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ID: 2690

Marcos 9.30-37

Auxílio Homilético

23/09/2018

 

Prédica: Marcos 9.30-37
Leituras: Jeremias 11.18-20 e Tiago 3.13-4.3,7-8a
Autoria: Adélcio Kronbauer
Data Litúrgica: 18º. Domingo após Pentecostes
Data da Pregação: 23/09/2018
Proclamar Libertação - Volume: XLII

Morte e ressurreição: vida diferenciada

1. Introdução

As perícopes sugerem uma temática em comum: a corrida do ser humano atrás de prestígio e poder, atrás da satisfação de vontades e desejos. Os textos denunciam implacavelmente uma característica bem perigosa e ameaçadora presente na ação das pessoas: o sentido e o auge da vida acontece quando se alcança o topo, a fim de exercer fascínio e influência sobre os demais, sentir-se superior e impor aos demais a condição de servos. Neste sentido, os textos levantam a temática do exercício da autoridade. A serviço do que a autoridade está posta? Os textos apresentam dois caminhos. Um é pecaminoso e diabólico; o outro é o de Deus. Um promove a morte, a destruição e a guerra; o outro, a vida e a paz. Mais especificamente, o evangelho apresenta uma novidade: a ressurreição. Os discípulos não conseguem entender do que se trata, a mente deles está extremamente influenciada pela lógica do mundo, pois discutem quem será o mais importante.

2. Exegese

Compartilho a ideia de que o Evangelho de Marcos é o mais antigo dentre os sinóticos. Foi escrito por volta do ano 70. Lembramos que foi em 70 d.C. que Jerusalém foi destruída pelos romanos. O autor é desconhecido, no entanto, tem gente que defende a tese de que deve ter sido uma pessoa muito próxima ao apóstolo Paulo. Segundo Oscar Cullmann (2012), era “um judeu transplantado em uma comunidade cristã”. Creio que não há grandes novidades na pesquisa em relação a esses dados sobre o evangelista Marcos.

O objetivo central do evangelho é testemunhar que Jesus é Filho de Deus, portanto de natureza divina. Verdadeiramente este homem era Filho de Deus (15.39). Princípio do evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus (1.1). A morte e a ressurreição, anunciadas no texto que nos ocupa – vale lembrar que é a segunda vez que isso ocorre no evangelho (8.31-33) – estão em sintonia com o âmago da mensagem geral que Marcos quer levar aos seus leitores, isto é, Jesus é verdadeiramente Filho de Deus.

Ainda que o tema central do Evangelho de Marcos seja a natureza divina de Jesus, o mesmo repete com certa insistência que o seu messianismo não deve ser divulgado. Provavelmente para evitar uma má interpretação do mesmo. A má interpretação já começa pelos próprios discípulos, que não entendem o anúncio da morte e ressurreição. Esses seguem um pensamento messiânico que não transcende os seus próprios desejos, anseios e necessidades temporais. A questão é assumir um poder. Na primeira vez que Jesus anuncia a sua morte e ressurreição, Pedro o repreende, ao que Jesus reage dizendo: porque não cogitais das coisas de Deus e sim a dos homens (8.33). Na segunda vez que ocorre esse anúncio, é dito que os discípulos não entenderam e em seguida passaram a discutir sobre quem seria o primeiro. O termo gnoridsō significa entender ou conhecer. Os discípulos não conheciam e não entendiam a questão da ressurreição. Mas para que a filiação divina se concretizasse, era isso que deveria ocorrer. O anúncio da morte e ressurreição feito pelo Filho de Deus exige uma inversão na lógica do pensamento e das ações quanto aos relacionamentos interpessoais.

A lógica imperante até então é a de ser o primeiro e a de impor autoridade sobre os demais, se preciso for com uso de violência, normalmente usada. A nova lógica prega a máxima: quanto maior o poder, maior o serviço em favor da vida e da paz. Aquele que detém o poder morre em favor da vida. Essa é a boa nova de Jesus. Quem morre em favor dos outros vence a morte, promove paz e é de Deus.

A expressão que encontramos em nossa passagem é Filho do Homem. Essa expressão os evangelistas usam quando o próprio Jesus fala. Mas não se tem certeza sobre se o próprio Jesus se atribuía tal título ou se é uma tradição da comunidade. Mais provavelmente, no Evangelho de Marcos estava ligado ao cuidado sobre a questão do segredo messiânico referida acima.

Sobre a ressurreição que aponta para a esperança da eternidade, podemos citar Paul Tillich: “Nesta visão o processo do mundo significa algo para Deus. Ele não é uma entidade separada, auto-suficiente que, dirigido por um capricho, cria aquilo que quer e salva a quem quer. Antes, o ato eterno da criação é dirigido por um amor que encontra realização somente através do outro, daquele que tem liberdade de rejeitar ou aceitar o amor. Deus, por assim dizer conduz a atualização e essencialização de tudo o que tem ser. Pois a dimensão eterna do que ocorre no universo é a própria Vida Divina. Ela é o conteúdo da beatitude divina. Essas formulações referentes à Vida Divina e sua relação com a vida do universo parecem transcender a possibilidade das afi rmações humanas, mesmo dentro do círculo teológico” (2005, p. 708).

Não nos diferenciamos em essência quanto ao entender dos discípulos. E andamos buscando cada um ser o primeiro, os lugares mais altos e continuamos a promover a guerra no mundo, seguindo a sua lógica. A esperança na ressurreição pode inverter essa lógica? A ressurreição é uma promessa de vida. Nós a entendemos hoje ou estamos na mesma condição dos discípulos naquele momento?

