O pescador e sua mulher - um conto de fadas

01/12/2013

Dia após dia o pescador saía de seu casebre malcheiroso e ia pescar. Numa manhã destas fisgou um peixe enorme que mal conseguiu tirar da água. De repente este peixe começou a falar, pedindo que o soltasse, pois era um príncipe encantado. O pescador não teve dúvida: soltou o peixe falante.

Chegando em casa, contou a história à sua mulher. Imediatamente ela o mandou de volta para que pedisse um favor ao peixe, em troca de tê-lo soltado. Mesmo a contragosto ele foi. Chamou o peixe, e fez o pedido conforme instrução da mulher! Pediu uma boa casa.

– Vá pra casa, já está feito! – respondeu o peixe.

Chegando em casa, eis que para sua surpresa encontrou uma casa completamente equipada, e com jardim e horta. O pescador falou: – Agora está tudo ótimo!

Sua mulher, porém disse: – Vamos dormir, depois pensaremos!

No dia seguinte a mulher achou tudo muito apertado naquela casa. Agora queria um palácio!

Lá se foi o pescador pedir um palácio ao peixe. Desejo cumprido, com muito ouro e todo conforto imaginável.

O pescador pensou que agora com certeza sua mulher sossegaria.

Qual nada! Ela dormiu e pensou: Eu poderia ser rainha, depois imperatriz!

A cada 14 dias o pescador teve que chamar o peixe dos milagres. Sendo imperatriz, a mulher pensou, pensou o que mais poderia ser. Finalmente veio-lhe, durante a noite: Queria ser Papa! 

O marido não quis saber de ir ao peixe com tal pedido. Sentiu-se muito mal. Mas, depois de muita insistência da mulher, afinal foi. Havia um vento estranho, o mar estava revolto e escuro, o céu vermelho. O seu medo crescia. Mesmo assim chamou como de costume o peixe:

“Mantje, mantje, timpete Buttje, Buttje in de See (= Buttje no mar). Mine Fru, de Ilsebill (= minha mulher a Ilsebill) will nich so as ick dat will” (= não quer as coisas, como eu as quero).

– Ela quer ser papa!

– Vá para casa, que ela já é! – retrucou o peixe.

Imperadores, reis e cardeais estavam a seus pés, beijando-lhe a mão. O pescador a achou linda, e ficou alegre pensando que agora tivesse chegado o fim das petições de sua mulher.

Mas ela ia pensar na cama, como sempre. Pensando, pensando, o que mais ela poderia ser: Queria mais, ser mais, mandar no sol, na lua, nas estrelas – ser igual a Deus!

Que susto para o pobre marido! De joelhos implorou que ela desistisse. Mas qual nada! O pobre homem enfrentou uma tempestade, mas foi levar o pedido de sua mulher ao peixe. Rochas se partiram, árvores caíram. O mar se tingiu de negro. Mas ele recitou o seu pedido. E qual foi a resposta do peixe?

– Vá para casa. Ela já está sentada outra vez no seu velho casebre!

Uma história fantástica ou verdades vividas por nós? Dois personagens diferentes. Nenhum se sai bem.

Que frouxo, que banana de homem! Nós diríamos. Faz todas as vontades de sua mulher. Torce-se e se contorce. Até implora que ela pare de pedir coisas absurdas ou impossíveis. Mesmo assim, ele vai e faz a vontade dela. Aparentemente ele fica cada vez satisfeito de vê-la em novas situações e posições. Espera que ela também curta o que ele curte.

Aí os dois vão dormir. Ela pensa em mais e mais e mais...

A pergunta que fica? Por que este homem faz as vontades da mulher? Ele enxerga mais longe. Tem vergonha na cara. Mas por outro lado ele também aproveita a nova posição: A casa maior, o palácio, a bajulação de serviçais e poderosos...

Mas “ser como Deus”? Olha o respeito!

Ele aceitou a ambição da mulher – agradou-lhe o proveito. Assim a gente pode  interpretar o procedimento do pescador.

E a mulher? Será que é típico da mulher, pensar, pensar e não se satisfazer com o que tem, mas querer sempre mais? Seja em bens materiais, seja em posição social?

Alguém afirmou que é típico de mulher “ser ambiciosa no seu marido”. O que não parece ser o caso desta mulher. Ambicionava posições cada vez mais altas, degradando o marido a um mero “office-boy”. O fascínio do poder toma conta dela.

Isto não nos lembra um pouco da história de Eva no paraíso, quando a serpente aponta para a fruta e termina explicando “Sereis como Deus”?

Há um ditado que diz: “Quem tudo quer tudo perde”. As duas, Eva como a mulher do pescador, tiveram esta decepcionante experiência. Caíram.

Nosso conto de fadas sempre de novo afirma que ela pensava. Então não agia por instinto. Ela foi, passo a passo, fascinada pelo conforto e pelo poder.

Este conto de fadas pode nos parecer um exagero. Mas ele não convida a refletir? Quais são as nossas prioridades e ambições na vida? Ganhar, ganhar? Subir, subir? Ou existem coisas mais importantes?

Pensar, pensar como a mulher, sim. Mas chegar a conclusões mais sábias para não perder o Paraíso.


A autora é professora aposentada e artista plástica e reside em Curitiba/PR


Voltar para índice Anuário Evangélico 2014


 


Autor(a): Elfriede Rakko Ehlert
Âmbito: IECLB
Título da publicação: Anuário Evangélico - 2014 / Editora: Editora Otto Kuhr / Ano: 2013
Natureza do Texto: Vários
Perfil do Texto: Conto
ID: 34392
REDE DE RECURSOS
+
Se cada um servisse a seu próximo, o mundo inteiro estaria repleto de culto a Deus.
Martim Lutero
© Copyright 2024 - Todos os Direitos Reservados - IECLB - Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil - Portal Luteranos - www.luteranos.com.br