Quando a luz de Cristo brilhou - 2 Reis 2.1-12

Domingo da Transfiguração do Senhor | ANO B

06/02/2024

 

Amados irmãos, amadas irmãs,

quando a luz de Cristo brilhou, vimos a beleza do Deus-homem.

 

Hoje, vivenciamos um dos domingos mais bonitos e belos do calendário litúrgico: o Domingo da Transfiguração do Senhor. Este é o ápice, o ponto alto da Revelação/Manifestação/Epifania de Deus em Jesus Cristo. Ele nasceu em Belém, recebeu a visita dos Reis Magos, foi batizado por João Batista no Rio Jordão, iniciou seu ministério com curas e expulsões de demônios e, agora, tem sua face transfigurada em um alto monte. Uau! A humanidade teve a oportunidade de contemplar a beleza do Deus-homem Jesus Cristo. Por que a Transfiguração de Jesus é relevante para as nossas vidas hoje, em 2024?

Quando não reconhecemos que a glória de Deus também é revelada em todas as pessoas – que Cristo se esconde dentro delas num “disfarce angustiante” (como disse Madre Teresa), torna-se fácil abusar, desumanizar e explorar os outros. Mas, quando aprendemos a reconhecer a glória de Deus em Cristo, também aprendemos a reconhecer a glória de Deus em todas as coisas e em todas as pessoas – e isto muda tudo.[1]

 

Fomos criados/as à imagem e semelhança de Deus. Reconhecer a glória de Deus em Jesus Cristo, nosso irmão, significa também reconhecer a imagem de Deus em toda a humanidade – mesmo após a queda de Adão e Eva. O brilho da transfiguração não deve ofuscar ou nos tornar cegos para as diferentes realidades de sofrimento no mundo. Ao contrário, o brilho da transfiguração ilumina em todo ser humano exatamente aquilo que nos negamos a enxergar: a imagem de Deus! Iluminados pela glória da transfiguração, passamos a perceber que a glória de Deus não é oposta ao sofrimento, mas se manifesta nele! Na quaresma, vamos refletir sobre isso ao caminharmos com Jesus para a cruz!

Mas, quais são os ensinamentos presentes nesses dois textos tão importantes? Qual é a verdade divina presente nesses textos? O que Deus quer nos ensinar sobre a Transfiguração nesse dia? Bem, para responder as perguntas, vamos precisar olhar para 2 Reis 2.1-12 e Marcos 9.2-9 com mais calma. Vamos lá?

 

1      MOISÉS E ELIAS

 

E Jesus foi transfigurado diante deles. As suas roupas se tornaram resplandecentes, de um branco muito intenso, como nenhum lavandeiro no mundo as poderia alvejar. E lhes apareceu Elias com Moisés, e estavam falando com Jesus.” (Marcos 9.2b-4).

O momento já era glorioso. As roupas de Jesus se tornaram plenamente brancas. Nem mesmo a “Qboa” poderia tornar aquelas roupas tão brancas quanto a glória de Deus que se manifestou em Jesus. Mas não parou aí! Aparecem Moisés e Elias para conversar com Jesus, tornando a cena ainda mais impactante.

Poderia ter aparecido qualquer líder ou profeta. Mas porque apareceram Moisés e Elias?

Moisés foi uma figura importante na história do povo de Deus. Foi chamado por Deus para ser o libertador do povo da escravidão no Egito. Cruzou com o povo o Mar Vermelho e o deserto. Por 40 anos, lidou com a teimosia de um povo desobediente a Deus. E, no fim, Moisés “teve de morrer “em um monte”, não por culpa própria, mas pela culpa de todos nós, antes que aquela terra se abrisse”[2].

Elias foi um dos maiores profetas do povo de Deus, com altos e baixos. De um lado, experimentou um verdadeiro “avivamento” diante de Jezebel e Acabe; então, ele sucumbe e, esgotado no deserto, deseja a própria morte quando um anjo lhe toca e o reanima. No fim – no tempo de Deus –, Elias não morre, mas é arrebatado em um carro de fogo rumo ao desconhecido.[3]

2      CULTO E “AVIVAMENTO”

 

Irmãos e irmãs, Eliseu presenciou a subida de Elias para o mistério dos céus; Pedro, Tiago e João presenciaram o brilho glorioso da Transfiguração do Senhor Jesus. Dois eventos repletos de sinais, brilho e glória. Pedro, Tiago e João participaram de um culto como nunca haviam visto antes: onde a glória de Deus se manifestou no rosto e nas roupas do Senhor. Novamente: Uau! Quando a luz de Cristo brilhou, eles viram a beleza do Deus-homem.

Hoje, usa-se uma palavra para momentos como esse: “avivamento”. Mas, qual é o verdadeiro “avivamento”? Nosso desejo é experimentarmos a paz. Viemos ao culto para cantar “glória e aleluia”, fugir dos problemas e dos sofrimentos do mundo. E, sim, o culto em parte cumpre essa função para que possamos saber, sentir e fazer algo a partir da comunhão com irmãos e irmãs e recebimento da Palavra e dos Sacramentos.

De fato, estar em comunhão e ouvir a Palavra produz prazer. Não precisamos subir ao monte, pois sabemos que Deus desceu até nós. Deus está entre nós. Deus é o anfitrião que nos recebe neste lugar que chamamos de sua casa. E se Deus nos recebe, podemos ter a certeza de que a alegria do reencontro, da partilha e do ouvir da Palavra se faz presente.

