Um de nós | João 12.12-16

Ciclo da Páscoa - ANO B

19/03/2024

Um de Nós
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Amados irmãos, amadas irmãs,

o dia de hoje é uma festa. Como aquele povo humilde de Jerusalém, hoje nós celebramos a humildade do Filho de Deus que entrou na cidade não em um tanque de guerra ou com uma grande cavalaria, mas em um jumentinho, cria de jumenta.

O dia é de festa – mas é uma festa que em si possui um anticlímax. Jesus entrou em Jerusalém montado em um jumentinho, cria de jumenta, e é aclamado como Rei de Israel. Esse é o clímax. Qual é o anticlímax? Estamos nos últimos seis dias de Jesus! E é interessante perceber que o fim de Jesus começa com uma festa! Quem, naquele dia, diria que aquela seria a última semana de Jesus? Quem diria naquele Domingo que na próxima sexta-feira Jesus estaria pregado na cruz? Quem diria naquele Domingo que aquilo era só o começo do fim?

Mas Jesus não estava inconsciente destes fatos. Muito pelo contrário, como Deus-homem e profeta, já sabia de tudo o que iria acontecer. Aquilo fazia parte do plano de salvação de Deus para a humanidade. Teria que acontecer! Embora dias após tenha pedido que o cálice fosse afastado, pediu que o Pai cumprisse a vontade divina: a cruz.

Esta é a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém. Aliás, preciso abrir parênteses aqui hoje. Atualmente, a cidade de Jerusalém fica na faixa de Gaza – que está sofrendo terrivelmente com os ataques do Estado de Israel. Como lembramos no Dia Mundial de Oração, já são mais de 30 mil pessoas mortas. Entre elas, mais de 10 mil crianças. E, como vimos no DMO, há vários cristãos criando interpretações bíblicas que justificam o sofrimento palestino e dizendo que tudo isso é da vontade de Deus. Nesta semana, fiquei me perguntando: se a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém fosse neste ano, como seria? Certamente Jesus teria que desviar de muitos escombros – e corpos... De adultos, de crianças – de inocentes... Se Jesus entrasse em Jerusalém hoje montado em um jumentinho, talvez não haveria pessoas para o aclamarem, pois estariam escondidas em suas casas com medo das bombas e das armas... Se Jesus entrasse hoje em Jerusalém, ele mesmo poderia ser morto por um ataque do Estado de Israel – ironicamente. Ou, em vez de ser preso pelo Sinédrio, seria preso pelo Mossad que é o Instituto de Inteligência e Operações Especiais de Israel.

Podemos também olhar para perto de nós. E se Jesus entrasse em Sapiranga montado em um jumentinho, cria de jumenta, e percorresse toda a avenida 20 de Setembro ou toda a rua João Corrêa? Será que seria reconhecido como Messias e Salvador? Ou seria debochado, escandalizado e maltratado? E se não fosse montado em jumentinho; se, de repente, Jesus andasse por Sapiranga empurrando seu carinho de reciclagem, será que ele seria reconhecido como Messias e Salvador? Ou diríamos: “olha só, não tem mais o que fazer. Vai trabalhar!” E se Jesus não viesse montado em um jumentinho, mas viesse aqui na porta da Igreja pedir alguma coisa para comer, será que reconheceríamos Jesus?

Talvez Jesus seria expulso de diversos lugares simplesmente por ele ser quem ele é! Uma vez escutei alguém dizer que aquela praça coberta no centro de Sapiranga só serve pra juntar “coisa ruim”! Embora tenha ficado muito indignado, não consegui responder a pessoa na hora. Mas pensei em perguntar: você já foi conversar com aquelas pessoas? Já ouviu a história delas? Elas não são “coisa ruim”; não são “sujeira a ser limpada”. São pessoas! Enquanto pessoas, tem história! E quantas vezes fazemos como os sacerdotes e escribas e desprezamos o Jesus pobre e humilde que está bem diante dos nossos olhos.

A cantora norte-americana Joan Osborne fala um pouco disso na sua canção “One of Us” (um de nós). A letra da música diz: “E se Deus fosse um de nós? Apenas um estranho no ônibus tentando voltar para casa? Se Deus tivesse um rosto, como seria? E você gostaria de ver?” Quantas vezes Jesus passa entre nós de maneira tão desapercebida! Queremos enxergar a prosperidade, o progresso, o sucesso, a glória... Não queremos olhar para o sofrimento, a necessidade, a carência, a humildade, a pobreza. Mas é para estes que Jesus olha! Romano Guardini, um falecido teólogo católico, pregou e escreveu:

E quando as autoridades se aproximam do Mestre para perguntar-lhe se estava de acordo com aquele absurdo de ser aclamado pelo povo como Messias, Jesus responde que é precisamente pela boca dos pequeninos, dos humildes, daqueles que nada significam para o mundo, que a verdade se manifesta.[1]

 

Vamos ouvir isso da própria boca de Jesus: “Mas quando os principais sacerdotes e os escribas viram as maravilhas que Jesus fazia e as crianças que gritavam no templo: “Hosana ao Filho de Davi”, ficaram indignados e perguntaram a Jesus: - Você está ouvindo o que estão dizendo? Jesus respondeu: - Sim! Vocês nunca leram: ‘Da boca de pequeninos e crianças de peito tiraste o perfeito louvor’?