3. Meditação

A vida é relacional. Mesmo que nos isolemos, estamos em relação com a vida e tudo o que implica viver. Cremos que fomos criados à imagem e semelhança de Deus. A criação já nos impôs uma relação: com o Criador e com a própria criação. Viver é sempre estar em relação uns com os outros e com Deus, não importando em que condições. Viver é experimentar as relações entre as criaturas. A pergunta é: que tipo de relações nós estamos tendo a fim de edificar, experimentar?

Cremos que Deus, na própria criação, através dos mandamentos, na pregação profética e, por fim, ele mesmo em Cristo nos indicou um caminho, uma indicação ou critérios para nos relacionarmos. Nós entendemos a proposta de Deus? O texto indica que temos dificuldades quanto ao entendimento.

As passagens bíblicas indicadas apontam que apresentamos profundas dificuldades para produzir experiências de relações que estejam em um nível pelo menos razoável no sentido de promoverem dignidade e paz. Estamos em busca de poder e praticamos um rol enorme de tramas para alcançá-lo. Mas qual o objetivo de alcançar poder, prestígio e fama? Qual o sentido do acúmulo sem limites de riquezas?

Em nossas relações domésticas, como lidamos com o poder? Estabelecemos que tipo de relação? Parece ainda haver uma disputa de afirmação pessoal e busca por imposição de vontades e desejos com uma dose excessiva de satisfação de interesses individuais. Nem sempre se compreendem as medidas necessárias entre vontades pessoais, reais necessidades e possibilidades ou até as responsabilidades.

O poder exercido por Deus se manifesta no serviço ao outro, no serviço à sua criação. Deus presta um serviço à vida. O anúncio da morte e ressurreição indica o poder de Deus, o poder absoluto de Deus em última instância. Só a fé pode captar isso. O entendimento humano, a compreensão humana não possui “frequências” para captar essa mensagem, somente a fé. A fé no poder de Deus, revelado na morte e ressurreição de Jesus, tem efeito prático na vida relacional. A fé transforma o ser humano para uma experiência diferenciada de relações. Foi o que ocorreu na comunidade de Jerusalém, a comunidade experimentou o Pentecostes, cujo resultado foi a busca por uma vida comunitária e relacional bem diferenciada.

Ainda podemos sonhar com relações de paz? Ainda podemos ter a utopia de relações diferenciadas das que vivenciamos? A morte e ressurreição de Cristo nos movem em que direção de vida relacional? Por fim, nós de fato cremos nisso? Cremos na ressurreição? Que sentido isso faz para nós? Em que medida estamos na mesma condição dos discípulos, com dificuldades de entendimento e profundamente preocupados com os lugares que almejamos ocupar?

4. Imagens para a prédica

Sugiro usar a figura das frequências eletromagnéticas, que são a forma de transmissão de sinal de rádio, TV ou internet sem fio. Há um equipamento que emite um sinal com os dados a serem transmitidos e outro equipamento que recebe esses dados através de uma frequência. Os discípulos tiveram grande dificuldade em entender a mensagem da morte e ressurreição de Jesus. Seguiram na frequência do entendimento humano, na lógica “mundana”. A mensagem de Deus em Jesus revela o poder de Deus, um poder transformador de vidas. Ela precisa ser decodificada pela fé, o que faz com que sejamos transformados no sentido de edificarmos relações diferenciadas no mundo, mesmo que não sigam a sua lógica.

5. Subsídios litúrgicos

Confissão de pecados: Sugiro um período de silêncio com a motivação de que a comunidade medite sobre as relações que cada pessoa tem estabelecido ao longo da vida.

Súplicas: Entre uma súplica e outra canta-se, por exemplo, o hino 367 do HPD 2.
Concede, ó Deus, ao mundo o entendimento do teu poder, a fim de que possamos superar o poder do mal no mundo.
Socorre-nos, Senhor, socorre o teu povo que geme por causa das dores, por causa das feridas abertas em função de relacionamentos confl ituosos e violentos.
Ouve os nossos clamores, não feches os olhos para as nossas aflições. Tem misericórdia de nós, o teu povo.
Nós cremos em ti, por isso cantamos louvores e te damos glórias.

Oração do dia: Misericordioso Deus, nós cremos que em Cristo assumiste a natureza humana e revelaste teu poder solidário através da morte e ressurreição, alicerçando uma firme esperança de vida. Porém, também confessamos a nossa dificuldade em entender tudo isso. Humildemente reconhecemos as nossas incertezas e dúvidas. Ajuda-nos a crer, transforma nossa mente e ensina-nos a nos relacionar bem uns com os outros, com dignidade e paz.

Bibliografia

CULLMANN, Oscar. A Formação do Novo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 2012.
TILLICH, Paul. Teologia Sistemática. São Leopoldo: Sinodal, 2005.


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Autor(a): Adélcio Kronbauer
Âmbito: IECLB
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo do Tempo Comum
Área: Governança / Nível: Governança - Rede de Recursos / Subnível: Governança-Rede de Recursos-Auxílios Homiléticos-Proclamar Libertação
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 18º Domingo após Pentecostes
Testamento: Novo / Livro: Marcos / Capitulo: 9 / Versículo Inicial: 30 / Versículo Final: 37
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2017 / Volume: 42
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 50203

AÇÃO CONJUNTA
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fe pecc

Ainda não somos o que devemos ser, mas em tal seremos transformados. Nem tudo já aconteceu e nem tudo já foi feito, mas está em andamento. A vida cristã não é o fim, mas o caminho. Ainda nem tudo está luzindo e brilhando, mas tudo está melhorando.
Martim Lutero
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Quisera não ter outro pensamento que este: a ressurreição aconteceu para mim!
Martim Lutero
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