Em um primeiro momento, Eliseu, Pedro, Tiago e João experimentaram essa alegria única ao contemplarem eventos únicos. A mesma alegria foi compartilhada pelos discípulos quando Jesus definitivamente subiu aos céus no dia da Ascensão. Essa é a alegria de viver momentos únicos! E no culto também vivenciamos momentos únicos. É bom estarmos aqui, ouvirmos da Palavra, termos comunhão e deixarmos os problemas da vida do lado de fora – por um momento, pelo menos.

 

3      BÊNÇÃO E ENVIO

 

Como seria bom se os textos bíblicos terminassem no ponto alto, no brilho e na luz. Mas, aqui nestes textos, o final não diz “e ali viveram felizes para sempre”. Esse até era o desejo dos discípulos de Jesus: “Então Pedro, tomando a palavra, disse a Jesus: - Mestre, bom é estarmos aqui. Façamos três tendas: uma para o senhor, outra para Moisés e outra para Elias.” (Marcos 9.5). Ao experimentarmos a alegria da presença de Deus, não queremos outra coisa senão permanecermos experimentando tal alegria. Mas, a vida continua!

Ao final do culto, recebemos a Bênção e o Envio. Elas significam que o culto está terminando; ao badalar do sino, inicia-se o culto do dia a dia que nem sempre conta com alegrias e prazeres, mas dores, estresses, ansiedades, relacionamentos difíceis e sofrimentos. O sino anuncia que, após o culto, retomamos as nossas lutas diárias.

Da mesma forma, após a ascensão de Elias, o profeta Eliseu passou por várias dificuldades. Aquele momento glorioso não eliminou seus problemas, mas o tornou espiritualmente capacitado para enfrentá-los. Da mesma forma, Pedro, Tiago e João não puderam permanecer no alto do monte: “Ao descerem do monte, Jesus lhes ordenou que não divulgassem as coisas que tinham visto, até o dia em que o Filho do Homem ressuscitasse dos mortos”. (Marcos 9.9).

A Transfiguração de Jesus faz muito bem a amarra entre o tempo da Epifania e o tempo da Quaresma. Na Epifania, vimos Jesus ser revelado como Filho de Deus e manifestar sinais maravilhosos; o auge foi a transfiguração; e, agora, inicia-se aquela caminhada de 40 dias até o auge do seu sofrimento.

Da mesma forma, vir ao culto não elimina os sofrimentos. Aqui, temos aquele momento de plenitude, pertencimento e alegria; mas, no dia a dia, a quaresma se faz presente: cometemos pecados, enfrentamos tentações, lidamos com situações difíceis... Como é a vida neste mundo!

Mas, ao final do culto, recebemos a bênção e o envio que são a certeza de que o mesmo Deus que esteve conosco neste tempo de comunhão – tão cheio de beleza, gratidão e plenitude – permanecerá conosco nos desafios que enfrentaremos ao longo da semana que está iniciando.

 

 

Amados irmãos, amadas irmãs,

e assim, somos enviados por Deus para uma nova semana. O que isso significa? Não devemos apenas receber o brilho de Jesus; é preciso passá-lo adiante. Quando a luz de Cristo brilhou, vimos a beleza do Deus-homem. Mas não devemos esconder essa luz apenas em nossas vidas. O mundo precisa conhecer essa luz. E, a partir do envio no final do culto, após a bênção, Deus nos motiva a levarmos sua luz aos lugares mais escuros.

Quando aprendemos a reconhecer a glória de Deus ao nosso redor e dentro de nós, então nós, como Jesus, somos inspirados, fortalecidos e recebemos a coragem para enfrentar as trevas, sabendo que, independentemente do que soframos, a luz nunca será completamente extinta. Pode parecer ingénuo, mas o que o mundo precisa é de pessoas que tenham aprendido a capacidade de reconhecer a glória onde quer que ela esteja. Esta é a capacidade que sustenta relacionamentos, que mantém comunidades, que une as pessoas e que nos leva ao serviço altruísta uns aos outros e ao nosso mundo. Sem uma visão da glória de Deus, do glorioso Reino de Deus, torna-se muito difícil trabalhar pela verdadeira justiça e cura. Mas, com esta visão, nenhum sacrifício é demais na busca para que o Reino de Deus se manifeste entre nós – nem mesmo a cruz.[4]

 

Estamos próximos do tempo da Quaresma. Nesta semana, teremos o Culto da Quarta-feira de Cinzas que dá início a este tempo de reflexão, arrependimento e contrição. A cada semana da quaresma, vamos aprender sobre como o mundo procura apagar a luz de Jesus – até que cheguemos à derradeira Sexta-feira da Paixão onde essa tentativa foi ainda mais forte!

Quando a luz de Cristo brilhou, vimos a beleza do Deus-homem. Que a luz do Cristo transfigurado no alto monte esteja conosco na quaresma das nossas vidas especialmente quando enfrentarmos as trevas que buscam encobrir a luz que Jesus nos doou. Amém.

 


[2] GUARDINI, Romano. O Senhor: reflexões sobre a pessoa e a vida de Jesus Cristo. São Paulo: Cultor de Livros, 2021. p. 352.

[3] Cf. GUARDINI, 2021. p. 352.


Autor(a): P. William Felipe Zacarias
Âmbito: IECLB / Sinodo: Rio dos Sinos / Paróquia: Sapiranga - Ferrabraz
Testamento: Antigo / Livro: Reis II / Capitulo: 2 / Versículo Inicial: 1 / Versículo Final: 12
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Prédica
ID: 72247
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