Obra Gustavo Adolfo - 90 anos de solidariedade
Armindo L. Müller
A vida humana consiste em dar e receber.
Todos recebemos — todos podemos dar. Pois ninguém é tão rico que não tenha para receber e ninguém é tão pobre que não tenha nada para dar.
Nesta interação acontece toda a convivência humana. Recebemos de Deus e de inúmeras outras pessoas todo tipo de benefícios. E sempre somos chamados a fazer o mesmo por eles, com os dons e recursos que temos.
Este é, em última análise, o motivo da existência da Obra Gustavo Adolfo (OGA). Dar e receber — receber e dar: nisto consiste a razão da sua existência. Não é pois de admirar por que ela adotou como orientação para suas atividades o lema: Receber ajuda para poder ajudar. Com isto ela quer sempre trazer à lembrança de que a fé deve levar à vivência prática. Se a minha fé não me leva a agir em amor e solidariedade, ela ainda não está completa. Fé e amor, fé e ação, devem sempre andar juntos. A fé jamais pode ser propriedade exclusiva e particular. A fé me dá acesso aos benefícios de Deus, e o amor me leva a repartir estes benefícios com as pessoas e as necessidades ao meu redor.
Fundação
A OGA foi fundada em 1910 justamente para que as comunidades necessitadas pudessem ser auxiliadas. Já anteriormente, por volta da virada do século, haviam sido feitas tentativas de fundá-la, mas estas falharam, porque os objetivos propostos foram ousados demais. A intenção de auxiliar as comunidades necessitadas da Alemanha ainda hoje seria um objetivo elevado demais. As dificuldades das inúmeras jovens comunidades que então brotavam em toda a parte, no Brasil, eram grandes demais e todo o auxílio possível deveria ser dirigido para elas.
No transcurso dos noventa anos de sua existência, a OGA foi, para muitos, o único e último recurso para a solução dos seus problemas. A própria IECLB, nos anos críticos da Segunda Guerra Mundial, conseguiu sobreviver e atender seus prementes compromissos financeiros graças aos recursos que a OGA conseguiu arrecadar. Para isso, a OGA teve que desfazer-se de seus bens imóveis e recursos, mas a hora era de ajudar, e de imediato. E, com raríssimas exceções, todas as comunidades e paróquias da IECLB, em algum momento da sua existência, solicitaram e obtiveram maiores ou menores auxílios da OGA. Com os auxílios recebidos, na maioria dos casos, não conseguiram resolver os seus problemas financeiros, mas obtiveram novo ânimo para mobilizar as forças e possibilidades locais. Em toda a parte, onde se participa de um concílio ou reunião, o representante de alguma paróquia levanta e expressa a sua sincera gratidão pela motivação que a OGA lhes deu. Graças a isso arregaçaram de novo as mangas, puseram-se a lutar com mais vigor ainda e conseguiram resolver as suas dificuldades.
Atualidade
A OGA é hoje imprescindível para a nossa igreja. Não apenas porque os recursos provenientes do exterior estão ficando cada vez menores, o que nos obriga a encontrar maneiras e formas de resolver os nossos problemas com as nossas próprias forças. A OGA é imprescindível, isto sim, porque as possibilidades de solução dos nossos problemas estão muito mais em nossas próprias mãos do que imaginamos. Os problemas que nos cercam são enormes, mas as possibilidades de solucioná-los também são enormes. Apesar de toda a miséria, o Brasil é um país imensamente rico. Também a nossa Igreja não é uma igreja pobre. O que falta é uma visão clara da tarefa dos cristãos e das comunidades. Estamos, ainda, apegados demais aos muros dos nossos templos e paróquias. O horizonte do cristão deve ser muito mais amplo.
A OGA encontra aqui a sua grande e interminável tarefa. Ela quer animar, motivar e encorajar as comunidades, departamentos, obreiros e membros para um engajamento maior, para a solidariedade mútua. Ela quer incentivar para que, onde houver necessidades, surja alguém que ajude a minorá-las. Ela quer ser uma espécie de intermediária entre uns e outros. O que a motiva é o lema bíblico: Ajudem uns aos outros e assim estarão obedecendo à lei de Cristo. (Gl 6.2)
Objetivo
Isto tudo ainda parece ser um bonito sonho, distante e inalcançável. Mas pode e precisa urgentemente ser transformado em uma realidade bem presente. Tudo depende de nós. Para que isso aconteça, os órgãos diretivos da Igreja precisam apoiar a OGA com mais profundidade. A OGA ainda é vista e tratada como uma espécie de entidade assessora, encarregada de arrecadar dinheiro a ser distribuído aqui e ali. E, enquanto a OGA for vista e entendida como tal, não poderá alcançar os objetivos a que se propõe. Todos os obreiros devem estar engajados nas atividades da OGA, entusiasmando as comunidades e membros para participarem desta proposta de solidariedade mútua. Enquanto a OGA ainda for vista como entidade a quem apenas devem ser enviadas ofertas e doações ou a quem devem ser encaminhados pedidos de auxílio, ela não terá alcançado os objetivos que a ela são inerentes. Está chegada a hora de comunhão, fraternidade e solidariedade deixarem de ser apenas palavras bonitas.
O objetivo da OGA é o objetivo básico do Evangelho e, por consequência, da própria Igreja: a fé deve ser vivida e praticada em atos concretos de amor e solidariedade. Eu não posso crer apenas para mim; isto é farisaísmo e egoísmo. A fé não fecha as mãos. Ela abre os braços para alcançar a todos, longe e perto. Onde uma comunidade não tem um lugar para celebrar os seus cultos, deve surgir uma outra que lhe oferece condições para poder fazê-lo. Onde alguém chora, deve aparecer alguém que enxuga as lágrimas. Onde alguém sofre, precisa estar alguém que ajuda a aliviar a dor. Onde alguém passa fome, precisa estar alguém que oferece pão. Onde alguém perdeu o sentido de viver, precisa estar alguém que aponta para um futuro cheio de esperança. Esta é a proposta da OGA; para isto ela foi criada e por isto ela existe.
O autor é pastor da IECLB e atua na Comunidade Evangélica Luterana de Nova Friburgo, RJ
Voltar para o índice do Anuário Evangélico 2000
