Relato de vida

Semana Nacional da Pessoa com Deficiência - 2006 - Caderno de Subsídios

01/08/2006

Relato de vida

Aos seis meses de vida contraí paralisia infantil. Minha vida, desde o começo, ficou determinada pela deficiência. Mais determinante, porém, foi o amor e o acolhimento de minha família, pai, mãe, avós, irmã e amigos, que não me deixaram desistir da vida.

Ao ingressar na escola, tive minhas primeiras experiências de exclusão. Até ali vivia no meio da família e de amigos que sabiam lidar com os limites que a deficiência impunha. Conviviam comigo e percebiam minhas capacidades. Na escola, porém, começaram as experiências dolorosas de ser deixada para trás pelos colegas que podiam correr e de receber apelidos dolorosos, ligados à eficiência. Por outro lado, também na escola começou a minha maior experiência de inclusão. Talvez por ter sido no interior, cidadezinha pequena, e por ser de família conhecida, as professoras da escola tinham um profundo respeito por mim e buscavam me incluir em tudo.

No momento da educação física, lembro que se alguma atividade fosse incompatível para mim, outra atividade me era proposta: ser juíza, observar o jogo para dar dicas de melhora, ser torcida organizada ou até mesmo fazer algo para a professora durante aquele tempo. Não me sentia excluída. Posso ver hoje que, se minhas possibilidades de correr, pular, jogar estavam limitadas, outros desafios me eram propostos: ler muito, liderar cantos, explicar algo para alguém que não tinha entendido alguma matéria, até cuidar da turma quando a professora saía. Fui crescendo acolhida e desafiada a ver o que posso e o que não posso. E foi assim, para dentro da vida, no culto infantil, no ensino confirmatório e no grupo de juventude evangélica.

Com isso, quero dizer que é na convivência diária que a inclusão acontece. Para isso, é necessária a presença das pessoas com deficiência em todos os setores e lugares. Sem convivência direta há preconceito. Com a convivência, o preconceito se dissipa. Posso afirmar que o preconceito e a exclusão vêm na mala de quem nunca conviveu ou experimentou proximidade com alguém que tem uma deficiência, seja física, mental ou sensorial. Sem convivência, criam-se medos, inseguranças e preconceito. Convivendo, os fantasmas da exclusão desaparecem.

As leis de inclusão social estão aí para garantir a convivência, a participação de quem tem limites maiores do que os outros. No meu tempo de escola fundamental, as professoras me conheciam, conviviam comigo e viam as minhas possibilidades antes de verem meus limites. Infelizmente hoje, precisamos dessa lei para fazer as pessoas perceberem o que minha família e minhas professoras já sabiam do fundo do coração: que olhando de perto, convivendo, os limites não nos separam, mas aproximam. Que o limite de alguém não precisa ser sua limitação.

Inclusão não é novidade, é mera conseqüência de conviver. Inclusão é pensar JUNTO com a pessoa que tem a deficiência e ir descobrindo maneiras de poder participar.

Se é preciso conviver para incluir, o serviço da Igreja não pode ser outro que oportunizar convivência, partilha e comunhão. O servir tem que ser recíproco. Tanto a comunidade serve as pessoas com deficiência, reunindo-as, como as pessoas com deficiência servem a comunidade trazendo seu potencial e suas experiências de vida. Numa comunidade todos servem, cada um com sua capacidade, seu dom, seu limite. Somente reunindo os diferentes dons e capacidades das pessoas é que uma comunidade pode ser corpo de Cristo. Procure não ver as pessoas com deficiência como aquelas que só recebem o serviço, mas como aquelas que têm a contribuir com o seu jeito, pois elas não são a deficiência em primeiro lugar, mas são pessoas com dons e limites, como qualquer outra.

Que Deus abençoe os nossos dons e que saibamos reconhecê-los em cada pessoa!

Pastora Iára Muller

Índice do Caderno de Subsídios - Semana Nacional da Pessoa com Deficiência - 2006
 


Autor(a): Iára Müller
Âmbito: IECLB
Natureza do Texto: Artigo
ID: 23903
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