Justa estima ditada pela sabedoria
Chovera a noite todo na Vale do Taquari, aonde fui assessorar um grupo de lideranças das nossas Comunidades, em um salão à beira do rio, que estava mais de dez metros acima do seu nível normal. A intensa chuva da noite atrasou o início das atividades. Enquanto tomávamos o café como recepção de boas-vindas, conversávamos sobre o morro que desceu, soterrando uma família de sobrenome alemão de uma das Comunidades.
Diante desta calamidade, com voz serena e lágrimas, uma senhora manifestou a sua dor: ‘Sempre pensei que estas desgraças só aconteciam com os pobres que vivem nos morros cariocas! Agora, aconteceu com os nossos’.
As pessoas que ali estavam, todas lideranças ponderadas e com muita sabedoria, ouviram sem julgar a dor, também gerada, em parte, pelo preconceito. A dor daquela mulher precisou ser ouvida e foi ouvida, sem julgamento.
A frase sofrida daquela liderança me levou, ao fim daquele dia de estudos, a concluir com a leitura de Romanos 12.3: Em virtude da graça que me foi concedida, eu peço a cada um de vós que não tenha de si mesmo um conceito mais elevado do que convém, mas uma justa estima, ditada pela sabedoria, de acordo com a medida da fé que Deus dispensou a cada um.
Diferente daquele preconceito, que misturou sabedoria e uma não tão justa estima, são alguns discursos de pastores midiáticos na época de pandemia. Hoje, faço questão de dar nome, pois a sua fala foi pública contra as autoridades paulistas que insistiam no isolamento para proteger as pessoas. Valdemiro Santiago, que se intitula apóstolo, cuja instituição tem uma dívida fiscal de mais de cem milhões de reais com a Receita Federal, falou que viveu na África no tempo da epidemia do Ebola, ‘e nada me pegou. Não é agora que este vírus vai me pegar. Estou protegido’ e continua desdenhando, junto com tantas outras lideranças religiosas, das orientações que buscam nos proteger do contágio.
O referido pastor midiático também desdenhou da exortação do apóstolo Paulo: Não pense de si além do que convém. Cremos em Deus, mas não estamos isentos da contaminação. Confiamos em Deus, mas acidentes acontecem, porém menos se cuidarmos de nós e das pessoas que nos cercam.
Logo, ter um conceito de si mesmo mais elevado que convêm implica renegar uma justa estima. Também poderíamos dizer diferente: ter uma ideia de si mesmo inferior ao que convém nos leva a uma injusta estima. Ambas não são ditadas pela sabedoria que vem da graça, que não nos coloca em cima do muro, mas sob a justiça da graça que atende às nossas necessidades, mas não aos nossos desejos ilimitados.