Até que enfim, alguém olhou para a gente!
No primeiro domingo de julho, o frio intenso, com temperaturas abaixo de zero, convidava as pessoas a ficarem em suas casas, mas deixei o lar aconchegante, em São Leopoldo/RS, para ministrar uma palestra após o Culto no Encontro de Famílias da Comunidade no centro de Porto Alegre/RS.
Para a minha surpresa, o templo tinha mais de 150 pessoas e quase a metade ficou para a palestra. Mesmo que os aparelhos não dessem conta de aquecer o ambiente, lá estavam pessoas de todas as idades sendo aquecidas pela Palavra e pela Comunhão em Comunidade.
O clima frio da semana inspirou pessoas a buscarem, em um grande ginásio de esportes, espaço para a população de rua tomar uma sopa e dormir. Segundo a pregação calorosa daquele dia frio, também a nossa Comunidade ajudou a motivar o acolhimento do povo de rua para não congelar. A Comunidade demonstrou o seu calor decorrente da fé.
Houve, entretanto, corações que estranharam algumas pessoas do povo de rua terem ido ao ginásio, tomado a sopa e voltado para o seu canto, ou seja, não terem ficado no ginásio. O Pregador enfatizou que o amor não impõe condições. Em nada diminuiu a manifestação do amor caloroso o fato de algumas pessoas de rua não terem aceitado o abrigo para dormir.
Um gesto de amor precisa estar aberto, inclusive, à ingratidão. Estamos amando e não fazendo uma troca, explicou o Pregador, citando a Parábola do Filho Pródigo. O envolvimento da Comunidade e de outras organizações para aquecer a noite do povo de rua da capital gaúcha mostra que o preconceito pode ser uma grande desculpa para não amar. Quem faz conta ou julgamentos a respeito das outras pessoas, especialmente das últimas, pode estar arranjando argumentos para não participar da festa da solidariedade.
Esta ação com o povo de rua sofrido de Porto Alegre e de tantas outras cidades não resolverá o problema daquelas pessoas que fizeram da rua o seu lar. As pessoas que se envolveram nesta ação diaconal não são ingênuas a ponto de considerar tal gesto a solução para o drama dessas pessoas. Na verdade, elas não se deixaram tomar pela ideia que, ‘se não é para resolver tudo, então não há nada fazer’, uma grande desculpa para não se envolver.
O assunto é mais complexo e exige mudanças na nossa sociedade, mas ela pode começar por um gesto assistencial. Como disse uma mulher de rua que se sentiu acolhida: ‘Até que enfim, alguém olhou para a gente’. Esse foi um olhar sem preconceito e que trará mais solidariedade nessa sociedade – de tanto ódio e tanta mentira – que se diz cristã. Será mesmo?