer junto com o necessitado. “Servir” pode parecer um pouco heróico, convertendo o necessitado em “objeto”. Por outro lado, o compartilhar faz-nos relembrar o doador de todas as coisas, que nos liberta para dar: “De graça recebestes, de graça daí” (Mt 10.8).

Desta forma, o texto da viúva de Sarepta, em consonância com o evangelho de Marcos, nos traz vários ensinamentos.

1. Querer castigar os poderosos com a estratégia do quanto pior, melhor, somente faz o pobre sofrer e não afeta ao poderoso.

2. O texto bíblico também nos ensina que os governos tem mandato de responsabilidade para prevenir situações difíceis. O governo existe para resolver os problemas difíceis. Os problemas fáceis cada um de nós consegue resolver.

3. E um ensinamento mais – para nossa vida pessoal: o texto nos ensina que doar do tudo que temos é fácil; difícil é doar do resto! Essa máxima vale pra toda nossa vida. No início do mês, é fácil ir ao shopping e comprar três sacolas de roupa. Mas depois do dia 20, o cálculo já é um pouco diferente. Tudo é mais fácil quando desfrutamos da fartura. O mesmo vale para a vida. É fácil conviver na alegria e na saúde, mas quando chegam a tristeza e a doença, as coisas ficam bem mais difíceis.

No entanto, apesar das dificuldades e carências não devemos perder a fé e a esperança. Os milagres de Deus acontecem na escassez, não na abundância. Ao reconhecer suas fraquezas e limitações, o ser humano consegue ainda ser generoso e entender a força e o poder de Deus na sua vida. Quanto mais arrasados estamos, mais preparados ficamos para reconhecer a Deus como Senhor, Todo Poderoso.

Todos os milagres de Jesus aconteceram na ausência: de vinho, de pão e peixe, de saúde, de vida; mas nenhum deles se deu na falta de fé e de esperança. Onde está Deus, lá não tem falta. Porque o Reino que Jesus proclama se constrói sobre a generosidade. E nas situações difíceis de nossa vida e de nosso mundo, a presença de Deus nos ajudará a ver os caminhos da superação.
Amém!


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Autor(a): Nilton Giese
Âmbito: IECLB / Sinodo: Sudeste / Paróquia: Belo Horizonte (MG)
Testamento: Antigo / Livro: Reis I / Capitulo: 17 / Versículo Inicial: 7 / Versículo Final: 16
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Prédica
ID: 35714
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