Sob o guarda-chuva de Deus !

01/12/2013

Hoje, no mundo, 75% das pessoas vivem nas cidades. Essa realidade está se refletindo mais e mais na nossa querida Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil. Sim, a grande maioria das pesso- as ligadas às nossas Comunidades Luteranas que ainda moram na zona rural trabalha na cidade. O problema é que não é tão simples viver-se na zona urbana. Nela vive-se numa multidão solitária, onde não se dirige mais a palavra; onde não se trocam mais olhares; onde não se tem mais interesse pela outra pessoa; onde não se é mais conhecido pelo nome e sim pelo que se faz ou pelo que se tem. Até daria para se dizer que o melhor lugar para se esconder das outras pessoas é num grande centro.

Pois é exatamente neste lugar que precisamos aprender a viver como Igreja. Foi por isso que, no ano de 2013, a IECLB começou a estimular a reflexão a partir do Tema do Ano “Ser, Participar, Testemunhar - Eu vivo comunidade” e do Lema Bíblico “Eu sou o seu Deus. Eu lhes dou forças, ajudo e protejo com a minha forte mão.” (Isaías 41.10). E para o ano de 2014 nos propõe como Tema do Ano: “Vidas em Comunhão” – como Lema Bíblico: “Procurai a paz da cidade para onde vos desterrei e orai por ela ao Senhor, porque na sua paz vós tereis paz.” (Jeremias 29.7).

Quantas irmãs e irmãos se perderam, continuam se perdendo na cidade? Faço esta pergunta por que experimentei essa realidade na carne. No final dos anos 50
minha família trabalhava na agricultura no interior de Tenente Portela (RS). Nossa vida era pacata. À noite olhávamos as estrelas e dialogávamos horas e horas quando não ouvíamos o rádio na sala iluminada com uma lâmpada da marca Aladim. Já durante o dia, eu, menino, brincava com os filhos dos índios kaingang e a vida seguia seu ritmo lento, seguro e constante.

Foi de repente a nossa mudança para Porto Alegre (RS). Lembro que meu pai estabeleceu o seu negócio na Avenida Farrapos. O movimento constante de veículos me dava dor de cabeça. Estávamos vivendo uma crise familiar muito grande, por não dominarmos aquele contexto citadino. Num certo domingo, bem cedo, saí a caminhar sem rumo pelas calçadas do bairro onde morávamos: IAPI. Não demorou muito, me vi diante de um templo simpático; de uma igreja, cujas portas estavam abertas. Lá dentro a Comunidade reunida entoava hinos que me eram conhecidos. Ouvi a prédica do pastor, escorado no muro que separava o templo da rua. Não ousei entrar, participar daquela comunhão por causa da minha timidez. Pensei em voltar ali. Mas na época não fui acolhido, e assim o tempo foi passando. Nossa família foi se acostumando ao novo ritmo da capital e as coisas acabaram se sucedendo como sucederam. O fato é que estávamos sem Igreja. Ficamos sem Igreja.

Eu cresci. A vida deu suas voltas. Hoje faz alguns anos que eu, já pastor, quase fui dar de mim na Pastoral Escolar do Colégio Pastor Dohms, bem perto daquele templo que, um dia, tentou me abraçar, a partir dos seus cânticos cristãos. Outro dia, em visita à capital dos gaúchos, parei ali no início da Rua D. Pedro II, 676. Foi naquele espaço que eu bem poderia ter buscado apoio, já aos sete anos de idade.

Todas estas lembranças acabaram direcionando os meus pensamentos para o Salmo 91.1-2 onde se lê que “a pessoa que procura segurança no Altíssimo e se abriga na Sua sombra protetora, experimenta um Deus defensor e protetor”. Na versão alemã está escrito: “Wer unter dem Schirm des Höchsten sitzt und unter dem Schatten des Almächtigen bleibt, der spricht zu dem Herrn: Meine Zuversicht und meine Burg, mein Gott, auf dem ich hoffe.” Muito boa esta ideia. O salmista sugere que Deus é uma espécie de “guarda-chuva” que protege aquelas e aqueles que Nele creem.

