Aconselhamento Pastoral, Psicologia e Espiritualidade - I

01/05/2009

   Na nossa sociedade atual, repleta de assuntos e complicações de toda a ordem: emocionais, espirituais, familiares, financeiros, políticos, de saúde, segurança, relacionamento, etc., com a pressão das mudanças éticas, morais, de costumes e hábitos, muitas pessoas precisam de ajuda para lidar melhor com os problemas e apoio para solucioná-los. Nesse sentido, podemos contar com o Aconselhamento Pastoral, sobre o qual vai nos apresentar uma reflexão o P. Lothar Carlos Hoch, que estudou Teologia na Escola Superior de Teologia, em São Leopoldo/RS, e no Luther Theological Seminary, em Saint Paul, Minnesota, USA, é Doutor em Teologia pela Philipps Universität, Marburg/Alemanha, e atua como Professor titular da Faculdades EST, onde foi Reitor entre 1999 e 2006. O texto será apresentado em duas partes: a primeira nesta edição e a segunda na edição de junho, em homenagem ao Dia do Pastor e da Pastora, comemorado em 10 de junho.

   No Seminário de Clínica Pastoral que ministro nas Faculdades EST, em São Leopoldo/RS, costumo incentivar e acompanhar os estudantes a fazerem visitas em hospitais ou em outras instituições que abrigam pessoas que sofrem e peço que eles escrevam relatórios das visitas que os impactam mais fortemente. Outro dia, um estudante compartilhou que visitou um homem e, ao se aproximar do leito, perguntou como estava passando, a esposa interveio e disse ‘Os nossos dias neste hospital têm sido horríveis. Parece ser um local esquecido por Deus. Quem passa pela rua, do lado de fora, não imagina o que se passa aqui dentro!’.
   Este fato expressa duas facetas importantes que merecem ser destacadas: Primeira faceta: esta mulher expressou o que inúmeras pessoas experimentam na hora da doença, da morte de um ente querido, do luto, da separação conjugal, da depressão, ou seja, o abandono por parte de Deus. Eis que chega um representante da igreja e a mulher dispara ‘Assim como Deus está longe, também vocês da Igreja estão longe dos hospitais e não podem imaginar o que a gente passa aqui dentro’.
   De fato, as nossas igrejas costumam se dedicar mais aos assim chamados ‘membros fiéis’, que participam dos cultos e dos grupos organizados, ou seja, mantêm o foco da sua atenção pastoral centralizado no templo enquanto os membros mais afastados ficam em segundo plano, por isso a visita pastoral na hora da crise, justamente quando se experimenta a ausência de Deus, é um dos mais importantes desafios pastorais nos dias atuais. Estou convencido de que as igrejas históricas estão perdendo seus membros para outras igrejas, justamente porque estão deixando a sós os seus fiéis na hora da dor e da crise. Precisamos desenvolver uma concepção mais dinâmica de Aconselhamento Pastoral que não espera as pessoas no templo e na casa pastoral, mas que vá em buscadelas ali onde elas se encontram.
   Segunda faceta: a doença e o sofrimento levantam dúvidas e questionamentos relacionados com diferentes áreas da vida. No leito da enfermidade, as pessoas são obrigadas a parar, têm tempo para refletir e se confrontar consigo mesmas e com a fragilidade humana. Isso pode suscitar o protesto contra Deus, mas pode igualmente levar a pessoa à autocrítica, a fazer um balanço da sua vida e se dar conta de que não cuidou suficientemente da sua saúde,que negligenciou a sua vida familiar, enfim, pode chegar à conclusão de que precisa dar mais atenção à espiritualidade e cultivar a sua relação com Deus.
   No aconselhamento pastoral e psicológico, devemos centrar a nossa atenção no paciente. Para nós, aconselhadores cristãos, abertos a aprender com a Psicologia, a Psicoterapia e a Psicanálise, isso significa: Em primeiro lugar, que em nossa ação terapêutica e pastoral devemos ser sensíveis a todas as necessidades da pessoa, tanto físicas, psicológicas, materiais e culturais e especialmente as necessidades espirituais. Essa sensibilidade especial para a espiri tualidade, contudo, não nos autoriza a querer impor as questões de fé sobre as pessoas e, muito menos, a nossa forma particular de crer.
   Não nos cabe extrapolar a nossa autoridade pastoral e pretender manipular a vontade de Deus para conseguir fins imediatos. Nós nos entendemos como servos de Jesus Cristo e nos colocamos de forma humilde a seu serviço, ora para o consolo, ora a admoestação, ora para a cura, mas, às vezes, não nos é proporcionada a graça de poder animar, consolar e curar e, então, nos resta a mais sublime de todas as nossas ações, qual seja, a de suportar com paciência a fragilidade do outro, sem achar que temos que oferecer uma solução para tudo.
   O genuíno Aconselhamento Pastoral se dá sob o signo da cruz. Aconselhamento Pastoral sob o signo da cruz é o exercício da solidariedade na fraqueza. Aconselhamento cristão é o ato de permanecer ao lado do outro na mais profunda escuridão, sem apelar para soluções mágicas, mas trazer perante Deus tanto a dor e a fraqueza do outro quanto a minha própria impotência.
   Na Capela da Escola Superior de Teologia, em São Leopoldo, atrás da mesa eucarística, há um quadro que apresenta duas pessoas: uma que acolhe a outra, com um braço envolto em torno da mesma, e o outro braço apontando para uma singela cruz que se encontra atrás do altar. O que eu enxergo neste quadro é o seguinte: por mais importante que seja, que eu saiba acolher uma pessoa em seu sofrimento e que eu saiba ouvi-la em profundidade, e jamais devo me entender como sendo o sujeito da cura ou da solução do seu problema. Cabe-me apontar para além de mim mesmo, para Cristo, o bom pastor.

Fé e amor perfazem a natureza do cristão. A fé recebe, o amor dá. A fé leva a pessoa a Deus e o amor a aproxima das demais. Por meio da fé, ela aceita os benefícios de Deus. Por meio do amor, ela beneficia os seus semelhantes
Martim Lutero
© Copyright 2024 - Todos os Direitos Reservados - IECLB - Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil - Portal Luteranos - www.luteranos.com.br