O testemunho sobre o Senhor e Messias Jesus não vem da boca dos poderosos e que acham que são alguma coisa; o testemunho sobre o senhorio de Cristo vem da boca dos pequeninos – inclusive das crianças! E se os humildes se negarem a falar sobre Jesus, então as próprias pedras terão de clamar (cf. Lucas 19.40).

 

Amados irmãos, amadas irmãs,

tudo isso para nos dizer que:

 

1.    A entrada triunfal de Jesus em Jerusalém foi escandalosa: Jesus acabara de ressuscitar Lázaro. A fama de Jesus se espalhou por causa desse milagre: “Uma numerosa multidão dos judeus ficou sabendo que Jesus estava em Betânia. Eles foram até lá não só por causa dele, mas também para ver Lázaro, a quem ele tinha ressuscitado dentre os mortos” (João 12.9). Uma multidão afluiu ao redor de Jesus. E a multidão aclama como Rei e Bendito um homem simples montado em um jumentinho, cria de jumenta – como havia sido profetizado pelo profeta no Antigo Testamento (cf. Zacarias 9.9). Da mesma forma, continua sendo escandaloso ver Jesus nos humildes e considerados fracos deste mundo – embora Jesus seja encontrado neles;

 

2.    A entrada triunfal de Jesus em Jerusalém foi profética e histórica: O teólogo Romano Guardini diz:

Ao viver na história, vemos somente as aparências; o seu sentido nos está oculto. O sentido do que acontece é como um relâmpago: é preciso apreendê-lo no momento exato, pois logo em seguida ele volta a ocultar-se. Por isso vivemos num mistério, vivemos de esperança... Mas ao profeta o sentido é revelado. O oculto e o manifesto são uma só coisa. Pelo Espírito, o mistério se torna claro.[2]

 

Os espectadores não entendem, mas Jesus, como profeta, já sabe onde essa entrada triunfal vai chegar! Ele já sabe todo o sentido histórico daquele momento – porque é um profeta! Guardini diz:

Não é o fato de ver o futuro que faz de alguém um profeta, mas sim a sua capacidade de interpretar a história como referência à vontade salvífica de Deus e de projetar na história essa mesma vontade divina. A profecia é a abertura da história para o sentido que Deus lhe dá... É desse tipo de profecia que se trata aqui.[3]

 

Jesus, como profeta, interpreta o acontecimento histórico de sua entrada triunfal em Jerusalém. Ele já sabe o sentido desse momento. Ele sabe o propósito desse momento. Ele sabe exatamente onde esse momento vai dar: a cruz enquanto cumprimento da vontade de seu Pai que está nos céus.

 

Irmãs e irmãos,

esse é o sentido da entrada triunfal de Jesus em Jerusalém. Iniciamos hoje os últimos seis dias de Jesus. Esse é o início do fim. Mas o fim foi o início de um novo começo! Essa entrada escandalosa, profética e histórica vai culminar na glória escandalosa, profética e histórica da cruz – e a cruz vai culminar na esperança da ressurreição.

Deus está entre nós. Deus é um de nós. Vamos ver Jesus naqueles lugares para onde ninguém quer olhar. Vamos ver Jesus naqueles desprezados pelo mundo que só consegue enxergar a prosperidade, o progresso e o sucesso – que, aliás, estão custando caro para a Criação de Deus. Vamos ver o Jesus que caminha pelas nossas ruas de maneira escondida e desapercebida. Vamos ver Jesus no rosto de quem sofre, de quem chora, de quem luta, de quem vive! Vamos ver Jesus e segui-lo. E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará os nossos corações e as nossas mentes em Cristo Jesus, amém.

 


[1] GUARDINI, Romano. O Senhor. São Paulo: Cultor de Livros, 2021. p. 445.

[2] GUARDINI, 2021. p. 447.

[3] GUARDINI, 2021. p. 447.


Autor(a): P. William Felipe Zacarias
Âmbito: IECLB / Sinodo: Rio dos Sinos / Paróquia: Sapiranga - Ferrabraz
Testamento: Novo / Livro: João / Capitulo: 12 / Versículo Inicial: 12 / Versículo Final: 16
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Prédica
ID: 72514
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