Nunca me esqueci! Em 1967 já era noitinha quando eu, com doze anos de idade, saí da padaria com pães debaixo do braço. Chovia cântaros. No que eu abri meu guarda-chuva, logo fui abordado por uma pessoa idosa: - Você me dá uma carona? Claro – respondi. E lá fomos nós, de braços dados com o foco nos nossos endereços.

O “guarda-chuva” que Deus abre sobre nós não tem nada a ver com proteção de sol ou chuva. Trata-se de um guarda-chuva especial para pessoas como nós que aqui nos ocupamos com esta leitura do Anuário Evangélico; para pessoas que têm preocupações; para pessoas que experimentaram e ainda experimentam derrotas; para pessoas que estão às voltas com suas culpas e com seus medos...

Que bom abrigo é este! Pelo jeito o salmista fez ótimas experiências com Deus. Notem que ele não se entendeu como alguém especial; que ele não se mostrou arrogante por causa do cuidado que Deus estava tendo com ele. No Salmo em questão não está escrito que, uma vez achada a proteção debaixo daquele “guarda-chuva”, se está protegida; protegido para o resto da existência. No texto está escrito, isso sim, que o tal “guarda-chuva” de Deus nos dá a confiança, a esperança e a certeza de que Deus vai conduzir os nossos caminhos. É só debaixo da proteção de Deus que podemos nos sentir cuidadas; cuidados, nem mais nem menos que as outras pessoas que também são cuidadas pelo Criador. O cartaz da IECLB para 2013 mostrava exatamente isso!

Verdade é que ninguém pode induzir Deus a agir dessa ou daquela maneira. Se confiarmos em Deus, Ele não nos deixará na mão; Ele se tornará um castelo forte para nós. Só sob a proteção de Deus é que nós podemos nos sentir seguras; seguros dos ataques que porventura viermos a sofrer na cidade. Coisa boa saber disso: Sob o “guarda-chuva” de Deus eu estou protegido de todas as tormentas e de todos os inimigos que possam me machucar. Sim, a nossa vida, presen- te e futura, é fruto das vivências que experimentamos ontem e hoje. Neste momento quando escrevo já é tarde da noite do dia 11 de agosto de 2013 – Dia dos Pais. Hoje pela manhã celebramos Culto. Num dado momento o mesmo foi visitado por três homens estranhos. Eles chegaram atrasados e se sentaram nos últimos bancos. Logo ficamos sabendo que eram imigrantes haitianos. Fazer o quê? Ir buscá-los, acolhê-los, inseri-los na nossa Comunidade; na nossa IECLB. Se Deus se fez homem com o intuito de mostrar Seu amor, abrindo o Seu “guarda-chuva” sobre as nossas cabeças, tanto no campo como na cidade, façamos o mesmo.

Guardem isso! A esperança precisa da nossa lembrança; precisa que nos recordemos, constantemente, das pessoas com as quais tivemos relações; que nos recordemos diuturnamente da nossa relação com Deus. É dessa forma que melhor podemos viver. Comemoremos nos- sa vida com gratidão e enchamos nossa história da esperança; do Momento Novo que já é verdade entre nós, a partir da promoção de encontros.

Hoje vivo meus últimos anos de pastorado. Neles, junto com as lideranças da Comunidade onde atuo, articulo projetos. Sabemos aonde queremos chegar. Olho-me no espelho e me vejo amadurecido pelas experiências que passei, tanto em nível familiar como em nível social. Foi Deus quem me oportunizou tudo isso. Foi Ele que trabalhou em minha vida, sempre se assessorando de ir- mãs e irmãos na fé. Não! Não posso parar de ir ao encontro de quem se pára a ouvir os hinos cantados num Culto que acontece num dos templos da minha; da nossa IECLB.


O autor é Pastor na IECLB e atua na Paróquia Evangélica de Itoupava Central – Blumenau/SC


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Autor(a): Renato Becker
Âmbito: IECLB
Título da publicação: Anuário Evangélico - 2014 / Editora: Editora Otto Kuhr / Ano: 2013
Natureza do Texto: Artigo
ID: 34371
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